Poucas coisas pareciam mais odiosas aos olhos dos
aristocratas romanos do que os bárbaros. E dentre as coisas mais odiosas que os
bárbaros faziam, nada superava a prática dos escalpos pelos citas, outros povos
nômades. Nas palavras de Heródoto: “Quando um cita mata seu primeiro homem, ele
bebe um pouco de seu sangue e leva sua
cabeça para o rei. Depois, cortam a cabeça em círculo ao redor das orelhas e,
segurando-a, arranca a pele fora. Em seguida, raspa essa pele com uma costela
de boi e a amassa com as mãos até que fique maleável; então passa a usá-la como
guardanapo.”
O romano Amiano Marcelino descreveu suas impressões sobre os
hunos: “Eles têm um corpo atarracado, membros fortes e pescoço grosso. E são
tão horrendos e deformados que parecem animais sobre duas pernas.”
Contudo, apesar do largo uso da violência, a mais desumana
concebível, o maior assassino em guerras, desde sempre, foram as doenças. A
rotina de juntar milhares de homens, pô-los em espaços minúsculos, submetê-los
a uma alimentação sofrível e em locais fétidos criou o melhor ambiente possível
para a proliferação de doenças. Daí surgiu um arsenal mortífero que há muitos
séculos nos acompanham: disenteria, diarréia, tifo, tuberulose...
Em 161 d.C., ouviu-se sobre uma nova e mortal doença na
fronteira noroeste da China, onde ocorria mais uma guerra contra povos nômades.
Essa nova doença havia rapidamente matado um terço dos soldados. Apenas quatro
semanas após, relatos idênticos vieram da Síria. Em 167 d.C., finalmente, a
misteriosa praga chegava a Roma. O número de vítimas nessa última foi de tal
monta que Marco Aurélio adiou sua partida em direção ao Danúbio, para tentar
achar uma solução. Não apenas não a achou como ainda levaram a nova praga
consigo.
Analisando os sintomas relatados, supõe-se que se trate de varíola.
Após apenas um ano do nascimento, entre um quarto e um terço
de todos os bebês morriam em até um ano do nascimento. Poucos adultos
sobreviviam após os 50 anos. Doenças como a varíola se desenvolveram
isoladamente, contudo as guerras mudaram o cenário.
Algumas pessoas traziam anticorpos para aqueles vírus e
bactérias, mas seriam necessários muitos anos até que seus germes se
espalhassem para os demais. Estimativas para o Egito apontam para uma redução de
25% da população, entre 165 e 200 d.C.
As milhares de mortes causadas por essas doenças deixaram os
exércitos em frangalhos, diversas cidades bem protegidas caíram diante dos
inimigos e a crise social conseqüente estraçalhou sociedades, da China a Roma.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Guerra: o horror da guerra e seu legado para a
humanidade”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário