A inteligência humana costuma ser
estudada pela forma e rapidez com que o DNA se dissemina por uma população. Em
2005, cientistas informaram que dois genes, que já eram produto de mutações
anteriores, conseguiram se disseminar em grande quantidade: o gene da
microcefalia, que se disseminou 37 mil anos atrás; e o gene ASPM (relacionado
às divisões celulares que resultam em neurônios), 6 mil anos atrás.
Seguindo o ritmo da natureza,
caso dada mutação se dissemine, esta mutação provavelmente trouxe vantagens,
mostrou-se benéfica para a espécie. No entanto, descobriu-se um efeito carona na
transmissão genética. Caso certo gene se encontre muito próximo de outro,
poderão ser repassado conjuntamente, sem que o organismo consiga dividir o DNA no
ponto específico de separação. Isto é, genes que podem não ser benéficos, podem
ser passados aos herdeiros por meio de carona com outro, este sim benéfico.
Cientistas verificaram que tanto
o gene da microcefalia quanto o ASPM foram disseminados por efeito carona.
Em 2005, o geneticista Bruce Lahn
passou a pesquisar a relação entre genes da microcefalia e ASPM e a influência
deles sobre o crescimento dos neurônios. Ele não só percebeu diversas versões
desses genes como ainda pôde visualizar diversos caronas. Outra coisa que lhe
chamou a atenção foi a velocidade estonteante com que se espalharam.
Essa velocidade de disseminação
só poderia ser conseqüência de alguma eventual vantagem que tais genes possam
ter trazido à espécie. Sabendo que esses genes têm influência sobre a produção
de neurônios, Lahn argumentou que eles trouxeram alguma vantagem no campo
cognitivo, incrementando nossa inteligência.
De fato. No entanto, as versões
tanto da microcefalia quanto do ASPM que aumentam a capacidade do cérebro são
específicas, e se disseminaram entre 3.500 a.C. e 4 mil a.C. Foi nesse período
que surgiram as primeiras artes simbólicas e as primeiras cidades.
O passo seguinte deu origem a
muitas confusões na academia. Essa versão que aumenta a inteligência foi
observada mais frequentemente entre asiáticos e caucasianos do que entre
africanos. Racismo? Isso foi argumentado.
O ponto é que a próprio
questionamento sobre a eventual existência biológica de raças é questionada. E
a razão alegada é que alguns grupos étnicos respondem muito mal a certos
medicamentos, como o contra hepatite C e doenças cardíacas, entre outras. Outras
populações respondem biologicamente muito mal à fartura de alimentos dos tempos
modernos, em contraste com as condições de escassez que as acompanharam ao
longo da evolução.
Existe uma teoria que diz que
descendentes de escravos capturados na África ajudam a elevar as taxas de
hipertensão até hoje. A razão é que o organismo daquelas pessoas acumulava com
mais facilidade nutrientes, como o sal, o que lhes permitia maior resistência e
capacidade de sobrevivência, tanto em seus locais de origem como para a própria
viagem transoceânica em navios negreiros, que tantas vítimas fez. Por outro
lado, seus descendentes têm acesso a uma quantidade de sal e demais nutrientes
em excesso, o que se reflete em diversos problemas de saúde.
Outra doença que depõe contra a
inexistência biológica de grupos distintos a ponto de apontarem para a
existência de raças humanas é a AIDS. Alguns grupos étnicos apresentam
indivíduos com imunidade ao HIV – e por razões que variam bioquimicamente entre
os grupos.
O mesmo ocorre com Doença de
Crohn, diabetes, câncer de mama e outras. Alguns cientistas dizem que argumentar
pela inexistência de raças pode prejudicar os pacientes. Raças, no ponto de
vista deles, seriam populações que apresentam versões diferentes de certos
genes.
Segundo alguns deles, ao mapear
esses genes com versões significativamente diferentes, chegam-se aos grupos
tradicionalmente apontados como raças: africanos, asiáticos, caucasianos ... O
que tirou o impulso inicial de fazer uso dessa classificação são os cruzamentos
geográficos, que geram muitas justaposições e sobreposições genéticas. Caso
clássico são os indianos, nascidos num cruzamento geográfico milenar. Nestes
últimos, o conceito de raça torna-se completamente impreciso.
Quanto aos efeitos práticos
desses genes, observou-se que eles pareciam auxiliar os espermatozóides a bater
a cauda com mais velocidades. Também trazem novas defesas ao sistema
imunológico. Por fim: pessoas portadoras desses genes tiveram melhor desempenho
em testes de QI.
Interessante comparar o que está
descrito acima com o impacto que esses genes tiveram primeiramente no corpo
humano. Cerca de 30 mil a.C., nosso DNA reduziu o tamanho médio do corpo humano
em 10%. O cérebro humano foi reduzido em 10%, também – acredita-se que se tenha
reduzido ainda mais, desde então. Quem fez isso?
Desde então caiu por terra
qualquer menção à relação entre tamanho do cérebro e inteligência superior.
Alguns números: o cérebro humano pesa em média 1,4 Kg; o cérebro de Ivan
Turguêniev pesava 2 Kg; Daniel Webster e Charles Babbage, um estadista e um
matemático famosos, tinham cérebros na média. O grande poeta Walt Whitman tinha
um cérebro de vergonhosos 1,25 Kg. O criador da frenologia, ciência que estuda as
regiões cerebrais e suas funções, Franz J. Gall, tinha um “cerebrozinho” de 1,2
Kg.
