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quinta-feira, 26 de outubro de 2017

COMPARTILHAR NAS REDES: A NOVA DROGA DO SÉCULO XXI


Seja no cinema, seja na fila do supermercado, na selfie que o destraiu quando seu time fez um gol, não importa onde. Tirar o celular, apontar para o seu rosto ou para algo que você quer que todos os seus contatos vejam também e postar se tornaram ações diárias, hábitos incrustados no cotidiano.

O desenvolvedor de softwares Dana Hanna tirou o celular do próprio bolso logo após o “sim” da noiva e fez o selfie no próprio casamento. Quando o juiz de paz disse que já podia beijar a noiva, postou a foto e atualizou o status para “casado”. Foi uma brincadeira mas representa bem os novos tempos.

Mas como se chegou a essa compulsão coletiva? Primeiramente é necessário dizer que toda a polêmica que gira em torno da rede social não é inédita. Televisão, telefone, rádio tudo já teve seu momento de “capeta disfarçado”, atentando o juízo da humanidade.

Em segundo lugar: dopamina. Neurotransmissor fundamental para o funcionamento do cérebro, a dopamina cria a felicidade e a tristeza. A sensação de recompensa que ela cria transforma nossos hábitos.

E nossa sobrevivência se deve a ela: sexo, comer nos causam prazer porque a dopamina assim definiu, e é por isso que repetimos essas ações. Além disso, a dopamina age com mais eficácia quando há o elemento da incerteza. A curiosidade a respeito de qual será o próximo post a surgir na timeline, ou qual foto nosso contato postará cria ainda mais sensação de prazer.

Essa compulsão aqui descrita é a mesma causada pelo uso de drogas: ao satisfazer o desejo, a satisfação se esvai – como quando você curte uma notícia, sem nem mesmo abrir o link. Aquela vontade de trocar o canal incessantemente quando tira o controle da TV da mão de outra pessoa, também denuncia a mesma compulsão: trocar o canal traz a sensação de quando se vê um novo post surgindo.

Perceba: não é o ato de ler o post que agita descarrega dopamina na corrente sanguínea; é o ato de compartilhar, opiniões ou fotos ou qualquer outra coisa.

Mas o prazer inerente ao ato de compartilhar não é novidade na nossa espécie. Um estudo de Harvard – lembrei do Jô Soares J - concluiu que 40% de tudo o que falamos tem como objetivo informar aos outros sobre nós mesmos. Cerca de 80% do que se publica nas redes sociais também tem esse mesmo fim. É o narcótico dos usuários das redes sociais.

Aliás, o jornalista Bem Dreyfuss publicou uma matéria na revista Wired comparando cada rede social com uma droga, em razão de seus efeitos: o Facebook é o álcool, a droga que todos usam; o Twitter é o cigarro, causa sensações não agradáveis no começo, mas depois o corpo se acostuma e pede mais; o Youtube é a maconha, porque é difícil até de se classificá-lo como rede social (assim como é difícil de classificar a maconha como uma droga).     

Então, fisicamente, quando compartilhamos nas redes ativamos o sistema límbico, região cerebral associada à recompensa e onde age a dopamina. Tem-se a mesma sensação de quando olhamos aquela picanha na brasa, ou quando nos deitamos com aquela pessoa desejada.

E mais: quando falamos de nós mesmos, a sensação de recompensa se torna mais intensa. Este fato demonstra o grau de narcisismo que acomete as pessoas, em geral – coisas da nossa espécie.

Mas dar conta dos eventuais interessados pode afogá-lo em comentários, sem que possa dar a devida atenção a cada um deles. Em média, cada usuário do Facebook tem 338 “amigos”. Pois bem, nosso cérebro consegue dar conta de no máximo 150 relacionamentos (pode variar um pouco de pessoa para pessoa), em razão de limitações no neocórtex cerebral. Um estudo apontou que uma empresa sofre de quedas de produtividade quando ultrapassa 150 empregados – a partir daí tem que dividir em subgrupos. Um diretor-executivo pode lidar com no máximo 150 chefes de equipe.  

Bom, então a solução é sair da rede que, conforme estudos realizados, aflige 40% dos usuários com experiências negativas freqüentemente? Não exatamente.

A Crise de 2008 afetou a Islândia como a poucos países do mundo. Eles perderam quase todos os recursos financeiros nacionais, os maiores bancos faliram e a moeda local se desvalorizou em mais de 80%. A Dívida Pública atingiu impensáveis 900% do PIB. Reformas políticas se faziam prementes e a plataforma usada para reunir sugestões e contribuições foi justamente o Facebook. A nova Constituição islandesa é considerada a primeira experiência de crowd funding do mundo.

Além do mais, o temor em relação ao desconhecido e, especialmente, ao incontrolável não é novidade. A televisão foi acusada de promover o escapismo da realidade em massa; assim como a internet é acusada de promover a alienação das pessoas de suas vidas sociais normais; o telefone foi acusado de tornar as felicitações de aniversários mais frias, como ocorre com as mensagens enviadas por meio de aplicativos de bate-papo.

Enfim: no fundo no fundo, tudo como dantes no reino de Abrantes...    


Rubem L. de F. Auto

Fonte: livro “Inveja: Como ela mudou a história do mundo” 


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