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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

BLACK LIVES MATTER! O BERÇO DA CULTURA NEGRA NO RIO DE JANEIRO


O local de fundação da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro foi o Morro Cara de Cão, no atual bairro da Urca. Esse fato se deu em 1º de março de 1565, por Estácio de Sá.

A fundação da Cidade Maravilhosa se deu no contexto de guerras contra as invasões francesas. Por 10 anos, estes ocuparam a região, na tentativa de fundar uma colônia americana, a França Antártica.
Estácio de Sá morreu em 20 de fevereiro de 1567, apenas um mês após a expulsão definitiva dos inimigos europeus. Durante o conflito, Estácio foi ferido no rosto por uma flecha envenenada.

Após a morte de Estácio, o terceiro governador-geral do Brasil e tio do de cujus, transferiu a cidade da região do Morro Cara de Cão para a região do Morro do Castelo, atual bairro do Castelo, região central da cidade. Julgava-se assim estar mais bem protegida.

Em seguida, assumiu o cargo o primeiro governador do Rio de Janeiro, Salvador Correia de Sá, também sobrinho de Mem de Sá.

Foi em homenagem a Salvador Correia de Sá que se batizou o bairro da Ilha do Governador, à época seu engenho de açúcar daquele governador.

Embora seja uma instituição milenar presente em todas as sociedade humanas – lembremos da história dos hebreus na Bíblica -, a escravidão sempre causou uma certa repulsa em alguns, e mesmo indignação em outros.

Grécia e Roma praticavam a escravidão de maneira desabrida, mas a posição social ocupada pelos escravos era bem específica, de maneira a permitir a aquisição da liberdade.

Os primeiros seres humanos escravizados no Brasil foram os índios, ainda nos anos iniciais de nossa história pós-Cabral.

Já em 1611 se iniciaram os primeiros movimentos abolicionistas de proteção aos indígenas. Como já estavam nas novas terras, os índios foram logo recrutados como mão de obra. Mas grande parte do trabalho que eles executavam, como transporte de toras de Pau-Brasil, funcionasse num sistema de escambo.

Logo os jesuítas saíram em defesa dos indígenas, publicamente reconhecendo pureza e inocência neles; na privacidade de suas propriedades, praticavam a escravidão indígena em larga escala.

A abolição definitiva da escravidão de povos indígenas foi realizada pelo Marquês de Pombal, durante o reinado de D. José I.

O local onde a escravidão indígena permaneceu por mais tempo foi a Capitania de São Vicente, em São Paulo. Dada a extrema pobreza dos seus moradores, não era possível adquirir escravos africanos. A saída encontrada era escravizar índios. Os bandeirantes paulistas eram os grandes aprisionadores de índios, os quais vendiam como escravos.

Com a proibição de escravizar os índios, a alternativa de que se lançou mão foi o uso de escravos africanos, iniciada já na primeira metade do século XVI, nas fazendas de açúcar.

Os escravos mais valorizados eram aqueles de Angola e Moçambique, chamados de Bantos, normalmente usados na lavoura. Os negros vindos do porto de Mina, atual Elmina, em Gana, eram direcionados para as lavras mineiras. Eles já tinham experiência adquirida nas minas de ouro africanas.

Além de se abrigarem em galpões escuros e insalubres – as senzalas -, os escravos eram frequentemente acorrentados, para evitar fugas. No caso de tentativas de empreendê-las, o castigo mais usado era o açoite – a pena mais comum no Brasil colonial.

O açoite seria abolido no Brasil em 1885. Essa medida estimulou a fuga de escravos, precipitando o fim da odiosa instituição.

A abolição da escravidão de negros foi precedida por movimentos emancipacionistas como Conjuração Baiana, em 1798. Culminou com a Lei Áurea, de 1888.

O ano de 1888 marcou outros eventos: foi o ano da fundação da cervejaria Brahma, primeira companhia a contratar trabalhadores negros, recém-libertos. Também foi o ano de criação da Guarda Negra, apenas 3 meses após a Lei Áurea.

Quanto à moralidade da prática escravagista, José Bonifácio declarou em 1832, na Assembléia Constituinte então em vigor: “a escravidão é um cancro mortal que ameaça os fundamentos da nação.” Em 1831, no período regencial, foi aprovada uma lei anti-tráfico de escravos, mas não foi aplicada.

Mesmo após a abolição, os negros eram proibidos de praticar ritos de religiões e de festas africanas: todos seriam batizados e deveriam ser católicos. Nesse ponto, a adoção da religião católica por diferentes etnias se diferenciou: enquanto os negros Bantos adotaram o catolicismo mais facilmente, os negros Minas mantiveram quase intacta sua religiosidade original.

