O ano de 1950 é marcado por uma triste memória: o
Maracanazzo. A derrota do selecionado brasileiro para o uruguaio em pleno
Maracanã, inaugurado apenas três meses antes, por 2 X 1 de virada, deixou o
país em clima fúnebre.
Mas aquele ano também marcou uma das eleições mais
importantes da história do país. Getúlio Vargas disputava com o brigadeiro Eduardo
Gomes sua chance de retornar ao Catete, agora pela via democrática do voto. Vargas
venceu de goleada, reafirmando o poder que exercia sobre as massas. Era o
candidato do povo: havia eleito Dutra nas eleições anteriores, fora eleito para
o Senado e agora recebia uma chuva de votos para presidente.
Na reta final, a vantagem do candidato do PTB era de tal
monta avassaladora que o PSD, cujo candidato era Cristiano Machado, abandonou
seu candidato e fechou coligação com o PTB, levando assim ainda mais votos para
Vargas.
A derrotada UDN não conseguia engolir o resultado apurado
nas urnas. Não criam ser possível que o velho ditador, afastado do poder há
cinco anos, pudesse nadas de braçada na democracia daquela forma. Parecia
imbatível. Um verdadeiro símbolo que pairava acima dos demais mortais. Uma
pessoa que enfeitiçava as pessoas de tal forma que arrastava multidões, embalava
o trabalhador a caminho do trabalho, fazia pessoas pobres e sofridas sorrirem.
Mas a UDN queria reverter o resultado, e a via possível era
a Judicial. A Legislação Eleitoral do período era dúbia no que tocava à
quantidade de votos necessária para a vitória. A UDN fez um requerimento ao
TSE, mas este foi indeferido. De qualquer maneira, em meio a tais debates
surgia um novo nome na política nacional: Carlos Frederico Werneck de Lacerda,
ou Carlos Lacerda, o Corvo. Jornalista e proprietário do jornal Tribuna da
Imprensa, deputado federal pela UDN, Lacerda se notabilizou pelos textos
raivosos, quase insandecidos, fazendo uso de expressões que chamaríamos e “linguagem
do ódio”. Fazia uso freqüente de “denúncias” de corrupção, nunca provadas, e de
expressões como “mar de lama”, por meio das quais tentava prejudicar desafetos
e beneficiar aliados.
Foi dele uma famosa declaração dada em 1º de junho de 1950,
quando ainda tentava barrar a candidatura de Vargas:
“O senhor Getúlio Vargas não deve ser candidato à
presidência. Se candidato, não deve ser eleito. Se eleito, não deve tomar
posse. Empossado, devemos recorrer À revolução para impedi-lo de governar.”
Essas forças golpistas marcariam o retorno de Vargas com
instabilidade política e crises numerosas, do primeiro ao último dia do “velho”
no Catete. Desejava-se, literalmente, impedi-lo de governar, tirá-lo do cargo e
substituí-lo. As forças ocultas não descansariam.
O PIB brasileiro passou a ser medido desde 1947, durante o
governo Dutra. De fato, foi registrado crescimento significativo até 1950, mas
esse resultado foi acompanhado pela inflação crescente (já batia nos 60%).
Para o cargo de vice, foi eleito (eram eleições à parte)
João Café Filho.
O gabinete Vargas trazia nomes da década de 1930. O general
Pedro Aurélio de Góis Monteiro para chefiar as Forças Armadas; João Neves da
Fontoura para Relações Exteriores; Francisco Negrão de Lima para a Justiça; Horácio
Lafer para a Fazenda e Danton Coelho, defensor do sindicalismo, para o
Trabalho.
A primeira crise surgiu com a nomeação do Ministro da
Guerra, cuja escolha inicial recaiu sobre o general-de-divisão Newton Estillac
Leal, representante da ala nacionalista das Forças Armadas. Os milicos de
posição contrária iniciaram uma crise nos quartéis, que levaria à troca do nome
do Ministro por três vezes, em curto espaço de tempo.
No campo econômico, Vargas publicou leis acerca dos crimes
contra a economia popular, regulamentou a remessa de lucros ao exterior. Após,
foi criado o BNDE, o Banco do Nordeste e o Instituto Brasileiro do Café.
Mas a polêmica mais importante surgiria no âmbito do debate
que havia se iniciado no governo anterior. Naqueles anos, ficou famosa a “Questão
do Petróleo”. O lema “O petróleo é nosso” estava relacionado à eventual criação
da Petrobras.
O projeto de criação da estatal foi encaminhado ao Congresso
Nacional em 6 de dezembro de 1951. Após inúmeros ataques e defesas ao polêmico
projeto, em outubro de 1953 o governo editou a Lei n. 2.004, de criação da
Petrobras. A fiscalização da companhia era exercida pelo Conselho Nacional do
Petróleo.
O monopólio da exploração, pesquisa, refino e
comercialização de petróleo, gás natural e seus derivados estavam nas mãos da
nova estatal. Essa situação somente seria alterada em meados da década de 1990,
no governo FHC. Distribuição e revenda permaneciam atividades abertas à
concorrência.
Pouco a pouco, Vargas instaurava uma democracia quase direta
com o povo. Entretanto, ao passo que sua popularidade aumentava, somada às suas
medidas para tributar remessas de lucros e aumentar o valor do salário-mínimo,
que sofria com a inflação acumulada, os ataques vindos da oposição ficavam mais
violentos.
Em junho de 1953, Vargas substituiu seu Ministro do
Trabalho, Indústria e Comércio. O novo ocupante do cargo era conterrâneo de São
Borja, partidário do PTB, bacharel em direito e deputado federal: João Belchior
Marques Goulart, o Jango.
Era evidente que Jango era o favorito de Vargas para
sucedê-lo na vida pública. Mas a medida tomada por Jango inviabilizaria quase
totalmente os planos da dupla. Em fevereiro de 1954, Jango autorizou o reajuste
do salário mínimo em astronômicos 100%. Esse foi o estopim para uma crise política
de tirar o fôlego.
Os primeiros a manifestarem descontentamento foram os
militares. Setenta e nove coronéis assinaram o “Manifesto dos Coronéis”. Um dos
nomes a aderirem a esse documento foi o de Golbery do Couto e Silva, um dos
arquitetos do Golpe de 1964.
Jango pediu exoneração do cargo em 23 de fevereiro.
Quanto à mídia, todos eram oposição a Vargas, exceto o
jornal Última Hora, de Samuel Weiner, que era acusado de chapa branca e de ser
sustentado com dinheiro do Banco do Brasil.
Enfim, apesar da
popularidade, Vargas retornou ao poder para ver um Brasil bastante diferente
daquele que governara até 1945.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: Livro “Dossiê Getúlio Vargas”
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