O processo de descolonização da África teve início nos anos
1960, mas não havia envolvido ainda os chamados “bastiões brancos” do sul do
continente. Portugal refutara totalmente a idéia de conceder a independência a
Angola e Moçambique.
A África do Sul era governada exclusivamente por brancos que
correspondiam a apenas 20% da população e ainda governava de fato a Namíbia. A
Rodésia (atual Zimbábue), governada por brancos que mal chegavam aos 5% da
população, apoiou Ian Smith em seu grito pela independência do país em 1965,
mas Londres não reconheceu essa jogada.
Mas o maior caso mais complexo ocorria na África do Sul, com
seu repugnante racismo constitucional. Este país tinha muita relevância econômica
e estava plenamente associado a empreendimentos e empresas transnacionais – o sul
do continente africano é riquíssimo em minerais fundamentais no mundo moderno,
possui grandes extensões de terras férteis e detém posição geopolítica
estratégica por sua proximidade com rotas marítimas entre o Atlântico e o
Índico.
A África portuguesa conseguiu sua independência após mais de
15 anos de lutas ferrenhas – o processo foi relativamente acelerado após a
Revolução dos Cravos, em 1974. Moçambique conseguiu se libertar dos lusitanos
liderado por Samora Machel, da Frelimo.
Vitoriosos, Moçambique passou a ser governado exclusivamente
por negros que se declaravam marxistas-leninistas. Um governo negro e comunista
agora vizinho dos brancos racistas da Rodésia e da África do Sul foi capaz de
contagiar a maioria reprimida e em 1976 ocorreu o Levante de Soweto (localidade
mais miserável de Joanesburgo), que foi duramente reprimido, mas capaz de
chamar a atenção do mundo para aquela realidade inaceitável.
Nesses anos também se deu a independência de outras colônias
portuguesas: Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe.
Mas a ex-colônia portuguesa mais expressiva era Angola, cujo
processo de independência foi acompanhado de perto: era economicamente forte
por dispor de petróleo, ferro, diamantes, além de metais bastante valorizados;
e tinha uma minoria branca muito forte politicamente. O que se viu foi um confronto sangrento
envolvendo diversos grupos sedentos por
assumir o poder na ex-colônia: a Frente Nacional de Libertação de Angola,
apoiada pelos EUA; tropas vindas do Zaire, ao norte; o Movimento Popular para a
Libertação de Angola, o MPLA de Agostinho Neto, o mais forte dos três, que
contou com apoio fundamental de militares cubanos, enviados ao milhares, tanto soldados
quanto instrutores. Note-se que grande parte daqueles cubanos eram descendentes
de angolanos levados para a América como escravos. Havia ainda a guerra no sul
do país, envolvendo a União para a Independência Total de Angola (UNITA), que,
ao lado do exército sul-africano, um dos mais poderosos do mundo então, declarava
uma guerra-relâmpago contra o MPLA.
A situação difícil em que se encontrava o MPLA ensejou a
criação de uma ponte aérea entre Luanda e Havana, que serviu para o envio de
uma tropa de mais de 20 mil soldados cubanos, que lograram êxito ao expulsarem
o exército sul-africano do centro do país, uma vitória realmente assombrosa se
considerarmos a força das tropas sul-africanas.
Após a vitória, o MPLA passou a governar o país recém-independizado,
declarando seguir a linha marxista-leninista: mais uma república negra e
comunista, para calafrios dos vizinhos capitalistas e racistas. Contudo a
guerrilha no sul, envolvendo a UNITA e seu líder Jonas Savimbi, apoiado e
financiado pelo governo sul-africano e pelos EUA.
Ao mesmo tempo, Angola tentava infiltrar na Namíbia os agentes-guerrilheiros
da Organização Popular do Sudoeste Africano – SWAPO, o que levou a África do
Sul a ocupar uma faixa de terra no sul de Angola, com a intenção de impedir
essa invasão. Em resposta, Angola enfileirou seus homens ao norte dos soldados
sul-africanos.
Todas as lutas de independência africanas sofreram com o
mesmo problema: após a debandada dos colonos brancos, pouco sobrava em termos
de capitais, conhecimentos técnicos e administrativos, enquanto as guerras
internas e externas consumiam os poucos recursos disponíveis, inclusive em
termos humanos.
A Etiópia era governada pela marionete de Washington Haile
Selaissie, quando foi derrubado em 1974 por meio de um golpe militar. O país
sofria com miséria aguda, seca, guerrilhas muçulmanas e esquerdistas na vizinha
Eritréia. O novo governo, de matiz esquerdista, pôs em curso uma reforma
agrária, rompeu com os EUA e parecia conseguir conter a oposição aguerrida.
Em 1977, em meio a rebeliões separatistas, que acometiam
diversos países da região, a Somália, governada por socialistas e aliada da
URSS, atacou a Etiópia, com apoio de Moscou.
Nesse período, membros da CNA (Congresso Nacional Africano)
iniciaram uma série de atentados na África do Sul, o que levou o governo a
aumentar a repressão contra a maioria negra e a investir pesadamente em armamentos
para seu exército.
Já na Rodésia, o inimaginável aconteceu: subiu ao poder a
ZANU (União Nacional Africana do Zimbábue), por meio de eleições coordenadas
pela Grã-Bretanha. O novo presidente, Robert Mugabe, formou um governo de
coalizão com o ZAPU (União do Povo Africano do Zimbábue) e procurou oferecer
garantias aos colonos brancos de que seus investimentos estavam seguros naquele
novo país. A economia continuo a prosperar e ele teve o apoio necessário para
encaminhar as reformas que beneficiariam a maioria negra. Além disso, o país
foi rebatizado para Zimbábue, nome de origem africana, em lugar da ridícula
homenagem ao empresário de origem britânica.
Após mais este capítulo, a África do Sul ficou completamente
isolada na região, mas mantinha seus ataques bombardeios ininterruptos aos
vizinhos revolucionários e mal-comportados.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Desvendando a história da África”
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