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segunda-feira, 6 de março de 2017

A MAIOR CRISE DA HISTÓRIA: DOENÇAS, FOME E CAOS DA RESSACA FEUDAL


Por volta do século II d.C., doenças surgidas em locais isolados do planeta, porém disseminadas para diversas outras paragens por conta dos intercâmbios populacionais provocados por guerras, havia arrasado a população de diversos países do mundo.

Mas a tragédia não estava completa. Mudanças climáticas catalisaram os efeitos negativos. Cientistas calculam que o clima estava ficando mais e frio e mais seco a cada dia. O esfriamento global reduziu as estações dedicadas à colheita, reduzindo os alimentos disponíveis e lançando diversos refugiados às migrações por toda a Eurásia.

Com isso, diversas redes comerciais, construídas ao longo de séculos, começaram a desmoronar. Diante da falta de recursos, Estados deixaram de pagar seus soldados. O resultado foi a mutação de soldados em bandidos. Generais se tornaram chefes guerreiros, se uma autoridade suprema.

Na China, em 189 d.C., uma revolta interna resultou no incêndio da capital imperial e no seqüestro do imperador-menino, de apenas 8 anos de idade. Ao fim, o grande império se esfacelara em 3.

Roma seguiu destino bastante semelhante. Crises agrícola e comercial esvaziaram os cofres, de modo que os imperadores passaram a desvalorizar suas moedas (reduzindo a quantidade de prata), o que levou a uma crise inflacionária. O passo inevitável seguinte foi a suspensão do pagamento do soldo dos soldados.

Sem pagamentos e numa economia de preços crescentes, a revolta era inevitável. Em 193 d.C. (com repetição em 218), a guarda imperial se apossou do trono. Entre 218 e 222, Roma foi “governada” por um adolescente psicopata (mesmo para os níveis romanos). Entre 235 e 284, Roma contou 43 imperadores. Quase todos militares. Todos terminaram seus mandatos assassinados, exceto por um, que morreu de doença. Dos 42 assassinados, dois morreram pelas mãos dos godos e dos persas. Os 40 restantes foram assassinados por compatriotas romanos.  

Quando um general se sublevava contra o império, seus batalhões deixavam suas posições e se lançavam em inevitáveis guerras civis. As fronteiras ficavam desguarnecidas, permitindo movimentos ameaçadores dos povos vizinhos. Durante esses períodos: godos construíram navios e atacaram a Grécia; francos invadiram a Gália e a Espanha; a própria Itália foi atacada; mouros invadiram o norte da África; persas queimaram a Síria.

Sentindo-se completamente desprotegidas, as províncias romanas formaram governos próprios e, em 260 d.C., o Império Romano se cindiu em três.

A crise se arrastou até o século III. Após meio século, Roma recuperou o controle sobre toda a bacia do Mediterrâneo em 274. Em 280, a reunificação alcançou a China.

Mas o caldo entornou de novo e Roma retrocedeu ao caos no final do século IV.

Em 476, após mais 70 anos de violência e caos desnorteantes, um rei germânico anunciou que a metade ocidental do império romano não mais existia.

Na China, a dinastia Sui conseguiu enfim reunificar todo o império.

O Império Romano do Oriente, rebatizado para Império Bizantino, liderado por Justiniano, em 520 conseguiu reconquistar partes da Itália e da Espanha, além do norte da África. Contudo, no século seguinte, os bizantinos foram obrigados a recuar.

O processo seguia um curso cíclico. Seguidos ataques contra um império estabelecido lançava a região em uma onda incontida de violência e caos; após a vitória, o novo rei entronado procurava restabelecer a ordem e a lei; para tanto, extorquia impostos; o novo Estado, rico, passava a ser produto da cobiça dos vizinhos; e começa tudo outra vez.

A devastação provocada por guerras e conflitos traz conseqüências além da imaginação menos sofisticada. Incapazes de prover segurança, os governos lançavam os comerciantes locais num ambiente inviável, em termos de atividades comerciais. Não mais comerciando e lucrando, os governos não mais recolhiam impostos – sem falar na população, alijada do consumo de bens diversos. Sem renda, os governos ficavam sem os exércitos, os soldados engrossavam as fileiras do banditismo, que tinha os simples camponeses como vítimas. A reação dos camponeses foi procurar a segurança dos grandes senhores de terras.

A moeda de troca exigida pelos senhores de terras (mais tarde, feudais) foi organizar os camponeses em milícias, que policiavam as terras e coletavam impostos. Donos de suas próprias tropas, esses senhores se tornaram a cada dia mais independentes dos poder central. Ao mesmo tempo, os monarcas se viam com menos autoridade sobre os nobres.

Resumindo: a perda de poder pelos soberanos levou ao encolhimento dos exércitos, desmembramento das redes de comércio. Como as novas milícias eram bem rústicas, se comparadas aos disciplinados exércitos nacionais, a própria cadeia de comando deixou de existir.

Incapazes até de pôr em funcionamento um sistema tributário, os reis passaram a distribuir títulos de nobreza àqueles que conseguissem manter forçar de segurança que pudessem ser convocadas quando o rei estivesse em apuros.

Rapidamente os senhores de terras (ou feudais) descobriram uma maneira de conseguir mais soldados: concediam pedaços de terras a cavaleiros que se prontificassem a se apresentar em caso de conflito, além daqueles que conseguissem recrutar.

A principal consequência para os monarcas foi sua perda de ascensão sobre seus homens.        

Quanto ao império Bizantino, este foi destroçado por árabes recentemente islamizados, por volta de 630. Em 650, esses mesmos árabes conquistaram a Pérsia. Em 750, os muçulmanos já eram senhores do Marrocos ao Paquistão. Frequentemente atacavam aFrança e Constantinopla.

A noroeste da Europa, os germânicos que haviam invadido o império Romano e criado reinos próprios onde antes eram províncias do antigo Império não paravam de fazer guerras. Quando apresentavam um monarca mais forte e com soldados mais competentes, seus reinos cresciam por incorporação de outros. O que mais se destacara nesse período foi o rei Carlos Magno, que virtualmente unificou as Europas ocidental e central entre 771 e 814. Magno conseguiu tais sucessos ao se impor sobre a nobreza, cobrando-lhes pesados tributos e alfabetizando a população.

O sucesso de Magno foi coroado quando o papa o proclamou Sacro Imperador Romano. Seu sonho de império único se desfez com sua morte. Seus filhos dividiram o legado, dando origem ao que seria França e Alemanha, futuramente.

Completando o cenário de caos e violência, os vikings vinham se aproximando a cada dia mais, vindos do extremo norte, saqueando cada reino com que se deparavam no caminho.  

Dessa forma, o colapso de antigos impérios levou o mundo ocidental a um caos milenar, que foi superado apenas após os sucessos econômicos europeus, especialmente após a conquista da América.
       

Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “Guerra: o horror da guerra e seu legado para a humanidade”.   

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