Inicialmente, conforme singravam suas costas e procuravam
uma saída para a Ásia em seu périplo, a África não interessava diretamente aos
portugueses. Tratava-se apenas de um local para fundarem entrepostos e bases que
servissem de escala em suas jornadas para a Índia. Daí interessarem-se tanto
por ilhas e portos litorâneos.
Dificilmente se aventuravam em seu interior. Uma exceção
foram os franceses que, ainda em meados do século XVII, navegaram o Rio Senegal
adentro.
O papel mais importante nesse período foi o executado pelos
lançados – ou tangomaus. Eram chamados de lançados em referência à expressão “lançados
às praias”. Eram aventureiros ou degredados, largados nas costas africanas,
inicialmente, depois também na América e na Ásia. Foram eles que estabeleceram
redes comerciais entre europeus e africanos.
A grande maioria sucumbia às doenças e aos ataques, mas os
que sobreviviam adquiriam tanto imunidades quanto conhecimento da geografia
local. Aprendiam a língua dos povos com quem travavam contato, seus usos e
costumes comerciais. Muitos se tornavam responsáveis por atividades comerciais
relevantes.
Importante lembrar que a Ilha de Cabo Verde, cuja
colonização se iniciara em 1462, era ponto importante para o comércio com a África.
E mais, a atuação comercial mais importante na ilha estava em mãos de mulatos,
cuja miscigenação se dava com mulheres africanas. Este fato causou preocupação
na Coroa portuguesa, que enviou grande contingente de mulheres brancas, pois
temiam que os mulatos fossem menos leais à Coroa portuguesa por sua meai
ascendência africana.
No início do século XVII, outras nações européias começaram
a desembarcar na costa da África, como os holandeses e os ingleses. Os
holandeses iniciaram suas aventuras africanas atacando as possessões
portuguesas: atacaram El Mina, na Costa do Ouro, em 1637; depois, ocuparam
Luanda, capital de Angola, entre 1641 e 1648. Finalmente, em 1652, fundaram a
Cidade do Cabo.
Os ingleses faziam incursões regulares na África desde 1533.
Em diversas oportunidades tiveram entreveros com os portugueses.
A Companhia Francesa da África Ocidental foi fundada em 1626
e os franceses logo se estabeleceram no Senegal.
Nesse período, o produto de exportação por excelência, o
grande interesse europeu no continente, eram os escravos. Por esse motivo,
durantes os séculos XVI e XVII houve a formação de novas organizações políticas
cujas bases eram o comércio de escravos: os achântis e os iorubás, por exemplo.
A contrapartida mais desejada pelos africanos eram as armas de fogo.
Em meados do século XIX, quando o comércio de escravos foi
extinto, essas nações demonstraram toda a fragilidade sobre a qual foram
erguidas, pois não restara qualquer atividade econômica relevante afora aquele
degradante comércio de seres humanos. A atividade econômica costeira levou ao
definhamento o tradicional comércio transaariano.
As mudanças políticas decorrentes da instalação de mais de
trinta fortes europeuis na Costa do Ouro eram inevitáveis. Inicialmente, os
europeus deveriam pagar tributos para os líderes locais, pelo direito de lá se
estabelecerem. Mas em alguns lugares os europeus rapidamente passaram a
prevalecer em relação aos povos locais, e então o dever de pagar tributos se
inverteu. Outros efeitos foram mais sutis, mas igualmente importantes.
Os fortes europeus empregavam africanos, que lá trabalhavam
segundo o esquema de trabalho assalariado. Lá, aprendiam diversos ofícios, além
de aprenderem a realizar de maneira mais refinada o ofício que dominavam.
Ainda, muitos europeus tiveram filhos miscigenados, que já cresciam em contato
com estrangeiros.
Assim surgiram africanos que conseguiam estabelecer contato
facilmente com os europeus, tornando-se intermediários no trato com chefes
africanos. Muitos destes se tornaram pessoas bastante poderosas.
A sistematização do tráfico de escravos levou a uma
restrição da moeda de troca em torno de produtos realmente valiosos. Agora, os
comerciantes africanos exigiam, além do tradicional cauri (que servia como moeda
local), tecidos, armas de fogo, facas, pólvora, bebidas alcoólicas, fumo,
açúcar, bacias de cobre. Desnecessário dizer que produtos de consumo como esses
eram incapazes de desenvolver qualquer atividades econômica na África (ao
contrário do que ocorria na Europa, em que a demanda por esses produtos para as
trocas comerciais ajudou a dar início à Revolução Industrial).
Completando ao cenário apocalíptico que se desenhava, a
drenagem de mão de obra começava a dar sinais de sua perversidade, embora
relativamente compensada por não envolver mulheres.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Desvendando a história da África”
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