Inicialmente, o que atriu os romanos à região da Lusitânia
foi o ouro. Um dos governadores da Província foi Plínio, o Velho, de 70 a 75
d.C. Ele dizia que o gigantesco veio de ouro que se estendia pela Lusitânia,
Galiza, até as Astúrias era o maior do mundo (mundo conhecido dos romanos era
equivalente a duas Europas, mais ou menos).
A regulação que Roma estabeleceu sobre a exploração do ouro
limitava as empresas a esta atividade dedicadas a 5.000 empregados por veio, em
toda a Ibéria. Após a revogação desse Decreto, Plínio calculou em 320 mil onças
a produção anual de ouro da Ibéria Ocidental. Diga-se: as reservas de ouro em Portugal eram de tal monta imensas que apenas em 1992 uma mina próxima a Jales,
Vila Real, teve suas atividades encerradas, tendo sido inaugurada ainda pelos
romanos. Sua produção incluía também prata, em montante duas vezes superior ao
do ouro. Geólogos calcularam em mais de U$ 1 bilhão de dólares a quantidade de
ouro ainda remanescente, esperando técnicas mais eficientes de exploração para
que seja retirado.
No entanto, as técnicas de exploração do ouro aos tempos dos
romanos impressionavam pela crueldade com os mineiros. Plínio testemunhou: “À
luz de lanternas, longos túneis foram rasgados nas vertentes das montanhas. Os
homens trabalhavam em longos turnos, podendo, durante meses a fio, não ter
acesso à luz do dia. Os tetos estavam sujeitos a ruir e a esmagar os mineiros
no seu interior. Apanhar ´[erolas ou pescar peixe roço nas profundezas do
oceano parecia, comparativamente, bastante mais seguro. Como fomos capazes de
tornar a terra perigosa!”
No norte de Portugal, a técnica de exploração de ouro era a
céu aberto. Por 200 anos a área foi laborada, tendo empregado mais de 2 mil
pessoas ao mesmo tempo.
Plínio mais uma vez se mostrou chocado com a louca ganância
que o metal despertava: “O método utilizado consistia em amassar a terra com
cunhas e britadeiras de ferro. A mistura de argila e cascalho era considerada
como a mais resistente e duradoura de todas – exceto a ganância pelo ouro, que
consegue ser ainda mais forte.”
Continuava o Velho, descrevendo as ações após a terra abrir
uma fissura, causada pelos golpes das ferramentas: “Com um grito ou um aceno, o
vigia dá ordem para os mineiros pararem, descendo rapidamente do seu posto. A
montanha rasgada desintegra-se com um estrondo inimaginável, que é acompanhado
por uma descolação de ar igualmente incrível. Quais heróis conquistadores, os
mineiros contemplam o seu trinfo sobre a natureza.”
A seguir, abriam-se as comportas dos reservatórios, previamente
construídos na montanha, e a água precipitava-se através de íngremes condutos –
estes caminhos da água eram feitos por homens pendurados em cordas nas encostas
das falésias.
As torrentes arrastavam pepitas de até 3 mil onças. Estas
ficavam presas nos degraus talhados nas rochas. O tojo de cascalho contendo os
fragmentos de ouro eram secados, queimados e o ouro recuperado das cinzas.
As técnicas romanas eram de tal forma avançadas, que foram
abanonadas após Portugal sofrer invasões seguidas de diversos povos, que eram
incapazes de entender como a água era bombeada, de modo a manter as minas
secas. Apenas no século XIX pode-se conceber um método compatível.
Na região do Alentejo, os romanos se apropriaram das minas
de cobre, prata, estanho, zinco e ferro dos cartagineses. Expandiram bastante a
produção desses locais. Outro metal valorizado era o chumbo branco, que
adicionado ao ferro, protegia-o de ferrugem.
Outros campos incluíam o de São Domingos, explorado por uma
empresa britânica até a década de 1960; e Aljustrel, cuja exploração mineral
permanece até hoje.
