A chegada dos portugueses no território da atual Angola se
deu em 1482, sob o comando do capitão Diogo Cão. Testemunharam esses
portugueses aglomerações humanas fortemente estruturadas em reinos, como e
reino do Congo e diversos outros, seus tributários, como o Reino de Lunda. Mais
ao sul existiam diversas tribos de bosquímanos, que desconheciam a agricultura
e o pastoreio.
Os reinos do Congo e de Luna eram os principais econômica e
socialmente, praticavam a modo produção escravagista, segundo o qual os
escravos eram de propriedade da aristocracia e dos chefes administrativos das
províncias. Os principais trabalhos eram executados por escravos.
As relações iniciais entre portugueses e autoridades locais
foram pacíficas, missionários introduziram o cristianismo, comerciantes
transformaram Luanda numa importante praça de comércio internacional. Essa
seria a realidade das primeiras cinco décadas de relacionamento.
Foi a partir do mandato do governador Paulo Dias de Novais
que se iniciaram as investidas militares contra Angola. Entre 1560 e 1574 tomou
lugar uma ocupação militar que chegou a vitimar o próprio governador, capturado
e feito escravo pelo rei Ngola Kiluanje, do reino do Ndongo, por seis anos.
O cativeiro de Novais terminou quando ele e um embaixador
local foram enviados a Portugal, levando um pedido de ajuda de Ngola ao rei
português em sua luta contra os reinos africanos vizinhos ao seu. Em troca,
comprometia-se a realizar comércio pacífico com Portugal. Assim, em 1575,
Novais retorna a Luanda, constrói uma igreja e começa a povoação portuguesa em
Angola.
Após serem expulsos de Pernambuco, os holandeses se lançam
sobre Angola, em sua luta para tomar um naco do império português. Por sete
anos, de 1641 a 1648, os batavos controlaram a maior parte da Angola
portuguesa, que a essa altura servia como o principal porto de embarque de
escravos para o Brasil. Ao fim do período citado, os holandeses também foram de
lá expulsos, viajaram para o sul, seguindo a costa, e então fundaram a colônia
do Cabo, embrião da futura África do Sul.
Mas a expulsão dos holandeses de Angola somente seria
possível devido à fundamental ajuda brasileira, que compreendia o envio de
navios e homens que, em 1648, deixaram o Recife.
Interessante notar que, nessa época, houve uma proto-industrialização
do Brasil, que levou à demanda por trabalho escravo qualificado, e este era
encontrado nas cortes africanas, mais especificamente os cativos dos reis. Logo
os portugueses se voltaram para esses escravos, mandaram-nos para o Brasil e aumentaram
bastante os incentivos para que os reinos africanos se engalfinhassem em busca
de mais escravos, para comercializar com Portugal, destinados ao Brasil e às demais
colônias.
Mas Angola nunca se rendeu totalmente, sendo possível
acompanhar diversas rebeliões e movimentos anti-coloniais. Mas um novo capítulo
se iniciou em 1822, após a independência do Brasil.
Ficou rapidamente evidente que os brasileiros pretendiam
anexar Angola à Federação brasileira, antes que se tornasse independente e no
intuito de garantir o fluxo de escravos para o Brasil – além de tornar Angola
num mercado cativo para os produtos brasileiros, gerando assim a demanda que
permitiria a industrialização do Brasil. Perceba-se que este foi um movimento
dos usineiros, não do governo propriamente. E visavam a tirar Portugal do papel
de intermediário no comércio entre Brasil e Angola. O método utilizado seria
mediante fortalecimento de movimentos rebeldes em Luanda e Benguela contra os
lusos.
Havia o interesse dos traficantes de escravos também. Os
ingleses fizeram Portugal decretar o fim do tráfico de escravos em 1836. O
temor em Portugal foi tamanho que o Brasil assinou um acordo com Portugal pelo
qual o primeiro se comprometia a não incorporar colônias do segundo.
Mas o Brasil assinaria em 1850 a extinção do tráfico de
escravos. Como resultado, as relações Brasil-Angola entraram em declínio:
eliminou-se de um dos principais produtos cambiados e angola passou a país
exportador de matérias-primas e de produtos minerais, o que punha aquele país
como um dos grandes concorrentes do país nos mercados mundiais.
Aliás, Brasil e Angola praticavam até então um intercâmbio
comercial rico, para além do tráfico de escravos. Angola exportava para o
Brasil ouro em pó, marfim, óleo de amendoim, cera branca e amarela, azeite de
dendê, e outros; o Brasil exportava para Angola aguardentes, açúcar, tabaco, e
ainda reexportava produtos europeus e asiáticos, como tecidos, lenços, vinho,
manteiga, etc.
