Quem não gosta de bolo, sorvete e
tantos docinhos feitos com o acionador favorito da região do prazer no nosso
cérebro, o açúcar?
Todos gostam, como se pode
constatar pelas cinturas avolumadas e pelas cáries nos dentes. É improvável que
amantes de coisas açucaradas pensem em História enquanto se deliciam com
estimados 45 quilos de açúcar por ano (nos EUA), mas o doce já teve papel
importante num dos períodos mais azedos da era moderna.
O ouro branco, como os colonos britânicos
o chamavam, foi o motor do tráfico de escravos, que trouxe milhões de africanos
para as Américas, a partir do século XVI. A história de todas as nações do
Caribe, da maior parte da América do Sul e de parte do sul dos EUA foi, para sempre,
moldada pela cana de açúcar, cultivada com fins econômicos por superpotências
européias.
O lucro advindo do comércio de açúcar
era tão significativo que pode ter ajudado os EUA a alcançarem sua
independência da GB.
Por milhares de anos, pessoas de
todo o mundo foram atraídas pelo gosto doce. Antes que o açúcar se tornasse conhecido,
nossos ancestrais comiam mel, tâmaras e outros alimentos doces, os quais usavam
como adoçantes. Sabemos disso por registros ancestrais de povos do Mediterrâneo.
O mel é nosso adoçante mais
conhecido. Nas cavernas de Arãna, na Espanha, pinturas rupestres de 12.000 anos
mostram mulheres coletando mel. Elas usavam o mel para cozinhar, como se faz
hoje, para fazer hidromel (bebida alcoólica) e para limpar machucados. O
primeiro tipo de mel que nossos ancestrais usaram foi o mel selvagem, tirado de
ninhos de abelhas selvagens. Mais tarde, as pessoas começaram a deixar as
abelhas nas colméias, como fazemos hoje.
Embora o açúcar tenha chegado à
Europa por volta do ano 1100, não foi amplamente usado até o século XVI. Até
então era reservado a pessoas ricas, que o usavam tanto para adoçar comida
quanto como remédio.
A primeira planta da qual se
extraiu açúcar foi a cana de açúcar. As espécies gramíneas das quais a cana de açúcar
evoluiu se originaram de algumas pequenas ilhas no Oceano Pacífico, Polinésia e
Melanésia, dentre outras. Especialistas estudaram essas espécies gramíneas até
sua origem, de 10.000 a 15.000 anos atrás.
As espécies originais foram
transportadas à Índia, Indonésia e China há aproximadamente 8.000 anos, e desde
então estão extintas. A cana de açúcar atual pode alcançar 6 metros de altura.
Cresce em climas tropicais e subtropicais. Requerer muita água e calor. Os
maiores produtores mundiais são: Brasil, Cuba, Índia, Filipinas e México.
Como as pessoas usavam o açúcar no
interior da cana de açúcar, antes que os métodos de produção modernos fossem
inventados? Os indianos chupavam a cana, como se faz ainda em muitos lugares do
mundo. Mais tarde, passou-se a ferver o suco da cana, formando cristais de
açúcar sólido.
De acordo com a lenda, foi
Alexandre o Grande quem primeiramente trouxe cana de açúcar – ou pelo menos
histórias a respeito dela – para a Grécia, após uma expedição militar à Índia.
Por volta de 300 aC, seu almirante, Nearchos, navegou desde o Golfo Pérsico, ao
longo do rio Indo, onde a cana de açúcar crescia às suas margens, balançando ao
vento. Nearchos pegou uma, provou-a, e exclamou: “Canas indianas que produzem
açúcar e sem abelhas!”
Os árabes trouxeram o açúcar à
região do Mediterrâneo. Eles cultivaram canas de açúcar no sul da Espanha e na
Sicília, após a ocupação dessas áreas. Na Idade Média, Veneza era o maior exportador
e importador de açúcar da Europa. Cana de açúcar bruta era importada da Índia e
refinada em Veneza, antes de ser exportada para o resto da Europa.
O açúcar era muito caro e
conhecido como ouro branco. Pessoas ricas estocavam açúcar como uma forma de
poupança. Uma história diz respeito a um bispo que comprou açúcar de
comerciantes portugueses, por muitos anos, e o estocou em seus aposentos.
Quando morreu, suas posses foram repartidas entre os monges que lhe eram mais
próximos. Entre as posses estava o açúcar. Os monges o experimentaram com
grandes expectativas, mas desgostaram dele. Em vez de ser doce, estava amargo.
Eles não sabiam que esse açúcar era transportado pelo Egito por meio de
camelos, cujo suor foi absorvido pelo açúcar, deixando azedo e sem qualquer
valor comercial.
A produção de açúcar cresceu no
final do século XV, quando exploradores trouxeram cana de açúcar mais para o
sul. Por exemplo, Henrique o Navegante espalhou-o da Sicília a Creta.
Inicialmente, o suco era extraído usando-se prensas manuais. Mais tarde as
pessoas começaram a usar rodas movidas por animais e, após, rodas d`água.
Durante sua viagem, Colombo
descobriu que o Caribe tinha o clima perfeito para cultivar cana de açúcar.
Aprendera sobre seu cultivo nas ilhas Madeira, e levou a cana à América (Índias
ocidentais), onde era plantada e colhida em grandes plantações. O açúcar bruto
era despachado para a Europa para ser refinado e comercializado. Com o incremento
da produção, tornou-se mais amplamente comercializado e já não era mais
reservado às classes mais altas.
