Desde 1503, conforme consta em
carta de Américo Vespúcio a Pietro Soderini, já se falava na existência de ouro
no Brasil. Além dessa passagem, havia uma lenda sobre uma serra toda feita de
prata: Sabarabuçu, na língua indígena.
Ansioso por encontrar tais metais
preciosos, D. Pedro II de Portugal, o pacificador, no final do século XVII,
enviou carta a alguns destemidos bandeirantes para que se lançassem ao interior
do país em busca da tão sonhada fortuna, que salvaria o futuro do Reino.
A partir de São Paulo, em 1674,
Fernão Dias, atendendo ao chamado real, atravessou o Vale do Paraíba e seguiu
pela Serra da Mantiqueira. Após muita labuta, nada encontraram e a esperança de
achá-los também se esvaiu. Uma rebelião tomava corpo entre os membros da
bandeira. O próprio filho de Fernão, José Dias, tomou para si a tarefa de matar
o pai e retornar para casa com os demais.
Contudo, uma índia do grupo soube
dos planos e contou a Fernão. Este não pensou duas vezes e mandou enforcar o
filho, para dar o exemplo. Achou algumas pedras, que julgava serem esmeraldas,
mas eram águas marinhas. Por fim, antes de retornar, pegou uma febre e faleceu
pelo caminho.
A despeito de seu fracasso em
encontrar pedras preciosas, a bandeira de Fernão Dias teve o mérito de ligar a
região de São Paulo ao interior da Bahia. Outro nome marcante do período de
tentativas de descobrir ouro no Brasil foi Raposo Tavares.
Porém, é Antonil que dá melhores
pistas sobre a maneira como foi achado ouro pela primeira vez nas Minas.
Segundo Antonil, uma bandeira saída de São Paulo chegou às margens do rio
Tripuí. Um mulato, com sede, baixou sua gamela e pôs-se a beber água, quando
avistou pequenas pedras escuras no fundo da gamela. Desconfiado a respeito de
tais pedras, vendeu-as a Miguel de Souza. Embora ninguém ainda soubesse do que
se tratava, essas pedras foram parar nas mãos de Artur de Sá e Meneses,
governador do Rio de Janeiro. Este descobriu que se tratava de ouro, escurecido
pelo acúmulo de óxido de ferro na sua superfície.
Finalmente, ouro no Brasil!
Uma expedição, liderada por
Antônio Dias, achou o local onde o mulato havia encontrado as pedras: localizava-se
próximo ao pico Itacolomi. Evidentemente a notícia de tal achado levou a um
afluxo enorme de pessoas de todas as partes em direção à região, inóspita e
selvagem. No seu máximo, a população de Vila Rica chegou a 100.000 pessoas – a maior
cidade brasileira.
A febre do ouro atingiu Portugal
dramaticamente. Durante os 200 anos anteriores, os portugueses, em geral, não
se interessaram por emigrar para o Brasil. Todavia, após as notícias de ouro,
passaram a chegar o Porto do Rio aos milhares. O despovoamento de Portugal
passou a causar tal preocupação que foi baixada uma lei, em 20 de março de
1720, proibindo a saída de portugueses do Reino, com pouquíssimas exceções,
para ocupar cargos públicos na colônia.
Mesmo assim, nos primeiros 60
anos, estima-se em mais de 600.000 o número de reinóis saídos da metrópole em
direção ao Brasil.
A cobiça estrangeira também se
fez presente. Todos sabiam que o ouro saía das Minas e seguia em direção ao
Porto do Rio, em comboios de mulas bastante inseguros. A metrópole simplesmente
ignorava a inexistência de caminhos e estradas interligando as diversas regiões
do Brasil, apesar dos impostos altíssimos. Por volta de 1700, Garcia Rodrigues
Pais, filho de Fernão Dias, usou recursos próprios para abrir o Caminho Novo,
para o Rio de Janeiro, retirando a necessidade de passar pela capitania de São
Paulo.
Em 1710, um pirata francês
mostrou do que a cobiça é capaz. Jean-François Duclerc atracou seis navios na
Baía da Guanabara, tripulados por mil piratas. Ameaçado o saque, a cidade
reagiu como pode. As Fortalezas de São João e de Santa Cruz dispararam tiros de
canhão a esmo, mas conseguiram rechaçar a invasão momentaneamente. As
autoridades portuguesas comemoraram a retirada de Duclerc e seus homens, porém
estes apenas aportaram em torno da região de Guartatiba. Desembarcaram e marcharam
em direção à capital, novamente. São Sebastião do Rio de Janeiro teve suas ruas
invadidas pela retaguarda, de surpresa.
