A estrutura social do Brasil colonial seguia o modelo
colonizador português, excetuados apenas os “índios bravios” e os poucos
estrangeiros aqui residentes.
Havia uma minúscula elite, composta por portugueses que
possuíam títulos nobiliárquicos concedidos pela metrópole, estrangeiros a
serviço da Coroa e por brasileiros, os chamados nobres da terra, igualmente
agraciados por títulos em função de seus feitos em terra brasilis.
A esses eram reservados os postos na administração pública,
o oficialato militar e cargos eclesiásticos. Eram exemplos de tais postos:
ouvidores, desembargadores, diretores de empresas, comandantes, bispos etc.
Aqueles que não possuíam títulos, fossem ricos ou pobres,
poderiam obtê-lo (em geral, o título de Cavaleiro da Ordem de Cristo) por meio
do diploma universitário (especialmente o obtido em Coimbra), ou por alcançar
alguma conquista excepcional em nome do Rei (podendo ter sido o feito realizado
por algum antepassado). O pedido era analisado e poderia ser concedido ou não.
Esse pedido poderia ser feito por qualquer um, até mesmo
aqueles preconceituosamente classificados como “gente de infecta nação”:
negros, cristãos-novos (em geral, judeus), mouros, ciganos ...
Os índios puderam ser feitos escravos até por volta do
século XVII. Desde então restou vedada tal prática, após acordo entre os
monarcas português e espanhol. Passaram então à condição de cidadãos vassalos
do rei luso.
Existiam aqueles que eram ricos, porém destituídos de
títulos. A esses, restava viver de maneira fausta, fazendo questão de assim serem
notados. Era essencial a eles possuírem ao menos três residências: uma
localizada na cidade, normalmente um sobrado de alto estilo, numa rua central
da urbe; uma casa de campo, numa chácara localizada no subúrbio, porém próxima
de um centro urbano, onde dispunham de belos jardins, pomares, quartos para
hóspedes etc.; e uma casa rural, sede de sua imensa fazenda.
Era igualmente importante contar com uma capela, em pelo menos
uma das residências, tanto melhor se fosse reconhecida como hábil à celebração
de atos litúrgicos de missa, batizados, casamentos...
Outra ocasião importante para inscrever seu nome na lista de
“homens bons” (isto é, habilitados a exercer o cargo de vereador) era o trajeto
entre a chácara e a cidade. Era quando se exibiam riqueza e o comportamento
nobre: veículos de alto padrão, números de animais, luxuosos arreios,
quantidade de escravos a seu dispor, criados e vestimentas que os adornavam...
Na escala social, abaixo dos restritos “elitizados”,
encontravam-se os plebeus livres (forros ou libertos). Por algum motivo, haviam
escapado do cruel destino da escravidão.
Em 1796, a capitania do Rio de Janeiro contava com 182.757
pessoas: 39,92% brancos; 10,48% pardos libertos; 3,60% pretos livres e 46%
escravos (pretos ou pardos). No total, havia cerca de 84 mil escravos.
Outro fator de conformação da sociedade eram as confrarias.
Recebiam diversos nomes: irmandades, ordem terceira, maçonaria etc. Exerciam
funções culturais, religiosas, de sociabilidade e de proteção aos mais
necessitados.
As confrarias ligadas ao exercício de uma profissão procuravam
proteger o mercado de trabalho de seus membros. Faziam parte desse grupo as
irmandades: de São José (pedreiros, carpinteiros...), de São Jorge (ferreiros,
latoeiros...), a dos alfaiates, dos ourives, dos sapateiros etc.
Tais confrarias erigiram as mais belas igrejas do Rio de
Janeiro, todas regiamente decoradas.
Era assim que as pessoas garantiam também um enterro digno,
com direito à celebração de missas em sua memória, cortejo com acompanhamento do
pároco etc.
Essas irmandades também procuravam assegurar a alforria dos
membros pretos e pardos.
Em festas e procissões, cada confraria ocupava uma posição
no cortejo compatível com sua posição na hierarquia da Igreja.
