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quinta-feira, 31 de agosto de 2017

GUERRA DO ÍNDICO – O INÍCIO DA DOMINAÇÃO DO MUNDO


Seis meses após o regresso de Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral zarpou de Lisboa no comando de 13 embarcações e 1.200 homens e mantimentos para até 18 meses. Compunham a tripulação: marinheiros, soldados, artesãos e criminosos em liberdade condicional, além de herbanários, barbeiros-cirurgiões, médicos, nove sacerdotes e um mestre em cosmografia.

A caminho das Índias, Cabral fez uma breve parada na costa do Brasil. Aquela que a história oficial conta que teria sido por acidente... Bom, reclamou o território para Portugal.

Atingido por uma tempestade ao largo do cabo da Boa Esperança, perdeu quase metade da frota – incluindo a morte do comandante Bartolomeu Dias.

Chegaram a Calecute em setembro de 1500. Foi recebido pelo Senhor dos Oceanos e entregou-lhes os presentes que trouxera: prata, tigelas e clavas adornadas em ouro, tapetes de seda e tapeçarias finas – tinham algum valor.

O samorim havia sido informado sobre um navio do Sri Lanka, aportado contendo cinco elefantes. O samorim pediu que os portugueses o capturasse, o que foi feito. Receberam imediatamente autorização para comerciar.

Mas os problemas com os muçulmanos continuavam. Ao tentarem impedir o comércio com os portugueses, Cabral capturou seus navios. Os muçulmanos responderam atacando um entreposto português, matando 50 pessoas. Prenderam várias pessoas e apreenderam a mercadoria dos portugueses.

Cabral retorquiu apreendendo todos os navios de muçulmanos aportados e chacinaram seus tripulantes. Puseram as mercadorias árabes em seus navios e bombardearam a cidade de Calicute. Após destruírem vários edifícios, zarparam rumo a Coxim, ao sul de Calicute.

Foram bem recebidos pelos hindus locais, que viram ali uma oportunidade de detewr os muçulmanos, que já dominavam a região.

Ao longo dos anos, os portugueses estabeleceram em Coxim seu porto comercial mais importante. Sempre que os navios portugueses passavam por Calicute, aproveitavam para bombardear a cidade e incendiar os navios em seus portos.

O primeiro europeu nomeado vice-rei da Índia foi Francisco de Almeida, em 1502. Ao chegar a Coxim, soube que uma expedição proveniente de Calicute havia atacado a cidade e que o soberano de Coxim e a guarnição portuguesa local estavam refugiados numa ilha. Para reverter o quadro, o monarca de Coxim aceitou ser vassalo do rei de Portugal.

Um novo ataque vindo de Calicute ocorreu. Agora, com a ajuda de barcos de guerra turcos e egípcios pagos pelos venezianos. Afinal, a quebra do monopólio árabe implicava a quebra do monopólio entre Veneza e os reinos europeus.

Ao final dessa batalha, Portugal era vitorioso. Tornaram-se os reis do oceano Índico.

Para proteger seus novos domínios, necessitavam de uma base bem protegida. O local escolhido foi a ilha de Goa, até então ocupada e governada por comerciantes de cavalos árabes. E esse fato foi bastante importante.

Um líder hindu local, chamado Timoja, procurou os portugueses e pediu-lhes ajuda para expulsar os árabes. Afonso de Albuquerque era o comandante supremo do Índico. Timoja e Albuquerque se juntaram a uma frota portuguesa e partiram em direção às frotas inimigas. Os fuzilaram completamente com seus canhões.
O governante muçulmano respondeu enviando uma exército de mais de 50 mil homens. Conseguiram capturar um forte português e retomaram o controle da cidade. Albuquerque estava com seus navios parados, pois não havia vento para impulsioná-los – foram três meses nessa condição.

Quando os ventos voltaram a correr, e trouxeram mais barcos provenientes de Lisboa. Bombardearam o forte e retomaram o controle de Goa. Milhares de muçulmanos tentaram escapar a nado, mas morreram afogados.

Oito dias de bombardeios intensos e as defesas caíram totalmente. Timoja foi logo nomeado o novo governante hindu. Procuparam-se também em avisar os demais governantes hindus sobre o ocorrido e dizer que nutriam respeito pela cultura e pela religião deles. Prometeu a mais profunda amizade de Portugal.
Os portugueses permaneceram em Goa até 1961. Sua cidade foi a primeira cidade européia na Ásia. Reconstruída a cidade, Afonso de Albuquerque ali fixou residência. Dentre outros feitos, criou ali uma casa da moeda, para cunhar moedas portuguesas a partir do ouro adquirido na região. Também ordenou a construção de um enorme estaleiro e de uma fábrica de munições.

Logo após chegaram os missionários da Sociedade de Jesus, chefiados por seu fundador, São Francisco Xavier. Estes missionários adotaram a língua e a vestimenta típica dos hindus. O ecumenismo dos novos missionários era tal que um dos missionários, Frei João de Brito, foi assassinado por fundamentalistas cristãos.

Em Goa, os portugueses construíram escolas secundárias e universidades. Introduziram a tipografia, fizeram pesquisas em farmacologia, a partir de plantas medicinais que iram conhecendo. Essas foram as bases da farmacologia moderna.

Muitos criminosos em liberdade condicional permaneceram em Goa, a pedido de Afonso de Albuquerque. Eles abriram padarias, sapatarias, bares, carpintarias e serralherias. As notícias de fortunas surgidas na Ásia levaram até mesmo prostitutas lisboetas a entrarem nos navios disfarçadas de homens. Em Goa, os homens eram incentivados a contraírem casamento com mulheres asiáticas.

Alguns aproveitaram para adotar o costume indiano da poligamia. Chegaram a possuir harens privados.
Aos atuais descendentes daqueles colonos portugueses é reconhecida cidadania portuguesa.


Rubem L. de F. Auto

Fonte: livro “A primeira aldeia global”   