Essa questão foi debatida por José de Alencar, escritor e deputado geral na Câmara dos Deputados, em 1871:

“A grande virtude e a excelência do cristianismo estão justamente em que ele se amolda a todas as condições sociais. Consolam todas as misérias, todas as dores deste mundo. Se for um esplendor para os reis, é um refúgio para os cativos. A todos grandes e pequenos ilustres e obscuros, ricos e pobres, a todos a religião aponta uma esperança inefável: a esperança de uma vida melhor.”

Apesar dessas restrições, seres humanos costumam resistir. Às escondidas, escravos mantinham suas tradições vivas, praticando rituais, festas e artes. Criaram, por exemplo, a capoeira.

As negras, em geral, ocupavam tarefas domésticas: cozinheiras, arrumadeiras e amas de leite eram as mais comuns. Das relações sexuais não consentidas entre senhor e escravas, surgiu a enorme população de mulatas no Brasil.  

Quanto à alforria foi um pouco mais observada no Brasil na região das Minas, no século XVIII. Ocorreram casos de alforria por testamento, mas o mais comum era juntar algumas moedas por anos a fio.

A escravatura, de pessoas em geral, foi abolida por Portugal, de maneira pioneira, em 12 de fevereiro de 1761, por Marquês de Pombal, durante o reinado de D. José I. No entanto a medida valeu para Portugal e suas colônias asiáticas. No Brasil, a elite escravocrata pôde manter o estado de coisas como mais lhes aprazia.   

Durante os anos de prática da escravidão, houve reação por parte dos escravos. As revoltas em fazendas terminavam com fugas para as florestas, quando se formaram os quilombos. Lá, praticavam desinibidamente sua cultura, língua nativa e religião. Em muitos também há registros de trabalho escravo no contexto dos quilombos.

Dois quilombos que se destacaram em importância foram: Quilombo dos Palmares, liderado por Zumbi; e Quilombo do Ambrósio, nas Minas Gerais. Este, tornou-se famoso pelos ataques desferidos contra tropeiros que iam às regiões de mineração de diamantes, em Goiás.

A história da escravidão de povos negros é, sem dúvidas, um episódio bastante triste, tanto para as vítimas quanto para quem insiste em cultivar a humanidade e a civilidade. Mas também é um período mal compreendido, cheio de nuances e idiossincrasias de raiz local, brasileira.

Um caso muito interessante foi a história da cantora lírica Joaquina Lapinha da Conceição. Negra, brasileira, desenvolveu uma vibrante carreira internacional ainda em meados do século XVIII e colheu elogios das plateias mais exigentes da Europa. Foi uma das primeiras mulheres a autorizadas a se apresentar publicamente em Lisboa.

Nascida em Minas Gerais, começou a atuar no Rio de Janeiro por volta de 1780. De 1791 a 1805, apresentou-se em diversas cidades portuguesas. O contexto abertamente racista da época a obrigava a usar cosméticos brancos sobre a pele, de maneira a disfarçar sua negritude.

Retornou ao Brasil e retomou sua carreira na cidade.

Dentre os monumentais poemas de brasileiros, alguns dedicaram suas linhas à questão da escravidão e suas práticas indigestas. O nome que mais se destacou nesse contexto foi o de Antônio Frederico de Castro Alves, o Castro Alves. Nascido em Curralinho, na Bahia, em 1847.

Viveu entre 1847 e 1871. Apesar de descender de uma família de posses, vestir-se elegantemente e cultivar gostos refinados, Castro foi capaz de entender as angústias e os sofrimentos que afligiam as infelizes vitimas da escravidão. Os poemas em que expunha seus sinceros sentimentos lhe renderam a alcunha de “Poeta dos Escravos”. Compôs o mais célebre deles aos 21 anos: “Navio Negreiro”.

Morreu de tuberculose, doença que contraiu aos 16 anos, antes que pudesse terminar seu curso de direito.
Mas nenhum anti-escravagista brasileiro poderia ser comparado a Joaquim Nabuco. Seu currículo era extenso: político, diplomata, historiador, jurista e jornalista. Formou-se em direito na Faculdade do Recife. Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. Mais que isso, era descendente de uma família de escravocratas, paradoxo esse que deixou transparecer ao longo de suas obras.

