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segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

SEXO, DROGAS E MPB: TIM MAIA


Segundo ele mesmo, ele foi um notório praticante de Triatlon: pó, uísque e maconha.

Sebastião Rodrigues Maia foi o mais novo de seis filhos. Nasceu em 1942, na Tijuca. Seu pai era dono de uma pensão, para viajantes sem teto no Rio.

Ainda cedo, Tião precisou trabalhar, sendo sua atividade mais conhecida no bairro entregador de marmitas. Ganhou aí seu primeiro apelido: Tião Marmiteiro.

Nessa época, conheceu Erasmo Carlos. Vizinho de Tião, Erasmo flagrou o Tião Marmiteiro traçando uma marmita de um cliente. Tião correu atrás do tremendão com uma barra de ferro.

Seu pai, percebendo o gosto do filho pela música, dá-lhe um violão e o matricula em aula de canto. Começa a se apresentar em feirinhas e quermesses. Ensina os acordes básicos a Erasmo, à época contando 17 anos. Erasmo apresenta Tião a um amigo, Jorge Bem.

Também nessa época, desembarca no Rio um capixaba de Cachoeiro do Itapemirim, Roberto Carlos. Este deseja um teste na banda dos garotos iniciantes, The Sputnik. É aceito.

Contudo, um episódio traumático ocorreria logo em seguida. The Sputniks chama a atenção do apresentador Carlos Imperial. Este, apresentava o programa Clube do Rock, na TV Tupi.

O primeiro show na TV acaba em briga entre Tião e Roberto Carlos, na porta da emissora. É o fim do breve banda.

Na semana seguinte, pela TV, Tião assiste ao desafeto apresentando um número no mesmo programa. Foi apresentado pelo  Imperial como o “Elvis Presley brasileiro”.

Tião, revoltado, procura Imperial novamente e o convence a ouvi-lo cantando uma versão de “Long Tall Sally”. Imperial gosta mas se opõe ao nome artístico que o jovem exibia. Daí em diante, Tião Marmiteiro seria Tim.

Em 1958, chega ao fim o programa de Imperial, e com ele o espaço que Tim tinha para se apresentar. Sem emprego, prestes a completar 17 anos, parte para os EUA. Almeja estudar televisão. Lá, após ser adotado por uma família, passa a ser conhecido como Jimmy, the Brazilian. Arruma trabalho num supermercado, fuma o primeiro baseado e emplaca um conjunto musiacal, The Ideals.

Em 1963, com três amigos e a bordo de uma carro roubado, Tim cruza nove estados americanos. Cometem uma série de furtos, Tim é preso cinco vezes, por: agitação, bebedeira, roubo de combustível e posse de substâncias ilegais.

Ainda preso, envolve-se em problemas com outro preso e é deportado para o Brasil.

Aqui desembarcando, Tim descobre que seu país agora é uma ditadura militar. Ao ligar a televisão, descobre que seu antigos companheiros, Erasmo e Roberto Carlos formam uma famosa dupla de cantores que não saem da TV.

Logo após, Tim é preso pela polícia por furto; passa 10 meses na penitenciária. Nesse período era ainda mais torturado ouvindo os sucessos dos antigos parceiros musicais.

Ao ser libertado, Tim parte para São Paulo, desejando fazer contato com os antigos parceiros. Mas não consegue falar nem com Erasmo nem com Roberto.

Contudo Tim faz três novos amigos, igualmente malucos: Rita Lee, Arnal e Sérgio. O trio seria conhecido como Os Mutantes. Os novos amigos tomam ácido e vagam pelas ruas gastando a onda...

Também consegue ser aprovado para figurar no programa Quadrado e Redondo, que seria exibido pela TV Bandeirantes. Mas a atração não emplaca.

Em 1967, ainda sem conseguir achar alguma coisa para fazer, soube que Roberto Carlos estava na cidade. Novamente Roberto não o recebe, mas Tim consegue entregar ao astro uma fita cassete com duas composições próprias. Roberto gostou das músicas do velho Tião e passou a recomendá-lo a gravadoras.

Logo a CBS contrato Tim, que grava um compacto... que se torna um fracasso. A CBS dispensa logo o garoto.

Roberto Carlos procurou novamente o velho parceiro. Eram tempos de explosão da música soul e Roberto encomenda algo nesse estilo a Tim. Nasceu assim o primeiro sucesso do velho Tião: “Não vou ficar”. O sucesso parecia aguardar o garoto.

Rita Lee e Eramo Carlos convencem o todo-poderoso presidente da Phillips, André Midani, a contratar Tim.

