No começo de 2007, Knut era um
filhote recém-nascido de urso polar, órfão de pai e abandonado pela mãe. Foi
criado no Zoológico de Berlim. Até aqui, nada de anormal. Porém, um grupo de
ativistas alemães defensores dos direitos dos animais fez uma proposta que
causou comoção no mundo todo: sacrificar o bichano! Argumentavam que sua
criação não seria natural e a separação futura de seu criador causaria imenso
sofrimento no animalzinho.
Independente do que se pense
sobre os métodos mais aconselháveis de criação de ursos-polares, parece ser
algo desumano sacrificar um ursinho-polar. O mesmo vale para filhotes de
mamíferos em geral: eles simplesmente parecem demais com bebês. A mente humana é
pré-programada para se derreter diante de bichinhos fofinhos.
Segundo pesquisas, a preferência
que nutrimos por traços de recém-nascidos serviu como motivo para a seleção da aparência
de animais domésticos e mesmo de espécies na natureza, tudo realizado por nós,
humanos.
O processo que será descrito a
seguir tem um nome grego: pedomorfose, que chamaria de “cara de bebê”. Esta
descreve a persistência de características infantis ao longo do processo de crescimento.
O que podemos perceber em comum
entre bebês de mamíferos (e vertebrados em geral) e bebês humanos, especificamente?
Cabeça desproporcionalmente grande em relação ao resto do corpo, olhos grandes,
nariz ou focinho curto. No caso dos mamíferos, pelos ou pele macios e aquelas gordurinhas
no queixo que deixam o rosto com aquele aspecto fofinho.
Mas qual seria a função dessa
aparência? É claramente uma chantagem emocional direcionada aos adultos. A
aparência de bebê sinaliza necessidades de cuidados, vulnerabilidades. As
espécies que souberam melhor usar essa aparência, ao longo da evolução, foram
mais paparicados pela mamãe e sobreviveram mais saudáveis. E assim esse aspecto
físico persistiu nas gerações seguintes.
O mesmo ocorre nos cães. Contudo,
nesse caso, o responsável por selecionar os mais fofos fomos nós, humanos. A
pedomorfia é um aspecto presente nas raças de cães que mais se multiplicaram ao
longo do tempo – evidentemente isso só ocorreu porque nós permitimos. Quais as
características presentes nos cães que mais favoreceram sua evolução? Orlhas caídas,
rabinhos que abanam, pelos com manchinhas, e que latem (em vez de uivar, como
faziam seus ancestrais lobos).
Uma experiência, ainda em curso,
na Rússia tenta explicar como ocorreu esse processo: cientistas passaram a
selecionar raposas pelo critério de docilidade - as mais mansas tinham a
preferência na hora da reprodução. Após algumas gerações, selecionaram-se
basicamente raposas de orelhas caídas e de pelo manchado, aparentemente quase
cachorros.
Por fim, alguns sustentam que nós
mesmos somos versões “pedomorfisadas” de chimpanzés. Sustenta-se que aspectos,
como os poucos pelos que temos, é resultado apenas de nossa preferência e
resultou nessa pedomorfose.
O famoso paleontólogo Stephen Jay
Gould realizou essa análise num famoso ratinho: Mickey Mouse. Ao pôr diversas
imagens que Mickey foi tomando ao longo dos anos, analisando as diferenças nos
desenhos do ratinho, desde seu nascimento quase adulto, Gould demonstrou que,
inconscientemente, os desenhistas da Disney faziam uma espécie de pedomorfose.
A explicação metabólica para a
pedomorfose é a redução no ritmo de desenvolvimento, um atraso nas mudanças
morfológicas que levam à aparência adulta. Qual a causa da seleção de quem tem
a cara mais infantil? Seleção sexual: traços de quem “precisa de carinho e
proteção” devem ter sido considerados mais atraentes na hora de conseguir um
parceiro sexual. Caso tenham se revelado vantajosas nesse sentido, tais
características fatalmente persistiram nas gerações seguintes.
Entendeu porque tantas pessoas
queriam espancar uns alemães “defensores” dos animais?
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Além de Darwin: o
que sabemos sobre a vida ...”
http://img.timeinc.net/time/photoessays/2008/flocke/flocke_01.jpg
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