No Brasil colonial, o tratamento dado a pessoas oriundas das
mais diversas nações era bastante variado. Os portugueses eram tratados como
senhores, conquistadores, reinóis etc. Os índios eram tratados chamados de “gentio
da terra”, “negro da terra”, “gente de cabelo escorrido” ... ou pelos nomes das
nações indígenas a que pertenciam: tamoios, tupinambás, goytacazes etc.
O filho de português que aqui nascesse era designado como “natural
do Rio de Janeiro”, por exemplo, não como brasileiro.
Os espanhóis poderiam ser classificados como estrangeiros ou
não, a depender de como se encontravam as relações entre as duas nações.
Estrangeiros não poderiam entrar livremente no território
brasileiro. Morar aqui dependia de autorização régia. Navios estrangeiros,
somente aqueles que dispusessem de permissão, ou que se encontrassem necessitados
de socorro.
Preocupado com a quantidade e a situação dos estrangeiros residentes
na capitania do Rio de Janeiro, Portugal emitiu ordem ao governador dom Álvaro
da Silveira Albuquerque, em 1703, para que verificasse as condições legais dos “muitos
estrangeiros de várias nações”. Note-se que, no caso das regiões de minas, a
entrada de estrangeiros era virtualmente impossível.
As ordens davam conta de que somente deveriam permanecer em
cada capitania quatro famílias de ingleses (solteiro contava como uma família),
e quatro de holandeses, conforme disposto em tratados. Os excedentes deveriam
ser presos e enviados a Lisboa.
Contudo, o Brasil continuava a ser um destino desejado por
muitos. Ao adentrarem o território brasileiro, em geral eles procuravam alterar
nome e sobrenome para uma versão aportuguesada. Outra tática muito usada era
contraírem casamento na Igreja Católica. Para tanto, os não-católicos abriam
mão da fé anterior e se batizavam na Igreja Católica. Após o nascimento do
primeiro filho, obtinham a permissão para aqui permanecerem.
As ordens religiosas, especialmente a Companhia de Jesus,
representavam um problema para o controle de estrangeiros. Decidiu-se pelo veto
ao envio de religiosos estrangeiros às Minas Gerais, exceto aqueles autorizados
pelo Rei. O bispo realizava o controle direto.
Alguns estrangeiros conseguiam a permissão tão ansiada por
meio da prestação de serviços ao rei. Foi o caso do irlandês André Cussaco,
governador da capitania do Rio de Janeiro de 1694 a 1695.
Em 1707, o Reino resolveu pôr a casa em ordem. Expediu-se
uma carta por meio da qual o rei decretava que os governadores deveriam enviar
a Lisboa todos os estrangeiros que excedessem a cota permitida.
No Rio de Janeiro, o número de estrangeiros em condição
ilegal era de vinte.
No entanto, alguns tentaram burlar sua condição frente ao
decreto. Foi o caso de John Braneck, apontado como inaugurador da família Werneck.
O governador do Rio de Janeiro à época, dom Fernando Martins
de Mascarenhas mostrou-se simpático aos estrangeiros, concedendo bastante tempo
até a execução das ordens régias. Isso permitiu a muitos se casarem ou buscarem
outras maneiras de legalizar sua permanência.
Mas o sucessor, governador Aires Saldanha, foi obrigado a
dar cabo da incumbência.
Dois casos exemplificam bem os que conseguiram ficar na
cidade. O francês João Leygos, rebatizado como Pedro de Fita e viveu como se
português fosse. E John Braneck, de origem desconhecida.
Esse último, após sua chegada ao Brasil, foi morar em Minas
Gerais, perto do rio Paraíba. Possuía uma roça, uma vendinha e um rancho onde
hospedava viajantes. Lá, Braneck foi denunciado como membro de um bando de
contrabandistas. Dizia-se que ele permitia que se cruzassem suas terras com
mercadorias sem registro.
No entanto, sua viúva, Isabel, defendeu-se nos autos
alegando que na verdade eram funcionários e soldados reais, da Fazenda Real,
que praticavam aqueles crimes, em benefício de seus negócios privados. O fato
era agravado pelo fato de serem eles proibidos de manter atividades comerciais
no local onde exerciam suas funções públicas. Por fim, alegou Isabel que
aqueles criminosos de fato haviam se apossado das propriedades da família e os
exploravam comercialmente.
Como Isabel tinha cinco filhos e não dispunha de meios
outros que garantissem seu sustento, pediu a restituição das terras, do armazém
e do rancho.
Os descendentes de John e Isabel, em dado momento, passaram
a assinar o sobrenome Werneck, adquiriram o status de fidalgos de origem
portuguesa. Futuramente participariam da fundação de grandes fazendas de café
no Vale do Paraíba e em Vassouras.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: Livro “Histórias de Conflitos no Rio de Janeiro
Colonial”
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