Assim como os chimpanzés, temos
piolhos. Porém, os nossos são mais bem adaptados a corpos sem pelos. Existem em
dois tipos, capilares e púbicos.
No entanto, há cerca de 70 mil
anos, os piolhos capilares evoluíram para um terceiro tipo, adaptado a tecidos.
Por isso eles servem como marcadores do momento em que passamos a usar roupas.
Portanto as pessoas da Idade das
Pedras tomavam banhos regularmente e muitos dos sítios arqueológicos
descobertos ficam a curtas distâncias de fontes termais.
O passo seguinte ocorreu na Idade
do Bronze. As regiões onde hoje se localizam o Paquistão e a Índia era habita
por um povo conhecido como harappianos, reconhecidos pela higiene. As cidades
que eles construíram possuíam sistemas de esgoto feitos de tijolos e gesso.
Calhas nas margens das ruas direcionavam a água para o sistema de canos
subterrâneos. Construções de vários andares também tinham encanamento ligando
todos os pisos.
Como a região é notória pela
falta de chuvas, a água que eles pensavam em canalizar vinha do subsolo.
Mohenjo-Daro tinha mais de 700 poços revestidos de tijolos que forneciam água à
vontade e a todos. Construíram até uma piscina enorme: a Grande Banheira, de 12
X 7 metros quadrados. Ficava dentro de um Templo, no alto de uma montanha.
Os sacerdotes egípcios tinham
horror a piolhos. Para evitá-los, raspavam todos os pelos do corpo. Também se
banhavam 5 vezes por dia. Mas isso não refletia um hábito arraigado, pois o
resto da população não tinha tanto asseio assim com sua higiene.
Os ricos, como costuma ocorrer em
todas as civilizações, buscavam se diferenciar. Possuíam banheiros
residenciais, de chão de pedra impermeável e escoamento da água por canais
subterrâneos. Pela manhã lavavam o rosto e as mãos rapidamente. À noite tomavam
um banho completo, com baldes. Os pobres se levavam no Nilo. Ambos usavam
sabonete à base de gordura animal e vegetal.
Ao norte da ilha de Creta, no
Mediterrâneo, fica as ruínas de Cnossos. A cidade antiga possuía aquedutos vindos
das colinas próximas. Como o encanamento descoberto é duplo, deveria servir
para água fria e quente.
Em Olinto, ainda na Grécia
antiga, arqueólogos descobriram casas equipadas com banheiras de terracota,
provavelmente aquecidas pelos fogareiros das cozinhas. Essas instalavam também
pias na parede, chamadas delouter.
Para uma limpeza completa,
usavam-se os banhos públicos – balaneion, bastante comuns em Atenas. Possuíam
assentos individuais instalados em círculos, facilitando a socialização.
Empregados lavavam os visitantes com sabonetes chamados rhymma. Havia também
saunas com uma piscina gelada, para um mergulho posterior ao suadouro.
Os banhos romanos também eram
quentes: chamavam-se thermae. Os sistemas de aquecimento se chamava hypocaust:
uma vapor superaquecido subia por entre pilares, vindo da fornalha operada por
escravos. Aquecia salas e piscinhas localizadas acima.
Homens e mulheres se banhavam
separadamente, embora na mesma instalação. Os horários de visitação também eram
diferenciados: mulheres, escravos e criados pela manhã; homens, à tarde.
O uso seguia o seguinte roteiro:
entrava-se pelo pátio de exercício, a palaestra. Lá, ele ficava suado. De lá,
seguia para a sala de troca, o apodyterium – o visitante deveria constratar um
escravo para cuidar de sua toga, prevenindo-se contra ladrões. O cômodo
seguinte era o átrio principal, aquecido: o tepidarium. Adiante, se alinhavam
os cômodos menos aquecidos.
Caso desejasse, o visitante
poderia seguir em direção à sala de vapor: a sudatoria. Se quisesse mergulhar
numa pi9scina quente, deveria ir ao caldarium. Escravos espalhavam óleo no
corpo do visitante e raspavam a sujeira com um estilete chamado strigil.
Se optasse por um banho frio
antes de outra aplicação de óleo e raspagem, havia o frigidarium à disposição.
A escala dessas construções
poderia impressionar. OS Banhos de Caracalla, do século III, tinha lotação
superior a 1.600 pessoas e a casa principal equivalia a dois campos de futebol
americano. Ah! Possuíam duas bibliotecas, também.
O acesso à água era um direito
essencial de todos os romanos, cidadão ou escravo. Os banhos romanos eram um símbolo
da civilização. Eram até mesmo usados para atrair os bárbaros recém-conquistados.
Mas a água que abastecia Roma não era distribuída equanimemente: 10% pertenciam
ao Imperador; 40% para os contribuintes – quem poderia pagar impostos; 50%
seguiam para as casas de banho comunitárias e fontes públicas. Ou seja, os
pobres não tinham abastecimento de água residencial.
Algo mudou após a ascensão do
cristianismo a religião oficial. Os primeiros pensadores cristãos viam os
banhos como locais de depravação, perdição e de muitos pecados. Clemente de
Alexandria via quatro motivos para ir a uma casa de banho: calor, prazer, saúde
e limpeza. Os cristãos somente poderiam ir a um local daqueles pelas duas
últimas razões. Os banhos nunca deveriam vir acompanhados de prazer... nem
gente estranha pelada.