Diante da iminência de um disco, Tim escreve “Azul da cor do mar” e “These are the songs”. Diz-se que Nelson Motta estava trabalhando no novo disco de Elis Regina, quando convida Tim para dar uma passada no estúdio. Tim chegou com um violão e cantou “These are the Songs”. Elis ouviu a música emocionada e começou a cantar com Tim. Logo a banda passou a acompanhar a cantoria. Nelson percebeu a magia do momento e apertou o “Rec”.

Essa gravação apresentou um novo ídolo ao Brasil.

O primeiro LP foi suado. Tim teve de fazer um grande malabarismo para driblar as limitações dos equipamentos de que dispunha. Os quatro canais tiveram de dar conta do vozeirão de Tim. O disco saiu em 1970 e foi um sucesso.

Realiza os shows num Teatro da Praia com gente saindo pela janela. Também corre solta a amada maconha. Diante de denúncias sobre o cheiro que saía do camarim, a polícia deu uma batida, mas nada encontrou. Só o cheirinho da erva descartada a tempo.

Aos 28 anos, Tim namora Janete e se muda para o Leblon.

E fatura. A Associação Brasileira de Cacau encomenda uma música ao novo ídolo. Nasce aí o sucesso “Chocolate”. Inicialmente um jingle, torna-se um clássico.

Em 1972, com o bolso cheio, Tim resolve passar um tempo e ondres. Pretende fazer contato com os grandes artistas brasileiros lá exilados na cidade: Caetano Veloso, Hélio Oitica, Gilberto Gil e Jorge Mautner. Tim mergulha com gosto na boemia londrina: LSD, haxixe e cocaína são companheiras de toda hora.

Quando do retorno, seus discos ainda vendiam sem parar. Com o ego nas alturas, Tim chega a distribuir ácido para os executivos da gravadora. Outra feita, destruiu o escritório do chefão da Phillips, André Midani.

São tempos de teatro lotado e público delirando.

Algum tempo depois, separa-se de Janete. Tim agora mora numa casa, na Estrada da Barra, ao lado da banda.

Um dia, Tim convida a ex para ficar com ele na nova casa. De madrugada, Janete dá entrada no pronto-socorro com o corpo todo machucado. Denunciou Tim por agressão.

Quando o delegado o intimou, Tim chegou acompanhado de Janete, abraçados. Disse que se tratou só de uma queda da escada. Janete confirmou tudo... E deixaram a delegacia.

Algum tempo depois, Tim passou a exibir uma barriga cada vez mais saliente. Brincava com o peso: “O problema do gordo é que quando ele beija, não penetra. E quando penetra, não beija”. Tenta se internar numa clínica de emagrecimento, mas foge logo depois: “Fiz uma dieta rigorosa, cortei álcool, gorduras e açúcar. Em duas semanas, perdi 14 dias.”

No final de 1974, Tim se transfere para a RCA Victor. Também termina com Janete e se junta com Geísa, então com 17 anos. Mas o relacionamento logo terminaria.

Passa por uma fase na qual apenas compunha músicas românticas. Larga o ácido, mas descobre a mescalina – uma espécie de alucinógeno.

Ainda gravando um álbum duplo, Tim recebe a visita de Geísa, desejando reatar com o cantor. Embora esteja grávida de um jogador de futebol, Tim acolhe aos dois – ele seria agora o padrasto de Léo. Logo depois Geísa fica grávida de Tim.

O álbum estava com as músicas prontas, faltando apenas as letras. Foi quando a vida de Tim deu outra reviravolta completa.

Tim tomou uma dose cavalar de mescalina e foi visitar um amigo. Lá chegando, seu amigo estava no banho. Enquanto aguardava e curtia a onda da mescalina, Tim deparou-se com um livro, Universo em Desencanto.

Pouco após, Tim estava em Belford Roxo, na casa de Manoel Jacintho Coelho, quem psicografou o livro. Manoel era mestre de uma nova doutrina, que fundara: Racional. Essa doutrina pregava que deveríamos atingir a Energia Racional, que somente seria alcançada se abolíssemos todos os alteradores de consciência. O resgate final ocorreria com a chegada de discos voadores.

Bom, Tim tornou-se fiel seguidor de Manoel Jacintho. Este ajuda Tim na composição de músicas que expliquem sua doutrina. Tim doa todo o mobiliário de seu apartamento, ficando com apenas um colchão.

Buscando alcançar a Energia Racional, Tim proíbe todos os músicos da banda de utilizar álcool, maconha, ácido e cigarro. Carne vermelha também está proibida. Sexo, só para procriação. Sua banda agora se chamava Seroma Racional. Tim chega a examinar a pupila e o hálito dos músicos, para saber se estavam seguindo as regras.