Em março de 1845 terminou o prazo acertado entre Brasil e Grã-Bretanha para extinguir o tráfico de escravos em direção ao Brasil. Conhecido como Bill Aberdeen, a ato de autoria de Lord Aberdeen permitia ao Almirantado britânico aprisionar navios negreiros, estivessem onde fosse. Poderiam também julgar a tripulação do navio por crimes.

Embora criticado até em terras inglesas, pelo excesso de poder conferido aos britânicos, essa lei terminou por aumentar consideravelmente o tráfico de escravos às vésperas de entrar em vigor – com o aumento conseqüente do preço.    

O fato é que apenas o uso de mão de obra escrava conferia competitividade às exportações brasileiras. Logo a política se dividiu: os conservadores, chamados de saquaremas, culpavam os liberais, ou luzias, pela submissão ao poder de polícia britânico. Mas o poder britânico tomava corpo na Corte do D. Pedro II, que dependia da ajuda britânica para superar os conflitos na região do Rio da Prata.

O passo mais importante foi dado por Eusébio de Queiroz, que fez passar a Lei nº 581 de 1850, que passou a circular com seu nome, que punia os importadores de escravos.

A reação conservadora veio com o incremento do tráfico interno de escravos, saídos das regiões do nordeste, em crise econômica, em direção às fazendas de café do sudeste. O descontentamento dos fazendeiros nordestinos fez engrossarem as fileiras abolicionistas.

Ainda assim, os traficantes de escravos tentaram encobrir as mercadorias proibidas. A reação veio por meio da Lei Nabuco de Araújo (pai de Joaquim Nabuco), que coibia essas táticas. Os últimos  escravos africanos desembarcaram no Brasil em 1856.

Entre 1850 e 1870, aumentou significativamente a imigração de europeus para o Brasil. Vinham laborar em cafezais, contudo encontraram condições análogas à da escravidão de negros africanos. Após os primeiros problemas diplomáticos, com o retorno dos imigrantes ludibriados, o governo interveio e regularizou uma proteção ao imigrante.

A substituição foi bastante rápida: cidades que tinham 80% dos trabalhadores rurais negros, em 1871, já em 1899 contavam com 93% de trabalhadores brancos.

Por tudo isso, além da malária e das mortes e alforriamento de escravos, em 1888 o número de escravos era bastante reduzido.

Ainda em 1880, políticos como Joaquim Nabuco e José do Patrocínio criaram a Sociedade Brasileira contra a Escravidão, em 1880. Depois desta, embrionária, várias outras foram criadas. Contaram com o apoio de artistas, intelectuais, jornalistas, para arrecadar fundos e alforriar o maior número de escravos possível.

Na Faculdade do Recife, alunos como Plínio Lima, Castro Alves, Rui Barbosa entre outros fundaram a Associação Abolicionista.

São Paulo contava com uma Sociedade Emancipadora e com um advogado que equivalia a uma Sociedade inteira: Luís Gama, responsável por emancipar mais de 1.000 escravos.

Quando o movimento abolicionista ganhou corpo e dinâmica própria, os Estados do Ceará e Amazonas se adiantaram e aboliram a escravidão de seus territórios, em 1884.

Tais movimentos pregavam a abolição sem indenização, haja vista a ausência de pagamentos do Estado aos fazendeiros ser um dos grandes entreves do movimento.

Após a proibição do tráfico negreiro, em 1850, o passo seguinte ocorreu apenas em 1871, com a Lei do Ventre Livre, ou Lei Rio Branco, editada pelo Gabinete Visconde do Rio Branco. Naquele momento, a imagem externa do país era uma grande preocupação.

Os filhos de escravos, conhecidos como ingênuos, nasciam livres e poderiam optar por uma dentre as duas: ficar com os senhores até os 21 anos, ou ser entregues ao governo. Na prática, foi um fracasso, pois os ingênuos eram mantidos cativos, como escravos. Somente eram entregues os ingênuos deficientes físicos, cegos etc.

Em face do descaso com que eram tratados, a mortalidade infantil cresceu significativamente, com a morte de ingênuos, desprezados pelos senhores. Esse descaso poderia ter sido evitado, caso o governo tivesse cumprido seu compromisso de aportar fundos visando à educação e preparo dos ingênuos para a vida de trabalhador livre.

Desde 1887, os abolicionistas transferiram seu luta para o local dos fatos: o campo. Ajudavam nas fugas em massa de escravos. Isso forçava a contratação dos escravos fugidos como trabalhadores assalariados. Cidades inteiras libertaram seus escravos. Negros fugidos e mulatos abraçaram também a causa, após serem libertados.

