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terça-feira, 3 de janeiro de 2017

DENTES E DENTISTAS – UMA HISTÓRIA DE DOR E ASSEIO




Há 9 mil anos, em Mehrgarh, no atual Paquistão, foram achadas evidências de um dentista em pleno ofício. Nos dentes de esqueletos desencavados existem pequenos orifícios de menos de meio milímetro. Seu formato uniforme evidencia sinais de perfuração em meio a um tratamento bucal.

Esse dentista usou uma broca de arco com ponta de pedra, perfurou o esmalte e removeu uma cárie de seu berrante paciente. Dos 11 dentes pesquisados, 4 possuíam cáries inflamadas.

Ainda da pré-história, uma equipe italiana comprovou que um esqueleto achado na Eslovênia – morto há 6.500 anos – apresentava uma obturação. Foi realizada com resina feita de cera de abelha, inserida num dente rachado. Assim, cobriu-se e se protegeu um nervo exposto.

O grande destruidor de dentições no Neolítico eram grãos de pedra que se mordiam como resíduos do fabrico de pães em moinhos de pedra.

Os gregos, por meio do Pai da Medicina, Hipócrates de Cos, dera uma contribuição à odontologia: o fórceps odontológico, ou odontagogon.

A primeira ponte dentária da história foi registrada em 700 a.C. Feita pelos etruscos usavam faixas de ouro planas como aparelhos ortodônticos, apoiava-se sobre os dentes saudáveis vizinhos para substituir o dente quebrado.

Séculos depois, os fenícios usaram fios de ouro em lugar dos suportes planos. Um exemplar de uma mandíbula dourada da época está no Museu da Universidade Americana de Beirute. Este esqueleto é de uma pessoa que sofria de periodontite.

O romano Aulo Cornélio Celso já recomendava limpar regularmente os dentes. Os aristocratas tinham uma escovação própria: um escravo pegava um ramo macio, aplicava um pouco de pó de polimento e esfragava nos dentes e na gengiva de seu senhor. O pó podia ser feito de diversas matérias primas. Uma delas era chifre de veado – que também era afrodisíaco.

A invenção da escova de dentes... Chinesa. Prendiam pelos de porcos em um osso.

No islamismo, registra-se que Maomé usava uma escova feita chamada “miswak”. Era feita com gravetos de uma árvore: Salvatora Persica.  

A Idade Média europeia tinha alguns hábitos de higiene bucal. Existiam equivalentes da época a fio dental, escova de dente, líquidos de enxágue bucal etc. No entanto, a chegada de açúcar em quantidades cada vez maiores, do Novo Mundo e do Oriente, levou a uma crise dentária, especialmente entre os aristocratas e nobres europeus. Uma das grandes vítimas foi a rainha Elizabeth I.

No século XVIII, surgiu uma tendência de cultivar dentes fortes e saudáveis. No entanto, o início dessa moda não poderia deixar de ser acompanhado de experiências dramáticas. Dentes se viram esfolados por pós abrasivos, giz, sal, soda, cinzas. Aplicações de ácido nítrico destruíram o esmalte de dentes de muitas pessoas.

Com o barateamento do açúcar, consumido agora em quantidades cada vez mais homéricas, a odontologia teve de realizar alguns progressos, e elas vieram da França.

Pierre Fauchard iniciou sua carreira na marinha da França e terminou em Paris, reconhecido como o “Pai da Odontologia”. Foi o primeiro a fazer uso clínico de microscópios, por volta de 1790. Criou diversos tratamentos, comuns até hoje. Correção de dentaduras de crianças, obturações de amálgamas, criação da dentadura (no caso, de marfim), incrementou o fórceps (agora se chamava Pelicano), criação de brocas, cadeira de dentista... Tudo isso saiu da cabeça brilhante do francês.

Como ponto negativo: manteve a crença de que urina ainda era o melhor enxaguante bucal que existia... Crença ainda da época dos romanos antigos.

Impossível pensar em tratamento dentário mas não pensar em dor. O primeiro anestésico experimentado foi o gás do riso – abandonado após a descoberta de seus efeitos narcóticos. Em 1846, introduziu-se o éter, seguido pela cocaína e pelo clorofórmio. E pôde-se sentir um alívio.

A escova de dente produzida na China não conseguiu se tornar um produto global. No entanto, em 1780, um inglês preso por incitar um motim, William Addis, perfurou um osso de porco e fixou cerdas de vassoura. Ficou feliz com o resultado, promoveu seu produto e nos possibilitou a todos escovar os dentes com escova apropriada. Sua empresa funciona até hoje.

Contudo, até por volta de 1850, não havia um enxaguante bucal melhor do que a urina de portugueses recomendada pelos romanos. Até que o cirurgião escocês Joseph Lister criou o Listerine. Usando fenol, era recomendado para tratar de infecções orais. Mas a publicidade o transformou em mais um imenso sucesso comercial. Em sete anos o lucros aumentaram 7.000%.

Anos depois, finda a II GM, o plástico entra em cena e subsitituiu a seda do fio dental e as cerdas animais das escovas. O nylon era agora o ator protagonista da escovação e da limpeza bucal.
Por fim, o fluoreto passou a ser usado no tratamento de água potável, a partir de 1909.  

E os dentes agradecem.


Rubem L. de F. Auto

Fonte: livro “Um milhão de anos em um dia”.

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