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quarta-feira, 31 de maio de 2017

VILLEGAGNON E O SONHO DA FRANÇA NAS AMÉRICAS – PARTE 1


A vida de intrépidas aventuras de Nicolau Durand de Villegagnon começou após completar 21 anos, em 1531, e ser admitido na Ordem de Malta.  

Em 1540, após ser enviado a Veneza, participou de uma missão estranhíssima. Francisco I, rei católico da França, celebrou aliança com Suleiman, rei turco muçulmano, para se defender de Carlos V, sacro imperador romano-germânico e católico. Villegagnon recebeu uma missão de incentivar Suleiman a invadir a Áustria, no coração da Europa.     

Esse ambiente estava conturbado por causa da posição dúbia da Igreja, ora apoiando Carlos, ora apoiando Francisco.

Após entregar a Francisco I as plantas das principais fortalezas do ducado de Milão, que já aparecera no radar de Francisco I como futuro alvo, Villegagnon caiu nas graças do rei francês.

Villegagnon também foi enviado à Argélia, para acompanhar o desempenho do exército de Carlos V na Argélia. Essa guerra era importante para a França, que era atacada por navios árabes, que chegavam a usar o porto de Toulon para reabastecimento.

Em 1542, retornou a Paris, onde se encontrou com Francisco I e descreveu sua experiência em Argel.
Com a morte de Francisco, assumiu o trono francês Henrique II, que também nutria simpatias por Villegagnon. Este novo rei delegou-lhe uma delicada missão: expulsar os piratas ingleses que tanto atacavam a costa da Bretanha. Em poucos dias, Villegagnon afundou cinco navios ingleses, pondo fim à pirataria local.

Outro episódio histórico envolvendo Villegagnon foi o seqüestro de Maria Stuart. Filha de Jaime V, rei da Escócia, ainda recém-nascida herdara a coroa do pai. Henrique VIII, rei inglês, logo iniciou tratativas para que a nova rainha escocesa desposasse seu filho, Eduardo, também infante. Henrique VIII considerava essa união de coroas fulcral para o futuro da Inglaterra.

O grande problema nessa trama era de fundo religioso: os escoceses eram católicos, portanto apoiados por França, Espanha e Roma; a Inglaterra era protestante anglicana, portanto inimiga de todos esses países citados.  

A mão de Maria, Maria de Guise, não queria que a filha se casasse com protestante algum. Escondeu a filha e esperou um posicionamento da França. A resposta foi surpreendente: Maria deveria se tornar futura rainha da França, acumulando-a com a coroa francesa. O esposo de Maria seria Francisco, futuro Francisco II, filho de Henrique II.

Após ter ciência da trama, a marinha inglesa foi posta em ação, com a missão de não deixar a pequena Maria Stuart sair da Escócia.

Coube à França contra-atacar: Villegagnon foi incumbido de raptar a futura rainha da França. E o fez com desenvoltura.

Deixou a França com quatro galeras, Seus remadores eram todos presidiários: foram escolhidos os que pareciam odiar mais os britânicos e a eles foi prometida a liberdade.

A expedição contava com mais de 6 mil homens. Uma tropa desembarcou em Leith, mas era apenas um ataque falso, visando atrair a atenção dos ingleses. A Villegagnon coube contornar a ilha pelo norte e subir a foz do rio Clyde. Em direção à fortaleza de Dumbarton, onde estava Maria. Despistou soldados ingleses e retornou pelo mesmo caminho.

Em 13 de agosto de 1548, a pequenina rainha de duas nações desembarcou em Brest, e encaminhada à companhia de Henrique II, em Paris, sua futura casa.

Os ingleses foram humilhados por aquele homem de apenas 38 anos. Esses feitos, dentre outras vitórias espetaculares contra a marinha inglesa, levaram à assinatura de um tratado de paz com a Inglaterra, que devolveu a cidade de Boulogne à França.

Aos 42 anos, Villegagnon foi nomeado vice-almirante francês e recebeu a missão de fortificar o porto de Brest. Também usou o novo cargo para sugerir a conquista da ilha de Córsega, até então genovesa, para que a França pudesse sonhar dominar o Mediterrâneo no futuro. Vale notar que dessa ilhota saiu Napoleão, futuro imperador francês.

Ainda em Brest, Villegagnon teve conhecimento sobre a costa brasileira e suas possibilidades comerciais. Pouco tempo depois, o vice-almirante estava cumprindo uma missão secreta em terras tupiniquins.

Em 1554, aportava em Cabo Frio, conheceu os índios tamoios, informou-se sobre os navios de patrulha portugueses, e preparou a futura missão de colonização francesa.

Essa futura colônia se chamaria França Antártica, mas teve sua história intensamente prejudicada por causa dos conflitos religiosos que assolaram a França. Um dos principais personagens envolvidos nesses conflitos chamava-se Jean Cauvin, o Calvino (ou João Calvino, em português).

Após se mudar para Basiléia, na Suíça, Calvino fundou sua primeira igreja reformista. Em 1536, transferiu-se para Genebra, também chamada de Roma protestante.

O ponto explorado por Calvino na sua tese protestante girava acerca da eucaristia. Ele não acreditava na presença divina nesse rito e deixou seu ponto explícito no livre Tratado da Ceia.

A partir de 1555, a França se dividiu entre católicos e huguenotes (cuja maioria era calvinista). O almirante Coligny, espécie de primeiro-ministro da França, era o porta-voz dos protestantes.

A expedição para o Brasil partiu em 1554, com Villegagnon no comando. Armadores do porto de Dieppe deram apoio, tendo em vista as possibilidades comerciais que poderia abrir. O segredo era essencial, para que não se despertasse a atenção do embaixador português em Paris.

Os curto período de quatro anos de existência da França Antártica viu a chegada de inúmeros navios mercantes franceses, que despachavam para a França produtos diversos, especialmente pau-brasil.

Mas Villegagnon via possibilidades de ganhos imediatos por meio de ataques a galeões espanhóis e portugueses, que regressavam do Extremo Oriente, carregados de especiarias.

(Continua)
  
   
Rubem L. de F. Auto


Fonte: Livro “Histórias Depois da Glória: Ensaios sobre personalidades e episódios controversos da história do Brasil”     

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