Segundo Homero, a guerra entre Tróia
e Esparta ocorreu pela disputa envolvendo uma mulher: Helena. O rei de Esparta,
Menelau, casado com Helena, teve a esposa raptada e seduzida pelo príncipe de
Tróia, Páris. O casal fugiu para Tróia. Iniciaram-se negociações diplomáticas
objetivando a devolução da mulher, mas elas falham. Menelau pediu reforços a
seu irmão, o rei grego Agamêmnon, que se juntaram aos ex-pretendentes preteridos
por Helena. Eles juraram defender aquele homem que Helena escolhesse para
desposá-la.
A guerra durou dez anos. Ao cabo,
Tróia foi invadida, saqueada e destruída. Os troianos foram massacrados e as
mulheres e meninas viraram escravas ou concubinas dos espartanos vitoriosos.
Quanto há de verdade nesses relatos?
A cidade de Tróia de fato existiu e foi destruída por invasores. Isso ocorreu
por volta de 1200 a.C. Os poemas de Homero recordam que o episódio ocorreu numa
época compatível com essa data. Alguns historiadores apontam como motivo real
para o conflito algumas disputas em torno de rotas comerciais que cortavam a
região.
Contudo, há quem diga que o
motivo na realidade foi Helena, além de todas as outras mulheres que viviam em
Tróia. Isso mesmo: tratou-se de uma invasão de espartanos desejosos por
capturar e levar para casa as mulheres da cidade vizinha, na porrada!
A tese está descrita no livro “The
Rape of Troy: Evolution, Violence and the World of Homer”, de Jonathan Gottshall,
que argumenta: “As pessoas acham que Aquiles (herói grego daquela guerra) tem
como objetivo a glória eterna simplesmente porque ele diz isso.” De fato,
Gottshall vê apenas uma disputa humana em torno de recursos. Quem garante mais
recursos para os seus, em prejuízo do inimigo.
Parece tosco, rude e primitivo
demais? Talvez fosse essa a realidade vigente à época. Gottshall e demais
pesquisadores propõem que a sociedade testemunha da Ilíada e da Odisséia era
muito pobre, seus heróis viviam em meio a dificuldades. No poema, Homero
descreve porcos e ovelhas passeando no interior de palácios; as rainhas vão
buscar água pessoalmente na fonte e fiam as roupas dos maridos.
A sociedade grega da época de
Homero era uma cultura tribal, muito semelhante às dos índios ianomâmis. A
sociedade grega que Homero descreve, de tempos anteriores, era muito mais
primitiva, excluindo-se apenas o fato de que conheciam a metalurgia. São grupos
pequenos constantemente em guerra com seus vizinhos. Qual o principal motivo
desses conflitos? Mulheres. Era prática de povos antigos em todo o mundo.
O resultado é que os chefes
guerreiros mais poderosos dispunham de um grande número de mulheres – esposas e
concubinas. O grande prêmio desses chefes era a oportunidade de espalhar seus
genes para um grande número de descendentes.
Tudo isso é sustentado sobre o
pilar mais injusto da evolução: o modo como ela trata homens e mulheres. Os
homens podem gerar um número muito grande de filhos com diferentes mulheres;
enquanto que elas estão limitadas pelo número de óvulos e pela menopausa –
além, é claro, de todo o período de gestação.
Para completar o quadro, nas
sociedades gregas o infanticídio de meninas era enorme. Era uma sociedade
guerreira que desejava alocar seus recursos ao maior número de guerreiros,
portanto homens. Com a redução gradual no número de meninas, com o tempo também
faltavam esposas. Bom, eles resolviam isso indo à guerra ... por mulheres. E
os jovens iam à guerra feito loucos!
Apenas para medir o grau de
dedicação que eles vertiam para essa tarefa: Quando Agamêmnon resolveu tomar
para si a escrava preferida de Aquiles, deu-se início a um conflito tão
acirrado entre ambos que o maior herói grego pôs o rabo entre as pernas e se deu
por vencido. A reação do herói foi a história descrita na Ilíada como a “cólera
de Aquiles”.
Importante fazer notar que a
espécie humana não conta com machos alfa, embora seja comum repetir essa
falácia. Machos alfa monopolizam as fêmeas do grupo, o que é até mesmo
impraticável em humanos, que tendem a formar grupos bem numerosos.
As mulheres, por sua vez, não
apenas viviam naquele tipo de sociedade como ainda encontravam maneiras de
manipular os fatos em seu favor, como Clitemnestra, irmã de Helena e esposa do
rei Agamêmnon, que vê na ausência do marido a chance de se juntar a seu amante
na tarefa de matar o rei, seu marido. Quanto a Helena, é perdoada por Menelau e
volta a casa como rainha, de novo.
Por fim, recorde-se a frase de
Aquiles, em cólera e relembrando suas batalhas passadas: “Passei muitas noites
insones e dias sangrentos na batalha, lutando com outros homens por suas
mulheres.”
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Além de Darwin: o
que sabemos sobre a história da vida ...”
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