Desses testes, certamente o mais
famoso foi o “roubo” do cérebro de Einstein. O físico alemão morreu no dia 18
de abril de 1955, de hemorragia interna após sofrer um aneurisma na aorta. Um
dos homens mais admirados do mundo, foi submetido a uma junta médica
internacional, mas não resistiu. Surgiu então a pergunta: quanto pesaria o
cérebro de um dos homens mais inteligentes do mundo? Einstein não concordou com
a idéia de bisbilhotarem seu cérebro após sua morte porque detestava a idéia de
que este pudesse ser tratado como relíquia, algo que lembrava religião ... Não
combinava consigo e com sua modesta.
Porém, o patologista de plantão
quando da chegada do corpo, Thomas Harvey, não resistiu à curiosidade e até se
imaginou fazendo um favor à humanidade quando planejou como “roubar” o cérebro
do criador da Teoria da Relatividade. Como Einstein exigiu ser queimado, Harvey
extraiu o cérebro inteiro, sem avisar a ninguém, e devolveu o corpo à família.
Interessante dizer que um médico
de Nova Jersey “roubou” os globos oculares de Einstein, em 1955. Anos depois
ele recusou uma oferta milionária de Michael Jackson pelas “bilhas” do gênio. O
resto do corpo foi cremado, algum tempo depois, sem mais “desvios” de órgãos.
Após a pesagem, a dúvida virou
decepção: 1,22 Kg, abaixo da média dos humanos. Quando a notícia se espalhou –
a cremação ainda não havia ocorrido -, a família protestou, mas terminou
concordando que se realizassem outros estudos na massa cinzenta do cientista.
Apenas três estudos foram
publicados com base no órgão central de Einstein: realmente não acharam nada de
extraordinário. Talvez pesquisas relacionadas ao método de crescimento do
cérebro possam trazer algum resultado posterior, que apontem alguma
característica física que explique diferentes desempenhos.
A tese de que o tamanho do
cérebro explica sua capacidade saiu de “moda”. Em seu lugar, as pesquisas
focavam no tamanho de certas áreas do cérebro. Os primatas apresentam axônios:
prolongamentos carnudos de neurônios. As informações circulam com mais
velocidade. Outro fator importante é a espessura do córtex – região sede de
pensamentos, sonhos etc. Certos genes são cruciais nesse processo.
E aí nossa historinha chega ao
ponto! O fato de que a espessura do córtex é um fator relevante no
desenvolvimento da inteligência e de que genes são os responsáveis por esse
desenvolvimento fica claro quando esse processo não corre com eficácia:
desenvolvem-se cérebros pequenos e primitivos. Um desses genes é o ASPM – primatas
têm trechos extras de DNA de ASPM em relação a outros mamíferos. As tiras
extras de aminoácidos (isoleucina e glutamina, a “química da inteligência”) formados
se acumulam no córtex.
Outra função fulcral dos genes de
ASPM é o aumento da densidade de neurônios – também fator essencial da
inteligência. Esse processo ocorre nos primeiros dias de vida, quando a maior
parte de nossas células é de células-tronco (células não especializadas, que
podem se tornar qualquer outra). O mesmo
vale para os neurônios.
O ponto é: quando uma
célula-tronco se torna um neurônio, a produção pára. Somente novas
células-tronco se tornam neurônios. Um cérebro grande exige acúmulo de
células-tronco. Portanto a divisão celular inicialmente deve ocorrer entre
células-tronco gerando novas células-tronco, antes que se especializem em
neurônios.
A divisão celular é controlada
pelos genes ASPM, que controlam os fusos que ligam os cromossomos. Se ocorrer
algum erro nesse processo, os neurônios podem se formar cedo demais e o cérebro
que se forma é defeituoso. O ASPM não garante cérebros grandes, mas cheio de
neurônios.
Voltando ao cérebro de Einstein,
embora pequeno, era bastante denso em função do formato do seu córtex
pré-frontal. Esta parte do cérebro coordena os pensamentos e é responsável por
resolver problemas e dividir tarefas em etapas.
Quanto às rugas e dobras no
cérebro, há algo também interessante. Elas por si sós não garantem mais Inteligência,
mas macacos menos espertos possuem menos rugas que os cérebros de macacos mais
inteligentes. Crianças que sofrem da síndrome do “cérebro liso” apresentam
sério retardamento. Quando nossos genes começam a enrugar nosso cérebro
(afinal, nascemos com ele quase liso), estamos nos distanciando de nossos ancestrais,
desde primatas.
Einstein tinha corrugações
diferenciadas na região do córtex do lobo parietal – responsável pelo
raciocínio matemático, processamento de imagens, sons, dentre outros sentidos.
Ele disse que pensava em física por meio de imagens ...
Seu córtex também era 15% mais
espesso que o das demais pessoas.
Por outro lado, uma parte de seu
cérebro chamada opérculo parietal parecia ausente. Essa parte do cérebro ajuda
a produzir imagens: Einstein começou a falar aos dois anos e porque até os sete
tinha que pronunciar em voz alta as sentenças que pretendesse formular. Quer
mais um detalhe: a falta dessa região, por seu turno, pode tornar as
transmissões de informações mais rápidas.
Conclusão: vamos esperar mais
descobertas nesse campo ...
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “O polegar do
violinista”
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