Tim perde peso pela primeira vez na vida. Sua voz também melhora. Aos 32 anos, sua voz estava no ápice.
Infelizmente a gravadora recusa-se a lançar o álbum duplo.

Tim, então, funda a Seroma Discos, gravadora própria. Prensa 500 cópias e passa a vendê-las nos dias de shows.

Tim agora só anda de branco e carrega livros da doutrina a tiracolo. Suas visitas também são solicitadas a usar vestes imaculadamente brancas logo que chegam. Tim e banda eram vistis pelas ruas do centro e de Copacabana cantando hinos Racionais.

Para completar, a banda somente poderia fazer shows gratuitos, como na penitenciária de Niterói.

Então outra reviravolta acomete o cantor. Três dias antes de completar 33 anos, Tim acorda com três desejos irrefreáveis: comer carne vermelha sangrenta, beber alguma coisa alcoólica e fumar um baseado. Larga imediatamente a doutrina-seita-religião Racional. Entra no seu apartamento arrancando as vestes brancas e xingando o antigo mestre.

A banda agradece aos céus o retorno do velho Tim.

Tim também pede que se destruam as cópias restantes de Racional.

Observação: o disco é excelente e hoje é um clássico, ainda mais valorizado pela dificuldade de encontrá-lo.
Quando acaba a fase Racional, Tim está sem dinheiro e a banda não é nem sombra do que fora no passado. Mas Tim quer recomeçar, e ele sabe como fazê-lo.

Passa a se apresentar em clubes e quadras, no subúrbio, concentrando-se nos seus maiores hits. O público adora o velho Tim. Os músicos também. A velha banda retorna e agora se chama Vitória Régia – nome da rua onde Tim reside agora.

O ano de 1977 vê a explosão da disco music. Nessa época, a nova droga apreciada no pedaço é a vodka em pó. Tim adota a disco music e a nova droga.

Financeiramente, sua vida entra em parafuso: processos, indenizações, penhoras etc. Suas dívidas se amontoam.

Guta Graça Mello, da Som Livre, adianta um valor a Tim, por um novo álbum. O álbum se torna um fracasso.

Agora, as gravadoras estavam cansadas das doideiras de Tim. Os shows cancelados afastam também os músicos.

Mas Tim era imprevisível. E isso quer dizer algo. O velho André Midani er agora o comandante da Warner. Traz Tim para a empresa. Sentindo-se bastante à vontade, Tim chama os amigos: Pepeu Gomes, Hyldon, Lincoln Olivetti, seleciona um repertório arrasador e lança o álbum “Disco club”, de 1978. Nesse clássico estão registrados “Acenda o farol” e “Sossego”.

A coroa volta ao Rei do pedaço.

Mas o Rei não muda. Troca incessantemente de gravadora e só para quando volta para a sua própria, a Seroma.

E é por meio dela que lança seu próximo trabalho. Lança um compacto, cujo lado B trazia “Do leme ao pontal”.

Com o dinheiro arrecadado, lanço o próximo álbum, “Nuvens”. O disco é fantástico, mas o trabalho de distribuição às lojas é péssimo. Quase não vende, porque as pessoas não o achavam.  

No ano seguinte, Tim lança “O descobridor dos sete mares” pelo selo Lança, da Phillips/Polygram. Neste, estão presentes a faixa-título e “Me dê motivo”. É um sucesso.

No ano seguinte, lança o álbum “Sufocante”, que não decola. Volta para a RCA, pega um adiantamento de 40 mil dólares... E compra um carro sem Nota Fiscal.

Pela RCA, desentende-se com o produtor Michael Sullivan, pega o material já gravado, mete debaixo do braço, entrega ao amigo Lincoln Olivetti e lança o trabalho. Mais um sucesso.    

Diante do sucesso, Tim não conseguia conter sua verborragia: falou mal da RCA, abriu processo contra a Polygram e ainda achou tempo para se lançar para Presidente da República:
“Sarney nunca tomou 300 LSDs nem comeu churrasquinho de gato com Ki-Suco como eu; não tem experiência para ser presidente. Eu seria melhor do que ele.”

Algum tempo depois, o carro de Tim é parado num blitz. Acham boa quantidade de drogas com ele. A coisa fica séria e é levado para a 13ª DP, em Copacabana. Tim inicia um coro ainda na porta da delegacia, junta-se uma platéia em volta dele... E é liberado.

