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quinta-feira, 24 de maio de 2018

A DESCOLONIZAÇÃO DA ÁFRICA NO CALOR DA GUERRA FRIA


O processo de descolonização da África teve início nos anos 1960, mas não havia envolvido ainda os chamados “bastiões brancos” do sul do continente. Portugal refutara totalmente a idéia de conceder a independência a Angola e Moçambique.

A África do Sul era governada exclusivamente por brancos que correspondiam a apenas 20% da população e ainda governava de fato a Namíbia. A Rodésia (atual Zimbábue), governada por brancos que mal chegavam aos 5% da população, apoiou Ian Smith em seu grito pela independência do país em 1965, mas Londres não reconheceu essa jogada.

Mas o maior caso mais complexo ocorria na África do Sul, com seu repugnante racismo constitucional. Este país tinha muita relevância econômica e estava plenamente associado a empreendimentos e empresas transnacionais – o sul do continente africano é riquíssimo em minerais fundamentais no mundo moderno, possui grandes extensões de terras férteis e detém posição geopolítica estratégica por sua proximidade com rotas marítimas entre o Atlântico e o Índico.  

A África portuguesa conseguiu sua independência após mais de 15 anos de lutas ferrenhas – o processo foi relativamente acelerado após a Revolução dos Cravos, em 1974. Moçambique conseguiu se libertar dos lusitanos liderado por Samora Machel, da Frelimo.

Vitoriosos, Moçambique passou a ser governado exclusivamente por negros que se declaravam marxistas-leninistas. Um governo negro e comunista agora vizinho dos brancos racistas da Rodésia e da África do Sul foi capaz de contagiar a maioria reprimida e em 1976 ocorreu o Levante de Soweto (localidade mais miserável de Joanesburgo), que foi duramente reprimido, mas capaz de chamar a atenção do mundo para aquela realidade inaceitável.

Nesses anos também se deu a independência de outras colônias portuguesas: Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe.

Mas a ex-colônia portuguesa mais expressiva era Angola, cujo processo de independência foi acompanhado de perto: era economicamente forte por dispor de petróleo, ferro, diamantes, além de metais bastante valorizados; e tinha uma minoria branca muito forte politicamente. O  que se viu foi um confronto sangrento envolvendo diversos  grupos sedentos por assumir o poder na ex-colônia: a Frente Nacional de Libertação de Angola, apoiada pelos EUA; tropas vindas do Zaire, ao norte; o Movimento Popular para a Libertação de Angola, o MPLA de Agostinho Neto, o mais forte dos três, que contou com apoio fundamental de militares cubanos, enviados ao milhares, tanto soldados quanto instrutores. Note-se que grande parte daqueles cubanos eram descendentes de angolanos levados para a América como escravos. Havia ainda a guerra no sul do país, envolvendo a União para a Independência Total de Angola (UNITA), que, ao lado do exército sul-africano, um dos mais poderosos do mundo então, declarava uma guerra-relâmpago contra o MPLA.

A situação difícil em que se encontrava o MPLA ensejou a criação de uma ponte aérea entre Luanda e Havana, que serviu para o envio de uma tropa de mais de 20 mil soldados cubanos, que lograram êxito ao expulsarem o exército sul-africano do centro do país, uma vitória realmente assombrosa se considerarmos a força das tropas sul-africanas.

Após a vitória, o MPLA passou a governar o país recém-independizado, declarando seguir a linha marxista-leninista: mais uma república negra e comunista, para calafrios dos vizinhos capitalistas e racistas. Contudo a guerrilha no sul, envolvendo a UNITA e seu líder Jonas Savimbi, apoiado e financiado pelo governo sul-africano e pelos EUA.

Ao mesmo tempo, Angola tentava infiltrar na Namíbia os agentes-guerrilheiros da Organização Popular do Sudoeste Africano – SWAPO, o que levou a África do Sul a ocupar uma faixa de terra no sul de Angola, com a intenção de impedir essa invasão. Em resposta, Angola enfileirou seus homens ao norte dos soldados sul-africanos.  

Todas as lutas de independência africanas sofreram com o mesmo problema: após a debandada dos colonos brancos, pouco sobrava em termos de capitais, conhecimentos técnicos e administrativos, enquanto as guerras internas e externas consumiam os poucos recursos disponíveis, inclusive em termos humanos.
A Etiópia era governada pela marionete de Washington Haile Selaissie, quando foi derrubado em 1974 por meio de um golpe militar. O país sofria com miséria aguda, seca, guerrilhas muçulmanas e esquerdistas na vizinha Eritréia. O novo governo, de matiz esquerdista, pôs em curso uma reforma agrária, rompeu com os EUA e parecia conseguir conter a oposição aguerrida.

Em 1977, em meio a rebeliões separatistas, que acometiam diversos países da região, a Somália, governada por socialistas e aliada da URSS, atacou a Etiópia, com apoio de Moscou.

Nesse período, membros da CNA (Congresso Nacional Africano) iniciaram uma série de atentados na África do Sul, o que levou o governo a aumentar a repressão contra a maioria negra e a investir pesadamente em armamentos para seu exército.

Já na Rodésia, o inimaginável aconteceu: subiu ao poder a ZANU (União Nacional Africana do Zimbábue), por meio de eleições coordenadas pela Grã-Bretanha. O novo presidente, Robert Mugabe, formou um governo de coalizão com o ZAPU (União do Povo Africano do Zimbábue) e procurou oferecer garantias aos colonos brancos de que seus investimentos estavam seguros naquele novo país. A economia continuo a prosperar e ele teve o apoio necessário para encaminhar as reformas que beneficiariam a maioria negra. Além disso, o país foi rebatizado para Zimbábue, nome de origem africana, em lugar da ridícula homenagem ao empresário de origem britânica.

Após mais este capítulo, a África do Sul ficou completamente isolada na região, mas mantinha seus ataques bombardeios ininterruptos aos vizinhos revolucionários e mal-comportados.


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “Desvendando a história da África”  

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