Não ficarão curados. Mas o que
realmente matou, digamos, Chopin? Fibrose cística? E quanto a Dostoievski?
Epilepsia. Edgard Poe? Raiva? Jane Austen? Catapora na idade adulta, talvez. E
Vincent van Gogh? DTS, ao menos em parte.
Médicos já decretaram que
Ebenezer Scrooge sofria de transtorno obsessivo compulsivo (OCD). Sherlock
Holmes deve ter sofrido de autismo, a julgar pelos sintomas. Darth Vader deve
ter sofrido de disfunção limítrofe da personalidade.
Ao elaborar tais diagnósticos,
surgem algumas curiosidades: Teria a hemofilia derrubado a Rússia Czarista? E a
Revolução Americana, teria sido influenciada pela gota? Charles Darwin teria
sido ajudado em sua teoria por mordidas de mosquitos?
O “paciente” histórico mais
antigo a ser sujeito de tais diagnósticos, digamos, um tanto tardios, foi o
faraó egípcio Amenhotep IV (Akhenaton). Praticou heresias, em vida, que lhe
custaram a dinastia mas garantiram sua imortalidade histórica.
No seu quarto ano de governo, Amenhotep
decidiu mudar de nome: seria agora Akhenaton (significava Espírito do Deus Sol
Amon-Rá). Também decidiu extinguir o politeísmo no Egito: o Deus seria agora
Aton, para quem construiu uma nova cidade. Não fez por menos, e anunciou que
era um filho perdido do Deus Aton. Convenientemente, mandou suas tropas
destruírem todos os símbolos religiosos que não fossem a veneração de seu “pai”.
Para completar, eliminou o plural de “Deus”, “Deuses”, da gramática egípcia –
só havia 1 Deus, agora.
Após, transferiu a realização de
todos os serviços religiosos para o dia – eram todos noturnos.
Akhenaton governou por dezessete
anos. Em seu período, as representações artísticas em pinturas passaram a adquirir
um caráter mais realistas, mas apenas nos elementos que não representassem o
rei e sua família. Pássaros, peixes, árvores tudo parecia bastante realista.
Contudo, o Rei, sua esposa Nefertiti e seu filho Tutankamon, mesmo em cenas
domésticas, eram representados por linhas grosseiras, às vezes até mesmo
grotescas, que lembravam pessoas com membros deformados.
Até o reinado de Akhenaton, o
modelo físico dos faraós era Adônis, deus do Norte da África, de ombros largos
e em formato quadrado. Após Akhenaton, os egípcios de sangue-azul pareciam
seres alienígenas. Arqueólogos não economizaram nos adjetivos a Akhenaton, em
suas representações artísticas: louva-seus humanóide, cabeça de amêndoa, braços
de aranha, pernas de galinha, lábios de botox etc. Às vezes ele parecia ter
seios. Em outra, sua virilha é como a de um boneco, andrógino.
A exemplo de diversas famílias
reais ao longo da história, as famílias de faraós casavam-se entre si. Apesar
de Nefertiti ter sido a esposa preferida de Akhenaton, para gerar herdeiros ele
usou sua irmã. Não seria difícil crer em deformidades hereditárias, muitas delas
com conseqüências na aparência física. Inclusive Akhenaton teria sido excluído
de cerimônias na Corte por causa de sua aparência. Na tumba de seu filho
Tutankamon foram encontradas 130 bengalas, muitas devem ter sido usadas desde a
adolescência. Em geral, os médicos identificam as doenças como Síndrome de
Marfan e Elefantíase.
Em 2007, o governo do Egito permitiu
a colheita de DNA de cinco gerações de múmias, incluindo os faraós citados. Ao
fim dos trabalhos, foram essas as conclusões: não foram encontradas grandes
deformidades em Akhenaton e em sua família. Portanto as “deformidades” em seus
retratos eram, na verdade, propaganda pela qual ele era retratado de maneira
distinta de todos os mortais e faziam referência a deuses da mitologia egípcia.
As deformidades genéticas
encontradas eram muito sutis: Tutankamon herdou pés chatos e lábio leporino.
Provavelmente tinha ossos enfraquecidos. Após quebrar o fêmur, certa feita, os
ossos de seus pés gangrenaram, o que demonstra problemas na circulação
sanguínea. Tutankamon assumiu o trono aos nove anos de idade e restaurou a
crença nos deuses antigos, na tentativa de resolver os problemas que o Egito
enfrentava.
Foram encontrados DNA de malária
nos ossos de Tutankamon. Embora antepassados de Tutankamon tenham tido malária
e sobrevivido, no jovem rei ela foi fatal, em razão dos diversos problemas de
saúde de que sofria, e levou-o aos dezenove anos.
Pelo desconhecimento da causa de
tantos problemas genéticos, Tutankamon se casou com uma meia-irmã. Os dois
filhos que tiveram morreram aos cinco e aos sete meses de vida.
A linhagem de Tutankamon foi bastante odiada
no Egito. Após sua morte, Ramsés, um general, assumiu o trono e procurou
extirpar toda e qualquer referência a Tutankamon e toda a sua linhagem.
Em 1962, um médico publicou um
trabalho sobre porfiria. Trata-se de uma disfunção das células sanguíneas. Essa
doença leva ao acúmulo de resíduos tóxicos que causam o descamamento da pele,
nascimento de pelos pelo corpo ou alcançar os nervos, levando à psicose. Com o
tempo, descobriu-se que ela também estava associada à geração de bolhas na pele
e à falta de substâncias químicas no corpo, em alguns casos. Porém, foram tão
poucos os casos conhecidos para se ter idéia de todo o seu potencial.
