O local onde se desenvolveram as principais civilizações
africanas atende pelo nome de Sahel: é onde se encontram o deserto do Saara e
as savanas africanas, isto é, local de encontro dos pastores nômades do deserto
com os agricultores sedentários. Inevitável que ali surgisse uma relação de
troca comercial complementar.
Pelo Sahel passavam as principais rotas comerciais do
deserto, com suas caravanas e cidades intermediárias, que conformavam uma rede
comercial imensa. Essa imensa atividade econômica desenvolveu toda uma gama de
serviços correlatos: tributos de passagem, hospedagem, serviços de guias,
serviços de guarda e proteção etc.
Por exemplo, iam para o Sudão africano o sal, o cobre,
artefatos em vidro, pedras raras, perfumes, panos de algodão, tâmaras e
espadas. Na direção contrária iam goma, âmbar, pimenta malagueta, marfim, peles
e homens escravizados.
O deslocamento se dava por camelo ou no lombo de jumentos.
As mercadorias mais valorizadas eram sal, ouro e escravos.
O alicerce sobre o qual se ergueram as grandes civilizações
locais foi a tomada de controle sobre as regiões produtoras dessas riquezas. O
acesso às salinas, às minas de ouro, o controle sobre cruzamentos de vias
comerciais relevantes, verteram para si montantes de recursos que financiaram a
criação de centros de poder e formas de Estados.
Exemplo mais dramático era o tráfico de cativos na região
subsaariana. Aristocracias guerreiras dominavam e escravizavam outros grupos,
que eram posteriormente trocados por mercadorias, em geral ligadas à guerra,
como cavalos.
Provavelmente a história do reino de Gana, cujo início teria
se dado no século VIII, deu-se nesses termos. Localizado entre o Saara e as
cabeceiras dos rios Níger e Senegal, era estratégico para a dominação das rotas
de comércio entre o deserto e a savana.
Logo conhecida como “terra do ouro”, controlava o fluxo de
ouro que provinha do sul, por um lado, e o fluxo de sal, em sentido inverso. A
riqueza que se acumulava necessitava de proteção, o que foi alcançado com a
emergência de um poderio militar, além da coordenação administrativa necessária
para governar tal território, a cada dia mais complexo.
Crê-se que a primeira dinastia governante do Gana tenha sido
de cameleiros do deserto, que se instalaram nos portos do Sahel com vistas ao
comércio do ouro. Essa também foi a porta de entrada no Islã na região, como se
lê nos textos de viajantes árabes da época.
Interessante notar que o controle administrativo recaía
muito mais sobre as pessoas do que sobre o território, isto é, a influência do
governante era exercida sobre diversos grupos de súditos, não importando tanto
o território que ocupavam. Assim é que cidades distantes, porém importantes
centros de comércio, contavam com certa autonomia, mas eram suseranas; por
outro lado, a capital Kumbi Saleh era dividida em duas, uma cidade era o centro
administrativo do reino de Gana, enquanto a outra metade era um centro de
reunião de comerciantes muçulmanos, portanto quase soberana em seus desígnios.
O comércio foi fulcral tanto para o nascimento quanto para a
derrocada do reino de Gana. A perda do controle sobre as rotas comerciais cujo
monopólio do ouro e da cunhagem de moeda caía agora em mãos de povos
islamizados. Já no século XII o resultados desse enfraquecimento era bastante
aparente.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Desvendando a história da África”
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