A cidade de 12.000 habitantes se
uniu contra os invasores. Brancos, negros, ricos, pobres, estudantes jesuítas,
armados de pistolas e facas, mulheres com panelas de óleo quente derramados de
suas janelas. Ao cabo, Duclerc foi preso. Após alguns meses, foi assassinado estando
sob custódia do tenente Tomás Gomes da Costa, em sua casa.
No ano seguinte, mais um surpresa
infeliz. Sob o pretexto de vingar o crime de guerra cometido contra Duclerc,
que era inimigo de guerra capturado, portqanto merecedor de tratamento
especial, outro corsário francês, René Guguay-Trouin aportou na Baía. No
entanto agora não eram mais seis, mas dezessete navios. Fundearam e iniciaram o
bombardeamento da cidade. Desta feita foi um ataque indefensável. O governador
Francisco de Castro Morais fugiu da cidade.
Para deixar a cidade, Trouin
exigiu um resgate: doze milhões de cruzados! Quantia impossível de ser
amealhada, os portugueses juntaram tudo o que puderam achar: seiscentos mil
cruzados, cem caixas de açúcar e duzentos bois. O governador acrescentou mais
dez mil cruzados de seu bolso. Trouin aceitou a quantia, mas não sem antes saquear
completamente a cidade, junto com seus homens, de casas particulares a
edifícios públicos, passando por igrejas, nada foi poupado.
Por sua covardia, o governador
foi demitido do cargo.
A exploração do ouro em Minas
podia ocorrer por faiscadores, na beira de rios, ou nas lavras. Em geral, os
mais pobres eram faiscadores e exploravam trabalhavam normalmente sozinhos. As
lavras exigiam investimentos maiores e escravos. O imposto cobrado era o
quinto, que os faiscadores quase nunca pagavam. As lavras eram exploradas sem a
devida comunicação à Coroa, e o sistema de tributação era uma bagunça.
Em 1702 houve a publicação do
primeiro regulamento das Minas e a distribuição das lavras passou a seguir
critérios mais claros. O afluxo de pessoas foi enorme e os problemas do
crescimento passaram a se fazer presentes.
Com a presença de milhares de pessoas
que se dedicavam à extração de ouro em tempo integral, faltavam braços para a
agricultura. Com isso, começou a faltar comida e o preço dos alimentos foi à
estratosfera. Os indivíduos mais abastados conseguiam adquirir alimentos, mas os
mais pobres enfrentaram fomes severas em 1698, 1700 e 1713. Acharam-se pessoas
mortas por fome, mesmo tendo os bolsos repletos de ouro.
Aqueles que não conseguiam
recursos pára voltar para casa, iniciaram o processo de povoamento da região.
No caso de Vila Rica, o arraial tomou impulso entre 1700 e 1705.
Seu crescimento foi muito rápido
e, em 1723, foi elevada a capital da Província. Poucos anos depois era a maior
cidade do Brasil. Os homens mais ricos e os maiores intelectuais fixaram
residência naquela cidade.
Como as primeiras minas de ouro
foram encontradas por bandeirantes paulistas, estes achavam que tinham mais
direitos sobre as lavras de ouro do que as pessoas de outras capitanias. Por
outro lado, os portugueses também alegavam direitos, uma vez que se julgavam
donos da terra. Dado este cenário, as pessoas de outras capitanias ficaram ao
lado dos portugueses. OS paulistas os chamavam pejorativamente de “emboabas”.
Em pouco tempo, os paulistas se
tornaram minoria, haja vista o enorme influxo de pessoas de outros lugares. O
ex-bandeirante Manuel de Borba Gato era o chefe dos paulistas. O fazendeiro
português Manuel Nunes Viana liderava os emboabas.
Em dado momento, pequenos
conflitos descambaram na Guerra dos Emboabas, de 1707 a 1709. Com o tempo, os
emboabas tomaram o controle político e administrativo. Manuel Nunes Viana foi aclamado
governador e primeiro homem a ocupar um cargo público na América do Sul por
vontade popular. Ressalte-se que não havia o desejo de ver um Brasil
independente; tratava-se apenas de afastar os paulistas do poder local.
O ponto alto dessas batalhas
contra os paulistas deu-se no local conhecido por Capão da Traição. Após traição
dos paulistas, que fingiram rendição e atacaram os emboabas, estes se vingaram matando
mais de 300 deles. A final, os paulistas foram expulsos do território mineiro.
