Segundo filho de Fernão Cabral, Pedro não poderia usar o
sobrenome de família nobre Cabral (esse privilégio era reservado ao filho mais
velho). Deveria se chamar Pedr`Àlvarez de Gouveia, por volta de 1500. Somente
após a morte do irmão mais velho, 1516, passou a poder assinar Cabral.
Nascera em 1468 ou 1469 em Belmonte, pequeníssima aldeia de
algumas centenas de pessoas. Sua mãe era herdeira rica da região.
Por volta de 1478, com 10 anos mais ou menos, foi enviado à
Corte de Lisboa para receber sua educação, própria dos nobres (cultura geral,
como usar armas e como se comportar em cerimoniais). Aos 16 era fidalgo de D.
João II e recebia 1.000 réis por mês e tinha direito a moradia. Aos 18, recebeu
esporas de cavaleiro e passou a receber
a tença de 26 mil réis.
Lutando no Marrocos, Pedro contraiu malária, doença cujas seqüelas
o acompanhariam até o túmulo.
Sua experiência no norte da África o permitiu realizar o
trajeto náutico e adquirir alguma experiência no mar. Era sua única prova no
mar antes de ser agraciado com o comando da expedição caríssima que passaria por
terras brasileiras.
Essa expedição contou a com a participação dos melhores
marujos portugueses. Sem dúvidas seu comando se devia muito mais a sua
capacidade de liderança, competência, prudência, coragem...
A expedição sob a batuta de Cabral era maior da história de Portugal até então. Sua
missão mais relevante seria estabelecer relações permanentes com o Samorim de
Calicute, instalar naquele lugar uma feitoria permanente e dar início a uma
rica corrente de negócios.
Portugal pretendia assim pôr fim ao monopólio comercial de
Veneza, Gênova e Florença – controladoras do comércio de especiarias – e dos
mercadores árabes. Os fluxos comerciais que tomaram corpo ao longo de toda a
Idade Média mostravam que não seria possível aos europeus viverem sem as
especiarias do Oriente.
Até então essas mercadorias eram transportadas até
Constantinopla por camelos. Outro caminho possível era transportá-las por meio
de navios árabes da Índia e da China até portos no Egito. Dali, galeras
venezianas e genovesas levavam as especiarias até portos do Mediterrâneo
(alguns faziam o frete até o norte da Europa).
Esse comércio fez de Veneza a nação mais rica da Europa. Os
produtos mais disputados eram: perfumes, condimentos, vinhos especiais, incenso
e drogas medicinais.Os lucros eram inigualáveis.
Contudo, em 1453 chegou o fim daquele arranjo comercial
internacional. Os turcos tomaram Constantinopla e fecharam a rota até então
utilizada.
Importante recordar que a viagem de Cabral fora precedida
pela de Vasco da Gama, em 1498, cujo objetivo era abrir o caminho até a região asiática
tão desejada. Vasco fora convocado para comandar a esquadra para as Índias, mas
recusou-se em face de problemas de saúde.
Pedro tinha 32 anos apenas, mas deveria possuir qualidades
excepcionais que o alçaram a líder de empreendimento. Em geral, o capitão das
expedições era um nobre e detinha a palavra final em decisões de grande relevo.
Mas quem mandava no dia a dia era o piloto principal da frota, quem detinha as
decisões de fundo técnico. A esquadra cabralina contava com os melhores pilotos
e comandantes que existiam em Portugal.
Portugal nessa época era um pequeno reino cuja população não
passava de 1,1 milhão de pessoas. Apesar de diminuto, esse reino havia realizado
conquistas fabulosas: em 1415, tomara Cauta, no atual Marrocos. Tentaram manter
todo o país sob seu guarda-chuvas, mas era impossível, haja vista os recursos
humanos insuficientes. Passaram então a controlar portos estratégicos ao longo
da costa africana. Dali,enviavam a Portugal: ouro, marfim, escravos e pimenta.
Não era mais necessário cruzar o Saara para realizar esse transporte.
A almejada rota comercial para o Oriente foi um projeto
pessoal do infante d. Henrique. O choque causado pelo sucesso de Colombo foi
enorme, mas amenizado pelo Tratado de Tordesilhas, que impôs sua linha
demarcatória a 370 léguas de Cabo Verde, em vez das 100 propostas inicialmente.
De fato, nenhuma linha foi respeitada pelos dois países.
Com o acordo, Portugal ganhava o direito de navegar
livremente pelo Atlântico Sul e mantinha suas possessões, já conquistadas: São
Jorge da Mina, na Guiné (rico exportador de ouro) e entrepostos na costa
ocidental africana, que serviam aos propósitos do rico comerciante lisboeta
Fernão Gomes.
Em 1495, morreu D. João II, o Perfeito, provavelmente
envenenado. Foi sucedido por D. Manoel, o Venturoso, que reuniu notáveis,
buscando saber se seria melhor parar as expedições e concentrar-se nas riquezas
que já fluíam para o país; ou continuar com a meta indiana.
A resposta dos conselheiros foi para que mantivesse a busca
pelas Índias, mas alguns ajustes deveriam ser feitos: melhores embarcações, que
superassem o cabo das Tormentas (passaram a construir caravelas com proas mais
altas e menores calados, podendo assim se defender de ondas muito altas,
mantendo a capacidade de entrar em enseadas mais rasas).
A expedição de Vasco da Gama havia avaliado previamente as
defesas militares de Calicute e previra dificuldades diplomáticas, religiosas e
comerciais na região. Percebeu hostilidades vindas de mercadores árabes,
bastante incomodados com aqueles europeus recém-chegados, que costumavam ser
seus clientes, agora pretendendo abrir concorrência.
A expedição de Cabral partiu com 13 navios e cerca de 1.500
homens. Deveram selar um acordo com o Samorim, fundar uma feitoria nos
arredores da cidade e iniciar uma corrente comercial contínua. Sob essa
perspectiva, Cabral foi mal sucedido. Quando aportou em Calicute, sua frota se
reduzira a menos da metade da configuração inicial.
Vendo suas negociações com o Samorim empacadas (os árabes
fizeram de tudo para afundar os planos portugueses), Cabral tomou a decisão de
bombardear Calicute. Parte da cidade foi arrasada e muitos consideram essa atitude
um grave erro do comandante.
Portugal sofreu também com espionagens. O famoso mapa de
Cantino trazia informações guardadas como segredo de Estado em Lisboa.
Provavelmente foram contrabandeadas.
(Continua)
Rubem L. de F. Auto
Fonte: Livro “Histórias de Conflitos no Rio de Janeiro
Colonial”
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