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segunda-feira, 22 de maio de 2017

LUIZ DA CUNHA – DE JUIZ A PRESIDIÁRIO


No Brasil Colônia, o fim de um mandato em cargo público era marcado por uma devassa, em busca de irregularidades eventualmente cometidas pelo titular. A esta, chamava-se “residência”. A essa malha fina se submeteu o bacharel Luiz Antônio Rosado da Cunha, recentemente ocupante do cargo de juiz de fora da cidade do Rio de Janeiro, de 1744 a 1750. O cargo de Luiz Antônio lhe garantia cumulativamente a Presidência da Câmara de Vereadores, a provedoria de defuntos e ausentes, das capelas e dos resíduos da capitania.

Luiz Antônio também foi autor do primeiro livro impresso no Brasil, em 1747. Seu título era: Relação da entrada que fez o Excelentíssimo e Reverendíssimo Senhor D. Frei Antônio do Desterro Malheiro: bispo do Rio de Janeiro em o primeiro dia desse presente ano de 1747, havido sido seis anos Bispo do Reino de Angola, donde, por nomeação de Sua Majestade e Bula Pontifícia, foi promovido para esta Diocese. E era só o título...  

Infelizmente, nesse mesmo ano de 1747, foi decretada a Lei de Imprensa – por Ordem Régia – proibindo a impressão de livros e o funcionamento de gráficas na Colônia.

Luiz Antônio teria sua residência promovida pelo desembargador Roberto Car Ribeiro, juiz do Fisco da cidade do Rio de Janeiro. Porém a tarefa foi delegada ao ouvidor da comarca, Francisco Antônio Berquó da Silveira Pereira.

Dr. Francisco divulgou edital convocando qualquer pessoa que tivesse alguma queixa contra o ex-bacharel a se apresentar aos membros da junta responsável pela residência.

O resultado das avaliações descrevia um homem probo ao extremo, um dos melhores juízes de fora que alguma vez exerceram o cargo naquela comarca.

Em 9 de abril de 1750, Francisco Berquó emitiu despacho ratificando o comportamento exemplar de Luiz da Cunha no cargo.

Os demais órgãos de corregedoria, em Lisboa, também despacharam favoravelmente o ex-bacharel. Por fim, o Conselho Ultramarino mandou passar certidão de bom servidor a Luiz da Cunha.     

Como reconhecimento pelos belos serviços prestados, Luiz da Cunha foi nomeado para o cargo de “intendente do ouro e provedor da Fazenda Real de Goiás”. Exerceu-o de 1758 a 1761.

Ao fim de seu mandato, tendo feito o deslocamento desde Goiás até a cidade do Rio de Janeiro, nesta permaneceu alguns dias, a fim de se despedir dos amigos de longa data.

Notou-se facilmente que sua permanência no cargo em Goiás rendeu muitos e belos frutos... Luiz da Cunha trazia consigo vistoso cabedal: ouro, escravos, armas de fogo, roupas de luxo, pratarias etc. Realidade bastante diversa daquela de quando se despedira da cidade do Rio de Janeiro.

Como se não bastasse, somente então Luiz da Cunha tomou conhecimento de que era alvo de denúncias. E o soube da maneira mais drástica: o rei enviara carta ao governador Gomes Freire informando sobre falcatruas diversas perpetradas por Luiz da Cunha e ordenava na mesma que um desembargador se deslocasse até Goiás para empreender a prisão do provedor, além de confiscar seus bens.

Mas nada disso foi necessário. Coincidentemente Luiz da Cunha estava na cidade do Rio, e sua prisão foi decretada sem que fossem necessário ir a Goiás. O desembargador responsável também decretou o confisco dos bens que o acusado trazia consigo.

Passo seguinte, Fonseca Brandão foi enviado a Goiás para proceder à apuração das denúncias.

O relato sobre o ambiente político em Goiás foi decepcionante. A corrupção era praticada de maneira desinibida. A conclusão foi de que uma quadrilha depenava os cofres públicos. Tal quadrilha era composta pelo Ouvidor da Comarca, pelo tesoureiro, pelo escrivão da Fazenda Real, pelo capitão-mor, por vereadores, padres e pelo provedor Luiz da Cunha.

O próprio governador de Goiás, o capitão João Manuel de Melo, denunciou a pilhagem em carta destinada ao Rei.

Pois bem. A autoridade responsável pelo processo, no Brasil, era o conde da Bobadela. Este governou o Rio de Janeiro por trinta anos, ao fim dos quais não possuía qualquer bem material incompatível com sua renda. Deixou o cargo gozando de uma imagem de honesto, religioso e de dedicado protetor das pessoas que governava.

Até mesmo foi aberta uma exceção, com o fim de homenageá-lo dignamente. Embora fosse vetada a exibição de qualquer imagem de autoridades em repartições públicas, foi permitido um quadro do ex-governador na sala de audiências da Câmara de Vereadores.    

Já Luiz da Cunha, teve como triste fim de sua carreira o registro de seu recolhimento à cadeia pública da cidade do Rio.


Rubem L. de F. Auto

Fonte: Livro “Histórias de Conflitos no Rio de Janeiro Colonial”    


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