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segunda-feira, 2 de outubro de 2017

NOBREZA: LUXO, ÓCIO E SACANAGEM


A entrada em cana dos reinos absolutistas marcou o fim da soberania que os nobres tinham sobre seus feudos. Tornaram-se vassalos, isto é, ocupantes de posições de confiança do rei. Ganharam cargos e privilégios: altas posições no Exército e na Igreja.

Sem poderes ilimitados em suas terras, restava aos nobres bajular o rei e esperar que caísse algumas migalhas em seus bolsos. Assim, criou-se uma espécie de competição entre os nobres pela atenção e, por conseguinte, pelos favores do Rei.

Nessa toada, não faltavam oportunidades para que o nobre exercício da bajulação ocorresse. No palácio de Versalhes, peças de teatro, óperas e balés faziam sua estréia antes de irem ao circuito de Paris. Três vezes por semana o rei promovia noites de diversão: no Salão de Vênus, oferecia um enorme bufê; no Salão de Diana, jogava-se bilhar; no Salão de Apolo, o móvel era a música; no Salão de Mercúrio, os jogos eram o tema; o Salão de Marte recebia os amantes da dança.

Outra oportunidade muito concorrida de bajular Vossa Alteza ocorria diariamente: tanto seu adormecer quanto no seu despertar eram cerimônias públicas, quando interessados podia para lá acorrer. Aliás, o despertar era dividido em duas partes: o petit lever e o grand lever. As refeições também eram cerimoniosas: havia o petit couvert e o grand couvert.

Em todos esses momentos, reis que se fizeram sinônimo de absolutismo, como o monumental Luís XIV, deveriam olhar para os lados e ver pessoas que não gostariam de ser esquecidas por ele. Espiões a seu serviço se encarregavam de informar nomes de quem viesse a fazer algum comentário desagradável sobre Sua Majestade.

As regras de convivência social se tornaram complexas e passaram a ocorrer em grande parte dentro de salões. Esse foi o momento em que as mulheres finalmente saíram de casa. Agora deveriam ser vistas, e essa regra não servia apenas para as cortesãs. Nessa sociedade já bem menos cristã do que as anteriores, às mulheres não bastava se comportarem como se santas fossem: agora elas deveriam amáveis e graciosas no trato pessoal; deveriam conhecer bem as regras de etiqueta à mesa; deveriam saber usar o tom de voz mais adequado a cada ocasião; deveriam conhecer razoavelmente sobre artes (mas sem ser pedantes, claro); era recomendável saber usar frases espirituosas, de fino humor, mas sem despertar polêmicas; apreciavam-se aquelas que declamassem poemas ou prosassem divertidas histórias; saber servir convidados e ser cortês com os mesmos conquistava admiradores, também.

Esse tipo de sociedade abriu guerra contra o fedor. A dama francesa poderia gastar até seis horas preparando sua beleza: envolta por criadas, claro, que permaneciam bastante ocupadas. Esse período viu o fornecimento de água em Paris esmaecer, o que forçou os hábitos de higiene a não usarem água: toalhas e pós ocuparam seu lugar. O cabelo era limpo com pó de arroz. O corpo era limpo com toalhas perfumadas, que se passavam pelo rosto, torso e axilas.

As maquiagens das mulheres eram tão carregadas que elas criavam personagens para desfilar pelos salões à noite. Perfumes e incensos revelavam o estrato social que o indivíduo ocupava. Essências de violeta, rosa, íris, almíscar e âmbar eram disputadas.

Já o trabalho, na corte, era sinônimo de sofrimento e de vergonha. O ócio e a falta de utilidade eram aquilo que trazia admiração, de fato.

Em Versalhes residiam mais de 10 mil pessoas, que acompanhavam a Corte como se espetáculo fosse. A burguesia poderia ter acesso àqueles fatos pela imprensa; mas só os nobres os presenciavam.
Se ver o rei era um privilégio, que dirá de se deitar com ele? Luís XIV era casado com Maria Teresa, mas teve diversas amantes. A duquesa de La Valliére, foi uma delas. A casa de caça em que se encontravam para seus momentos reservados, após diversas reformas, tornou-se Versalhes. A amante-real seguinte foi madame de Montespan. Ao mesmo tempo, Luís começou a trocar afagos com a viúva Scarron. Algum tempo depois, entrou em cena Marie Angélique de Acorailles, de apenas 18 anos – faleceu após engravidar do rei.   

A amante oficial era intitulada maîtresse-em-titre: recebia pensões e o cargo de conselheira íntima do rei.
 La Montespan caiu em desgraça após ser acusada de orquestrar o “Caso dos Venenos”: uma série de mortes por envenenamentos, ocorridas na Corte. Não foi condenada, mas teve de se manter distante do rei.
O resultado das aventuras amorosas de Luís XIV foi o seguinte: teve uma filha com La Villiére, dois filhos e duas filhas com La Montespan; um filho com a rainha. Não se contabilizam aqui os filhos bastardos.

Os inimigos do rei gostavam de repetir: “Foges da guerra, mas persegues as belas”. Diversas obras exploravam esse lado obscuro de Sua Majestade.

O reinado do Rei Sol marcou uma revolução na imagem da França em todo o mundo: o francês era agora uma língua diplomática importante; cozinheiros franceses eram muito respeitados; móveis franceses eram os mais desejados; tapeçarias, jóias, vestidos, penteados, tudo vindo “de França” era tido como o melhor, mais nobre.

Paris era um centro de estudos importante, para onde acorriam membros da elite dirigente e econômica de todo o mundo. A Academia de Belas Artes francesa serviu como modelo a todas que surgiram posteriormente.


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “Luxúria: como ela mudou a história do mundo”

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