AS AVENTURAS DE VASCO DA GAMA COM O REI DOS OCEANOS


Após as cartas de Pêro de Covilhã desvendarem a rota para as Índias, restava ao rei de Portugal ordenar que uma missão portuguesa realizasse a jornada tão aguardada. Coube a Vasco da Gama e seu comandante, Pêro de Alenquer, tal missão.
Vasco não era navegador. Membro da pequena nobreza burocrática alçada a cargos públicos nos tempos de D. João II, esse português cumpria o papel de embaixador enviado pelo rei de Portugal, portando carta régia válida para qualquer lugar em que aportasse. Vasco morreu como um dos homens mais poderosos de Portugal, vice-rei da Índia.
O historiador inglês Charles Boxer classificou essa aventura como o alicerce para a construção de um império marítimo, que se estendia do Brasil até o Japão. Na sua extensão, o português substituiu o árabe como língua franca. Portugal possuía a maior frota mercante do mundo. Portugueses fizeram parte do conselho do imperador da China. Fortes portugueses se multiplicaram em locais tão distantes quanto Barein, Pérsia, Paquistão e Japão. Cidades como Recife e Mombaça, na África Oriental, Goa e Malaca, ou Macau eram portuguesas, assim como o porto de Nagasáqui, no Japão.
A própria Grã Bretanha somente se tornou potência colonial após receberem Bombaim de Portugal, ofertada como dote ao rei Carlos II. Vasco da Gama deu início à era das colonizações europeias pelo mundo.
O historiador português Armando Cortesão registrou diversas viagens portuguesas entre as viagens de Bartolomeu Dias e de Vasco da Gama. Essa aventuras marítimas que tinham a Índia como destino pretendido ajudaram a desenvolver toda uma nova gama de técnicas de construção de embarcações melhores e mais bem armadas. Assim nasceu o projeto do Galeão, inovação portuguesa bastante festejada, que portava todo um conjunto de canhões embarcados, famosos por intimidarem cidades inteiras com seu estrondo.
A essa altura, o trono português fora herdado por D. Manuel, igualmente determinado a fazer do Grande Plano português uma realidade. E a missão agora era fazer um acordo comercial com o Samorim de Calicute, o conhecido Senhor dos Oceanos.
A frota de Gama era composta por dois barcos “redondos”, invenção recente, uma caravela e um grande barco de carga, carregando mercadorias como: têxteis, chapéus de seda, peças de ferro e de bronze, pregos, contas de coral, pequenos sinos e outras bugigangas. Além de alimentos frescos a bordo.
Quanto aos marinheiros, apenas 56 retornaram com vida. Além destes, havia carpinteiros, capelães, músicos, um intérprete árabe e um grupo de condenados em liberdade condicional – jovens aristocratas presos, que aspiravam a liberdade após o retorno da missão em que se alistaram. Eram sempre os primeiros a desembarcarem após navios portugueses aportarem nalgum lugar. Álvaro Velho eram o cronista da frota.
Vasco partiu de Belém, em Lisboa, em 8 de julho de 1497. Uma semana após, chegaram às Canárias. Voltaram-se para o sul e alcançaram Cabo verde e 27 de julho. Reabasteceram-se de alimentos frescos. Na altura de Serra Leoa foram arremessados para o ocidente. Na costa do Brasil, no Cabo de Santo Agostinho, fizeram um arco até a altura da Argentina, onde pegaram ventos que os transportaram até o sul da África.
Contornado o continente, atingiram a Ilha de Moçambique, em 29 de março de 1498. Foi ali que Vasco travou seu primeiro contato com comerciantes árabes, que dominavam as costas do Índico. Foi também ali que Vasco avistou quatro barcos de “mouros brancos” – trucos e persas – lotados de ouro, prata, pregos, pimenta, gengibre, pérolas, safiras e rubis.
Os habitantes locais se vestiam túnicas de algodão listrado e turbantes. Quase todos eram islâmicos e falavam árabe fluentemente. Foram muito bem recebidos.
Na verdade os habitantes locais pensavam se tratarem de asiáticos do norte da Ásia, não de europeus. Quando o Samorim descobriu a verdadeira identidade deles mandou-os matar.
Mas os portugueses conseguiram escapar do motim e chegaram a Mombaça, sãos e salvos.
Sofrendo de escorbuto, foi-lhes oferecida grande quantidade de frutas cítricas. Condenados desembarcaram com cartas de saudação, assinadas por Vasco da Gama e logo foram recebidos por uma multidão curiosa e pelo xeque, que os convidou a seu palácio.
Ao deixarem o porto local, seus guias fugiram. Conseguiram capturar e seqüestrar a tripulação de um navio lotado de mercadorias. Os comandantes os guiaram até Melinde, onde foram recebidos pelo monarca da cidade. Lá, conseguiram que um navegador os fizessem atravessar o Índico, quando chegaram finalmente a Calicute, em 20 de maio de 1498.
O primeiro diálogo foi travado entre um condenado e dois habitantes locais:
- Que raios estão a fazer aqui?
- Viemos à procura de cristãos e de especiarias.
- Foram enviados pelo rei de Castela, de França ou pelo doge de Veneza?
- Fomos enviados pelo rei de Portugal. Ele não permite que outros reis enviem gente para aqui.
- Deus vos abençoe por terem aqui vindo.

O samorim deixou seu palácio de campo e foi ter com os portugueses, curioso com aqueles viajantes um tanto diferentes. Vasco foi recebido com honras. Desfilou pelas ruas, onde pessoas lhes saudavam e davam boas vindas. Tudo ao som de músicos hindus.
Quando levado à presença do samorim, vestido apenas com um dhoti de algodão e um gorro bordado, adornado com um cinto incrustado de ouro e rubis, além usar pulseiras de ouro, jóias, anéis de esmeralda e diamantes. Usava também brincos de rubis e pérolas.
Vasco saudou o samorim à maneira hindu. Este pediu que os portugueses se sentassem num banco e mandou que lhes trouxessem frutas.
O samorim perguntou a Vasco o que pretendiam ali. Vasco respondeu que estavam à procura de cristãos e desejavam comprar especiarias. O samorim deu-lhes as boas vindas e pediu que seus pilotos guiassem as embarcações portuguesas até um porto mais seguro.
No dia seguinte, Vasco enviou num barco a remo presentes ao samorim: 12 rolos de algodão listrado, quatro fios de corais, uma caixa de açúcar, dois barris de leite e mel.
O samorim inspecionou as ofertas e considerou-as ridículas: “O mais pobre mercador árabe oferece a Sua Majestade mais do que isto. Não se encontra aqui nada digno de um rei. Têm de lhe dar ouro.”  
Vasco da Gama conseguiu remediar o mal estar dizendo que eram presentes pessoais dele mesmo, não do rei de Portugal. Prometeu que o ouro logo chegaria.
Vasco exigiu outra audiência com o samorim. Lá chegando, Vasco proferiu uma sequência tão grande de insultos contra o samorim que até o intérprete se recusou a traduzi-las.   
Os conselheiros do samorim novamente disseram ser vergonhoso que os portugueses não tivessem nada digno do rei deles. Vasco respondeu que tinha muitas mercadorias para comercializar: trigo, vinho, ferro e cobre fundido.
Os desentendimentos entre Vasco e as autoridades de Calicute deram oportunidade a seus inimigos, os árabes. Estes já haviam percebido que a chegada daqueles portugueses representava uma grande ameaça a altamente lucrativo monopólio comercial. Ao saberem da péssima recepção dada às bugigangas portuguesas, logo fizeram troça daqueles mercadores pés-rapados.
A única coisa que alegrava os olhos dos hindus eram as embarcações portuguesas. Famílias inteiras subiam a bordo para conhecê-las. Vasco organizou uma recepção suntuosa, procurando cultivar uma certa simpatia com os habitantes locais.
A muito custo, os portugueses conseguiram transferir as mercadorias que trouxeram até o centro de Calicute. Um morador local, de origem tunisiana e chamado Monçaide procurou Vasco e disse-lhe que os árabes tinham conseguido convencer o samorim de que os portugueses eram piratas e ladrões; além de pretenderem atacar e saquear a cidade assim que surgisse uma chance. Os árabes também prometeram uma enorme soma de dinheiro se o samorim mandasse prender e decapitar Vasco e seu séquito.
Logo após os portugueses foram proibidos de retornar a seus navios. Vasco, astutamente, percebeu que havia uns 20 indianos a bordo. Alguns aguardando para almoçar com os portugueses – a maioria bem vestida, aparentando serem nobres locais. Vasco mandou detê-los a bordo e negociou a troca pelos portugueses presos pelos indianos.
Confusão desfeita, Vasco reclamou estar profundamente indignado por ter sido acusado injustamente de pirata de ladrão. Disse que zarparia para nunca mais regressar.
O samorim mandou entregar a Vasco uma carta endereçada à majestade de Portugal, em que dizia ter sido muito prazeroso conhecer sua delegação e que, se lhe enviassem ouro, teria enorme prazer em transacionar demais mercadorias (especiarias e jóias) com seus mercadores.    
De regresso, Vasco teve de enfrentar uma série de tragédias. Dois terços de seus homens morreram de febre e de escorbuto. Restaram tão poucos homens que tiveram de abandonar dois de seus quatro navios. Não sem antes queimá-los, evitando assim que fossem capturados e se descobrissem seus segredos de engenharia.
A chegada a Lisboa teve recepção monumental. D. Manuel mandou que se tocassem todos os sinos de todas as igrejas do país. Também não demorou a mandar organizar outra frota, ainda maior do que a de Vasco, a fim de acertar os detalhes do acordo comercial a ser firmado com o samorim de Calicute. É aqui que entrará Pedro Álvares Cabral e sua frota espetacular, no mesmo contexto do “descobrimento” do Brasil.
Os barcos que retornaram com Vasco da Gama trouxeram especiarias como: canela, cravos-da-índia, pimenta, gengibre, noz-moscada, bálsamo, âmbar, almíscar, pérolas, rubis e muitas outras pedras preciosas. Embora pequeno, aquele carregamento tinha valor de mercado 60 vezes superior ao custo de toda a expedição.
Vasco não estava no meio daquela recepção festiva. Seu irmão mais velho tinha contraído febre e estava bastante abatido. Vasco o levou aos Açores, onde julgava que os bons ares ajudariam na sua recuperação. Mas não surtiu efeito, Paulo logo morreu.
Poucos anos após, Vasco da Gama foi nomeado Vice-Rei da Índia. Recebeu como prêmio por seus feitos espetaculares: sua vila natal, Sines; uma pensão anual de 30 mil réis em ouro – valendo também para seus herdeiros; 200 cruzados de especiarias por viagem; direito a embarcar gratuitamente em navios da frota real; direito a cobrar taxas de ancoradouro ao longo de toda a costa indiana. Tornou-se também o conde de Vidigueiras. Sua irmã e seu irmão mais novo foram nomeados nobres e passaram a receber pensão também.
Vasco morreu em 1524.


