Uma era é um período de tempo de duração incerta, uma vez
que seu início é definido por um marco histórico, mas seu fim é decidido a
posteriori.
Nosso calendário usa o conceito de Era Cristã, iniciado com
o nascimento de Cristo – a.C e d.C.
A ideia que inaugurou essas Eras foi produto da mente de um
monge grego chamado Dionísio. No século VI d.C. ele propôs que os anos fossem
contados a partir do nascimento de Cristo. Porém, àquela época ninguém sabia
quando Cristo havia nascido. Dionísio realizou uma série de cálculos e definiu
o ano de 754 após a fundação de Roma (AUC, ou “ab urbis conditiae”) como o
marco da Era Cristã.
Segundo a história da fundação da cidade de Roma, uma
mistura de misticismo e alguns fatos históricos, o fundador da famosa urbis foi
Rômulo – filho de Marte com Reia Sílvia, e irmão de Remo, a quem assassinou
numa disputa sobre o local em que a cidade seria inaugurada.
Rômulo tinha uma mente criativa e queria se desvencilhar da
cultura em que cresceu imerso. Não quis nem mesmo adotar o calendário que
conhecera: criou o seu próprio.
No novo calendário, o primeiro calendário romano, o ano
contava 304 dias. Era dividido em 10 meses, cuja duração variava entre 16 e 36
dias. Posteriormente, modificou-se a duração dos meses para que coincidissem
com os ciclos lunares – 30 ou 31 dias. O ano se iniciava sempre no equinócio de
primavera (início da primavera, 21 ou 22 de março no nosso calendário).
Fazendo as contas, percebe-se que aquele calendário tinha
defasagem de 61 dias em relação ao ano solar. A solução adotada foi tão simples
quanto inusitada: esses 61 dias eram ignorados sem a menor cerimônia. Não os contabilizavam.
Após o “último dia do ano”, seguia-se um período invernal “off the sheet”, fora
do calendário. Chegada a primavera, finalmente se iniciava o ano seguinte. Porém,
o dia exato, ficava a critério do rei defini-lo. Este seguia a observação
astronômica para saber o dia do equinócio. Evidentemente a ausência de bons equipamentos
de observação não permitia muito rigor no estabelecimento dessa data.
Os 10 meses de Rômulo eram: Martius, Aprilis, Maius, Junius,
Quintilis, Sextilis, September, October, November, December. Digamos que não
soam completamente estranhos... Lembrando: Martius começava em meados de março,
no nosso calendário, é tinha 31 dias. Os demais seguiam alternadamente, 30 e 31
dias, sendo que Quintilis e September tinham 30 dias cada.
Mais uns esclarecimentos: Martius era uma homenagem ao deus
Marte – lembro que Rômulo seria filho de Marte; Aprili vem da palavra em latim
para “abrir” – nessa época as rosas abrem, no hemisfério norte, claro; Maius homenageia
a deusa Maia; Junius homenageia a deusa Juno; os outros seguem nomes referentes
à sua ordem no calendário.
Fato é que esse calendário continha falhas que mereciam
reparos. Essa tarefa coube a Numa Pompílio, segundo rei de Roma. Este monarca adicionou
dois meses ao calendário, de modo a contabilizar o inverno. Os meses foram:
Januarius, homenagem ao deus Jano; e Februarius, homenagem ao deus Februs. Contudo,
Februarius era o 11º mês do ano e Januarius era o último.
Um detalhe importante: uma superstição romana os fazia
rejeitarem números pares como sendo de mau agouro. Aboliram meses com 30 dias;
a partir de então, somente poderiam ter 29 ou 31 dias. Os meses com 30 dias
perderam um dia e Januarius passou a ter 29 dias. Para que as contas fechassem,
Februarius tornou-se exceção e ficou com número par de dias.
O ano pompiliano tinha, portanto, 355 dias. Isso o fazia
mais próximo dos calendários lunares, portanto era inútil para a agricultura.
A defasagem de cerca de 10 dias em relação ao ano solar deveria
ser tratada. Fazia-se isso acrescentando um mês intercalar: o mês de
Mercedonius.
Esse calendário passou a obedecer a um ciclo de 24 anos: o ciclo
pompiliano. Esse ciclo era dividido em períodos de 4 anos. Os anos ímpares
tinham 12 meses – somando 355 dias; os anos pares tinham 13 meses, tendo o mês
intercalar 22 ou 23 dias.
O Mercedonius tinha 22 dias quando o ano era o 2º, 6º, 10º,
18º, 20º ou 22º do ciclo pompiliano; tinha 23 dias quando era o 4º, 8º, 12º,
16º ou 24º. O mês intercalar era introduzido no mês de Februarius. A contagem
de Februarius parava no dia 23, iniciava-se a contagem do Mercedonius, até 22
ou 23 de Mercedonius; após, voltava-se à contagem de Februarius normalmente,
até o último dia.
No fim das contas: o ano de Numa Pompílio tinha 355 dias;
com a intercalação, o ano tinha 377 ou 378 dias (isso criava mercedonius de 16
e 17 dias no fim do ciclo); num período de quatro anos tínhamos no rol anos com
355, 377, 355 e 378 dias; a média dos qautro anos é 366,25 dias por ano. Está quase
lá, né?
Por fim, o ciclo pompiliano completo terminava com seus “anos
longos” – aqueles com 377 e 378 dias – reduzidos a 371 e 372 dias. Eliminavam-se
assim 24 dias ao longo dos 24 anos: na média, eliminava-se um dia por ano.
Refazendo-se a conta: no ciclo de 24 anos, cada ano tinha, em média, 365,25
dias! Bateu!
Porém, para infelicidade de astrônomos e matemáticos, existe
uma coisa chamada política. Pontífices, posteriormente, introduziram mudanças.
Primeiro: o Mercedonius teve sua duração alterada nos dois últimos quadriênios
do ciclo. Reduzindo os mercedonius para três, eliminavam-se os dois mercedonius
mais curtos (16 ou 17 dias) e todos passaram a ter 22 ou 23 dias.
Assim, cada período de quatro anos contava com anos de 355,
355, 377 e 378 dias, somando 1.465 dias. Sendo o ciclo de 24 anos dividido em
seis períodos de quatros anos, tínhamos 8.790 dias; descontando-se o Mercedonius excluído do calendário – que tinha 22 dias -, ficamos com 8.768
dias em 24 anos, ou 365,33 dias por ano.
E assim a concordância com os astros ficou prejudicada.
Outra alteração pontifícia foi a inversão de ordem entre
Januarius (agora 11º mês) e Februarius (agora último mês).
A mudança significativa seguinte somente ocorreu com o
calendário Juliano, obviamente fundado no período em que Caio Júlio César
ditava os rumos de Roma.
Mas isso é assunto para outro post.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “O tempo que o tempo
tem: por que o ano tem 12 meses e outras curiosidades...”.
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