O Império romano viveu seu auge nos séculos I e II. Depois
disso se iniciou sua derrocada, até 476 d.C., com a deposição do imperador
Rômulo Augusto.
O milênio seguinte seria chamado de Idade Média, em geral
encarado como um retrocesso da civilização. Foi também a época em que o
cristianismo se expandiu e se consolidou em todo o continente. Após a queda do
Império, a Europa perdeu sua unidade econômica, política e militar; mas a
unidade cultural foi garantida pelo Cristianismo. A conversão se deu sobre cada
um dos povos que habitavam a região: as tribos germânicas, cujos ataques
abalaram as fronteiras do Império, foram convertidas no século V; os visigodos,
entre 382 e 395 d.C.; os ostrogodos, entre 456 e 472 d.C.; os lombardos, entre
488 e 505 d.C.; os borgonheses, entre 412 e 436 d.C.; os vândalos, entre 409 e
417 d.C.
Assim foram formados os reinos cristãos que pululariam o continente.
Bispos, pertencentes a famílias de aristocratas, governavam cidades
e aldeias a partir de suas catedrais. Arcebispos partilharam o território cristão
conforme a estrutura administrativa do Império: dioceses. No século VI, o
arcebispo de Roma recebeu uma denominação específica: Papa.
O poder da Igreja se expressava pela cobrança do dízimo,
pelo fato de suas terras não serem divididas entre herdeiros e pelo quase
monopólio da escrita. Era ela quem fornecia os escribas que transcreviam para o
papel, tanto leis quanto a história da origem dos mais diversos povos: em
geral, elas ganharam um novo final, com direito a conversão e promessas de um
futura feliz, do alto da nova fé.
Mas a mudança para o cristianismo demoraria bastante para se
consolidar. São Bonifácio viveu entreveros com os anglo-saxões, pois tanto os
católicos quanto os pagãos “recusam-se a ter esposas legítimas e continuam a
viver na luxúria e no adultério à maneira dos cavalos rinchantes e dos asnos
zurrantes.”
O rei Etelbado, em 756 d.C., continuava a praguejar contra
os costumes anglo-saxões: “O vosso desprezo pelo matrimônio legal, se fora por
causa da castidade, seria louvável; mas uma vez que vos chafurdais na luxúria e
até em adultério com freiras, é vergonhoso e condenável. Ouvimos dizer que
quase todos os nobres da Mércia seguem o vosso exemplo, abandonam suas esposas
legitimas e vivem numa intimidade culposa com adúlteras e freiras.”
Os pecados eram muitos, freqüentes e a necessidade de
confessá-los era condição básica para o perdão. Poucos confessavam pecados como
roubo, feitiçaria etc. Mas todos cometiam pecados da carne e o assunto sexo
passou a ser o mais disputado dos confessionários. Dever-se-ia confessar tudo:
sonhos, pensamentos, masturbações, posições sexuais, infidelidades. As
penitências eram definidas pelos próprios padres – passar um ano a pão e água
era uma das mais comuns.
Mas a necessidade de se homogeneizarem os “castigos” levou à
elaboração dos penitenciais: manuais que traziam penas preestabelecidas para
diversos pecados. O mais famoso foi o penitencial de Cummeans, do século VII.
Ele dispunha, por exemplo que: aquele que pecar com um animal deverá cumprir
penitência por um ano; se pecar consio mesmo, deverá cumprir três períodos de
40 dias; se for com um garoto de 15 anos, cumprirá por 40 dias; aquele que
corromper sua mãe deverá cumprir penitência por três anos, com exílio perpétuo;
aqueles que cometerem sodomia deverão cumprir penitência por sete anos; coito
interfemural, pena de 2 anos; pecar pensando em fornicação, mesmo não a realizando,
pena de um ano; mas se for atacado por pensamentos arrebatadores sobre sexo,
pena de sete dias; polução na cama levaria imediatamente a pessoa a levantar-se,
ajoelhar-se e cantar nove salmos, além de passar o dia seguinte a pão e água; se
um leigo que desonrar a mulher ou a filha virgem de seu vizinho deverá cumprir
penitência por um ano a pão e água, sem sua própria mulher... E muito mais.
Somando todas as datas em que os cônjuges estavam proibidos
de ter relações sexuais, chegava-se a 91 dia por ano (sem levar em conta os
períodos de menstruação). E a fornicação (sexo fora do casamento) era
considerada pecado mais grave do que o homicídios, segundo um penitencial do
século XV.
Para aqueles que precisavam de um incentivo a mais para ir
se confessar com um padre, contavam-se nos sermões histórias tenebrosas de filhos
de casais que não se confessavam, nascidas com defeitos ou com lepra.
Esse tipo de ameaça era necessário. Afinal, a conversão
nunca vinha sem resistência. Pr exemplo, no dia 14 de janeiro, diversas cidades
francesas comemoravam a Festa do Asno, e que uma jovem se fantasiava de Virgem
Maria, fingindo fugir do Egito. Lá chegando, um jumento que a acompanhara
ficava a ouvir a missa, ao lado do altar. Havia também a Festa dos Loucos, em
que se fazia piada da alta hierarquia eclesiástica.
Sem dúvidas a perseguição da Igreja aos pecados da carne deu
origem a um cinismo desmedido e ao deboche mal disfarçado.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Luxúria: como ela mudou a história do mundo”
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