Um paciente bem famoso de
porfiria foi o rei britânico Jorge III. Ele não se queimava se fosse exposto ao
sol. Sua urina era avermelhada. Sofria de constipação e de olhos amarelados.
Também sofria de acessos de insanidade, ou dizia não conseguir mirar seu
reflexo no espelho.
O rei teve seu primeiro acesso de
porfiria em 1765. O caso foi tão marcante que o Parlamento britânico fez
questão de deixar claro quem assumiria a coroa caso o rei enlouquecesse
completamente. Como vingança pela atitude, o rei demitiu seu primeiro-ministro.
Nessa época, a Grã Bretanha fez
passar a Lei do Selo, o que revoltou suas treze colônias na América. William
Pitt, estadista britânico, foi o responsável por restabelecer o entendimento entre a GB e
as colônias. No entanto, por sofrer de gota, ficou acamado e sem condições
psicológicas de lidar de maneira adequada com o problema. Tanto Pitt quanto
Jorge pressionaram demais os habitantes e se iniciou assim a Guerra que levaria
à independência dos EUA.
Embora longe das insanidades
dinástico-hereditárias das realezas européias, os EUA também tiveram seus
males. John F. Kennedy passou dois terços da infância adoentado. Chegou a ser
diagnosticado com hepatite e leucemia. Na idade adulta, tomava injeção de
hormônios. Sofreu diversos desmaios, a ponto de receber extrema unção por
algumas vezes.
Sabe-se hoje que ele sofria de
doença de Addison. Ela destrói as glândulas suprarrenais e impede a produção de
cortisona. Um dos efeitos colaterais da doença é a pele bronzeada, o que foi
marcante na imagem de Kennedy.
Seus adversários não entenderam
muito bem qual era a doença de Kennedy, mas faziam questão de alertar ao país
que ele poderia morrer durante o mandato ... o que de fato ocorreu, mas por
outro motivo.
A doença de Addison foi descoberta
em 1800. Era a destruição tuberculosa da suprarrenal, efeito colateral clássico
da tuberculose. Mas existe também a originada de causas inatas. Como a irmã de
Kennedy, Eunice, sofria dessa mal, provavelmente a sua tinha causas genéticas.
Em 1959, um médico alertou que
Abraham Lincoln poderia ter sofrido de síndrome de Marfan. O físico esquelético
do ex-presidente e seus “membros de aranha” evidenciam aquilo que é explicado
como uma mutação genética dominante, que ocorre nas famílias. O gene alterado
leva à interrupção da produção de fibroína, proteína com funções estruturais no
organismo. Em geral, os pacientes enxergam mal. Vítimas da síndrome também
costumam morrer cedo, por desgaste rápido e excessivo das artérias. Por mais de
um século, o exame desses tecidos era o que fornecia o diagnóstico da síndrome
de Marfan.
Lincoln foi assassinado aos 56
anos, já reeleito para um segundo mandato. Contudo era visível o rápido
deterioramento de sua saúde. Era fácil supor que eram os problemas advindos dos
anos de guerra, mas pode ter sido um tipo diferente de síndrome de Marfan. Os
seus modos um tanto taciturnos já foram apontados como tendência à depressão.
Os testes genéticos também já
foram usados com um dos fundadores da América: Thomas Jefferson. Em Paris, onde
era representante dos norte-americanos, Jefferson contava com os cuidados de
Sally, que trabalhava para ele. Era negra e tinha laços sanguíneos com ele,
pois o padrasto de Jefferson tinha uma amante escrava. Seus inimigos políticos
diziam que Sally era amante de Jefferson e a chamavam de Vênus Africana.
Jornais diziam que os dois filhos de Sally pareciam a cópia em tom escuro de
Jefferson.
Sendo verdade ou não, Jefferson
emancipou os dois quando atingiram a maioridade, o que não fez com nenhum outro
de seus escravos. Essa paternidade era negada por Jefferson, mas os dois jovens
se vangloriavam de serem filhos de quem eram.
Em 1990, iniciou-se a leitura dos
genes de Jefferson. Como o cromossomo Y não se combina ou cruza com outros
cromossomos, ele é transmitido integralmente aos descendentes. Jefferson não
tinha filhos reconhecidos, mas parentes próximos dele tiveram. Depois,
rastrearam os genes de um dos que supunham ser seu filho. Combinavam
perfeitamente.
Algumas constatações são
intrigantes e incompreensíveis. Jefferson se opunha publicamente ao casamento
entre brancos e negros e chegou a produzir uma lei nesse sentido. Parece bem
hipócrita.
Testes genéticos revelaram que
Gêngis Khan foi o homem mais insaciável da história: seus descendentes chegam a
16 milhões atualmente (1 em cada 200 pessoas do mundo).
Ao seguir as castas sacerdotais
do judaísmo, os geneticistas notaram que os cohanim (sacerdotes e descendentes
de Abrãao, irmão de Moisés) de todo o mundo têm cromossomos Y bem semelhantes.
Isso indica apenas uma linhagem patriarcal.
Também foram os testes genéticos
que constataram que a tribo do Lemba, na África, que desde tempos imemoriais se
dizem descendentes dos judeus – hebreus negros -, que ratificaram suas raízes
judaicas: 10% dos homens têm assinatura cohanim nos cromossomos Y.
(CONTINUA)
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