Recordando o modo de funcionamento do calendário Juliano:
havia três anos consecutivos com 365 dias e ¼. A cada quatro anos,
acrescentava-se mais um. Portanto a duração média de um ano Juliano era de
365,25 dias – ou 365 dias e 6 horas.
Portanto temos uma defasagem: o ano trópico, ou solar, é de
365 dias, 5 horas, 48 minutos e 45,2 segundos. São 12 minutos aproximadamente
de diferença. Portanto, a cada 128 anos teremos 1 dia de defasagem.
O cenário começou a mudar quando o imperador Constantino
chegou ao poder.
Em 325, Constantino convocou o Concílio de Nicéia. Naquele
momento, a Igreja Católica já era a representante da religião oficial do
império. Esse Concílio estabeleceu entendimentos importantes quanto ao
calendário do Império.
A celebração mais importante da fé cristã é a Páscoa. Nessa
data se comemora a ressurreição de Jesus Cristo. Um detalhe interessante é que
a Páscoa ocorre em data móvel, diferente do Natal, sempre em 25 de dezembro.
Isso ocorre porque a Páscoa é uma cerimônia de origem
judaica – portanto é estabelecida segundo o calendário judaico. A data da
Páscoa no calendário católico depende de sua conversão, a partir do calendário
judaico. Como sabemos, o calendário judaico é lunissolar, enquanto que o calendário
originado no Império romano é solar.
O Concílio de Nicéia estabelece uma maneira de realizar essa
conversão. Desde 325, a Páscoa é sempre celebrada no primeiro domingo depois da
primeira Lua cheia após o equinócio de inverno (em março). Assim, casam-se
ambas as datas.
E a Igreja, desde então, passou a ser a responsável pelo
calendário.
Percebeu-se que naquela época o equinócio vernal, fixado por
Júlio César em 25 de março, ocorria de fato em 21 de março. Redefiniram-se
essas datas e, nos anos bissextos, em 20 de março.
Bom, após essas mudanças, o problema principal se manteve. O
calendário Juliano continuava atrasado em 12 minutos por ano. No século VIII a defasagem
já atingia três dias.
Alguns estudiosos se debruçaram sobre o problema. Um deles foi
o frade franciscano Roger Bacon.Quando nascera, em 1214, o atraso já estava em
uma semana. Bacon era professor em Oxford, antes de se tornar frade.
Por sorte, embora obrigado a abandonar o posto de professor,
havia feito amizade com um outro religioso, que viria a ser nomeado papa:
Clemente IV. Este incentivou que Bacon achasse uma maneira de resolver a
defasagem do calendário.
Bacon escreveu uma obra em três volumes: Opus Majus, Opus
Minus e Opus Tertium. Bacon sugeriu uma solução: eliminar um dia a cada 125
anos.
Infelizmente Clemente IV faleceu antes que a reforma fosse
implementada. Outros papas tentaram implementar a reforma, mas episódios
politicamente mais imediatos conturbaram o ambiente. A decisão final de
reformar o calendário foi definida no Concílio de Trento.
A forma como ocorreria finalmente a reforma foi produto da
mente de um médico italiano chamado Luigi Lilio. Ele pensou numa maneira em
dois passos.
Inicialmente, ocorreria a supressão de 10 dias, para ajustar
o equinócio vernal. Depois, mudariam as regras dos anos bissextos. Ele sugeriu
não decretar bissextos, três anos num
período de 400 anos.
Assim, o ano civil de Lilio teria, em média, 365,2425 dias –
365 dias, 5 horas, 49 minutos e 12 segundos. A conta é essa: 400 anos julianos
teriam 146.100 dias; desse total, Lilio sugeria eliminar três dias; o ano Juliano
passa a ter 146.097 dias. Dividindo 146.097 por 400 teremos 365,2425 dias por
ano no novo método. O atraso agora caia a menos de meio minuto!
Em 1582, o papa Gregório XIII, finalmente, decretou a
reforma do calendário Juliano. O atraso, nesse ano, chegou a 10 dias.
Sua bula, Inter gravíssimas, prescrevia o método da reforma.
Ordenou a remoção de 10 dias no mês de outubro de 1582 – do dia 5 ao dia 14,
inclusive. A contagem ia até 4 de outubro; depois pulou para 15 de outubro.
Depois, prescreveu novas regras para os anos bissextos: o
ano de 1600 permaneceria bissexto; depois disso, os anos centenários não seriam
mais todos bissextos, mas só a cada 400 anos. Ou seja, 1700, 1800 e 1900 não
foram anos bissextos, por decisão papal. O ano 2000 teve seus 29 dias
normalmente. Outro ano centenário bissexto, só ocorrerá em 2400.
Essa regra que cobre o período de 400 será reiniciada,
perpetuamente.
Esse é o nosso calendário atual. Há ainda uma diferença de
26,8 segundos em relação aos eventos astronômicos. Isso significa que a cada
400 anos, o calendário fica defasado em 2 horas, 58 minutos e 40 segundos. A
cada 3.223 anos, a diferença será de 1 dia. Sugere-se tornar comum o ano de
4000, que seria bissexto.
O calendário dói reformado e sua adoção foi decretada...
pelo Papa. Ou seja, países católicos como Itália, Portugal e Espanha o adotaram
imediatamente. Países protestantes, como
Inglaterra e Alemanha mantiveram o calendário Juliano. A Europa ainda estava
vivendo as conflagrações da Reforma Protestante.
A França e a Holanda o adotaram em 1582. Alemanha e Áustria,
em 1584. Hungria, em 1587. Dinamarca e Noruega, em 1700. A Inglaterra demorou muito
mais: 1752, tendo de cortar 11 dias, pois seu atraso custou-lhe a
contabilização de um dia em 1700.
A Suécia o fez dramaticamente, entre idas e vindas, cortando
os anos bissextos por 40 anos. A Rússia adotou o calendário gregoriano em 1918,
após a Revolução Russa – teve de eliminar 13 dias. Os últimos foram Grécia
(1923) e Turquia (1926).
A China o fez em 1912, mas de fato só a partir de 1929.
Desde então o calendário chinês é mera tradição ainda mantida. O Japão o fez em
1873.
The end.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “O tempo que o tempo tem: por que o ano tem 12
meses e outras curiosidades...”
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