A
refavela
Revela aquela
Que desce o morro e vem transar
O ambiente
Efervescente
De uma cidade a cintilar
Revela aquela
Que desce o morro e vem transar
O ambiente
Efervescente
De uma cidade a cintilar
Nada mais natural que
começar a letra descrevendo aquilo que se deseja analisar. Infelizmente o Gil
cita uam constatação triste: da favela saem grande parte das garotas de
programa das nossas cidades. Pobreza e preconceitos mil relegam as negras e
mulatas à triste realidade da prostituição.
Mas existem os
contrapontos, citados ao longo da letra. As favelas também foram berço de
diversos estilos musicais e de diversões: samba, bailes dos anos 1970, funk
carioca, rap paulista etc.
A refavela
Revela o salto
Que o preto pobre tenta dar
Quando se arranca
Do seu barraco
Prum bloco do BNH
A refavela
Revela o salto
Que o preto pobre tenta dar
Quando se arranca
Do seu barraco
Prum bloco do BNH
As construções voltadas para as pessoas de
baixa renda, como os conjuntos financiados pelo Banco Nacional da Habitação, ou
BNH, nos anos 1970 e 1980, antepassado do “Minha Casa, Minha Vida” e abortado
pela escalada incontrolada da inflação, dava oportunidade de moradores de zonas
irregulares adquirirem seu sonhado lar. Certamente apenas os mais bem
empregados teriam essa oportunidade, revelando assim os casos de sucesso locais.
Deixar a favela para trás é, certamente, o
sonho de muitos.
E não se pense que isso é traição: morar num
barraco dependurado numa encosta é necessidade, não projeto de vida.
A refavela, a refavela, ó
Como é tão bela, como é tão bela, ó
A refavela, a refavela, ó
Como é tão bela, como é tão bela, ó
Mas é impossível desconectar
o ambiente das pessoas lá inserida. Sim, o lugar pode ser asqueroso, mas as
pessoas, não.
A refavela
Revela a escola
De samba paradoxal
Brasileirinho
Pelo sotaque
Mas de língua internacional
Brasileirinho
Pelo sotaque
Mas de língua internacional
Aqui nessa estrofe, Gil se refere a um dos produtos mais
celebrados das favelas: o samba. O sucesso internacional e as dimensões que
esse estilo musical, somado à festa anual que comemora, é, ao lado de grandes
jogadores de futebol, uma prova viva da capacidade criativa de pessoas nascidas
nas condições mais adversas imagináveis.
A refavela
Revela o passo
Com que caminha a geração
Do black jovem
Do black-Rio
Da nova dança no salão
A refavela
Revela o passo
Com que caminha a geração
Do black jovem
Do black-Rio
Da nova dança no salão
Nessa estrofe, Gil fala da juventude, em geral mais permeável a
novidades. São os jovens que disseminam as criações culturais saídas das
favelas.
Decadas atrás ocorreu com sambistas como Bezerra da Silva, que cantava
o samba-marginal, cujas letras descreviam crimes e contravenções com bastante
humor. Moradores de bairros afluentes, em geral jovens, passaram a ter contato
com aquela cultura marginalizada, e isso abriu portas e mudou o modo como aquela
geração encarava o samba e, consequentemente, as favelas.
As gerações mais recentes viveram o mesmo com o funk.
Iaiá, kiriê
Kiriê, iaiá
É música, né... J
A refavela
Revela o choque
Entre a favela-inferno e o céu
Baby-blue-rock
Sobre a cabeça
De um povo-chocolate-e-mel
A letra fala de oposições, paradoxos. Novamente
o tema retorna nos três primeiros versos.
Não custa lembrar, como se faz referência, que
blues e rock são subprodutos do jazz, estilo musical norte-americano e
originalmente negra.
A refavela
Revela o sonho
De minha alma, meu coração
De minha gente
Minha semente
Preta Maria, Zé, João
Revela o sonho
De minha alma, meu coração
De minha gente
Minha semente
Preta Maria, Zé, João
Como já havia sido falado anteriormente nessa música, a favela
revela pessoas, com seus sonhos, paixões, amores. Pessoas comuns,
brasileirinhos como a Maria, o Zé, o João etc.
A refavela, a refavela, ó
Como é tão bela, como é tão bela, ó
De novo, é uma música... J
A refavela
Alegoria
Elegia, alegria e dor
Rico brinquedo
De samba-enredo
Sobre medo, segredo e amor
Nessa estrofe Gil se concentra sobre o samba-enredo, mote dos
desfiles de escolas de samba. São muitos os sambas-enredo que falam das
favelas, da escravidão, de navios negreiros etc. Citações claras a um passado
terrível que ainda aflige pessoas de pele negra, ampla maioria nas favelas.
A refavela
Batuque puro
De samba duro de marfim
Marfim da costa
De uma Nigéria
Miséria, roupa de cetim
Bom, os dois primeiros versos se referem ao batuque nascido nas
favelas. O terceiro mistura referências ao samba e à África. Na sequência, a
referência fica mais clara: Costa do Marfim, região próxima à Fortaleza de onde
saiam os escravos.
Iaiá, kiriê
Kiriê, iáiá.
Fim.
RUBEM L. DE F. AUTO
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