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quarta-feira, 24 de maio de 2017

O CASAMENTO DA VIÚVA E A MORTE DO CAIXEIRO


Um evento deixou a cidade do Rio de Janeiro em polvorosa. Don Bárbara Barreto iria se casar pela segunda vez. Era viúva do poderoso capitão Antônio de Moura, ex-provedor da Fazenda Real.

O noivo da vez se chamava Amaro Fernandes, caixeiro, pobre e filho de plebeus, era natural de Braga, Portugal. Como se isso não bastasse, Amaro tinha menos de 25 anos, enquanto Bárbara contava 66.
Outra fonte de comentários maliciosos foi o fato de a cerimônia ter sido bastante apressada, tendo-se dispensado ao noivo a apresentação de certidão de batismo e comprovação de solteiro. Essa pendência só sanada com o pagamento de fiança e declaração de testemunhas.

A família de Dona Bárbara foi absolutamente contra o matrimônio. Sua filha, Catarina de Moura, era a mais indignada de todas.  

Finalmente, a cerimônia ocorreu em 14 de julho de 1724.

Logo após, sem maiores explicações ou razão aparente, Amaro foi preso e jogado na medieval e imunda cadeia pública.

A saída encontrada por Amaro foi escrever ao príncipe regente, suplicando-lhe ajuda e denunciando o absurdo por que passava.

Em 7 de dezembro de 1725, chagou a misericordiosa missiva de dom João que, em nome da rainha, mandava que o governador Luís Vahia Monteiro soltasse imediatamente Amaro e convocar todas as pessoas que Amaro listara como possíveis autores da arbitrariedade.

Os principais nomes apontados por Amaro era os familiares de sua esposa: Julião Rangel, escrivão da Câmara de Vereadores, e Sebastião de Sampaio Sande. Todos foram comunicados de que Amaro agora se encontrava sob proteção real.

O ódio mortal contra Amaro não respeitou sua condição de protegido da Príncipe e este foi alvo de mais um atentado. Recebeu vários tiros. Um deles o atingiu, mas Amaro sobreviveu.

Mais uma vez Amaro denunciou o ocorrido em carta, desta vez endereçada ao governador.
Em resposta, Vahia Monteiro mandou que o ouvidor geral coletasse as assinaturas das pessoas apontadas pelo denunciante.

Cerca de 20 dias após a ordem do governador, um bando invadiu a fazenda onde se encontrava Amaro, ainda convalescendo da última agressão, e, armados de facas e catanas, matou Amaro, além de retalhar seu corpo e membros.

O governador se enfureceu com o juiz de fora, criticando seu trabalho de apuração desde as primeiras tentativas de assassinar de Amaro.

Vahia enviou o sargento-mor Pedro de Azambuja, acompanhado de 150 homens, à região do homicídio, entre Niterói e São Gonçalo atuais. A ordem era para que prendessem os criminosos.

Quando depararam com suspeitos, estes tentaram fugir. Mas um deles, o capitão de cavalos Domingos Morato Roma foi capturado. Após vasculharem a mata do entorno, surpreenderam Don Catarina de Moura, ao lado de um negro, ainda com as mãos sujas de sangue.

Era já de conhecimento amplo que Catarina era a provável mandante do homicídio de Amaro. Importante notar que a ex-esposa de Amaro, Dona Bárbara, já se encontrava presa por ordem do governador.
Como o processo andava a passos de tartaruga, o governador entrou em atrito com o ouvidor-geral Manuel da Costa Mimoso. Aliás, não era a primeira vez de Vahia Monteiro se queixava da lentidão da Justiça do Rio de Janeiro.

As críticas do governador chegaram ao rei, que ordenou ao ouvidor-geral sanar as causas da insatisfação do governador. A resposta do ouvidor-geral foi rápida, na forma de um relatório em que elencava os feitos da Justiça até aquele momento.

Em resumo, o aspecto geral do caso, até o dia de 25 de julho de 1729, era essa: dona Bárbara Barreto fora condenada ao pagamento de 800 mil réis, ao Tribunal da Relação; Catarina falecera na cadeia; Sebastião de Sampaio Sande foi condenado ao pagamento de multa e ao degredo; o crioulo Gerônimo, escravo de Catarina, foi condenado a açoites e ao degredo para a colônia de Sacramento (atual Uruiguai); o outro escravo, João Crioulo, foi condenado à morte por enforcamento. Outros três denunciados foram absolvidos. Seis outros estavam foragidos até então.

Assim se castigava quem fugia do establishment...     


Rubem L. de F. Auto


Fonte: Livro “Histórias de Conflitos no Rio de Janeiro Colonial”     

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