As minas do norte eram todas estatais. No Alentejo, as
concessões eram vendidas a empresários individuais ou grupos de mineiros. Após
a aquisição, os concessionários deveriam iniciar atividades em até 25 dias –
caso contrário, caducava e revertia ao Estado.
Antes da comercialização, fazia-se necessário pagar altos
impostos. As estradas locais eram patrulhadas para impedir evasão. A pena a
quem desobedecesse a lei eram longos anos de trabalho forçado.
A atividade mineira era a mais lucrativa, mas não a única.
As técnicas romanas de agricultura também mudaram o modo de vida da região. O
azeite, o vinho e os cereais já eram cultivados, porém em escala reduzida se
comparada com os anos posteriores. Imigrantes italianos trouxeram plantas e
compraram terras, que iam juntando com outras até atingirem extensões imensas,
da ordem de 2 mil hectares.
O trigo e vários frutos (secos ou conservados em mel) e o
esparto – utilizado no fabrico de cordas e velas -, eram exportados para a
Bélgica, Holanda e Inglaterra. Um tipo de azeite lusitano era considerado pelos
romanos o melhor do mundo, atingindo preços estratosféricos.
Quanto ao vinho, na década de 80 d.C., o Império viu-se
diante de uma enorme quantidade de vinho que não se conseguia vender. O
imperador Domiciano mandou arrancar todas as videiras de áreas que pudessem
produzir outra coisa. Reduzida a produção pela metade, percebeu-se que as
adegas passaram a produzir menos quantidade de um produto com melhor qualidade.
Consequentemente, as exportações explodiram. Atualmente, quase 2 mil anos
depois, os vinhedos ao sul do Tejo, plantados pelos romanos, continuam a
produzir vinhos de qualidade, comercializado na Itália e além.
Até por volta de 212 d.C., a população da região se
caracterizava pela homogeneidade, devido especialmente aos casamentos
inter-raciais. O imperador Caracala decidiu conceder cidadania romana a todos
os não-escravos residentes naquela região.
As mineradoras romanas dominavam este setor na Lusitânia. As
altas classes italianas possuíam também as grandes fazendas e fábricas. Em
geral, os proprietários também residiam em Roma. Portanto os lucros também eram
todos enviados à insaciável Roma.
Durante a longa era da Pax Romanii na Lusitânia os
municípios foram evoluindo para comunidades democráticas, muitos deles com
autonomia administrativa. Cidadãos elegiam magistrados, que administravam tais
municípios. Cobravam impostos, que pagavam colossais obras públicas: estradas,
pontes, aquedutos, templos, banhos públicos e teatros.
A degringolada do Império se deu ao mesmo tempo que cobrava
impostos crescentes e investia um obras e serviços públicos cada vez menos.
Desanimados, muitos abandonavam os municípios com o fim único de não pagar
impostos. Decreto imperial classificou como vedadas tais mudanças. Sem
recursos, muitos cidadãos passaram a se vender como escravos ( a alternativa
era a prisão por dividas).
Em dado momentos, foram suspensas as eleições para o cargo
de magistrado, passando a ser hereditários ( o filho do cobrador de impostos
era o próximo cobrador de impostos, compulsoriamente, sob pena de morte).
Outra forma de se proteger das garras fiados do Império era
servir a ele. Muitos lusitanos se alistavam nas legiões romanas, servindo em
Províncias no norte da África, Gália, Grã Bretanha... Alguns foram soldados de
Constantino, quando marchou para libertar uma Roma sitiada pelos Godos.
Na Lusitânia, os ricos italianos, organizados em uma casta
única e superior, viam seus bons dias esvaindo-se com o poder do Império. Não
integrados com os locais, viram duas das três legiões lá estacionadas para os
defender sendo extintas por falta de verbas. Além disso, Roma se esvaía.
A cada dia, os bárbaros do norte da Europa se aproximavam mais
do coração do império...
Rubem L. de F. Auto
Fonte: Livro “A Primeira Aldeia Global”
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