O ambiente intelectual e boêmio fascinante de Berlim no
entreguerras produziu feitos notáveis: o expressionismo alemão no cinema,
Bertold Brecht no teatro, a escola de arquitetura Bauhaus, o método educacional
inovador Waldorf.
Mas agora o fim se avizinhava. Se em meados da década de
1920 os empréstimos americanos tiraram a economia alemã do fundo do poço, agora
o crash de 1929 fazia a fonte de recursos secar. OS desempregados que somavam
350 mil em 1930, em 1932 chegavam a 650 mil.
A crise econômica agora levava o centro do espectro político
a abraçar a extrema-direita e seu principal líder: Adolf Hitler. Aquele que era
chamado jocosamente de “cabo agitador” pelo presidente Paul Von Hindenburg, em
1933 venceu a eleição para chanceler. Declarou-se abertamente guerra a qualquer
coisa que pudesse ser chamada de vanguardista.
A ferramenta usada por Hitler para conquistar tamanha vitória
foi a mais simples possível: o medo. O líder do partido nacional-socialista
inculcava o medo dos comunistas, dizendo que eles iriam destruir os valores
tradicionais: família, propriedade e nação. Semeava o ódio aos judeus usando a
imagem de judeus odiados naqueles dias: financistas, empresários, líderes
comunistas, intelectuais e artistas “degenerados” (nome que usava para artes de
vanguarda).
Pequenos comerciantes, empregados públicos, agricultores e
toda uma multidão de recentes desempregados abraçaram o discurso do ódio e do medo.
No que se refere à libertação sexual, o nazismo pôs uma pá
de cal sobre as aspirações de toda uma geração. Agora a mulher voltava ao
trinômio conservador alemão “Kinder, Kuche, Kirche” – filhos, cozinha e igreja.
Segundo o ideário nazista, às mulheres eram proibidos pintar
o cabelo, usar cosméticos: era obra de comerciantes judeus que desejavam
vulgarizar a pureza das alemãs, transformando-as em prostitutas.
Em 1933, Hitler fez passar a “Lei de Incentivo ao Casamento”,
pela qual forneciam-se empréstimos aos recém-casados. Se houvesse filhos, os
valores eram incrementados. Obviamente os casamentos não poderiam ser
miscigenados e as crianças deveriam ser “arianos” saudáveis. Se a mulher
gerasse um quarto filho, o casal estava liberado das dívidas. Se desse à luz oito
filhos, recebia uma medalha de ouro.
Mulheres solteiras – e arianas, claro - eram incentivadas a ter
filhos de membros arianos puros da SS: elas fariam parte imediatamente de uma “elite”
racial nacional. Os atestados de pureza racial deveriam regredir a, pelo menos,
1750. As habilidades mais cobradas das jovens recém-casadas eram habilidades
domésticas e instinto maternal. Apesar das regras restritas, mais de 240 mil
alemãs foram aceitas como “reprodutoras de arianos” de membros da SS.
Controles de natalidade e clínicas de planejamento familiar
foram considerados ilegais. Mulheres judias, prostitutas, ciganas e portadoras
de doenças genéticas (incluindo alccolismo e depressão) foram esterilizadas.
Algum resultado surtiu efeito: em 1935 o número de
nascimentos chegou a 1,26 milhão, contra cerca de 900 mil em 1933. A profissão
feminina mais comemorada era a de parteira e a emancipação feminina se tornou ideia
subversiva.
Em 1938 já não havia mais parlamentares alemães no
Reichstag. Contudo, o sucesso inicial das blitzkrieg levou à expansão do
território, o que abriu espaço para as leais arianas em escolas, hospitais e
nos escritórios do Partido. E assim as alemães se tornaram responsáveis por
inculcar aquele ideário asqueroso na cabeça dos futuros cidadãos.
No que se refere às práticas sexuais, valia o mais profundo
conservadorismo à São Paulo: sexo, só para reprodução. Em 1936, o
orgulhosamente homofóbico Heinrich Himmler fundou o Escritório Central do
Combate À Homossexualidade e ao Aborto. Iniciava-se uma ofensiva contra os gays
e transexuais. O Instituto de Pesquisa da Sexualidade foi atacado pelo bando da
Juventude Nazista. O campo de concentração de Fuhlsbuttel pasosu a se
especializar na recepção de presos homossexuais: pintavam a letra A neles; mas
depois passaram a desenha um triângulo rosa. Com isso, supõe-se que entre 5 e 15
mil homossexuais foram para lá levados para serem “curados”.
A “cura gay” nazista se iniciava com sessões de
estuproterapia, no caso dos homens, ocorridas num galpão transformado em bordel;
as mulheres eram obrigadas a se prostituírem. Experimentos com hormônios e
cirurgias também eram aplicados. Não foram raros os casos de mortes violentas,
praticadas por soldados.
E assim a humanidade teria de aguardar pelo fim do segundo grande
conflito para poder respirar novamente ares mais liberais.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Luxúria: como ela mudou a história do mundo”
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