Existiam em Angola, naquela época, algumas facções das
classes ricas que nutriam sentimentos um tanto distintos quanto ao futuro da
colônia: alguns ricos queriam uma Angola independente, nos moldes do Brasil;
outros, queriam a permanência de Angola como colônia portuguesa; e alguns
outros, ligados ao comércio com o Brasil, queriam Angola como parte da Federação
do Brasil.
Já o povo não queria nada daquilo: protestavam e
manifestações sacudiram Luanda e Benguela, locais dos portos mais importantes,
entoando gritos anti-Portugal e anti-Brasil. Embora demonstrassem a recusa dos
Angolanos a aceitar a invasão estrangeira, esses protestos desuniram o povo
contra um inimigo comum, o que levou os portugueses a conquistarem pela
primeira vez em séculos todo o território angolano, por volta de 1900.
Durante a primeira parte do século XIX, quando o mundo
parecia abraçar a filosofia do liberalismo e do livre-mercado, Angola era um
centro de comércio relativamente aberto, negociando com Portugal, Inglaterra,
França, Alemanha, Bélgica, dentre outros. Procuravam ouro, marfim e escravos.
Tudo mudou novamente quando o acirramento das disputas
comerciais, ao lado de uma crise econômica global provocada por excesso de
produção, levou ao imperialismo nas metrópoles européias. Por volta de 1884,
quase todo o continente estava tomada pelas potências da época. Os conflitos decorrentes
dessa invasão do continente levaram à Conferência de Berlim. Ali se acordou a partilha
da África.
Uma das resoluções da Conferência definia que somente poderia
ter colônia quem a ocupasse militarmente; deveriam-se respeitar os acordos
firmados com soberanos africanos; a escravidão deveria ser abolida; os nativos
deveriam ser civilizados.
Em 1940, a população em Angola era de 3.738.010 pessoas; em
1950, esse número já era de 4.145.184 habitantes. Este aumento de 11% em apenas
10 anos refletia o influxo incessante de brancos, cuja imigração era
incentivada pelo governo português. A década seguinte veria o fortalecimento e,
em alguns casos, armamento das lutas anti-coloniais.
Em 1953, surge o primeiro partido político nacionalista de
angola, o PLUA – Partido da uta Unida dos Africanos de Angola. Alguns
dirigentes do PLUA fundaram o MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola,
de orientação marxista. Também surgiram em sequência o MINA – Movimento para
Independência Nacional de Angola, a UPNA – União das Populações de Angola, e
muitas outras.
Após, surgiram as forças de libertação propriamente ditas,
armadas e militarizadas. Foi o caso da FNLA – Frente Nacional para a Libertação
de Angola, surgida em 1962, e da UNITA – União Nacional para Independência
Total de Angola. Esta última era liderada por Jonas Savimbi, apoiada por EUA e
África do Sul, e de fundamentação ideológica capitalista.
Em 4 de fevereiro de 1961, diversas cadeias de Luanda foram
atacadas por membros do MPLA, que libertaram vários presos políticos. Foi dada
a largada na corrida pela independência nacional. Mas o grande obstáculo eram as
muitas riquezas do país – como minas de metais valiosos e jazidas de petróleo –
que opunham grupos locais e interesses transnacionais.
O MPLA era apoiado e financiado pela URSS, Cuba e demais
membros do Pacto de Varsóvia. A FNLA recebia apoio estadunidense e do Zaire
(atual República Democrática do Congo). A UNITa era financiada pela África do
Sul do apartheid e pelos EUA.
Apesar desses conflitos, a economia de Angola crescia
surpreendentemente: entre 1963 e 1973, crescia 7%, levando a rede de supermercados
Pão de Açúcar a inaugurar uma das suas maiores lojas em Luanda, capital de
Angola.
O fim da ditadura em Portugal (Salazar e Caetano), após a
Revolução dos Cravos, levou ao fim tardio do império português após o
reconhecimento da independência de Angola. A transição foi regulada pelo Acordo
de Alvor, de 1975, firmado por membros do MPLA, FNLA e UNITA, além de membros
do governo português, que transfeririam o poder formalmente m 11 de novembro de
1975, dia da independência. Mas um Acordo estabelecido entre partes tão
distintas estava fadado a não ter vida duradoura.
