Voltando no tempo 4 bilhões de
anos, o que se poderia observar? Bom, por alguns 600 milhões de anos, o que
existia foi compreensivelmente batizado de Éon Hadeano (na mitologia grega,
Hades guarnecia a entrada do inferno). A Terra sofreu nesse período bombardeios
incessantes de asteróides e impactos de outros cometas, além de ter se chocado
com pelo menos um Paneta do tamanho de Marte (esse último episódio conferiu
densidade à Terra, o que explica sua gravidade relativamente forte).
Quando as coisas se acalmaram,
criou-se um ambiente que favorecia o surgimento da vida. Na Groenlândia e na
Austrália foram achados, em rochas muito antigas, carbonatos: minerais formados
pela ação de microrganismos.
A vida é composta de moléculas
orgânicas, cujo elemento mais importante é o carbono. Essas moléculas se
desenvolvem nos ambientes os mais diversos. Em nuvens cósmicas existem
moléculas como a do etanol – ou álcool etílico. O universo está cheio de
aminoácidos, que compõem as proteínas.
Porém, o grande salto
evolucionário, partindo dessas moléculas e chegando aos primeiros seres
unicelulares, ainda é um mistérios a ser desvendado. Existem duas hipóteses
principais: “replicadores primeiro” ou “metabolismo primeiro”. O melhor exemplo
de replicador conhecido é o DNA. O detalhe é que essa molécula é complexa e
instável; não poderia ter surgido de maneira inédita, sem dar alguns passos
antes.
Os replicadores são elementos com
capacidade de se multiplicar e transmitir informação genética à geração
seguinte, com relativa fidelidade. É muito importante que haja algum grau de
alteração no herdeiro das informações genéticas, embora mantenham-se as
características principais do elemento-pai. Assim ocorre o grosso da evolução.
O modelo “metabolismo primeiro”
argumenta que as moléculas replicadoras necessitariam, antes de qualquer coisa,
de um ambiente em que se formassem e que as protegesse. O primeiro passo seria,
portanto, a geração de uma vesícula ou membrana – lembrando uma célula, mesmo –
que controlasse a passagem de substâncias por meio de si, em ambos os sentidos.
Em seu interior, moléculas desenvolveram a capacidade de executar a “autopoiese”
– gerar cópias de si mesmas. Esse ser primitivo já possuía a capacidade de
eliminar as substâncias que poderiam ser prejudiciais ao seu metabolismo,
mantendo seu interior saudável para o desenvolvimento da vida.
Existe um elo entre ambas as
hipóteses: o RNA. Esta molécula quimicamente semelhante ao DNA seria capaz de
agir como replicador e de iniciar o metabolismo celular. Embora ainda seja um
fato envolto em mistérios, sabe-se que 3,5 bilhões de anos a Terra já era um
celeiro de bactérias, seres unicelulares sem núcleo que abrigue seu material
genético (procariontes).
Aliás, deixe-se claro que a Terra
ainda é o “reino das bactérias” por excelência. Em nós mesmos, há mais
bactérias do que células humanas.
Esses seres podem se organizar em
colônias que, em conjunto, pode realizar tarefas bem mais complexas. Podem
trocar genes entre si, apenas pelo contato físico. Esse comportamento gera
variedade genética que lembra aquela realizada por meio de reprodução sexuada.
Então, há cerca de 1,5 bilhão de
anos, houve uma fusão entre duas bactérias. Assim surgiram os seres
eucariontes, organismos que possuem um núcleo que abriga seu material genético.
Deste processo surgiram funções básicas como respirar oxigênio ou fazer
fotossíntese. Antigas bactérias fundidas aos eucariontes deram surgimento a
essas capacidades.
Relacionar exatamente quais
fatores desequilibraram o desenvolvimento da vida em favor de seres cada vez
mais complexos ainda é uma tarefa inconclusa. Supõe-se que uma série de eras
glaciais, entre 750 e 600 milhões de anos atrás, hipótese conhecida como “Snowball
Earth” – ou “Terra Bola de Neve” – ajude a explicar. Nesse período, o gelo se
estendia até o Equador.
O crescimento exponencial da variedade
da vida animal na Terra ocorreu no período Cambriano: a Explosão Cambriana, a
partir de 650 milhões de anos atrás. Foi quando surgiram os ancestrais de todos
os grupos modernos de bichos: artrópodes, moluscos, vertebrados etc. Até então
a vida complexa ficou restrita aos mares.
Nas centenas de milhões
seguintes, a vida chegou a ambientes até então virgens (de vida), o que
garantiu uma diversidade espetacular: adaptação à terra firme; invenção dos
ovos; insetos voadores; répteis; aves.
Mas nem tudo são flores no Planeta
Terra. Os períodos de explosão de vida foram seguidos pelas temíveis extinções
em massa. Os paleontólogos apontam cinco: as Big Five. A menor delas levou mais
da metade das espécies existentes, mas outras superaram em muito esse número
- a do período Permiano extinguiu mais
de 90% delas, há 251 milhões de anos. A extinção do fim do Cretáceo levou
consigo os dinossauros (e vários mamíferos também) e ocorreu há 65 milhões de
anos, causada pela queda de um asteroide.
Contudo, diga-se, a grande maioria
foi provocada por eventos terráqueos, sem influência externa ao planeta.
Essas extinções mudaram
completamente o ambiente na Terra, levando animais bem adaptados à completa extinção
em um pequeno espaço de tempo (portanto, sem tempo para se readaptarem). Foram
equivalentes a um “reboot” no mundo. O único meio de resistir a esses eventos é
a ampla distribuição geográfica, já que seria quase impossível que fossem
atingidos em todos os lugares do mundo simultaneamente.
A recomposição das espécies
terráqueas levada a cabo no encalço das grandes extinções é definitiva. Após a
extinção do Cretáceo, os mamíferos dominaram a natureza e, há uns 6 milhões de
anos, uns chimpanzés africanos começaram a caminhar sobre duas pernas nas
savanas ao seu redor.
Vendo a história sob essa perspectiva,
conclui-se que o fato de estarmos aqui deve-se a... muita sorte.
Rubem L. de F. Auto
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