Diante do pioneirismo de Ceará e Amazona, o governo central deu mais um passo com a Lei dos Sexagenários, ou Lei Saraiva-Cotegipe. A proposta foi do então deputado baiano Rui Barbosa, libertava automaticamente a todos com mais de 60 anos. A compensação financeira aos fazendeiros era obrigatória, mas nunca foi cumprida. O mecanismo era um pouco mais complexo e cruel: completados 60 anos, os escravos deveriam prestar séricos por mais 3 anos aos seus senhores; após os 65 anos seriam libertos.

Desnecessário dizer que raríssimos escravos sobreviviam para usufruir dessa benesse...

De fato, o inadimplemento do governo em face das compensações financeiras devidas aos fazendeiros levou a que diversos questionassem judicialmente quanto à validade das emancipações concedidas até aquele momento.

Isso deu azo à campanha “Abolição sem indenização”.

A região onde a emancipação de escravos se desenvolveu de maneira mais célere foram as terras do Oeste paulista: ricas e prósperas, surfando na onda cafeeira, já atraiam imigrantes por adotarem mais rapidamente os contratos de trabalho.

Nos seus últimos anos, a escravidão passou a ser atacada também pelo Exército, que pediu publicamente para não mais ser acionado pelo governo para caçar escravos fugidos.
Somando-se a isso, do exterior diversos países se manifestavam contra a demora do Brasil em pôr fim àquele sistema deplorável.    

Por fim, em 13 de maio de 1888, rendendo-se às pressões que vinham de todos os lados, a princesa Isabel de Bragança assinou a Lei Áurea. E sem qualquer indenização aos senhores então expropriados.
Sentindo-se injustiçados, tais senhores se filiaram aos republicanos, contra a monarquia. Esse movimento levou o último pilar que sustentava o velho regime.

Faltava apenas a chamada Questão Militar, que girava em torno da possibilidade ou não da doutrina do soldado-cidadão, que procurava defender uma maior participação das Forças Armadas nas grandes questões nacionais. Culminou com o golpe republicano de 15 de novembro de 1889. Caiu a monarquia.
Em 1891 foi promulgada uma nova Constituição, nos moldes norte-americanos: laicismo, ampliação do direito ao voto.

Mas a crise econômica daqueles anos levaria a outra crise política. O novo ministro da Fazenda, Rui Barbosa, havia autorizado aumento das emissões monetárias em 75%. O Brasil virou um lamaçal de especuladores e de empresas-fantasma. O Mal. Deodoro da Fonseca, indignado com a situação, mandou fechar o Congresso. Em resposta, a Marinha se sublevou contra o Exército e exigiu a renúncia de Deodoro, que ocorreu em 23 de novembro de 1891. Foi substituído pelo seu vice, Mal. Floriano Peixoto.

Muitas outras disputas pontuaram esse período. No Sul, uma revolução federalista opôs-s ao governo de Júlio de Castilhos e o maragato Gumercindo Saraiva: resultou numa guerra civil. Terminou com a morte de Gumercindo e com a derrota de uma Armada enviada à região. Após mais de 12 mil mortos, Prudente de Morais assinou a capitulação dos revoltosos em Pelotas, em 1895.

Houve também o segundo levante da Armada (Marinha), comandado pelo Almirante Custódio de Melo e pelo Almirante Saldanha da Gama. Chegam a bombardear o Rio de Janeiro. Foram derrotados pelo Marechal Floriano Peixoto.

Já o cenário sob a perspectiva dos escravos recém-libertos era desanimadora: não tinham formação escolar ou profissão que pudessem adotar. Mantiveram-se, assim, às margens da cidadania e alijados de possibilidades de ascensão social.

Conforme previra Antônio Prado: “... ex-escravos, habituados à tutela e curatela de seus ex-senhores, debandaram em grande parte das fazendas, indo “tentar a vida” nas cidades; tentativa essa que consistia em: aguardentes aos litros, miséria, crimes, enfermidades e morte prematura...”

Outro símbolo cultural muito presente entre os escravos, no Brasil, foi a maconha. No século XVI, fumava-se o “bangüê”. Subproduto do cânhamo (espécie de cannabis), chamou a atenção da Corte portuguesa quando passou a servir de matéria prima para produzir tecidos para velas de navios – mercado bastante lucrativo, na época.