Os preconceitos consolidados na sociedade transpareciam nos
estatutos das confrarias. As de brancos eram vedadas a negros, miscigenados,
cristãos-novos, ciganos etc. As de negros eram franqueadas a brancos, mulatos;
A Irmandade de Santa Cecília, protetora dos músicos, eram integralmente
democrática: entrava qualquer pessoa, fosse músico, amante da música, músico
amador...
Intelectuais se organizavam em torno de Academias, literárias
ou científicas. Serviam para reuniões, para assistir a uma palestra de um
cientista importante, para discussões astronômicas, ministradas por brasileiros
ou estrangeiros.
O Rio de Janeiro do século XVIII contava com a Academia dos
Felizes, Academia dos Seletos, Academia Científica, Sociedade Literária.
A história do teatro em terra brasilis se iniciou no século
XVI, com os autos jesuíticos. As festas públicas ocorridas na cidade tinham uma
programação mais ou menos rígida: procissão, espetáculos pirotécnicos,
touradas, corrida de argolinhas e teatro. A primeira companhia de teatral data
de 29 de novembro de 1719. Tinha como objeto a apresentação de peças religiosas
e o presépio natalino.
Em 1748, a cidade contava com uma casa de espetáculos para
332 pessoas e 14 camarotes, localizado na rua da Alfândega. O proprietário
desta casa abriu uma segunda, por volta de 1757, ao lado do atual Paço Imperial.
O primeiro passou a ser chamado de Ópera Velha, em oposição ao segundo, agora Ópera
Nova. O Ópera Velha foi destruído num incêndio em 1769, quando era encenado “Os
encantos de Medeia”, de Antônio José da Silva.
Após a chegada da Família Real, em 1808, inaugurou-se um
novo teatro, em 1813, localizado na então Praça do Rocio, atual Praça
Tiradentes. Com isso, o Ópera Nova foi anexado ao palácio de dom João, nova
função do Paço Imperial, anteriormente residência do conde de Bobadela.
O Concílio de Trento estabelecera, no século XVI, que a
educação das crianças era dever de todos os pais católicos, mas, especialmente,
do padre da paróquia local. Era importante que se fosse alfabetizado para que
se pudesse praticar a fé de maneira correta, conforme a Bíblia e demais livros
sagrados. As aulas na cidade do Rio poderiam ser tomadas nas Ordens
(franciscanos, carmelitas, beneditinos, orfanato de São Joaquim para os meninos
pobres e a dos jesuítas, até 1759, quando foram expulsos. As aulas eram focadas
em alfabetização, contar e religião, no entanto apenas para meninos. As freiras
do convento da Ajuda e do recolhimento da Santa Casa de Misericórdia ministravam
aulas para as meninas.
A partir de 1760, após a extinção compulsória das atividades
dos jesuítas em Portugal, nasceu a educação pública. Os professores passaram a
ser remunerados pelos cofres Reais, que passaram a ministrar o ensino público e
gratuito nos mais diversos níveis: primeiras letras, gramática, latim, grego,
retórica, filosofia e, posteriormente, cirurgia e belas-artes.
Arquitetura militar, civil, matemática, ciências naturais,
topografia, dentre outras matérias, eram ensinados na Academia de Fortificações
do Exército. Atualmente essas funções estão divididas entre a Escola Militar e
a Escola de Engenharia.
Profissões como artífices, músicos e artistas eram
aprendidas com os mestres, vinculados às irmandades.
A leitura gratuita de livros, jornais e almanaques poderia
ocorrer nas bibliotecas das ordens religiosas, nas bibliotecas dos professores,
naquelas dos cursos dos mestres de ofícios, além das equivalentes particulares.
Havia diversas livrarias nas cidades. Mas a aquisição de
livros poderia ocorrer também pelo correio, encomendados a livreiros em Lisboa.
Quanto aos escravos, sua educação e instrução profissional dependiam
do interesse de seu senhor. Se a instrução do escravo permitia aumentar seu
nível de produtividade por um lado, por outro aumentava suas chances de se
libertar (alforria).
Os casamentos ocorriam geralmente entre pessoas da mesma
classe social e cor de pele, mas não eram raros os inter-raciais. Contudo, eram
mais raros os casamentos entre brancas e negros (o oposto era bem mais comum).
Rubem L. de F. Auto
Fonte: Livro “Histórias de Conflitos no Rio de Janeiro
Colonial”