Rubem L. de F. Auto

Fonte: livro “A primeira aldeia global”
    

terça-feira, 29 de agosto de 2017

“STRANGE FRUIT” –CONTRA O RACISMO, PONHA BILLIE HOLLIDAY PARA TOCAR


Strange Fruit

Southern trees bear strange fruit,
Blood on the leaves and blood at the root,
Black bodies swinging in the southern breeze,
Strange fruit hanging from the poplar trees.

As árvores do sul dão frutos estanhos,
Sangue nas folhas e sangue nas raízes,
Corpos negros se remexendo na brisa do sul,
Fruta estranha pendendo do álamo

Pastoral scene of the gallant south,
The bulging eyes and the twisted mouth,
Scent of magnolias, sweet and fresh,
Then the sudden smell of burning flesh.

Cena pastoril do sul corajoso,
Os olhos enormes e a boca cerrada,
Sotaque de magnólias, doce e fresco,
Então o aroma inesperado de carne assando.

Here is fruit for the crows to pluck,
For the rain to gather, for the wind to suck,
For the sun to rot, for the trees to drop,
Here is a strange and bitter crop.

Aqui está a fruta para os corvos atacarem,
Para a chuva reunir, para o vento sugar,
Para o sol apodrecer, para as árvores deixarem cair,
Aqui está a estranha e amarga colheita.



Rubem L. de F. Auto

PÊRO DE COVILHÃ – O ESPIÃO A SERVIÇO DE EL REY


Falante do idioma árabe, confiável e leal, Covilhã parecia ser o homem perfeito para a missão delegada pelo rei de Portugal: “tentar encontrar as fontes de canela e de outras especiarias do Oriente, bem como a rota utilizada para as faze chegar a Veneza”. Tinha 40 anos àquela altura e fora agraciado como cavaleiro da Guarda Real.

Recebeu, antes, cursos intensivos nas matérias que lhe poderiam ser úteis: cosmografia, geografia e outras afins. Tudo ocorreu em Santarém, pois em Lisboa poderia atrair a curiosidade de estrangeiros.

Em maio de 1487, Pêro deixou Santarém atrás e si e pôs-se a caminho das Índias. Levava 400 cruzados e uma carta de crédito valida para qualquer parte do mundo, garantida pelo banco dos Médici, em Florença.
Ao saber dos planos portugueses, o papa Júlio avisou Portugal para que não enviasse delegação comercial ao Egito, pois este estava na esfera de influência de Veneza. Covilhã teve de se disfarçar para não levantar suspeitas.

Chegando a Alexandria, principal porto escoador de mercadorias em direção a Veneza, Lá, Pêro pretendia comerciar o carregamento de mel que levava consigo. Contraiu uma febre muito forte, foi dado como morto, seu carregamento foi apreendido e vendido pelo emir da cidade. Mas ao se recuperar, Pêro foi indenizado pelo mel perdido e usou esses recursos para continuar sua missão.

No Cairo, Pêro teve contato com mercadores indianos. Conseguiu embarcar numa caravana proveniente do Marrocos em direção ao Iêmen. Chegaram a Suez cinco dias depois e chegaram a Tor, importante entreposto comercial no meio da rota Oriente-Ocidente.

Embarcou numa canoa local, que chamavam de dhow, em direção à costa ocidental da Índia. Em Adem, na Pérsia, maravilhou-se com a riqueza do porto local. O mercado contava com gengibres e especiarias em abundância. Soube também que aquilo tudo não era nada comparado a Calecute, mais ao sul.

Chegou a Calecute em 1488, no Natal. Era a capital do reino Samorim. Embora o porto em si fosse bastante primitivo, a abundância material impressionava. O rei tinha mãos e pés recheados de rubis e jóias. Era levado em procissão numa padiola revestida de ouro, rodeado por cortesãos brâmanes, perfumadíssimos e montando elefantes, eles também adornados por pedras preciosas.

Os muçulmanos que lá viviam haviam obtido autorização do ei para viverem em seu enclave de maneira bastante autônoma – vivendo sob a sharia, com juízes próprios. Era um local muito freqüentado por mercadores do Ceilão, Coromandel, Birmânia, Malaca, Sumatra, Bengala e Borneu.

Os preços eram elevados para quase todas as mercadorias. Pêro se impressionou com a pimenta cultivada localmente, cânfora, goma-lasca, noz-moscada, tamarindo, canela, porcelana chinesa, diamantes, safiras, rubis e pérolas.

As mercadorias eram adquiridas mediante outras, desejadas pelos comerciantes locais. Os mercadores árabes se dirigiam a Calecute carregados de copra, mercúrio, terra-de-siena queimadas e demais pigmentos, coral vermelho, açafrão, água de rosas, painéis de madeira pintada, facas, prata e ouro.

Pêro então tomou o rumo de Goa. Nem de longe tinha os atrativos de Calecute, mas era o local ideal para os portugueses fixarem um entreposto comercial na Índia. Era uma ilha nas mãos de muçulmanos. Era mais factível expulsar uns poucos muçulmanos do que atacar reinos hindus altamente militarizados.

A tarefa seguinte de Pêro era igualmente importante. O rei português sabia que a África era cercada por água - não se estendia até a China. Portanto haveria uma passagem ao sul daquele continente, abrindo passagem até o Oriente.

A tarefa de encontrar essa passagem foi delegada a Bartolomeu Dias. Cabia a Pêro achar a rota que levaria daquele ponto ao sul da África até a fonte das desejadas especiarias.

Em 1489, Covilhã chegou ao Cairo, depois de viajar por Moçambique, Melinde e Mombaça. Trazia consigo cartas marítimas, mapas terrestres, medições feitas em astrolábios. Tudo isso foi entregue ao mensageiro do rei, o rabino Abraão – a escolha de um rabino para essa missão se deve à facilidade que tinham de se passarem por mercadores árabes, sem levantar suspeitas. O rabino regressou a Portugal dois anos antes de Colombo se fazer ao mar a partir de Cádis.

Por seu turno, Bartolomeu Dias partiu de Lisboa em 1487, no comando de três caravelas. Aportou em Elizabeth Bay, em 26 de dezembro do mesmo ano. Dez dias depois, uma tempestade colossal arremessou os barcos em direção ao sul por vários dias.

Após retomar o controle das naus, Bartolomeu seguiu para o leste, pretendendo alcançar a costa novamente. Não tendo sucesso, mudou o rumo para norte. Alguns dias após, alcançou a costa pretendida. Interessante notar que em momento algum Bartolomeu avistou o Cabo das Tormentas – ou da Boa Esperança -, embora o tenha contornado.

Desembarcaram numa baía, onde encontraram alguns vaqueiros. Embora contasse com intérpretes oriundos do Congo, estes não conseguiram estabelecer contato com aquelas pessoas. Após se retirarem, os vaqueiros retornaram armados de lanças e atacaram a tripulação. Chamara o lugar de Baía dos Vaqueiros.
Seguiram viagem até um ponto a que chamara Rio do Infante. Exaustos, os marinheiros exigiram o retorno à casa. Bartolomeu tomou tal decisão e fizeram meia volta. Desembarcaram em Portugal pouco antes da chegada do rabino Abraão.

Após cotejar ambos os roteiros – de Dias e de Covilhã -, pode o rei perceber que se completavam com coerência. Tinham agora a rota completa, de Portugal às Índias.

Pêro de Covilhã não viria a por seus pés em Portugal novamente. O rabino após receber todas a documentação recolhida pelo espião, o incumbiu de uma nova missão: encontrar o lendário Preste João. Trata-se de uma lenda européia que já datava de dois séculos então.

Quando os muçulmanos devastavam reinos europeus, um após o outro, levando suas fronteiras cada vez mais ao norte (chegaram a fincar os pés a meros oito quilômetros de Paris), crescia dentre os cristão a esperança de que um lendário imperador cristão, chamado Prete João, o maior rei do Oriente, lançasse seus exércitos pela retaguarda muçulmana, permitindo assim que os cristãos fortalecessem suas resistências.

Mesmo não havendo qualquer registro da existência desse monarca, tornou-se mito, um quase-Deus. Em 1185, em Viena, publicou-se um mapa com a descriçãod e seu suposto reino. Era referenciado como o Grande Senhor de Todas as Índias – rei de dezenas de reis.