O resultado foi o fornecimento de sementes, de maneira a disseminar a cultura pelo território brasileiro. O incentivo era tal, que o vice-rei Luiz de Vasconcellos e Souza, em 1785, enviou a São Paulo 16 sacas de sementes e um manual de cultivo de Cannabis. Pedia encarecidamente que se plantasse maconha, o máximo possível. No século seguinte, tornou-se base de diversos remédios. Um exemplo eram os “Cigarros Índios”.
Mas a perseguição a simbologias que cepa negra era inevitável. No ano seguinte à Lei Áurea, proibiu-se a capoeira. Em 1890, o governo fez passar a Seção de Entorpecentes Tóxicos e Mistificação, que tinha como alvo o “baixo espiritismo”. Como a maconha era muito usada no candomblé, dava-se início à repressão oficial.

A primeira lei penal relacionada à maconha data de 1830, quando a lei passou a punir com pena de prisão quem comercializasse o “pito de pango”: um cachimbo de barro usado para fumar maconha.

Quando teorias médicas de cunho racista se propagaram, a maconha passou a ser descrita como incentivador de práticas de crimes. Em 1917, tais “teóricos” passaram a atacar o uso médico da Cannabis, ao obrigar a apresentação de receita médica para comprar remédios à base de Cannabis, desde 1917.
Em 1932, por fim, a substância foi proscrita.

Com Getúlio Vargas, passou-se às leis de cadeia para usuários. Quanto ao candomblé, o governo trocou a vedação do uso em cerimônia, em troca da legalização dos terreiros.

Após abordar a ida dos ex-escravos para as cidades e as dificuldades sociais que esses passaram a viver, aborda-se o lócus onde foram morar os infelizes “novos cidadãos livres”: as favelas.

Logo após a proclamação da República, surgiu um conflito que, inesperadamente, adquiriu envergadura de Crise nacional: a Guerra de Canudos. Povoado habitado por milhares de pessoas pobres, miseráveis, localizado nos rincões mais profundos da Bahia, tinha nos seus arredores um morro chamado Favela (nome de uma planta local).

Após diversas incursões, as últimas enviadas pelo governo federal, em 1897 o povoado se rendeu. Alguns soldados para lá enviados voltaram à casa, em grande parte no Rio de Janeiro. Mais uma vez incapaz de cumprir o que prometera, vários desses soldados tiveram seus soldos interrompidos. Sem dinheiro, essas pessoas se instalaram no Morro da Providência, região central da cidade. Com o tempo, passou-se a se referir àquela localidade como Morro da Favela.

Desde os anos 1920, esse nome refere a qualquer localidade semelhante.

Em 1927, o nome Estácio de Sá ressurge, agora associado ao samba (estilo musical que unia ritmos africanos a instrumentos da música européia). No alto do Morro de São Carlos, no bairro Estácio de Sá, surgiu a primeira Escola de Samba do Brasil, a “Deixa Falar”, fundada por Ismael Silva e por outros bambas pioneiros.

Essa história havia se iniciado com uma doméstica, chamada Maria Taioba. Seu patrão, o português Antônio Santos Rodrigues, era o dono de toda a área onde se localizava o morro de São Carlos-Estácio. Lá, ela construiu seu barracão.      

A partir dessa localidade, o Carnaval mudou significativamente.

Festa milenar que trabalhava rituais de fertilidade em sociedades pagãs, o carnaval era uma comemoração a deuses egípcios, teutônicos, gregos e romanos, até que fosse adotado pela Igreja Católica no século VI, visando a domesticá-lo na fé cristã, através da adoção da Quaresma, precedida por uma grande festa que tentava compensar os 40 dias de jejuns até a Páscoa, levando a sua proliferação mundo afora, até seu desembarque no Brasil, no século XVII.   

Em Roma, comemoravam-se as Saturnais de 16 a 18 de dezembro, em homenagem ao deus Saturno. Tribunais e escolas não funcionavam, alforriavam-se escravos. As festas incluíam danças e desfiles pelas ruas. A abertura ocorria por meio de um cortejo de carros em forma de navios, com homens e mulheres nus, dançando sobre os mesmos. Eram chamados “carrum navalis”... talvez origem do termo Carnaval.
Em fevereiro, ocorriam as Lupercais, festas em homenagem à fertilidade. Os Lupercos, seguidores de Pã, saíam pelados pelas ruas, banhados de sangue de cabra, correndo atrás de transeuntes, batendo neles com correias.

Em março, ocorriam os Bacanais, homenagem ao deus Baco, em celebração á primavera, homenageavam deuses como Como, Momo, dentre outros.

A Igreja tentou descaracterizar o quanto pôde essa festa, para torná-la um sacrilégio menor. Mas é impossível não lembrar do nosso carnaval.


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “ESTÁCIO DNA-DO-SAMBA: prostituição, poesias, prosas, tiro, porrada e bomba”

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