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terça-feira, 22 de novembro de 2016

JUSTIÇA PORTUGUESA: RAIZ DA BARBÁRIE JUDICIÁRIA BRASILEIRA?


Dom José, rei de Portugal, era casado com a princesa espanhola Mariana Vitória de Boubon. Publicamente, todos também sabiam que ele tinha uma amante: Maria Teresa de Távora. Esta era irmã caçula de Dom Francisco, Marquês de Távora, e casada com o filho deste, Dom Luís Bernardo. Esse tipo de casamento era bem comum entre os nobres da época.

A família de Maria Teresa era de grandes fidalgos que vinham sendo prejudicados pelas reformas do Primeiro-Ministro de Portugal Sebastião José, o Marquês de Pombal.

Em 3 de setembro de 1758, à noite, o rei deixou sua residência em direção aos braços carinhosos de Maria Teresa. Decidiu seguir o conselho de um de seus amigos mais próximos, Pedro Teixeira, que estava preocupado com a reputação do rei. Pedro pensava que a carruagem real chamava muita atenção, não se coadunando com encontros que deveriam prezar pela discrição. Pedro ofereceu então sua própria carruagem.

Partiu então o rei, serelepe e cheio de amor no coração ...

Quando retornando a seu palácio, a carruagem que transportava o rei foi emboscada. Era uma cilada. Três homens, protegidos pela escuridão das ruas, dispararam vários tiros na direção da carruagem. O cocheiro instigou os cavalos e os fez trotar embora o mais rápido possível. Dom José foi atingido em um dos braços, mas tanto ele como seu cocheiro conseguiram escapar com vida.

Instalou-se uma dúvida imediatamente: tratava-se de regicídio ou de um engano envolvendo Pedro Teixeira e seus desafetos, desinformados sobre o real ocupante da carruagem naquele momento? Sabia-se que o Duque de Aveiro, um dos homens mais poderosos de Portugal, odiava Pedro Teixeira – o motivo do desentendimento também se relacionava a mulheres. Portanto o rei teria sido apenas o homem errado, na hora errada e no local errado.

Independente dos reis motivos, Sebastião José, o Marquês de Pombal, viu no episódio a chance que faltava para se sobrepor de vez ao poder nobiliárquico, em decadência em Portugal, e instaurar um poder despótico e de cunho iluminista.

Primeiramente, Pombal proibiu Pedro Teixeira de dizer ao rei que a tentativa de homicídio poderia ter sido planejada contra si, não contra o rei. Depois, Pombal ordenou buscas em todo o reino a fim d encontrar os culpados pelo incidente. Dois homens foram encontrados, barbaramente torturados e, claro, “confessaram” exatamente o que Pombal queria ouvir.

Segundo a confissão, tratava-se de regicídio e os mandantes eram membros das famílias Távora, Aveiros e Atouguias. Não por acaso, essas três famílias pretendiam entronar o próximo rei de Portugal, o Duque de Aveiro. Estabeleceu-se a versão que cobriu Pombal de sinceras alegrias: o mandante do crime foi Luís Bernardo, o marido corneado, que o fez para lavar sua honra.

Sem direito a qualquer julgamento, o Duque de Aveiro, seus dois filhos e muitos outros membros de diversas famílias nobres foram condenados à pena de morte, da forma mais bárbara e sádica possível. Para garantir que toda a nobreza portuguesa entenderia o recado – não se ponha no caminho de Pombal! -, obrigou-os a assistir à carnificina.

Esta ocorreu em Belém, num campo aberto às margens do Tejo. Primeiro, ordenou Pombal que todos tivessem seus braços e pernas quebrados a marretadas. Após, foram garroteados e seus órgãos sexuais estraçalhados. Seus corpos foram untados com breu e queimados vivos. Fizeram isso com todos. As labaredas dos corpos em chamas eram vistas à distância, desde Almada. Por horas, o cheiro de carne humana queimada impregnou o ar.

Por fim, Pombal ordenou que suas cinzas fossem lançadas ao mar e seus nomes fossem riscados da nobreza, suas casas e palácios foram destruídos e os terrenos salgados, para que nada mais brotasse em seu solo ...

Este episódio ficou tão marcado na memória coletiva que, décadas depois, quando do julgamento dos inconfidentes de Minas Gerais, somente Tiradentes foi condenado a pena semelhante, porque ainda não se havia superado o mal estar causado por este julgamento.


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “1789 – A inconfidência mineira e a vida cotidiana nas Minas ...”           

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