Uma menina de quinze anos, que
tinha dois irmãos com distrofia de Duchenne: doença neuromuscular progressiva e
degenerativa, que afeta especialmente o sexo masculino. Aos três ou quatro
anos, meninos portadores da doença começam a ter quedas freqüentes, devido à
perda da musculatura. Por volta dos dez a doze anos eles perdem a capacidade de
andar. Mantém-se progredindo até atingir os membros superiores.
A doença pode ser produto de
mutação genética em 1/3 dos casos, sendo apenas pontual, sem risco de
transmissão. Nos 2/3 restantes o gene é herdado da mãe, portadora
assintomática. Embora sem os sintomas, os filhos do sexo masculino têm
probabilidade de 50% de herdar a mutação.
No caso dessa menina, uma assistente
social alertou para a grande probabilidade de que o pai da criança que a menina
esperava era seu pai biológico. O perigo agora estava redobrado. Havia o risco
de contrair doenças recessivas ou mentais com igual probabilidade.
Doenças recessivas são aquelas
relacionadas a genes que não são dominantes, isto é, somente ocorrem quando um
gene dominante não está presente. A criança nascida do incesto tem a
probabilidade de receber genes recessivos em dupla é duplicada, afinal equivale
a quase receber a mesma carga genética duas vezes.
A garota, agora mãe, havia recebido o gene da distrofia de sua mãe, fazendo com que o bebê tivesse 50% de chances de recebê-lo. Exame no feto mostrou que ele não havia recebido o ene da distrofia.
Após uma conversa particular, a
garota confessou ter freqüentes relações sexuais com seu pai, escondidos da
mãe. Pediu ainda que sua mãe não fosse informada. E tudo isso foi falado de
forma bastante natural.
Artigo da revista Lancet mostrou
a forte relação entre doenças genéticas e malformações e relações incestuosas.
Por outro lado, legalmente só há
estupro de vulnerável, em relações sexuais independente de consentimento,
apenas até os quinze anos. Caso contrário, é ato atípico.
Resta a dúvida: informar ou não as
autoridades sobre o incesto?
A uma paciente também portadora
de distrofia de Duchenne foi solicitado que trouxesse sua mãe para um exame, no
intuito de investigar a situação das outras mulheres da família. A mãe se
revelou portadora. Esse quadro mostra que as mulheres da família tinham alto de
risco de transmitir esses genes.
Após ter sido informada sobre o
quadro desenhado pela doença em sua família e dos riscos que seus parentes
apresentavam de transmitir da doença, respondeu que gostaria que apenas sua
irmã soubesse. Quanto Às primas, não: ela não gostava das primas ...
Sabendo-se que os exames foram
realizados nos genes de certa paciente, pode-=se alertar os familiares, mesmo
sem o consentimento da consulente?
No Brasil, essas situações foram
bem definidas para pacientes de HIV. O sigilo é quase absoluto, somente sendo
quebrado em situações muito particulares, ou quando põe em risco a vida de terceiros.
A liberdade de manipular essas
informações apresenta risco social, porque conhecer o risco de doenças é parte
do negócio de companhias de seguro, por exemplo.
É o caso da anemia falciforme, a
doença genética com maior incidência no Brasil. Essa síndrome altera a forma
dos glóbulos vermelhos, que ficam com o formato que lembra uma foice (falciforme
significa “em forma de foice”). Assim elas ficam mais frágeis, rompem-se e o
quadro final é a anemia.
Em 2005, após diversas pesquisas
nos EUA revelando casos de discriminação com base no patrimônio genético das
pessoas, o Senado americano aprovou uma lei proibindo práticas nesse sentido. Esse
é o caminho que tem sido trilhado por diversos países do mundo.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “GenÉtica: escolhas
que nossos avós não faziam”
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