A descrição de seu palácio era magnífica: palácio de cristal, soalhos de mosaicos de pedras preciosas, telhado sustentado por pilares de ouro. O pátio abrigava uma fonte da juventude eterna. Seu trono era de ouro, estava rodeado por leões, tigres, lobos etc etc.

Mas o que mais interessava para um futuro contato eram suas forças militares: 10 mil soldados de cavalaria e 100 mil de infantaria, cada qual com sua cruz numa mão e a espada noutra. Embora lenda, muitos crêem que foi essa crença que deu forças para que os europeus resistissem ao islamismo.

Durante uma conferência ecumênica, ocorrida em Florença em 1439, o rei português travou contato com uma delegação de abissínios negros que se diziam governados por um rei-sacerdote chamado João, o Presbítero. Essa informação foi mais tarde confirmada por um grupo de sacerdotes abissínios a um diplomata português, embora agora dissessem que o nome do tal monarca era Lucas Marcos.

Suspeitando que a localização do tal reino ficasse nas proximidades da nascente do Rio Nilo, o monarca português fez embarcar numa das caravelas comandadas por Bartolomeu Dias  um casal de congoleses, que foram desembarcados numa praia do Zaire. Seguiram em direção ao interior do continente, retornaram anos depois mas sem encontrarem qualquer pessoa que tivesse ouvido falar no Rio Nilo.

Em 1515, sem que Covilhã tivesse ainda retornado de sua jornada, exploradores portugueses haviam subido a costa da África oriental e foram informados sobre a localização aproximada do tal reino cristão.

Um padre, chamado Francisco, desembarcou próximo ao mar Vermelho. Levava uma carta do rei, D. Manuel, endereçada ao rei abissínio e presentes: crucifixos, tapeçarias descrevendo passagens da Bíblia, punhais encrustados com jóias, um órgão de igreja portátil...

Padre Francisco dera início a uma jornada de quatro meses caminhando por vales e montanhas. Até seu guia morreu no meio do caminho, além de um embaixador português. Escapou de emboscadas, foi levado a um mosteiro cujo monge não havia retornado há anos, foi assaltado e quase linxado...

Finalmente chegou à capital do reino almejado. Foi abrigado pelo rei, alimentado. Após uma longa espera, foi informado de que Pêro de Covilhã vivia numa mansão enorme ali perto. Encontrou-o, Francisco, proprietário de vastas terras, vivendo com incontáveis mulheres, possuía cavaleiros e escudeiros, cavalos, cães de caça... Fazia 15 anos que Covilhã não via um português.

Aproveitou, Covilhã, a ocasião para se confessar e pedir perdão pelos seus pecados. Francisco pediu que Covilhã retornasse a Portugal e retomasse seu matrimônio cristão com sua esposa. Foi quando Covilhã revelou que se encontrava em prisão domiciliar. Francisco retornou à casa de mãos vazias.

Mas foi essa aventura portuguesa em busca de um mito que os levou a descobrir enormes montas de ouro no lado Oriental do continente africano, em minas que batizaram de minas do rei Salomão.

Sagazmente, foram mantidas em segredo do resto das nações européias, mantendo assim seus lucros extraordinários a salvo.


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “A primeira aldeia global”  

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

AÇÚCAR – A ROTA DO SABOR


Por milênios, o mel foi o único adoçante conhecido pelos seres humanos. A cana-de-açúcar foi cultivada na Índia por uns três mil anos até chegar ao norte da África e à Europa meridional por volta do século VIII d.C.

A sogra de Cristóvão Colombo possuía uma plantação de cana-de-açúcar e, antes de se casar, Colombo transportava açúcar da Ilha da Madeira até Gênova. Este foi o fator decisivo para que tivesse a idéia de levar um pouco dessa planta para o Caribe, em 1493, quando de sua segunda viagem.

O sucesso da empreitada pode ser medido: um norte-americano médio consome cerca de 20 kg de açúcar por ano. Claro que nem todo esse açúcar vem do açucareiro. Ele está presente numa assombrosa variedade de alimentos industrializados.

O açúcar pode ser proveniente da usina de açúcar ou da refinaria de açúcar. A primeira fica geralmente próxima das plantações de cana, enquanto as segundas não podem ficar tão aproximas.

Na usina, a cana cortada é picada e espremida por máquinas. Ao caldo é adicionada barrela, que o clarifica. Um vácuo parcial é aplicado depois, o que o reduz até engrossar. Torna-se parecido com um xarope, marrom em razão das impurezas geradas no processo. À medida que a água evapora, o açúcar torna-se tão concentrado que vira cristais sólidos. Os cristais, ainda úmidos, vão a uma centrífuga, parecida com um tambor de máquina de lavar roupa, que separa a água dos cristais. O subproduto gerado é o melaço.

O líquido xaroposo final é o açúcar bruto. O FDA americano o classifica como impróprio para o consumo.

O processo seguinte ocorre nas refinarias de açúcar. Lá, ele é purificado por lavagem, dissolvido, fervido para recristalizar e centrifugado mais duas vezes, o que o torna mais puro – mais melado é gerado e descartado nesse processo.    

Se você vir anunciado “açúcar bruto”, ou não é bom para o consumo humano, ou é um açúcar refinado a partir do açúcar bruto, por lavagem com vapor, recristalização e centrifugação.

O melado gerado na primeira cristalização tem cor clara e é muito doce. Geralmente o transformam em xarope de mesa. O melado da segunda cristalização é mais escuro e é usado em culinária. O último melado é chamado melaço, é forte e amargo.


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “Doces: a ciência na cozinha”

D. JOÃO II, REI DE DOIS MUNDOS – PARTE 2


Todo o ouro aportado em Lisboa tinha como objetivo financiar aquilo que se denominava Grande Plano: criar a rota marítima alternativa que permitiria reativar o comércio de especiarias orientais e torná-lo monopólio português.

Pelo fato de D. João II ser grão-mestre da Ordem de Cristo, a cruz dos templários figurava nas caravelas das descobertas.

O que comércio que existira até então era dominado pelos venezianos, que construíram uma metrópole grandiosa com os lucros dali advindos. Seu império se estendia até Dalmácia e ao Mar Negro. Embora a riqueza cultural visual surgida em Veneza durante seus anos dourados não se compare àquela de Florença, as ciências naturais devem muito à Sereníssima: anatomia e medicina foram duas áreas que contaram com obras monumentais e seminais dessa época.

O grande obstáculo ao sucesso de Veneza foi sua aversão a qualquer coisa que lembrasse os árabes, embora estes fossem seus principais parceiros comerciais. Foi a cultura árabe que embasou as descobertas de grandes cientistas judeus. Foram judeus muitos dos ocupantes do Conselho dos Sábios de D. João II. Em retribuição, foi concedido à comunidade judaica um terreno numa colina de Lisboa, onde construíram uma sinagoga.

Eram judeus o tesoureiro real, o médico do rei e o grande matemático da Universidade de Salamanca.
Por seu turno, os árabes herdaram seus grandes conhecimentos científicos diretamente dos gregos. As grandes obras gregas quase todas foram traduzidas para o árabe, muito antes de os europeus sequer tomarem conhecimento da existência delas. Como a língua grega era totalmente desconhecida no ocidente, tais obras somente vieram à tona na Europa após tradução a partir do árabe. Sendo igualmente semitas, muitos dos tradutores eram de origem judaica.

Foi a partir dessas traduções que os europeus souberam da existência do oceano Índico. Eles criam que a África se estendia até a Ásia ocidental.

No afã de conferir as informações que jorravam, D. João II decidiu enviar um espião português até a região onde Marco Polo regressara, por medo de embarcar num navio árabe. O nome do “James Bons” português era Pêro de Covilhã.


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “A primeira aldeia global”

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

D. JOÃO II, REI DE DOIS MUNDOS


Seu reinado durou apenas 14 anos, mas foi um dos mais relevantes da história da Europa. Conforme inscrito em seu epitáfio: “Poderá não ter sido um grande homem, mas foi certamente um grande rei”. Segundo o historiador Oliveira Marques, deve-se dever a ele, não a D. Henrique, o plano global dos descobrimentos.

