Aquele que passou à história com o nome de Longino, na
verdade nas céu Gaio Cássio, siciliano de Taormina, atual ilha na Itália.
Face às dificuldades econômicas, que se avolumavam, buscou
nas fileiras do exército romano uma chance de superar os obstáculos, atitude
comum entre os jovens da época. Mas havia um problema que poderia se tornar
empecilho: nascera com um problema de visão – alguns historiadores pensam que
poderia ter sido catarata, ou miopia. O rigoroso processo de seleção prometia
rejeitá-lo.
No entanto, seu pai tinha bons contatos junto ao Senado
romano, o que ajudou na sua conscrição. Apesar dos problemas de visão, Longino
media quase 1,80 metros de altura, porte físico que pesava a seu favor.
Serviu nas Legiões por sete anos, findo os quais estava,
assim como quaisquer outros soldados, estava desgastado e precocemente
envelhecido. Por tradição, após esse período o soldo dos soldados romanos era
mantido no mesmo patamar e este era removido para outras funções, menos
desgastante. Com Longino, não foi diferente.
Deslocado para a Galiléia, assumiu o comando de uma guarnição
local. Longino era agora um orgulhoso Centurião romano. Tinha 28 anos.
O procônsul daquela Província romana chamava-se Pôncio
Pilatos, e este destacou o jovem centurião para que acompanhasse atentamente as
atividades de um homem que vinha se auto-intitulando rei dos Judeus, Jesus
Cristo. Desde então suas atividades se desenvolveram de uma maneira muito
particular, levando-o a trilhar caminhos imprevisíveis até então.
Após a condenação e crucificação do homem que fora
encarregado de investigar, Longino soube que Anás, o velho conselheiro do
Sinédrio, e Caifás, o sumo sacerdote, estavam decididos a mutilar o corpo de
Cristo. Pretendiam com isso demonstrar à multidão que Jesus não era o Messias.
Longino também teve a oportunidade de acompanhar o que se
fazia com os corpos dos dois criminosos crucificados aos lado de Jesus: os
fariseus destroçavam os corpos de Dimas e Gestas. Longino ficou aterrorizado
com o açougue humano que testemunhava.
Sensibilizado também com a resignação com a qual Jesus
aceitava seu cruel destino, Longino resolveu-se por proteger o corpo do homem
de Nazaré. Trotou seu cavalo em direção ao corpo ainda dependurado numa cruz,
cravou perfurou com sua lança o espaço entre a quarta e a quinta costela de
Jesus. Embora soe cruel despropositado hoje, essa era a maneira como os
soldados mostravam que um corpo já se encontrava sem vida: se, após perfurado,
não escorresse sangue, então o sujeito estava definitivamente morto, pois em
mortos não circula sangue.
Contudo, naquele caso, isso não correu. Após furado,
escorreu sangue a água.
O centurião, espantado com o jorrar do líquido do interior
de um suposto cadáver, levou-o a descansar sua lança e limpar imediatamente o
corpo que havia perfurado.
Supõe-se que Longino conhecesse algumas passagens bíblicas proféticas,
como a de Isaías, que predissera: “nenhum de seus ossos será quebrado”. Segundo
Ezequiel: “verão aquele que trespassaram”. Ao cotejar famosas passagens
bíblicas com a cena que se desenrolava à sua frente, Longino teria dito: Esse é
verdadeiramente o Filho de Deus!”
Mais do que isso. O jovem centurião passou a ser ver como
parte integrante da profecia, como uma ferramenta a serviço da história que,
necessariamente, deveria acontecer.
Findo a crucificação dos “criminosos”, Longino apresentou
seu relatório ao procônsul e recebeu como recompensa um período de descanso.
Porém, no dia seguinte à Via Crucis, Longino amanheceu
ardendo em febre, não conseguindo sequer sair da cama. Após ser socorrido por
um amigo, Yossef, Longino foi levado ao médico, que lhe receitou quatro dias de
repouso. Aproveitou para solicitar, ao que foi atendido, 60 dias de licença
para que voltasse à sua terra natal.
Certo dia, lembrando-se dos acontecimentos que tanto o
marcaram, teria se ajoelhado, mirando o céu, e orado a Deus, Todo Poderoso. Foi
o momento de sua conversão ao cristianismo.
Passo seguinte, abandonou a Legião romana e passou a se
dedicar integralmente à propagação das palavras de Jesus – algo bastante
incomum naquela altura, ainda.
Evidentemente, aceitar o homem que cravou uma lança no
abdômen de seu Mestre não é algo que abra caminhos gloriosos junto aos fiéis.
Longino foi canonizado pela Igreja Católica tornando o ato de espetar a lança
algo sagrado – e seu ato se tornou profético, em face do que já pregavam as Escrituras.
Longino se tornou desertor do exército romano. O castigo
para tal crime era a pena de morte. Para piorar seus perspectivas de vida no
Império, Longino retornou à Terra Santa, onde se juntou aos demais pregadores.
Não custa lembrar que o governante local ainda era Pôncio Pilatos. Segundo São
Gregório Nisseno, que escreveu no século IV, a área de atuação do novo cristão
era a atual Capadócia – à época, Cesaréia.
Pilatos, em retaliação, mandou executar Longino da maneira
mais cruel e recorrente então: decapitação. Após, sua cabeça foi transportada
para Jerusalém como troféu – e recado aos demais como ele, claro. Além disso,
sua língua foi cortada e seus dentes, arrancados um a um.
A crueldade acima é contada na história de Longino, mas
alguns suspeitam que foi bastante exagerada, com o intento de tornar o ambiente
de canonização de Longino algo heróico e merecido. Assim teria surgido São
Longino, cujo dia de devoção é 15 de julho.
Mas os relatos mais confiáveis falam que Longino, de fato,
sofreu muito em seus últimos dias. Os soldados romanos e torturaram
intensamente, em razão de seu crime de deserção, mas também pelas pregações religiosas,
que destoavam completamente da mitologia romana, religião oficial do Império.
A intolerância e o fanatismo já vitimaram quantos como Gaio
Cássio Longino ao longo da história?
Rubem L. de F. auto
Fonte: livro “As maiores civilizações da história”
Nenhum comentário:
Postar um comentário