Trechos do livro “Como nascem os monstros”:
“As motocicletas Falcon chegaram novinhas ao batalhão, junto
com os capacetes brancos, e de cara já mostraram ser máquinas de dinheiro!
Quem nunca avançou um sinal de trânsito? Quem nunca
estacionou em lugar proibido? Na Tijuca todo mundo fazia lambança. Como não
estavam acostumados ao policiamento de trânsito, os motoristas se sentiam
livres para qualquer aventura, e se assustavam quando escutavam as sirenes das
motos apontando na direção do acostamento. Todo mundo ficou apavorado! Os donos
de concessionárias de carros, que estacionavam a mercadoria na calçada; os
colégios particulares, cujos pais de alunos paravam em filas duplas; os mercados,
que recebiam caminhões de descarga fora do horário; e os mais espertinhos, que
faziam trocentas barbeiragens mas não tinham nem como correr das motos no trânsito
caótico de fim de tarde. (...) Algum Idiota (com maiúscula mesmo!) da Nextel, com
algum univitelino seu do Detran, teve a magnífica idéia de disponibilizar os
elementos de qualquer veículo apenas com os dados da placa do automóvel. (...)
Pilotavam com uma das mãos no guidão e a outra teclando no
rádio, verificando as placas dos carros que transitavam à frente deles à
procura de irregularidades. Assim, só abordavam na certeza, eliminando a perda
de tempo e aproveitavam ao máximo o dia de trabalho.
Documentos atrasados eram os erros mais comuns, e Às vezes
vinha o bingo: Busca e Apreensão e Restrição Policial.
(...)
Como os lobos, os policiais militares se organizam em matilhas.
Isso gera a criação de “clubes”, esferas de convívio muito restritas nas quais
os integrantes adquirem uma identidade própria relacionada a sua missão: os
cabineiros, os patrulheiros, os patameiros, os motociclistas etc.
Ocorreu-me, algumas vezes, que essa é a forma que os
comandantes encontraram para a tropa jamais se dar conta do quanto está sendo
negligenciada: a segregação. Quando o corpo é dividido e para dês e perceber
como unidade, é mais fácil promover o estado de confusão e alienação que impede
que a massa se dê conta do quanto está sendo manipulada em prol dos interesses
de uma determinada casta. Funciona da seguinte forma: enquanto um PM está
trabalhando na APTran dia sim, dia não, levando para casa 600 reais por semana,
ele não se importará com o colega que está baseado 12 horas debaixo de sol.
Enquanto o GAT estiver pegando 1.000 reais todo baile de sábado no Borel, que
se dane quem estiver lá na cabine do Andaraí. Quem está na boa não se rebela, e
quem está fodido perde a força para revolução porque não encontra unidade em
sua classe.
Com qualquer trocadinho a mais no bolso ele se esquece de
que, para que sua condição de patameiro (policiais que se deslocam em viaturas,
nos patrulhamentos) desabe por completo, basta o comando mudar, ou que aconteça
algo que desagrade uma estrela. Para que ele saia da bancária, basta que um
gerente não vá com a sua cara. Para que seja demitido da RP, basta acidentar
uma viatura.
Rubem L. de F. Auto
Nenhum comentário:
Postar um comentário