O diagnóstico pré-natal permite a
detecção de um grande número de malformações de doenças genéticas, ainda
durante a gravidez.
Pesquisas realizadas em países
onde o aborto é permitido, muitos casais decididos a interromper a gravidez
caso seja detectada algum problema desse tipo, decidiram-se por ter o filho
quando o diagnóstico excluiu a possibilidade daquela doença que temiam.
Situações como essas reforçam a
necessidade de discussões sobre a ética na interrupção da gestação, ao menos
nos casos de doenças graves e incuráveis. Mesmo mulheres que deram à luz filhos
com doenças genéticas graves, quando ainda não havia a possibilidade de
descobri-las em um diagnóstico, foram ouvidas reforçando argumentos a favor de
uma legislação que permita esse procedimento.
Entretanto, alguns cuidados devem
ser tomados. A detecção de mutações genéticas pode ser possível, mas o prognóstico
é impossível de ser traçado com certeza. Um exemplo é a ataxia epinocerebelar,
uma doença progressiva. O risco de ser portador é de 50%. O risco de contaminar
o feto é de 25% (50% X 50%).
Interessante que a doença é
transmitida por um cromossomo sexual X. A mulher tem dois desses. Caso tenha
dois filhos e cada um tenha herdado um X diferente, e ambos tenham nascido
saudáveis, exclui-se a possibilidade de que a mãe tenha essa doença.
Mas a situação revelou um
questionamento: é justo que a mãe tenha um diagnóstico a respeito da sua saúde,
por meio de diagnósticos – bem mais invasivos, aliás – realizados diretamente
em seus filhos?
E quanto a revelar doenças no
feto que somente se manifestarão quando atingirem a idade adulta? É justo submeter
alguém a um sofrimento imediato por conta de fatos que somente ocorrerão no
futuro, muitas vezes apenas após os quarenta anos? E quanto a saber antecipadamente
que esposa, marido ou filhos serão submetidos a esse sofrimento?
E diante do diagnóstico positivo
realizado no feto? Abortar ou seguir em frente? Seria mais interessante adotar
uma criança ... ou espermatozóides/óvulos de terceiros?
Há algum tempo surgiu a
alternativa do diagnóstico pré-implantação (DPI). O diagnóstico pré-natal é
feito durante a gestação (entre 10 e 12 semanas). Já o DPI é realizado nos
embriões in vitro, no laboratório.
Quando o embrião conta de oito a
dezesseis células, retiram-se uma ou duas células. Faz-se o diagnóstico nessas
células, buscando mutações que levem a dada doença genética. Importante notar
que a mutação deve ser previamente definida. Existem milhares de mutações e é
impossível fazer uma “varredura” em busca de alguma delas.
De posse do diagnóstico realizado
nas células, selecionam-se aquelas livres da mutação, implantam-se-nas no útero
e garante-se assim a gestão de um bebê saudável.
Imediatamente surge um
questionamento: seria esse um mecanismo para praticar eugenia? Essa provocação
tem como pano de fundo ações violentas e repressivas contra minorias, na
tentativa de gerar uma sociedade de pessoas com certo perfil físico específico.
Contudo, em tempos recentes surgiu o conceito de “prática eugênica responsável”:
elas devem mesclar liberdade reprodutiva individual com educação e discussão
pública sobre procriação de maneira responsável. Não se pode selecionar
características como cor dos olhos, da pele, do cabelo, preferência sexual etc.
Deve-se manter no campo das doenças e malformações.
Mas mesmo nesses limites estritos
é difícil avaliar a ética: pais surdos podem decidir por ter filhos apenas se
surdos; pais com nanismo podem desejar um filho com a mesma doença. Seria
eugenia algo que não é exatamente “eu”?
E quanto a selecionar de acordo
com as habilidades esportivas ou intelectuais? O livro “The genius factory: the
curious history os the Nobel Prize sperm bank” conta a história de um
experimento, que pretendia concentrar material genético de pessoas geniais –
matemáticos, físicos, grandes empresários, atletas, vencedores do Prêmio Nobel
etc. Após investigar os filhos desses doadores, descobriram-se pessoas ...
normais. Tratava-se de nada mais que racismo.
Ambiente e educação ainda são as
reais responsáveis por muita coisa nessa vida ...
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “GenÉtica: escolhas
que nossos avós não faziam”
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