Quando herdou a coroa de seu pai, D. Afonso, Portugal tinha uma população total inferior a 1,5 milhão de pessoas – 1/8 da população da Itália, menos de ¼ da Espanha, ou quase metade da população inglesa. O apoio financeiro para as expedições se devia unicamente à Casa dos Medici, banqueiros de Florença.

O Tesouro português estava completamente esvaziado, após anos de conflito com Castela, de tal forma que urgia qualquer recurso emprestado de fora. Solicitou à França, que recusou. Desesperado, D. Afonso se disfarçou de monge e se refugiou num mosteiro da Bretanha. Descoberto, foi deportado de volta a Portugal, onde pediu permissão para abdicar do trono. Morreu antes que seu pedido fosse analisado. A essa altura, a moeda portuguesa não valia nada. Além de pesadas dívidas com a Igreja, um consórcio de judeus adquiriu o direito de recolher os impostos do país.  

Em 1531, uma geração após o início das tais expedições portuguesas, o rei da Inglaterra se viu obrigado a escrever ao doge de Veneza pedindo-lhe desculpas por seus navios não mais aportarem em Veneza, mas em Lisboa, para adquirirem especiarias. Os armazéns venezianos estavam vazios e a cidade em profunda decadência.

A fortuna em mãos de portugueses era tamanha que nobres deste país, em visita à Itália, mandaram ferrar seus cavalos com ferraduras de ouro e usando um único prego. Deleitavam-se com os esfomeados italianos correndo atrás das ferraduras após se desprenderem dos cavalos. Lisboa era o lugar da fortuna e da abundância. Cidadãos ingleses e de outras cidades européias mais atrasadas se impressionavam com a opulência da cidade. Era referência nos campos das artes, das ciências, da ópera, da medicina, arquitetura e joalheria.

D. João II fundou o Conselho dos Sábios, constituído por eclesiásticos, cosmógrafos, matemáticos dando início à tradição portuguesa de aproximar intelectuais da administração pública. A Casa da Mina, por ele fundada para abrigar o ouro trazido da África, reteve quantidade tal de recursos que pagou as expedições de Bartolomeu Dias, Vasco da Gama e outros.

D. João II deu provas de sua competência logo que chegou ao posto. A aristocracia portuguesa, assistindo às desventuras de um rei fraco e atabalhoado, D. Afonso, planejou um golpe de Estado. Um dos líderes era o duque de Bragança, primo de D. João II, que já havia reunido uma enorme milícia própria. Recentemente coroado, D. João convocou seu primo para uma negociação. Após receber o primo, mandou prendê-lo e matá-lo. Fez o mesmo com o duque de Viseu, seu cunhado – matou com as próprias mãos, com uma punhalada e sem mais palavras.

A nobreza de Borgonha, contemporânea da fundação do país, foi seriamente prejudicada pelas atitudes do rei. Tiveram seus bens confiscados, pela primeira estavam submetidos à Justiça estatal, e somente foi devolvido a quem jurasse lealdade à Coroa, de joelhos.

Passou D. João a recrutar na população homens de qualidade, submetidos a entrevistas e a exame de antecedentes. Os aprovados eram inseridos na Lista do Rei e recebiam cargos na administração pública e na magistratura. Daí surgiu o Conselho dos Sábios.

D. João II foi o rei que recusou a proposta de Cristóvão Colombo. Mesmo tendo achado a proposta um disparate, submeteu-a ao Conselho, que tomou a mesma decisão. São muitas as teorias por trás dessa recusa, mas os historiadores modernos creem que navegadores portugueses já tinham descoberto e já comercializavam com o território que viria a ser o Brasil – mas esse fato era mantido sob sigilo absoluto. Como o retorno contava com um transbordo na costa da África ocidental, diziam que as mercadorias eram dali originárias.

Bartolomeu Dias havia descoberto a rota do Oriente mais de dois anos antes da expedição de Colombo. Portugal havia enviado um espião secreto, Pêro de Covilhã, à Índia, via Oriente Médio, de onde regressou com mapas árabes e indianos, que apontavam para diversas rotas entre a África setentrional e a Índia.

Após sua bem sucedida viagem, Colombo retornou e aportou em Lisboa, antes de informar os reis espanhóis sobre a boa-nova – pretendia humilhar o rei que recusou sua proposta. Mas se decepcionou: D. João o informou de que o Tratado firmado entre ambos os países dizia que a descoberta de Colombo se encontrava dentro de domínios portugueses.

Quando Colombo chegou à Espanha, os reis já tinham sido informados sobre os acontecimentos por meio de missiva enviada por D. João II. Ele ameaçava enviar efetivos militares à Anguilha (nome sob o qual Colombo batizou sua descoberta), a menos que recebesse uma contraproposta generosa.

Aqui se iniciaram as negociações que levariam ao Tratado de Tordesilhas e à divisão do mundo entre os reinos ibéricos. Nesse contexto se encaixa a expedição de Cabral e a tomada de posse do quinhão português das Américas.

A essa altura, a moeda portuguesa já era a mais valiosa da Europa. Todas as dívidas portuguesas estavam saldadas e os impostos voltaram a ser vertidos para os cofres públicos. O fator decisivo havia sido o ouro africano. No território onde hoje é o Gana, Portugal inaugurou uma diplomacia comercial que suplantou a era dos piratas e corsários, violentos e ambiciosos, que seqüestravam e torturavam em troca de ouro.

Portugal optou por enviar membros da nova nobreza, como embaixadores, bem paramentados e portando carta régia, saudando elogiosamente suas contrapartes, para negociar. Diogo de Azambuja foi o enviado ao Gana – local de onde saía o ouro que alimentava o comércio árabe -, onde conheceu Accra e suas areias cobertas de ouro de fácil extração. Havia também o ouro que chegava do interior do continente.

A proposta portuguesa incluía a construção de um entreposto comercial e a cessão do monopólio de todo o ouro da região. A sedução portuguesa falou mais alto e a proposta foi aceita.

Nove caravelas e dois barcos também enormes foram usados para transportar um castelo de pedra, um armazém e uma capela, tudo devidamente desmontado e remontado na África. Assim nasceu o Castelo de São Jorge a localidade de São Jorge da Mina – como os portugueses se referiam a Accra. Na praça do comercio, em Portugal, D. João mandou construir a Casa da Mina, cofre de todo o ouro que chegava.

O maior desafio ao empreendimento era manter as dezenas de navios piratas ingleses, batavos, franceses e de outras partes, distantes. Mesmo assim aportavam em Lisboa mais de 400 quilos de ouro anualmente por volta de 1500.

(Continua)


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “A primeira aldeia global”

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

CRESCIMENTO DO COMÉRCIO DE ESCRAVOS AFRICANOS – CAPITALISMO SELVAGEM E IMPIEDOSO


Uma primeira impressão deixada pelos primeiros escravos africanos a chegarem a Portugal foi relativa à religiosidade daquelas pessoas. Uma frase dita por Azurara, cronista da época e próximo a D. Henrique: “Provaram ser muito menos obstinados do que os mouros em relação à religião, tendo de imediato aceitado o cristianismo”. Isto é, ao contrário do apego dos árabes por seus símbolos religiosos, capazes de impeli-los à guerra santa, os africanos recém-chegados se mostravam muito mais permeáveis a uma nova fé, diferente de suas práticas religiosas em solo pátrio.

O sofrimento da divisão das “mercadorias” permanecia: um pai poderia permanecer em Lagos, enquanto a mãe era vendida para Lisboa, ao passo que o outro filho era enviado a outra parte qualquer.

Em África, o impacto dos novos invasores foi grande. Na costa da África ocidental, o medo preexistente da captura e venda no âmbito do comércio de escravos foi somado à crença local de que os europeus eram canibais e queriam aquelas pessoas para um belo banquete... Os portugueses estavam ficando bem famosos e despertavam ódio rapidamente.

Em 1446, apenas dois anos após o primeiro descarregamento de escravos no Algarve, Nuno Tristão alcançou a foz do Rio Gâmbia. Subiu o rio ao lado de um grupo de caçadores, distribuídos em 2 barcos. Subitamente foram atacados por 80 guerreiros, que se moviam em 12 canoas. Atacaram os odiosos lusitanos com flechas envenenadas. Tristão e a maior parte de sua tripulação foram mortos em menos de uma hora. Mesmo os que escaparam do local morreram poucos dias depois. Sobreviveram apenas um marinheiro ferido, dois grumetes e um jovem africano, capturado havia pouco.

