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terça-feira, 18 de abril de 2017

TEATRO DOS VAMPIROS – A SOLIDÃO SEGUNDO A LEGIÃO


Sempre precisei de um pouco de atenção
Acho que não sei quem sou
Só sei do que não gosto
E destes dias tão estranhos
Fica a poeira se escondendo pelos cantos

É um fato e é bastante fácil de perceber: quanto mais populosas se tornam as cidades, conforme mais pessoas nos cercam, mais sozinhos, solitários nos sentimos. A vida em comunidades com número reduzido de pessoas costuma dedicar mais atenção e cuidados ao indivíduo.
Os segundo e terceiro versos falam de algo bem comum: pessoas que se definem por meio de negação. Não consegue explicar quem é, sabe apenas enumerar aquilo que a desagrada.
Os dois últimos versos lembram apenas tédio e solidão, claramente o tema por trás da primeira estrofe.

Esse é o nosso mundo
O que é demais nunca é o bastante
E a primeira vez é sempre a última chance
Ninguém vê onde chegamos:
Os assassinos estão livres, nós não estamos

Os dois primeiros versos da estrofe acima falam de uma constatação simples e moderna: quando a vida se torna vazia, as pessoas tendem a acumular bens, buscando preencher aquele vazio. Rapidamente ela percebe que poucas coisas são capazes de suprimir o vazio d`alma... e nenhuma delas se relaciona a bens.
O terceiro verso também traz um ensinamento para nosso cotidiano: a vida nos permite apenas uma chance de abraçar uma oportunidade. Não a desperdice.
Os dois versos que fecham a estrofe fazem clara menção à violência urbana. Seria ela resultado dos tantos vazios apontados anteriormente?
Ou seria um protesto contra um eventual cerceamento de uma relação homossexual? Afinal, Renato era assumidamente gay, e a letra deixa transparecer, mais à frente, que existe um romance entre dois homens. Estariam pessoas contra esse relacionamento livres, enquanto os verdadeiros apaixonados se viam presos em sua sexualidade?

Vamos sair, mas não temos mais dinheiro
Os meus amigos todos estão procurando emprego
Voltamos a viver como há dez anos atrás
E a cada hora que passa
Envelhecemos dez semanas

Vazio interior, violência que o cidadão presidiário em seu imóvel. Bom, pelo menos podemos encontrar os amigos e desabafas com alguém que nos compreende, certo? Errado. Crise econômica, inflação galopante (lembre-se, essa letra vem de anos bastante tumultuados.
A situação financeira regrediu aos anos de adolescência: sem dinheiro para nada. Mas, quando isso ocorre na idade adulta, o efeito psicológico é semelhante a um envelhecimento acelerado. Não se trata de amadurecer, mas de desenvolver uma personalidade repleta de rusgas e mal humor: é quase uma dose cavalar de depressão direto na corrrente sanguínea.

Vamos lá, tudo bem - eu só quero me divertir
Esquecer dessa noite, ter um lugar legal pra ir
Já entregamos o alvo e a artilharia
Comparamos nossas vidas
E esperamos que um dia
Nossas vidas possam se encontrar

A estrofe acima começa procurando achar ânimo e atitude: apesar de tudo, vou em frente. Não demonstrar querer entender ou resolver problemas, mas esquecer por um momento que eles existem.
O terceiro verso aponta para uma rendição frente aos problemas, que se avolumam, mas está fora de nosso alcance resolvê-los. A mensagem é clara: desisto de lutar pelo que desejo e aceito de bom grado qualquer coisa que vier.
Conversar, explicar o que aconteceu desde o último encontro, expor desejos e planos... comparando vidas que se distanciaram, por um motivo ou outro. Seria esse distanciamento o motivo do vazio existencial do primeiro verso? Seria esse amigo aquele cujas dificuldades da vida o fizeram dez anos mais velho do que a passagem natural do tempo o faria?  

Quando me vi tendo de viver
Comigo apenas e com o mundo
Você me veio como um sonho bom
E me assustei
Não sou perfeito

O início da vida adulta é sempre marcante e amedrontador: escolhas definitivas de coisas que muito pouco entendemos, a escolha da carreira que o definirá profissionalmente pelos próximos 30 ou 35 anos, muitas coisas se somam em um curtíssimo espaço de tempo.
O que ajudou o autor a levar adiante essa montanha de problemas e desafios? Claramente ele fala do amor por alguém, certamente referência às estrofes anteriores.
Mas os versos finais falam da insegurança do relacionamento, do medo de decepcionar quem se ama.  

Eu não esqueço
A riqueza que nós temos
Ninguém consegue perceber
E de pensar nisso tudo, eu, homem feito
Tive medo e não consegui dormir

Apesar dos defeitos, que todos temos e conhecemos melhor do que ninguém, também temos qualidades, que somente quem nos conhece muito bem pode notá-las.
Mesmo com o passar dos anos e, claro, da idade, pensar no amor da juventude causa calafrios.

Vamos sair, mas não temos mais dinheiro
Os meus amigos todos estão procurando emprego
Voltamos a viver como há dez anos atrás
E a cada hora que passa
Envelhecemos dez semanas

Vamos lá, tudo bem - eu só quero me divertir
Esquecer, dessa noite ter um lugar legal pra ir
Já entregamos o alvo e a artilharia
Comparamos nossas vidas
E mesmo assim não tenho pena de ninguém



Rubem L. de F. Auto

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