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sexta-feira, 7 de abril de 2017

FILIPE II, DE ESPANHA: A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO PODER


Rei Filipe II da Espanha, conhecido como Filipe, o Prudente, governou o maior império do mundo durante a Era dos Descobrimentos. Ele controlou a Espanha  desde 1556 e Portugal, desde 1581, até sua morte, em 1598.

Enquanto consorte de Maria I, foi também rei da Inglaterra e da Irlanda. O Império espanhol governava as 17 Províncias da Holanda, a maior parte da América do Sul, toda a América Central e Texas, as Filipinas e partes da costa africana. Seu reinado inaugurou os Anos Dourados da Espanha, um período de florescimento artístico, musical e literário. Até o Brasil foi colônia do Império filipino quando da União Ibérica.

Embora vendo derrotada sua Invencível Armada em 1588, Filipe manteve unido um império global por meio de sua habilidade administrativa, numa época em que viagens lentas tornava tal tarefa quase impraticável.

Ele controlou a Espanha e suas colônias por 55 anos, iniciando em 1543 com sua nomeação à regência por seu pai, o Sacro Imperador Romano Carlos V. Carlos controlou a Alemanha, partes da Itália, Espanha e Bélgica, além da maior parte do novo mundo. Seu princípio de governo estava assentado na “defesa do Império, na disseminação da Fé Sagrada em Jesus Cristo, e na busca da segurança das pessoas e da paz.”

O Império global de Filipe não tinha cultura, moeda ou língua comuns. Era um retalho de instituições políticas e de leis. Filipe equilibrava os pratos rodopiando sobre sua cabeça por meio da mais avançada máquina burocrática da história moderna. Seu reinado foi mais um capítulo da longa marcha da Espanha em direção a uma Estado moderno, iniciado por seu bisavôs Fernando e Isabel. Dentre suas medidas mais importantes, Isabel eliminou toda uma categoria de conselheiros reais, nomeados em função de boas conexões com os monarcas. Dessa forma, ela fortaleceu o corpo de administradores profissionais, nobres e bispos, que desempenhavam tarefas judiciais e burocráticas.

Esse modelo despersonalizado de governança dominou a Europa pelos séculos seguintes, e permitiu um certo nível de automatismo. Caso a família real perdesse o controle do trono ou se a rainha não tivesse filhos, o Estado não desmoronaria.

A despeito de ter vestido o manto de protetor da fé católica ainda em tenra idade, Filipe tinha uma relação conflituosa com a hierarquia da Igreja. Em 1556, ele chegou a declarar guerra contra os estados papais e temporariamente ocupou seus territórios, provavelmente em retaliação ao Papa anti-Espanha de então.

Quando os nobres ensaiaram movimentos rebeldes em direção a Filipe, este respondeu criando o Conselho de Estado. Idealmente criado para auxiliar no governo, de fato Filipe não os ouvia. Desejava apenas que tais nobres cressem ter algum tipo de poder. O poder de governar e aconselhar estava nas mãos de advogados com treinamento para tanto.

Parte relevante da administração dos potentados espanhóis estava em mãos de Vice-Reis. Filipe delegava a eles instruções claras relacionadas à administração, justiça e rendas patrimoniais da Coroa e do Tesouro. Alguns locais contavam com Conselhos, igualmente responsáveis pela administração local. Esse Conselho era o único encarregado de assuntos relacionados à guerra. Foram exemplos: Conselho da Itália e Conselho da Índia.

Havia 10 “Audiencias”, ou corpos administrativos e judiciais. Todo esse aparato era o que garantia respostas estatais rápidas, numa época em que os deslocamentos eram lentos e precários – uma viagem entre Madri e as Américas durava seis semanas, em média.

Deve-se notar que Filipe foi capaz de desenvolver um sistema de entrega de correspondências por courier que permitia cobrir 185 quilômetros por dia. Melhor do que qualquer de seus concorrentes.

Ainda assim o volume de trabalho era abissal. Filipe redigia mais de 1.600 cartas por mês para se inteirar dos problemas nos seus domínios. Para auxiliá-lo, Filipe convocava pessoas de sua confiança. Uma das mais memoráveis dói o Cardeal Diego de Espinosa, que atuava como uma espécie de alter ego de Filipe. Foi este Cardeal quem deu ordens brilhantes à marinha, que permitiu a derrota dos Otomanos na Batalha de Lepanto, após longas 5 horas de intenso conflito.

Filipe se destacava também por ser um soberano que punha os pés em seus domínios e possessões. Conheceu diversas pessoalmente. Era o mais bem informado dos soberanos da época.

Seus súditos eram bastante obedientes ao rei, parte em razão de crerem que seu poder se assentava sobre dispositivos constitucionais, não apenas no seu “sangue azul”. E estavam corretos. Por diversas vezes se recusava a assinar ordens que pudessem infringir costumes locais.

Filipe conseguiu adquirir a confiança dos súditos. Viajava geralmente desarmado – apesar de ter sofrido sete tentativas de assassinato. Trabalhava em seu gabinete de portas abertas e fazia genuflexão quando passava um cortejo religioso pelas ruas, como qualquer cidadão.

Filipe se orgulhava em dizer: “O medo é para os tiranos: eu sempre me conduzi assim, por Deus, depositei minhas maiores forças e proteção pessoal nos corações leais e na boa vontade de meus súditos.”

Seus maiores adversários foram Inglaterra, França e Império Otomano – controlavam o Mediterrâneo, Península Balcânica, Ásia menor, Egito e costa norte da África.

Filipe tentou tomar controle sobre a Inglaterra por meio do matrimônio. Primeiro, tentou se casar com a Rainha Maria I, em 1554, mas ela morreu dois anos depois. Após, passou-se a cortejar Elizabeth I, mas encontrou um ser humano com uma força de vontade igual à sua, profundamente devota do protestantismo, tanto quanto Filipe o era em relação ao catolicismo, além de ser uma orgulhosa soberana, ainda que bastante jovem.

Em represália, Elizabeth encorajou as revoltas que grassaram pelos Países Baixos, que causou grandes transtornos ao império de seu pretendente.

Então Filipe apoiou a causa de Maria, rainha da Escócia, mas Elizabeth assinou a ordem para sua execução, pondo fim à possibilidade de insurgência católica contra a Dinastia Tudor – fundadora da Igreja Anglicana. Coma  derrota da Armada espanhola em 1588, corsários ingleses poderiam pilhar colônias da Espanha e até a costa da Espanha.

Filipe era tenaz, industrioso, sério, devoto dos estudos, protetor das artes, gentil com os amigos, e pio. Em 1571, ele perdoou prisioneiros na Espanha e das Índias para celebrar o nascimento de seus filhos.
Seu espírito piedoso só não alcançava a brutalidade que reservava aos levantes protestantes. Particularmente na Holanda. Usou a Inquisição espanhola largamente contra hereges de todas as estirpes. Executou maios de 1.200 cidadãos dos Países Baixos ainda nos anos iniciais das revoltas holandesas.
Para os protestantes, Filipe era o “demônio do sul” (daemon meridanius), mas para seus súditos espanhóis, era Filipe, o rei prudente.

Embora fosse o governante mais rico da Europa, devido à entrada de ouro vinda das Américas, guerras frequentes ameaçavam a Espanha com uma falência, até o ponto em que Filipe teve de vender as jóias de sua esposa, em 1588.

Após sua morte, deixou como herança um conglomerado enfraquecido de estados, divididos por cultura, religião e economicamente estáveis.        


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “The most productive people in History”

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