Alguns saíram à procura de novas jazidas e as acharam na região de Mato Grosso
e Goiás.
Antevendo mais problemas, a Coroa
agiu preventivamente ao desmembrar, em 1709, a Capitania de São Paulo e Minas
do Ouro da capitania do Rio de Janiero. Mainas do seria definitivamente
desmembrada de São Paulo em 1720.
Um dos grandes problemas da produção
de ouro era a arrecadação, da maneira mais eficiente, dos tributos incidentes –
o Quinto, ou 20% do ouro lavrado. Tais tributos eram escorchantes e bastante
sonegados.
Uma primeira medida foi a criação
das Casas de Fundição, simultaneamente à proibição de se carregar consigo ouro
em pó. Tal medida gerou transtornos, especialmente aos mais pobres, que usavam
pequenas quantidades de ouro em pó como moeda de troca na região das minas. A
Coroa também incentivava a canalhice, ao premiar delatores de quem tivesse ouro
em pó nos bolsos. Houve inúmeras tentativas da Coroa de reduzir a sonegação ao
mudar a maneira de arrecadar o quinto. Estima-se que pelo menos metade desse
tributo era sonegada: cobraram por escravo; ou por trabalhador, escravo ou não.
Tentou-se a quantia anual de 30 arrobas de ouro por ano. Mas nunca a
arrecadação proporcionada gerava contentamento na metrópole. A suspeita de
sonegação de grande monta estava sempre presente.
Um dos motivos para que a
arrecadação tributária sobre as minas nunca satisfizesse foi a assinatura, em
1703, do Tratado de Methuen. Por este, vinhos, azeites e laranjas portugueses
entravam em condições privilegiadas na Inglaterra que, por sua vez, encontrava
condições privilegiadas para suas exportações de tecidos e produtos
industrializados para Portugal. Com isso, as barras de ouro iam direto aos
cofres ingleses, que vestiam e alimentavam a metrópole.
Embora criticadas, as receitas
tributárias portuguesas foram infladas após a criação das Casas de Fundição. De
36 arrobas de ouro em 1724, foram para 133 arrobas no ano seguinte.
Se os mineiros já sofriam
bastante com as medidas portuguesas para inflar sua arrecadação do quinto, esse
cenário pioraria ainda mais após 1750, com a morte de D. João V e a assunção ao
trono de D. José I. Embora bastante incapaz, este se cercou de bons ministros
e, na prática, entregou a administração do reino a Sebastião José de Carvalho,
o Marquês de Pombal.
Embora tenha arrecadado 1.800
quilos de ouro só em 1749, achava pouco. Naquele momento, as Casa de Fundição
haviam sido fechadas e o quinto era cobrado pelo sistema de “capitação”.
Cobravam-se valores proporcionais ao número de trabalhadores da lavra.
Pombal retornou o sistema de Casa
de Fundição, porém acrescentou uma novidade: uma cota mínima de 100 arrobas,
cobrada da capitania. Caso a produção não atingisse esse valor, a Coroa lançava
mão da arrecadação compulsória, que chamava de contribuição coletiva, a derrama”,
cobrada de todos os moradores, mineradores ou não.
Até 1766, essa cota mínima era
atingida ano após ano. Contudo, com o exaurimento dos principais veios, o
tributo foi se acumulando, ao passo que as despesas da metrópole se avolumavam
como decorrência do terremoto de Lisboa, em 1755.
O exaurimento da produção, somado
a tributos cada vez mais sufocantes, à pobreza crescente na região das minas e às
notícias de cobrança da derrama, que prometia empobrecer ainda mais a
população, já em 1788, levaram ao descontentamento e ao ódio contra o Reino,
por parte de muitos.
A se somar ao exposto logo acima:
13 colônias inglesas, revoltadas por tributos crescentes, especialmente sobre o
chá produzido localmente, iniciaram uma Guerra de Independência em 1776, que
terminou em vitória e no reconhecimento da sua independência pela ex-metrópole,
em Tratado assinado em 1785.
Sem dúvidas a independência dos
EUA e as belas palavras escritas na sua Constituição iluminaram as mentes e
deram a inspiração necessária à famosa Inconfidência Mineira.
Rubem L. de F. Auto
Fonte:
Livro “1789 – A Inconfidência
Mineira e a Vida Cotidiana nas Minas do século XVIII.”
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