Esses sobreviventes navegaram para o norte, numa tortuosa viagem de mais de 60 dias. Foram resgatados por piratas galegos, já na costa de Portugal.

Tristão foi apenas um dos inúmeros europeus vitimados pela nova febre. O comércio lucrativo de pessoas atraía ambiciosos e os vitimava com a mesma facilidade. Um nobre dinamarquês de nome Eberhardt tentou achar outras mercadorias para comercializar com o continente desconhecido. Tendo viajado de Lagos até Cabo Verde, levava consigo uma tenda que ele mesmo criara, capaz de abrigar até 30 pessoas, porém leve a ponto de apenas uma pessoa poder carregá-la. O nobre dinamarquês pretendia trocá-la por um elefante.
A ignorância sobre as novas terras alimentava boatos sobre escravatura branca praticada no interior da África.

Os chefes de tribos costeiras rapidamente perceberam a lucratividade da atividade de capturar negros no interior e sua posterior venda a europeus, no litoral. Por volta de 1447, a abundância de mão de obra escrava era tal que o preço caía rapidamente. Nesse ano pelo menos um capitão, carregando mais escravos do que os mantimentos necessários, decidiu atirar o “excesso de carga” ao mar.

O monopólio papal concedido a Portugal era mantido pelos lusitanos a ferro e fogo. Um espanhol foi flagrado cambiando cavalos andaluzes por escravos (1 cavalo equivalia a 16 escravos). Quebraram-lhe todos os ossos, por ordem de El-Rey. Ainda vivo, foi lançado numa fornalha.

D. Henrique faleceu em 1460. Àquela altura, cerca de 1.000 escravos eram desembarcados anualmente em Lagos. Já compunham a maior parte da população do Algarve e representavam cerca de 10% da população de Lisboa.

Eram adquiridos então pacificamente, por meio de um contrato de fornecimento firmado com o rei Badomel, cujo reinado estava fincado na costa do atual Senegal. O lucro por viagem girava em torno de 600 a 700%, mantido mesmo quando a demanda por escravos em Portugal caía, pois reinos no norte da Espanha e vários países do norte da Europa supriam essa queda de mercado.

A maneira como os escravos eram tratados podia variar bastante. Casamentos entre africanos e portuguesas não eram incomuns no Algarve, assim como concessões de terras para o labor próprio. Aldeias como São Romão e Rio de Moinhos testemunham esse passado por meio de sua enorme população de arrozeiros negros. Geneticamente imunes à malária, aqueles negros substituíam os brancos que morriam ou adquiriam-lhes as terras. Prosperaram sobremaneira.

Mas isso era exceção. Em 1555, pouco mais de 100 anos após o início daquele comércio medonho, o padre Fernando Oliveira classificava a escravatura como uma espécie de tirania. Aproveitou para tirar a culpa exclusiva dos ombros dos reis africanos, ao culpar também quem comprava aqueles homens. Era isso que impulsionava a violência e o volume de negros capturados. Quanto ao argumento da “salvação das almas”, dizia Fernando: “Inventamos um comércio vil e cruel”.

A escravatura foi extinta em Portugal em 1773, e em todos os seus domínios em 1836. Mas sobreviveu em alguns lugares como nomes cínicos como “trabalho de aprendizagem”.

É errôneo limitar o comércio com a África aos escravos. Num entreposto na Mauritânia, explorado por portugueses, havia comércio intenso de goma-arábica, algodão, marfim e papagaios, plantas medicinais, cosméticos, temperos e amaciantes de carnes e muito mais.

Não eram produtos com o mesmo prestígio daqueles importados do Oriente, mas as pimentas alegravam muitos paladares. Seu baixo custo de aquisição turbinou o mercado de reexportação para o norte da Europa.

A moeda com a qual essas mercadorias eram pagas alimentou um intenso comércio em sentido contrário. Os reis africanos desejavam: vestuários, cobertores, contas de coral vermelho, objetos de prata e, especialmente, trigo. Portugal – e Algarve - importava toneladas desse produto para reexportar à África Ocidental. A Ilha da Madeira, descoberta por volta de 1420, assim batizada pela imensa quantidade de árvores lá existentes, depois de ser incendiada e arder em chamas por mais de dois anos, tornou-se território ultra-fértil. A providencial mão de obra africana labutou aquelas terras, distribuídas entre membros da Ordem de Cristo, lá cultivando trigo largamente. Tudo se destinava à aquisição de escravos dos reis africanos.

Quanto a D. Henrique, após abrir caminho para imensas fortunas, recolhe-se a sua vida casta e sem luxos. Legou o monopólio do comércio a seu sobrinho, D. Fernando, antes de morrer.


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “A primeira aldeia global”        

terça-feira, 22 de agosto de 2017

D. HENRIQUE, NAVEGADOR OU TRAFICANTE DE ESCRAVOS?


Henrique era o terceiro dos cinco filhos do rei D. João I e da rainha D. Filipa. Era seguramente o menos culto dos cinco. D. Duarte era versado em assuntos de Estado. D. Pedro freqüentou cortes e universidades européias de prestígio – era dono de uma respeitável biblioteca. D. Henrique era mais lembrado por sua dedicação à caça e aos esportes típicos dos fidalgos da época.

Até que completasse 66 anos de idade, somente havia saído de Portugal em duas ocasiões. Na primeira, navegou até a costa do Marrocos. Na segunda, fincou pés no país e lá deixou seu irmão, D. Fernando, na condição de refém do califa de Tânger. Fernando faleceu no cativeiro, em Fez, morto dependurado pelos tornozelos no muro da cidadela.

Embora Henrique seja lembrado pelo seu patrocínio às grandes viagens exploratórias portuguesas, de fato o Estado foi responsável por menos de 1/3 do total. A mais ambiciosa chegou no máximo a Serra Leoa.

Henrique também se notabilizou como pretenso fundador da gloriosa Escola de Sagres. De fato, seu irmão Duarte concedeu-lhe a missão de estabelecer Sagres, mas a obra de Henrique se resumia À construção de uns modestos edifícios, explodidos por Sir Francis Blake, quando de regresso desde Cádis, onde ameaçou decididamente o rei da Espanha.

Henrique contratou um grupo de cartógrafos e astrólogos catalães, estudiosos judeus, mas não parecia haver qualquer escola de navegação. Aliás, o infante residia em Raposeira, pequena aldeia perto de Lagos.
Certo mesmo foi o papel de Henrique como promotor primeiro do nefasto comércio de escravos africanos. Não se sabe se futuramente derrubarão seus monumentos também...

Seu cargo mais importante foi o de grão-mestre da Ordem de Cristo – os novos templários. A principal função da Ordem era proteger Portugal contra sanha espanhola. O financiamento da Ordem vinha da pilhagem além-fronteiras, em terras espanholas. Outro meio era cobrar por proteção, no estilo milícias cariocas.

Portanto o estado de pé de guerra entre Portugal e Espanha garantia o pão à Ordem. Após a assinatura de um tratado entre as duas nações, a sustentação financeira da Ordem estava em risco.

Em 1413, um monge da Ordem regressava da Sicília, e hospedou-se em Ceuta, um dos mais ricos centros de comércio muçulmano. Após breve andança pela histórica cidade: assistiu à vida agitada da cidade, promovida pela presença de mais de 20 mil mercadores ali dedicados ao comércio de especiarias, tecidos, tapetes orientais, pedras preciosas trazidas do Japão, além do ansiado ouro do sul do Saara. E mais: as defesas da cidade pareciam muito frágeis, sem falar no fato de que estava em guerra contra seus vizinhos.

Por sua vez, Portugal ardia na febre do ouro. As minas de ouro desenvolvidas pelos romanos continuavam silentes. Aquelas preciosidades que tanto alegraram os romanos permaneciam no fundo das minas, por não mais se dominarem as técnicas de engenharia desenvolvidas pelos romanos – tiveram de ser reinventadas no final do século XIX.

Os mercadores árabes recebiam seus pagamentos em ouro. Os europeus passaram, naquela época, a consumir carne cada vez em maiores quantidades. Isso exigia temperos e condimentos asiáticos. A compra desses condimentos levou a uma pressão insuportável sobre a balança comercial das nações européias. Uma saída era a desvalorização da moeda local (inflação), levada a efeito por diversas dessas nações. Disso resultou uma crise de confiança enorme sobre o valor das moedas locais, o que paralisou o comércio externo desses países.

