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terça-feira, 4 de abril de 2017

GOLPE DE 1964: REVOLUÇÃO, CONFUSÃO E REPRESSÃO

No seu discurso de posse, Costa e Silva prometeu quase tudo que sabia ser impossível cumprir – democracia, estabilidade jurídica e reformas – e finalizou com uma frase a um só tempo abstrata e de cunho fascista: “A meta do meu governo é o homem”. Quase uma referência implícita ao “homem soviético” ou ao “homem ariano”.

O novo Ministro da Fazenda, Delfim Neto, enfatizava aquilo que considerava relevante para a retomada da economia: queda dos juros, redução de tarifas, ampliação do crédito, incentivo aos investimentos e Às exportações.

O resultado positivo começou a despontar em 1967: crescimento de 4,8%. Em 1968, o dobro: 9,3%., assim distribuídos: indústrias 15,5%, construção civil 17%.

Essa retomada teve alguns fatores impulsionadores. A ociosidade do parque industrial, a demanda reprimida e contas públicas menos endividadas, resultantes dos anos anteriores de medidas recessivas, ajudaram; assim como um cenário externo, que viveu anos de bonança entre 1967 e 1973 (crescimento médio de 18% ao ano), que garantiram a demanda externa alentadora.

Mas essa recuperação não garantiu dias menos conturbados ao novo governo. Dissidentes do movimento golpista passaram a protagonizar movimentos de oposição. Formou-se a Frente Ampla, composta por Carlos Lacerda, João Goulart e Juscelino Kubitscheck, ainda em 1967.

Havia também uma oposição liberal, composta por grandes jornais (Jornal do Brasil e Estado de SP). Ao seu lado, setores da Igreja Católica igualmente dissidentes, que denunciavam a política econômica concentradora de renda e protegiam perseguidos políticos.

Foram os anos em que floresceram as músicas de protesto: Geral Vandré, Chico Buarque, Caetano Veloso e muitos outros. Dentro dos círculos intelectualizados, também vicejavam manifestações em oposição.
Mas não uma única posição. Havia também a Jovem Guarda (Roberto e Erasmo Carlos, dentre outros), que fazia grande sucesso e demonstrava qualquer posicionamento político, nem a favor nem contra.
No cinema, filmes “politizados”, como os de Glauber Rocha e Rui Guerra, empolgavam o público mais “engajado”, embora os filmes mais que mais populares fosse os de Roberto Farias e José Mojica, o Zé do Caixão.

Mas para as massas, o grande público, sem dinheiro para freqüentar cinemas, teatros ou comprar bons livros, o programa diários eram as novelas, programas de humor, todos devidamente domados pela censura prévia.

Inicialmente, a oposição a Costa e Silva era encarnada pelos movimentos estudantis. Culminaram com a Passeata dos Cem Mil, no Rio de Janeiro. A repressão policial desmesurada e desproporcional se fez presente, mas não impediu que estudantes secundaristas, escritores, cineastas e outros se unissem a eles.
O capítulo da lutas democráticas viria o surgimento das lutas armadas. Ainda em 1965, o ten. cel. Jeferson Cardim tentou constituir uma coluna saindo do Sul do país. Em 1966, a Serra do Caparaó sofreu uma invasão militar que desmantelou o grupo guerrilheiro que lá se abrigava.

A sociedade assistia espantada ao desenrolar dessas ações.

A reação do governo Costa e Silva foi explosiva. Ainda no segundo semestre de 1968, os movimentos estudantis perderam força. A repressão dava sinais de que vaia tudo, vida ou morte estavam em jogo, e a grande maioria não estava disposta a atuar nesses extremos.

O capítulo final das lutas estudantis se deu quando as principais lideranças foram presas em Ibiúna, por ocasião do XXX Congresso da UNE.

Em abril de 1968, a tal Frente Ampla foi tornada ilegal. As principais lideranças liberais ficaram sem um grupo político que os representassem. Restava apenas o MDB, que se tornava um balaio de gato, um partido que abrigava um espectro exageradamente amplo de posições políticas.

No meio de todo esse redemoinho, um fato que poderia ser considerado insignificante a princípio elevou o regime ditatorial a um novo patamar, frente ao qual o ambiente de 1964 seria uma quase-democracia. Após um discurso veemente contra as Forças Armadas, proferido pelo deputado Márcio Moreira Alves, a base do governo exigiu a abertura de uma CPI que punisse o parlamentar rebelde. O Congresso se recusou a processá-lo. Em retaliação, Costa e Silva decretou o AI-5, em dezembro de 1968.

A partir de então o Congresso foi fechado e o presidente passou a deter em suas mãos todo o poder da nação.

Na opinião de muitos analistas, ocorreu então o golpe dentro do golpe.


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedades”

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