Na visão de São Jerônimo – grande
opositor das casas de banho e, possivelmente, do banho em si –, tradutor da
Bíblia para o latim, a água quente excitava a região da virilha e estimulava
especialmente as virgens. Sua famosa frase denotava um típico porquinho que
espalharia seus péssimos hábitos por toda a Idade Média: “Aquele que foi
banhado em Cristo não precisa de um segundo banho”. Inspirou-se em outra avessa
ao banho, Santa Paula de Roma: “Um corpo limpo e um vestido limpo são o mesmo
que uma alma suja”. Frase de efeito direcionada às virgens – talvez ela
quisesse que elas assim permanecessem...
Nos mosteiros, códigos de conduta
regulavam todos os aspectos do dia a dia, inclusive o banho. São Benedito, fundador da
Ordem Beneditina tolerava banhos ocasionais: “Que os banhos sejam permitidos
aos doentes, sempre que necessário; mas que sejam apenas raramente permitidos
aos sadios, e especialmente aos jovens”. Enfim,banho só na Páscoa, Natal e
Pentecostes.
O islamismo pensava de maneira
totalmente distinta. A limpeza equivale a “metade da fé”, conforme Maomé. A
limpeza segue rituais inflexíveis. O dia começa com abluções – wudhu -, que
precedem as cinco orações diárias. Repete-se o mesmo após ir ao banheiro.
Outra contribuição dos islâmicos em
nome da higiene foi a ampliação dos banhos públicos: os hammams, que se
tornaram os banhos turcos a vapor. O banho de corpo todo era o ghusl. No século
IX, Bagdá possuía 1.500 casas de banho. O banho era gratuito a todos.
Os vikings eram especialmente
atraídos por saunas ferventes. Os homens saíam aos sábados para tomar um bom
banho – era o laudag, ou dia de lavar-se. Membros do povo Rus sueco, fundadores
da Rússia, eram ainda mais asseados: lavavam rosto e cabelo diariamente,
trabalho executado por jovens criadas.
Um holandês, David de Vries, no século
XVII descreveu o pesapunck, banho a vapor de tribos localizadas na costa do
Atlântico, pré-colombianas. Era uma cabana, com um pequeno forno de madeira
coberto de argila. Construídas perto de lagos e rios permitiam um banho frio
após o suadouro.
Mercadores holandeses também
forneceram testemunhos da limpeza e do asseio japoneses. Banhavam-se nas fontes
termais localizadas nas montanhas vulcânicas. Chamavam-nas de onsen. Também
usavam essa água nos banhos públicos: os sento.
A união entre a limpeza praticada
no Oriente Médio e a sujeira orgulhosa europeia, por ocasião das Cruzadas,
ajudou a mudar os hábitos de higiene na Europa.
Tomás de Aquino, teólogo do
século XIII, era um forte defensor do uso do incenso de purificação, comum no
Oriente Médio. Não demoraram a chegar versões europeias dos Hammams islâmicos.
Em 1290, Paris contava com 26 delas. Nada comparável a Bagdá, mas demonstravam
progressos.
Mas o pregresso não durou muito. A Peste Negra
levou à total repressão aos banhos públicos.
No século XVI, Elizabeth I instalou
uma banheira em seu palácio e declarou orgulhosamente tomar banho uma vez por
mês. Mas era exceção. O rei Jaime lavava apenas os dedos, numa bacia. Essa
prática foi impactada pelo linho. A descoberta do tecido e a criação de uma
técnica que procurava isolar o corpo da sujeira levaram muitos a abandonarem de
vez o banho. Enrolavam as pessoas em linho e apenas trocavam os trapos,
posteriormente.
Francis Bacon foi um dos adeptos
do linho, em vez do banho. Criou até um método de “impermeabilização” de
humanos.
Reis e rainhas com cheiro e gambá
eram muito comuns. Lady Mary Wortley Montagu era uma notória imunda. Quando
comentavam sobre suas mãos imundas, replicava dizendo: “O que você diria vendo
meus pés?”.
Tendo a medicina derrubado teses
absurdas que encantavam os porquinhos, a postura diante do banho também mudou.
As próprias linhas de pensamento científicas levaram à noção de que a água,
parte do mundo natural, não poderia ser prejudicial à saúde.
As conquistas de terras no Egito
e além, por Napoleão, o levaram a adotar o hábito de passar longas horas na
banheira.
Ah! Após descobrir os banhos
turcos, Lady Mary Wortley ficou fascinada com a ideia do banho que chegou a
adotar até o xampu.
A adoção de banho, banheira,
sabonete dentre outros itens de higiene pela nobreza levou à sua adoção por
endinheirados. Banheiras de madeira ou estanho passaram a ter vez dentro de
residências sofisticadas. Os banheiros contavam agora com banheira, ducha,
torneiras de água fria e quente, vasos sanitários, tudo alimentado por água em
cisterna.
As banheiras vinham com um
fogareiro abaixo, para aquecer a água. Outras residências instalavam caldeiras
no andar térreo das residências.
Os sabonetes são um capítulo à
parte. Inicialmente, na Idade do Bronze, era apenas ervas, alguns usando cinzas
e gordura animal. Os gregos preferiram óleos corporais e raspagem. Os árabes
islâmicos inventaram o sabonete feito de oliva. Entrou na Europa pela Espanha.
Na exposição de 1851, Londres
testemunhou uma profusão de sabonetes de todo tipo – muitos deles perfumados. A
marca mais antiga já estava presente por lá: sabonetes Pears, feitos com
glicerina e óleos naturais.
Mas o sucesso de mercado era
feito de óleo de Palma e azeite de Oliva: Palmolive.
Em 1880 surgiram os desodorantes.
Eram à base de cera. O desodorante à base de cloreto de alumínio surgiu em
1907.
Resumindo: banho é água mais
extratos de frutas e plantas. E é uma questão de higiene, apenas.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Um milhão de anos
em um dia”
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