Tim tinha tudo para decolar em direção ao estrelato, mas sua falta de compromisso com os shows o derrubava. Às vezes não ia para sacanear o contratante, com quem, volta e meia, tinha desentendimentos. Outras vezes ele simplesmente desligava o telefone e ficava incomunicável. Vez ou outra não comparecia por medo de avião.  

Tim passa a ter crises de paranóia, achando que havia alguém querendo matá-lo – a tal da Crise de Monarca. Acha que uns querem roubá-lo, outros querem tirar sua mulher dele. Quando compra cocaína, obriga o traficante a cheirar antes, por medo de estar envenenado. Passa a contar com a companhia de prostitutas noite adentro. Em geral, ficavam conversando.

Pouco depois, Tim perdeu uma causa trabalhista movida por antigos músicos. Perdeu uma quantia bastante relevante. O ECAD também venceu uma ação contra ele, segundo a qual o órgão reteve todos os direitos autorais de Tim, até o pagamento integral da divida. Somente tinha um FIAT Uno, que foi penhorado.

Outro evento desconcertante se abate sobre si. Seu caseiro, que sabia onde Tim guardava sua maconha, passa a vendê-la na vizinhança. A polícia descobre o movimento e prende o caseiro, que transportava uma sacola de maconha. O cara diz que era tudo de Tim Maia, e isso sai nos jornais.

Completando o quadro trágico. Sua mulher vai embora e sua mãe morre.

Mas seu bom humor era teimoso e desobediente. Não arrefecia. Após ser escalado para cantar na ECO 92, Tim é perguntado sobre o que ele tinha a ver com ecologia. Sua resposta: “Tudo”. Acende um baseado em frente às câmeras e diz: “Eu adoro o verde. Sou militante do PVB – Partido Verde do Bão.”

Em 1993, após um longo inverno, Tim apara arestas com a Rede Globo. Uma música sua passa à trilha da novela das oito. O álbum Romântico é escalado para ser lançado no Faustão. A banda toda chega na hora e sobe no palco. E esperam Tim... e esperam... Faustão chega a chamá-lo ao vivo: “Oh, Tim, acorda que ainda dá!”. Reconhecendo o cano, Fausto diz: “Quem é vivo sempre aparece, menos Tim Mais!”.

E Tim e Globo voltam à comumente incompatibilidade. Tim está vetado na emissora.

O disco seguinte, “Voltou clarear” é um fracasso. Em razão das dívidas, também não consegue o empréstimo que viabilizaria um lançamento mais explosivo.

No ano de 1995, Tim se aproxima de Almir Chediak, com quem trabalha o lançamento de um songbook interpretado por cantores diversos. Também fecha um contrato milionário com a Brahma, para uma série de shows. O primeiro, no Riocentro, é um tremendo sucesso de público.

Pois é. Mas era o Tim. No meio do show, ele fala: “Eu to aqui fazendo esse show pra Brahma, mas eu gosto mesmo é de guaraná Antarctica.” Seu contrato é rescindido e Roberto Carlos é escalado para seu lugar.

Tim está com 142 quilos, seu escroto está inchado e infeccionado. Seu diagnóstico diz que ele pode vir a perder testículos e pênis. É operado, mas sua recuperação segue sua receita própria: foge do hospital e vai pra casa fumar maconha e comer doces.

Com os doces, a reboque, vem a diabetes. Também retira uma catarata dos olhos.

Em meados do ano, havia emagrecido 20 quilos. Passa a usar óculos.

Talvez prevendo o fim iminente, grava quatro discos, os quais banca sozinho.

Em 8 de março de 1998, Tim sobe ao palco do Teatro Municipal de Niterói. Panejava gravar o acústico para o Multishow. O cara se atrasa, como sempre; a platéia espera, como sempre. A Vitória Régia sobe e toca a primeira, sem Tim, só com back vocals. Na segunda música surge um imenso Tim, reclamando de algumas notas fora de lugar. Está com 55 anos.

Tim deixa o palco. Todos pensam ser piada. Nos bastidores, passa mal. O show é cancelado. Quando o sistema de som chama um médico, descobre-se que Dráuzio Varella estava na platéia. A ambulância chaga, os fotógrafos não descansam seus flashes. Aparece Tim, respirando num tubo de oxigênio, andando lentamente.

Dá entrada no Hospital Antônio Pedro.

O músico não suporta à hemorragia digestiva, infecções pulmonares e renais. Seu coração para. Em 15 de março, Tim nos deixou definitivamente.             

         
Rubem L. de F. Auto

Fonte: livro “A vida louca da MPB”

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