O MPLA, mais forte dos movimentos populares, sentiu-se
enfraquecido pelo Acordo, saiu da aliança e, no dia da transferência do poder,
declarou unilateralmente a independência de Angola. O Brasil foi o primeiro
país do mundo a reconhecer o novo país e a legitimidade do governo do MPLA. Sem
dúvidas o governo brasileiro de Geisel não se sentia confortável com um novo
governo angolano tão próximo da URSS e de Cuba, numa região geopoliticamente
sensível – foco de crescentes interesses brasileiros, econômicos e geopolíticos,
mas prejudicados pelo caráter autoritário do regime, o que gerou muitas
resistências e repúdio ao Brasil naquela região. Optou-se por apoiar o MPLA, por
ser o mais forte dos movimentos independentistas, sob a liderança de Agostinho
Neto. Além do mais, sua forte influência religiosa continha um pouco o discurso
comunista – que é fundamentalmente ateu.
A independência de Angola viu se iniciar, na sequência, sua trágica
guerra civil. De 1975 a 1991, as contradições entre os projetos de governo dos
diversos grupos pela libertação, como a UNITA, que abraçou a causa do
capitalismo, apoiada pelos EUA e pela África do Sul do apartheid, em oposição aos
marxistas do MPLA, levou o país a uma dos episódios mais sangrentos que o mundo
veria em breve. Em 1988, quando a Guerra Fria acabava, a ONU se via forçada a
enviar uma missão de paz no país.
Forma-se uma “troika” de observadores, composta por EUA, Rússia
e Portugal, os principais players com interesses de longa data em Angola, para
acompanhar as negociações de paz.
As negociações de paz, plasmadas na forma dos Acordos de NY,
firmados na sede da ONU, deram origem à UNAVEM I, missão da ONU para fiscalizar
o cumprimento do Acordo.
As negociações de paz entre MPLA e UNITA ensejaram os
Acordos de Bicesse, assinado em Portugal e à criação da UNAVEM II. Firmaram
este documento: José Eduardo dos Santos, sucessor de Agostinho Neto na
presidência de Angola; Jonas Malheiro Savimbi, da UNITA; Cavaco Silva, primeiro-ministro
de Portugal; Peres Cuellar, Secretário-Geral da ONU; James Baker, secretário de
política exterior dos EUA; Alexandre Brassmertnykh, sua contraparte russa;
Joweri Musevini, presidente da OUA, Organização da Unidade Africana. O
principal acordo foi sobre a realização de eleições presidenciais em 1992, das
quais a UNITA participaria como partido, com candidato.
As eleições ocorreram, mas o resultado não foi o pretendido:
a UNITA não aceitou o resultado das urnas, apesar da garantia dada pela ONU de
que o pleito foi legítimo – aliás, os únicos casos de fraude ocorreram nas
áreas dominadas pela UNITA. O resultado foi: MPLA, obteve 49,57% dos votos; a
UNITA obteve 40,07% - portanto deveria haver um segundo turno, mas a UNITA
abandonou a disputa presidencial antes disso. Seguiram-se confrontos armados em
Luanda, que duraram uma semana, deixaram mais de mil mortos e terminaram com a
expulsão da UNITA de Luanda. O MPLA agora inaugurava um mandato legítimo,
consagrado nas urnas, enquanto a UNITA dava início à segunda guerra civil
angola, que se estenderia até 2002.
Nesse meio tempo, com as mudanças drásticas da geopolítica,
o caráter marxista do governo de Angola foi sendo deixado de lado, enquanto se
adotava a economia de mercado e o pluripartidarismo. O discurso pró-mercado da
UNITA já não reverberava tanto. Os EUA reconheceram a legitimidade do governo
angolano em 1993, e isso deixou a UNITA sujeita a sanções aplicadas pela ONU.
Em 20 de novembro de 1994, ocorre a assinatura do Protocolo
de Lusaka e a subseqüente criação da UNAVEM III – mas com a ausência de Jonas
Savimbi. Aliás, a UNITA não ajudou em qualquer momento, nem com a elaboração de
um governo de unidade.
Em 30 de junho de 1997 a UNAVEM III é extinta e substituída
pela MONUA, uma missão de observação. Durante essa missão, um fato trágico
ocorreu: dois aviões a serviço da ONU foram abatidos quando sobrevoavam Angola,
na área dominada pela UNITA. Mas já em 1999 a missão foi declarada
desnecessária pelo governo de Angola, restando apenas um escritório da ONU no
país. Em 2002, Jonas Savimbi foi morto em combate, o caminho estava aberto para
as negociações de paz definitivas.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Desvendando a história da África”
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