No século XVII, a maioria dos países
europeus tinha colônias por todo o mundo, onde plantavam cana de açúcar. Um
aspecto degradante da história do açúcar eram os escravos retirados da África e
enviados às colônias, para laborar naquelas tormentosas plantações.
Durante as Guerras Napoleônicas,
Napoleão bloqueou as rotas comerciais oceânicas para impedir que o açúcar fosse
importado por mar. Como conseqüência, os europeus procuraram um substituto da
cana. Eles descobriram que o açúcar poderia ser extraído da beterraba.
Entretanto a beterraba tinha uma concentração muito baixa de açúcar, o que
levou ao aumento do preço do açúcar.
Após aquelas Guerras, a França
retomou o controle das rotas comerciais e a cana de açúcar tornou-se disponível
de novo. A produção do açúcar de beterraba tornou-se redundante. Contudo, as
coisas mudaram novamente quando a escravidão foi abolida, em meados do século
XIX e o trabalho barato desapareceu – causando a subida do preço do açúcar, de
novo. Por essa época, a beterraba foi aperfeiçoada e agora passou a contar com
a mesma concentração de açúcar encontrada na cana. Iniciava-se assim um novo
capítulo completamente novo na história do açúcar na Europa.
Todavia, mais da metade da
produção global de açúcar ainda vem da cana.
Hoje, produz-se mais açúcar no
Brasil que em outro lugar qualquer do mundo, embora, ironicamente, a planta
nunca tenha se desenvolvido muito na América do Sul. A cana de açúcar – nativa do
sudeste asiático – fez sua primeira aparição no Novo Mundo com Cristóvão
Colombo, durante sua viagem em 1492, na República Dominicana, onde ela se
adaptou bem ao clima tropical.
Notando o potencial econômico da
cana de açúcar para as novas colônias americanas – os europeus já consumiam o
açúcar vindo de colônias no Oriente –, colonizadores espanhóis transmudaram
sementes das fazendas de Colombo, na República Dominicana, e as plantaram ao
longo de suas florescentes colônias caribenhas. Em meados do séc. XVI, os
portugueses haviam trazidos algumas para o Brasil e logo a cana de açúcar foi
parar nas colônias britânicas, holandesas e francesas, tais como Barbados e
Haiti.
Não demorou muito, entretanto, até
que os primeiros colonos percebessem que eles não tinham mão de obra suficiente
para plantar, colher e processar a laboriosa cultura.
Os primeiros escravos chegaram em
1505 e continuaram a chegar incessantemente por mais de 300 anos. A maioria
veio da África Ocidental, onde colônias portuguesas já tinham estabelecido
postos comerciais para marfim, pimenta e outros produtos. Para a maioria dos
mercadores portugueses, as pessoas que eles punham em navios cargueiros para
atravessar o Atlântico – uma viagem medonha conhecida como “Passagem do Meio” –
eram meramente um extensão do sistema comercial posto em prática.
A escravidão nas plantações de cana
de açúcar era o componente-chave, que os historiadores denominam de Comércio
Triangular: uma rede, onde escravos eram enviados para trabalhar em plantações
do Novo Mundo, o produto de seu trabalho era enviado a uma capital européia
para ser vendido, enquanto outros produtos eram enviados à África para serem trocados
por mais escravos.
Em meados do século XIX, mais de
10 milhões de africanos foram forçadamente removidos para o Novo Mundo e
distribuídos entre as plantações de açúcar do Brasil e do Caribe.
Durante esses três séculos, o
açúcar era de longe a mais importante das commodities de além-mar, que respondia
por um terço da economia européia inteira. Conforme a tecnologia avançava e se
diversificava, adicionando-se melado e rum aos coprodutos das plantações de
cana, os barões do açúcar de St. Kitts à Jamaica enriqueciam enormemente.
Essas colônias ricas em açúcar,
especialmente aquelas pertencentes a britânicos e franceses, tiveram enorme conseqüência
para o delineamento do mapa das Américas no séc. XVIII.
A GB perdeu suas 13 colônias
americanas, ao se tornarem independentes, em parte, porque suas forças
militares estavam ocupadas protegendo suas ilhas de fazendas de açúcar, dizem
muitos historiadores.
Os escravos empregados em
plantações de açúcar no Sul dos EUA, na África e no Caribe, eram muito mais
numerosos que os seus proprietários europeus. Os fazendeiros britânicos viviam constantemente
com medo de revoltas e demandavam soldados para que os protegessem. Muitas
batalhas decisivas da Revolução Americana teriam tido final distinto caso os
britânicos tivessem enviado sua força total.
Guarnições enormes estavam
estacionadas nas Índias Ocidentais para proteger fazendas de açúcar que os britânicos
tinham abandonado, no fim da Guerra dos Sete Anos, em 1763. Ao dividir as
Américas após o fim dos conflitos, o Rei George III decidiu pela cessão algumas
de suas ilhas caribenhas produtoras de açúcar à França, com o fim de assegurar
um pedaço mais relevante na América do Norte.
Como se pode avaliar essa negociação?
Ao permutar a doce e lucrativa Guadalupe
pelas estéreis e amargas terras do Canadá, somadas a terra a leste do rio Mississipi, muitos
ingleses acharam que o rei fez um mau negócio.
Rubem L. de F. Auto
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