Pode-se dizer que o único tutor
de Fermat no campo da matemática foi o livro “Aritmética”, de Diofante de
Alexandria. Estavam ali descritos mil anos de avanços matemáticos. Fermat lia
uma tradução feita por Claude Gaspar Bachet de Méziriac para o latim.
Ao contrário de Bachet, no entanto, Fermat desejava apenas
se divertir e alcançar uma satisfação pessoal por conseguir resolver problemas
que outros não conseguiam. Não queria escrever um livro didático para as gerações
futuras.
Uma característica do livro de Diofante eram as margens bem
largas, que permitiam fazer anotações e até resolver alguns cálculos mais
rápidos. Fermat fazia comentários, anotava fórmulas nessas bordas.
Uma dessas anotações tratava dos números amigáveis (ou amistosos),
que fascinaram Pitágoras. São pares de números em que um deles é igual à soma
dos divisores do outro. Por exemplo, 220 e 284: os divisores de 220 (1, 2, 4,
5, 10, 11, 20, 22, 44, 55 e 110), somados, resultam em 284; os divisores de 284
(1, 2, 4, 71 e 142), se somados, resultam em 220.
Até 1636, imaginava-se já terem sido descobertos todos os
números amigáveis. Fermat adicionou o par 17.296 e 18.416 à lista. Fermat basicamente
abriu a porteira... Depois dele diversos outros matemáticos acharam mais pares
com essa característica.
No século XX surgiram os números sociáveis. A ideia é que
funcionem como um círculo fechado. Por exemplo: 12.496, 14.288, 15.472, 14.536
e 14.264. A soma dos divisores do primeiro é igual ao segundo; a soma dos divisores
do segundo é igual ao terceiro; a soma dos divisores do terceiro iguala o
quarto; até que a soma dos divisores do quinto iguala o primeiro número.
A descoberta de um novo par de números amigáveis fez dele
uma celebridade. Mas ele complementou essa fama descobrindo outras curiosidades
matemáticas. Por exemplo, ele descobriu que o número 26 está entre um número
quadrado (25 = 52) e um cubo (27 = 32). Depois conseguiu
elaborar a prova matemática de que o 26 é o único número nessa condição.
No II volume de Aritmética, Fermat deparou-se com diversos
problemas e soluções relacionados com o Teorema de Pitágoras. Genialmente,
Fermat criou uma equação semelhante, porém aparentemente sem solução: X3 +
Y3 = Z3.
Não parou por aí. Continuou alterando a potência para
números maiores.
Aparentemente não haveria solução para: Xn + Yn
= Zn , para n = 3, 4, 5 ...
No mesmo Aritmética, volume II, ele anotou às margens do
problema 8:
“Cubem autem in duos cubos, aut quadratoquadratum in duos
quadratoquadratos, ET generaliter nullam in infinitum ultra quadratum
potestatem in duos eiusdem nominis faz est dividere.”
“É impossível para um cubo ser escrito como a soma de dois
cubos ou uma quarta potência ser escrita como uma soma de dois números elevados
a quatro, ou, em geral, para qualquer número que seja elevado a uma potência
maior do que dois ser escrito como a soma de duas potências semelhantes.”
Fermat fez essa afirmação e acredita ser possível prová-la.
Porém, o que ele deixou para os matemáticos do futuro foi uma afirmação
igualmente assombrosa:
“Cuius rei demonstrationem mirabilem sane detexi hanc
marginis exiguitas non caperet.”
“Eu tenho uma demonstração realmente maravilhosa para esta
proposição, mas a margem é muito estreita
para contê-la.”
Tudo o que foi dita só faz parte da história registrada
porque seu filho mais velho, Clément-Samuel, que decidiu publicar as descobertas
decorrentes do hobby favorito de seu pai.
É evidente que muitos não acreditaram que Fermat realmente
tivesse a resposta para o enigma. Mas sua anotações pessoais traziam
observações tão interessantes, lógicas tão inusitadas que realmente faziam crer
que Fermat tinha essa demonstração. Mas agora eles teriam de ser recriados. E
essa tarefa nmanteve muitos matemáticos ocupados.
Um deles era foi um dos maiores monstro da história dessa
ciência: Leonhard Euler.
O primeiro feito de Euler em relação aos desafios
quebra-cabeças de Fermat foi a prova do Teorema dos Números Primos. Fermat
estabeleceu que todos os números primos podem ser encaixados em duas categorias
principais: aqueles iguais a 4n + 1; aqueles iguais a 4n – 1 – n é um número natural.
Por exemplo, 13 está no primeiro grupo (4x3 + 1) e 19 pertence ao segundo (4x5 –
1). O Teorema dos Números Primos afirma que o primeiro tipo de números primos é
sempre a soma de dois quadrados (13 = 22 + 32). Quanto
aos segundos, nunca serão escritos dessa forma.
Provar essa afirmação, para todos so primos, mostrou-se ser
tarefa inglória. Em 1749, após 7 anos de esforços e quase 100 anos após a
publicação dos escritos de Fermat, Euler conseguiu chegar à prova – uma das que
Fermat afirmou ter secretamente.
Ao longo dos séculos seguintes, pouco a pouco todos os desafios
propostos por Fermat foram sendo desvendados. Mas o Último Teorema de Fermat
(aquele do Teorema de Pitágoras com expoente n) resistia.Daí o “Último” aposto
no início.
Continua!
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “O último teorema de Fermat:
a história do enigma que confundiu as mais brilhantes mentes...”
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