Em uma sociedade camponesa, poucos são livres. As pessoas
estão presas à terra, que pertence ao senhor. Suas raízes estão fincadas na
terra. Em geral, apenas os afiliados ao banditismo podem dizer orgulhosamente
que são livres.
No momento em que o homem se casa e passa a laborar no
campo, torna-se preso à sua realidade. A partir de então deve se dedicar a
semear os campos, colher a produção, consertar cercas danificadas. Por diversas
vezes rebeliões e guerras eram interrompidos em favor das colheitas.
De fato, até o ciclo de banditismo segue a lógica do
trabalho no campo. O auge dos roubos ocorria na primavera e no verão, tendo
seus vales nos meses de outono e inverno.
O estoque de bandidos em potencial era mais repleto nos
locais onde havia mais excedentes de mão de obra. Caso a demanda por
trabalhadores fosse incapaz de manter empregados todos os trabalhadores
disponíveis, os excedentes tendiam a procurar meio de sobrevivência no
banditismo.
A mesma lógica valia para os locais em que a produtividade
da terra era baixa, o solo era pobre ou a região, muito montanhosa. Algumas
sociedades criaram maneiras de lidar com esse excedente, de forma a evitar que
se filiem ao banditismo. A Suíça e outras sociedades criaram o alistamento
militar, para controlar esse excedente.
Seja como for, o alvo do banditismo sempre foi o jovem, saído
da puberdade e antes que se casasse. Poucos naquelas sociedades eram mais
livres do que essas pessoas. Após a assunção das responsabilidades familiares e
no trato da terra, jamais teriam a autonomia necessária para exercer a
atividade de bandido. Após os 30 anos, em geral eram instados a abandonar o
banditismo e procurar um ofício tradicional.
Em diversas sociedades, o excedente masculino também inflava
as fileiras do banditismo. O infanticídio feminino poderia elevar o excedente
masculino a 20% acima do número de homens. Os homens não casados tinham mais autonomia
para se filiar a bandos.
O perfil descrito do bandido tradicional, jovens e solteiros,
é o mesmo dos guerrilheiros colombianos atuais, em geral, contado entre 15 e 30
anos de idade.
A região da Andaluzia tinha um bandido-herói muito famoso,
Diego Corrientes, morto aos 24 anos. Lampião iniciou sua carreira no cangaço
entre os 17 e os 20 anos. Don José, bandido que inspirou a peça Carmen, começou
aos 18 anos.
Pode-se citar também os bandidos que se lançaram a tais
empreitadas em busca de uma maneira de se integrarem à sociedade rural e
deixarem a marginalidade a que estavam condenados. Foi o caso dos rasboiniki,
que infestavam a velha Rússia. Eles buscavam as áreas ao sul e ao leste.
Buscavam aquilo que chamavam de Zemlya i Volya (Terra e Liberdade).
Outra fonte de braços a serviço do banditismo eram as forças
militares. Diversos líderes de salteadores do sul da Itália, por volta de 1860,
eram descritos como ex-soldados do exército dos Bourbons; trabalhadores sem
terra, ex-soldados.
No entanto, a categoria mais importante de bandido, cuja
participação era individual e voluntária. São os homens insubmissos, não
dispostos a aceitar o papel dócil e passivo do camponês vilipendiado e
extorquido. Eram rebeldes ou, no dizer clássico, “homens que se fazem respeitar.”
Não eram tão numerosos quanto se poderia esperar pois, para cada ladrão “nobre”
que resiste, dezenas e dezenas aceitam as injustiças contra eles praticadas.
Os bandidos da categoria acima citada eram os “durões”, que
faziam ressoar sua fama de valentes, portavam armas ou bastões mesmo quando não
tinham o direito de usá-las, vestiam-se maneira própria, de forma a intimidar
as pessoas – como que se dissessem “Este homem não é dócil!”.
São exemplos a roupa dos “vaqueros” mexicanos, adotadas
pelos cowboys do faroeste. Seus equivalentes sulamericanos eram os gaúchos dos
pampas argentinos e sul riograndenses, que usavam trajes mais ou menos
parecidos.
Aqueles homens que se encaixavam na categoria acima, mas que
não desejavam se lançar ao banditismo poderiam traçar rumos alternativos,
servindo como guardas, soldados etc. Foi o caso dos “mafiosi” da Sicília, que
formaram um nova burguesia rural.
As categorias mais importantes foram previamente citadas,
mas ainda existe uma que, talvez, seja a mais interessante: os robber barons –
ou barões ladrões.
Esses eram fidalgos empobrecidos, porém se tornaram em dado
momento uma fonte enorme de bandidos. As armas eram privilégios daquela
categoria social, enquanto permaneciam vedadas aos camponeses. Lutar, empunhar
espada sou rifles, era um elemento que os representava; cresciam cercados por
esse mundo de violência e uso da força em seu proveito. Tornavam-se afeitos à
violência por meio de esportes como a caça, aprendiam a matar em nome da honra
pessoal e familiar, duelos eram freqüentes. O serviço militar e a administração
colonial eram a atividades onde extravasavam seus instintos mais sanguinários.
Esse tipo é bem representado na peça Os Mosqueteiros, de
Alexandre Dumas. Oriundos da Gasconha, tradicional berço de cavalheiros
despossuídos, eram valentões e tinham licença oficial para matar. Assim eram os
conquistadores espanhóis, por exemplo.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: Livro “Bandits”