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quinta-feira, 3 de novembro de 2016

PROUDHON: O FIM DA PROPRIEDADE PRIVADA COMO GERADOR DE RIQUEZAS


Em 1853, o pintor impressionista Gustave Courbert pintou um retrato de Pierre-Joseph Proudhon. Ao melhor estilo do pintor, foi pintada ao ar livre, num jardim, sentado sobre dois degraus. A mão direita descansa sobre a coxa. A mão esquerda afaga a barba. O olhar parece distante. Á sua direita, repousam livros, alguns abertos. No primeiro degrau, papéis. Às suas costas, um tinteiro e uma pena. Veste uma bata larga de linho branco. Duas meninas o acompanham: suas duas filhas.

Foi este homem quem declarou: “A propriedade privada é um roubo!” Proudhon  foi um revolucionário socialista, portanto defensor da igualdade. Contudo sua linha de pensamento era bastante individualista. Essa contradição pode ser explicada voltando-se às suas origens.

Courbet e Proudhon eram da região do Franco Condado, fronteira com a Suíça. Era uma região de comerciantes e artesãos, gente acostumada a se dedicar a atividades individuais. Sentiam-se desconfortáveis com o caráter anônimo e coletivo do Estado. Essas pessoas festejavam a independência, o fato de poderem governar suas vidas sem ter de dar ouvidos a decisões de burocratas, tomadas a centenas de quilômetros dali, por pessoas que mal conheciam a realidade local.

Era um mundo rural e burguês, de raízes individuais e com pessoas orgulhosas de sua independência. Dali, também provieram Victor Hugo e Charles Fourier.

Proudhon teve uma infância pobre. Seu pai fracassou na tentativa de montar um negócio próprio. Teve de largar os estudos e trabalhar para contribuir com o sustento de casa. Aprendeu o ofício de tipógrafo. Leu muito, sobre os mais diversos assuntos. Tentou estabelecer um negócio em Besançon. Fracassou.

Aos 28 anos, escreveu um livro sobre gramática. Por causa deste, ganhou uma bolsa para estudar na Academia de Besançon. Na sequência, foi a Paris. Ali, ao se deparar coma pobreza e o sofrimento das pessoas, mudou muito intelectualmente.

Em 1840, publicou “O que é a propriedade?” A resposta, no próprio texto, era: “A propriedade é o roubo.” A inspiração para a frase foi de Jacques Pierre Brissot, intelectual da Revolução Francesa.

Para Proudhon, homem que provinha de um ambiente de muito trabalho, que valorizava sobremaneira o esforço individual, a propriedade privada rendia benefícios ilegítimos, pois estes não eram derivados do trabalho.

Proudgon distinguia entre possessão e propriedade. A possessão era composta por bens de uso, enquanto a propriedade era o capital, as máquinas, os bens de raiz. Por não recusar a existência da posse individual, Proudhon foi acusado de se socialista burguês pelos comunistas.

Seu individualismo se manifetava até no orgulho que sentia por ser autodidata, ter aprendido o que sabia sozinho. Não concordava totalmente com as ideologias socialista e comunista. A esquerda o defenestrava por não se opor ao sistema de classes do capitalismo – Proudhon desejava apenas conciliá-las. Os capitalistas acusavam-no de não levar em conta a capacidade do capitalismo de se adaptar à realidade, não considerava seu caráter progressista.

Como um bom individualista, Proudhon não se importava de não se filiar a qualquer corrente de pensamento. E no momento em que o nacionalismo atingia seu auge, chegava a flertar com o perigo. Enquanto, para muitos, o Estado nacional significava liberdade, para Proudhon o Estado centralizado era sinônimo de fim das liberdades individuais.

Para ele, a sociedade deveria se organizar em pequenas unidades autônomas – novamente seu condado natal se fazia presente em suas teses -, sem qualquer instituição acima delas (nem Estado nem Igreja). Também não via necessidade de existir dinheiro. Acreditava que um intercâmbio de mercadorias, que envolvesse um número suficientemente grande de pequenos produtores, poderia substituí-lo. Novamente, somente benefícios advindos do trabalho seriam aceitos. Em sua teoria, defendia o fim dos direitos de herança, que evitaria o acúmulo de propriedades. Portanto ninguém estaria em condições de exercer o poder econômico nem político sobre os outros.

Em 1846, Karl Marx pediu que Proudhon o ajudasse no movimento comunista. Em carta de resposta, escreveu Proudhon: “Procuremos juntos, se quiser, as leis da sociedade, as formas como estas leis se realizam ... Mas, por Deus!, depois de ter derrubado todos os dogmatismos a priori, não pensemos em doutrinar o povo, por nossa vez ... Lutemos de forma séria e leal, demos ao mundo o exemplo de uma tolerância sábia e prudente mas, por estar À cabeça do movimento, não nos tornemos chefes de uma nova intolerância e não nos apresentemos como apóstolos de uma nova religião, mesmo que fosse a religião da lógica, a religião da razão ... Não consideremos nunca que uma questão se esgotou, e quando tivermos utilizado o nosso último argumento, comecemos de novo, se necessário, com eloqüência e ironia. Com esta condição, entrarei com prazer na sua associação; senão, não!”

Após esta carta, Marx apelidou-o de ideólogo pequeno-burguês.

Em suma, o anarquista Proudhon não queria o embate de classes previsto por Marx; mas desejava a supressão das diferenças de classe, por meio de uma forma de sociedade em que cada um pudesse desenvolver sua capacidade individual, livre de qualquer tutela.


Rubem L. de F. Auto

    

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