D. Henrique pensou numa saída diferente: pela via das armas! Um dia, sobre uma mesa do palácio real de Sintra, usando sacos de areia, feijões, papa de aveia e um rolo de fita, o grão-mestre dos templários criou uma maquete de Ceuta e de seus arredores.

Mais dois anos, e conseguiram reunir as tropas necessárias ao empreendimento. Arregimentaram-se mais de 19 mil soldados. Construíram 240 navios. Cavaleiros portugueses, normandos e alemães tomaram parte.
Tratou-se de empreendimento privado. A Ordem de Cristo financiou tudo, com vistas ao lucro. Não se viam símbolos portugueses, apenas a cruz dos templários. A Igreja os felicitou e desejou que tudo desse errado para os muçulmanos.

Pouco antes da partida, d. Filipa, mãe de Henrique, falecera. Mas não havia tempo para pesares. Ele cria que a partida breve era o último desejo de sua mãe.

Tendo sobrevivido a intensas tempestades, aportaram à noite em Ceuta. Junto com o amanhecer, Henrique liderou um assalto à cidade. Quase sem resistência, derrubaram o portão principal. O califa, assombrado com a quantidade de soldados e com a surpresa do golpe, debandou em retirada. A carta de rendição do califa lhes foi entregue por comerciantes genoveses que permaneceram no lugar.

O capelão consagrou a grande mesquita, que virou igreja. A pilhagem foi um sucesso, apesar do enorme número de riquezas destruídas no afã da vitória. Até estátuas de mármore foram desmontadas e levadas à casa. Depenada Ceuta, a cidade foi entregue à coroa portuguesa. Mas foi o fim daquele rico bastião: isolada das rotas de comércio, iniciou uma queda espetacular. Em 1425 já era um peso-morto para Portugal. Mas seria território português por mais dois séculos e meio.

Incendiado pelo sucesso da primeira expedição, D. Henrique decidiu liderar mais uma invasão, desta feita a Tânger. Pretendia 14 mil homens, mas somente conseguiu amealhar uns 3 mil. Os riscos eram tamanhos que nenhum aliado se dispôs a auxiliá-los. Mas Henrique estava decidido e, a 23 de agosto de 1437, partiram.

Desembarcaram em Tetuão e marcharam em direção a Tânger. Quando a cidade estava à vista, perceberam que trouxeram escadas muito pequenas para o tamanho da muralha da cidade. Montaram um acampamento fortificado em busca de uma solução para o impasse. Tinham pela frente 40 mil cavaleiros e 60 mil soldados de infantaria.

Sem que percebessem, se fechava em torno de si um grande cerco de berberes. A escaramuça seguinte vitimou quase a tropa toda, incluindo o cavalo de Henrique – mas este escapou.

Sem alimentos, os cavalos foram devorados pelos famintos cavaleiros. Bebiam lama, em busca de água.
O retorno foi conquistado após uma trégua negociada com o caifa. Os termos exigidos pelo califa incluíam a devolução de Ceuta, que teria D. Fernando, irmão de D. Henrique, como fiador: refém da corte do califa até que a devolução ocorresse. Henrique levou um filho do califa em troca.

A caminho das embarcações, a tropa foi assaltada por ladrões do deserto. Henrique entendeu aquilo como uma quebra do acordo e decidiu-se por não mais devolver Ceuta.

D. Duarte se desesperou diante da notícia do cativeiro do irmão Fernando. Henrique propôs uma expedição de 24 mil homens para salvar o irmão. Mas D. Duarte morreu ainda naquele ano, aos 49 anos de idade.

D. Henrique exerceu seu ofício de governador do Algarve até sua morte. Diga-se, Algarve sobreviveu separado do território português até meados do século XX. Embora contasse com terras férteis (a laranjeira asiático somente floresceu por lá), o Algarve não contava com praticamente nenhum camponês. Era área sub-povoada e sua população era de comerciantes, feirantes e pescadores.

Essa foi a realidade que despertou em Henrique o interesse pelo intenso comércio de escravos no mundo árabe. Os escravos eram raptados ou comprados ao sul do Saara. O desafio era imenso: nenhum europeu havia dobrado o Cabo Bojador e regressado. Mas era do infante a frase: “não há perigo tão grande capaz de superar a esperança do lucro.”

O progresso da indústria náutica fascinava: as galés usadas contra Ceuta foram superadas pelas caravelas que, por sua vez, ficaram obsoletas frente aos galeões. Mas as caravelas, patrocinadas pela Ordem, quebraram o isolamento europeu. Sua construção era segredo mantido a sete chaves. Foram as caravelas que substituíram os remadores pelo leme na traseira. Isso reduziu muito a necessidade de alimentos a bordo – e aumentou o tempo no mar. Completavam os ferramentais: bússola e astrolábio, importado dos árabes e aperfeiçoado pelos europeus.

Em 1435, fazendo pleno uso dos progressos descritos, Gil Eanes fez o impossível: dobrou o Cabo. Trouxe como prova uma planta: a Rosa de Santa Maria.

No ano seguinte regressou, ao lado de Afonso Gonçalves Baldaia, e desembarcou mais ao sul. Lá, avistaram pegadas de humanos e de camelos.

Em 1437, ocorreu o primeiro encontro entre europeus e africanos. Baldaia fora encarregado de capturar ao menos um africano e trazê-lo vivo. Baldaia desembarcou dois jovens fidalgos bons de caçadas para empreender a missão. Depararam-se com um grupo de 20 africanos que os fizeram regressar à base de pedras e paus.  

Baldai tomou conhecimento do ocorrido e partiu rio acima à procura do bando. Não os avistaram mais e mataram umas focas para vender a pele e ressarcir os custos da expedição.

Em 1441, Nuno Tristão levou um intérprete árabe consigo e tinha a mesma missão. Avistou um tuaregue e uma mulher negra. Deteve-os, mas o intérprete não os entendia e foram logo libertados.

À noite, Tristão chefiou um grupo que invadiu as matas à procura de futuros cativos. Chegando a um acampamento tuaregue, capturaram dez e mataram quatro. O líder falava bem o árabe: chamava-se Adahu. E o mais interessante: trabalhava como comerciante de escravos. Adahu e três companheiros dele foram levados ao Algarve.

Em Lagos, D. Henrique recebeu Adahu como a um cavaleiro. Recebeu roupas novas européias e instalações condignas. Adahu foi interrogado com muita curiosidade. Buscavam-se dele informações sobre a terra verdejante ao sul do Saara, a terra dos negros.

Adahu conseguiu sua libertação após entregar 4 escravos negros para cada tuaregue cativo. Foram levados ao Senegal. Oito dias depois, um mouro num camelo branco trouxe dez escravos para Baldaia, como combinado.

Como rastilho de pólvora, o comércio de escravos africanos se espalhou por toda a costa do continente negro. Pouco após, portugueses assaltaram um entreposto árabe de escravos, capturando 18 mercadores mouros. Arrancaram um resgate de 51 escravos negros guineenses e um leão – o primeiro leão africano a chegar à Europa. D. Henrique o usou para presentear seu preceptor em Galway, na Irlanda.   

Em 1443, Tristão avistou duas canoas vindo no mar, em sua direção. Os 14 homens a bordo foram capturados. Depois, mais 15 que haviam fugido para uma ilha também foram capturados. Neste ano, o papa concedeu a Henrique o monopólio de todo o comércio intercontinental até as Índias.

Meses após, Bartolomeu Dias aportou em Cabo Verde, o tal “país dos negros”. Eram seis caravelas que voltaram lotados de 235 escravos. Alguns tinham a pele clara, outros eram mulatos. Foram conduzidos a um descampado. Estavam cabisbaixos, com o rosto coberto de lágrimas. Alguns se esbofeteavam até cair no chão.

A angústia chegou ao auge na distribuição das “presas”. Para que ocorressem como combinado previamente entre as partes, precisaram separar mês e filhos, maridos e esposas, irmãos. Muitos precipitavam-se em direção ao outro em desespero. Mães pressionavam os filhos contra si, depois atiravam-se no chão, tudo para impedir o inevitável.

A multidão reunida para assistir à cena era enorme.

Henrique estava satisfeito e cedeu sua cota-parte de 46 escravos. Aprazia-lhe a previsão de que, após convertidos ao cristianismo, suas almas seriam salvas...


Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “A primeira aldeia global”

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

PORTUGAL PÓS-ARÁBICO – MAS AINDA BASTANTE ARÁBICO


Após invadirem Lisboa e ocuparem a cidade, os cavaleiros estrangeiros mataram o bispo e puseram frente à diocese o padre Gilberto de Hastings.

Até esse momento, os portugueses passaram 370 anos isolados do resto da cristandade. Em razão disso desenvolveram ritos e liturgias próprios e somente lá praticados. Recebeu o nome de Rito Bracarense, permitido pelo vaticano por decreto. Gilberto de Hastings abominava tais ritos e tentou introduzir o rito inglês do Sarum.

Tanto os padres quanto os cavaleiros estrangeiros foram convidados a permanecer naquelas terras. Os monges de Cister, liderados por Bernardo de Clairvaux, ajudaram sobremaneira no re-erguimento do novo domínio.

Os cistecienses, introduziram as mais avançadas técnicas de agronomia e ajudaram a multiplicar as variedade de plantas de toda a Europa. Organizaram as atividades de fundição de ferro, a indústria de construção naval, de pesca, da extração do sal, assim como a salga e seca do bacalhau. A fabricação de compotas e conservas se mantém como eles a criaram. O cristal Atlantis e um tipo de vidro que eles fabricavam e ainda é símbolo de qualidade e beleza imbatíveis. Nos seus domínios, proibiram a escravidão. Criaram escolas públicas que ajudaram a popularizar o latim. O abade da ordem era uma espécie de conselheiro do rei para a assuntos sociais.

A capital do domínio cedido aos cistercienses se localizava entre Alcoa e Baça. Batizaram-na Alcobaça. Ainda existem cerca de duas dezenas dos mosteiros por eles construídos – foram cerca de 340 em toda a Europa. O mais famoso foi o Mosteiro de Alcobaça. No seu interior havia duas capelas, frente a frente: uma com túmulo de D. Pedro I (de Portugal, não do Brasil!) e D. Inês de Castro, sua esposa. Em razão de ter sido um casamento vetado pelo pai, que mandou matar Inês, D. Pedro a embalsamou e a pôs a seu lado. Os cortesãos eram obrigados a beijar-lhe a mão, como se viva fosse.

O rei D. Dinis, alçado ao trono em 1279, mandou construir o claustro principal ao lado da Igreja. Havia ainda a Casa do Capitulo, onde se reunia com seus conselheiros, e uma câmara real, para recepções. Um dos maiores monarcas portugueses, recebeu o título de Rei Lavrador por causa de sua proximidade com os monges cistercienses.

Vendo sua indústria naval se expandir, construtores navais e 30 capitãos de marinha foram importados de Gênova. Dentre eles, Manuel Pessanha, primeiro almirante português. Tnha como missões principais, repelir ataques piratas e proteger o comércio marítimo. Enriqueceu de tal forma que ele e sua família se tornaram banqueiros do rei da Inglaterra.

O sucesso econômico de Portugal permitiu que o país inovasse nos seguros marítimos. Os armadores pagavam taxas devidas à Bolsa de Lisboa, que ressarcia quem sofresse qualquer sinistro.
D. Dinis também fundou o ensino superior em Portugal, recrutando professores de Paris. Mais tarde o campus foi transferido de Lisboa para Coimbra. Também é tido como o fundador da língua portuguesa. Foi Dinis quem determinou que a língua do povo seria o galaico, não mais latim ou borgonhês. Pequenas adaptações a transformaram numa língua distinta, usada por grandes escritores e poetas em obras monumentais.

Também foi Dinis quem garantiu a continuidade dos cavaleiros templários em Portugal. Extinta em toda a Europa por causa das perseguições promovidas pelo rei Filipe IV e pelo Papa Clemente V, nascida a partir de desentendimentos referentes a empréstimos não pagos. Após novo pedido de empréstimo solicitado à Odem, sem que se saldasse o anterior, e diante da recusa, todos os cavaleiros templários em território francês foram presos e seus bens, confiscados (a fortuna incluía cerca de 1/3 dos imóveis de Paris). Monges foram queimados vivos. O papa Clemente V emitiu a bula Pastoralis Praeminentiae, determinando a prisão de templários e diversos países e o confisco de seus bens. Mas isso não teve validade em Portugal.

D. Dinis, minimizou a bula. Portugal necessitava da Ordem para guarnecer suas fronteiras com a Espanha, pontuada por uma infinidade de Castelos. Sua medida foi, abolir a Ordem em Portugal, como mandava o pontífice, e criar uma outra, denominada Ordem de Cristo, cujo grão-mestre e todos os membros eram anteriormente templários. Esta recebeu todos os bens confiscados à precedente. Templários de toda a Europa procurara abrigo na nova Ordem. A sede da Ordem de Cristo foi definida em Tomar.

O estabelecimento da sede atraiu profissionais de diversas atividades: fabricantes de armas, de selas, de roupas, oleiros, moveleiros, fornecedores de utensílio agrícolas... Suas tarefas eram manterem-se como oficiais de cavalaria e treinar lavradores na arte da guerra (incluindo a esgrima).

Tempos depois, a existência de Portugal foi posta à prova nos embates envolvendo D. João, de Castela e D. João, Mestre de Avis. Por volta de 1385, os espanhóis chegaram muito perto de uma vitória, detida apenas pela pouca experiência de seus oficiais. A situação começou a se desequilibrar para o lado português quando da assinatura, em Westminster, um tratado entre D. João, Mestre de Avis, e o rei inglês Ricardo II. É considerado o tratado mais antigo ainda em voga. Por este, a Inglaterra comprometia-se a agir em defesa de Portugal sempre que solicitada, em troca de privilégios comerciais no porto de Lisboa.

Dando prosseguimento aos acordos, Portugal se comprometeu a apoiar a pretensão do duque de Lencastre John of Gaunt ao trono de Castela. Outro acordo definia que Filipa, filha mais velha de Gaunt, casar-se-ia com o Mestre de Avis. Gaunt possuía o maior ducado da Inglaterra e era reconhecido pela suntuosidade das recepções por ele promovidas. Ainda hoje sua família tem assento no Conselho de Ministros.
Gaunt reuniu sua riqueza pessoal a 3 mil libras fornecidas pelo Tesouro inglês e foi atrás de sua ambição. Gaunt conquistou rapidamente Santiago de Compostela. Saudado pelo futuro genro, seus exércitos marcharam juntos em direção a Castela, certos da vitória. No entanto, o calor escaldante os impediu, sem falar na peste, que vitimava seus homens. Vencidos, Gaunt retirou-se para Baiona.

O casamente de Filipa com João deu-se no Porto, co direito a cavalos brancos e tudo. Doan Filipa trouxe um estilo de moralidade até então desconhecido na Corte portuguesa – como a monogamia. Chegou a obrigar amantes a se casarem, após serem flagrados em situação comprometedora. Mestre de Avis também foi o primeiro rei português a reconhecer seus filhos bastardos.

Ao longo de 16 anos, Filipa concebeu 9 filhos, tendo seis deles sobrevividos. O mais velho, D. Duarte, herdou a coroa. O segundo, D. Pedro, freqüentou as melhores universidades européias e trouxe uma quantidade monumental das obras mais importantes de seu tempo a Portugal – como as Viagens de Marco Polo. O terceiro, D. Henrique, tornou-se grão-mestre da Ordem de Cristo.

Foi D. Filipa quem criou o “destino manifesto” português, ao definir que aquela nação estavca vocacionada à conquista do Marrocos e à conversão daqueles infiéis. O primeiro dia da jornada que Henrique imprimiria contra Ceuta foi marcado pelo falecimento de sua mãe. Após beijar a espada embainhada do filho, D. Filipe pronunciou suas últimas palavras: “jure que lavará suas mãos no sangue dos infiéis”. E finalmente morreu.  

    
Rubem L. de F. Auto


Fonte: livro “A primeira aldeia global”

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

PORTUGAL E OS CAVALEIROS TEMPLÁRIOS – IRMÃOS SIAMESES


Quando regressava à Europa desde Jerusalém, em 1126, Hughes de Paynes estava à procura de homens, dinheiro e da bênção papal. Queria fundar uma nova ordem militar ao lado de outro cavaleiro cristão, Godofredo de Saint-Aumer: a Ordem do Templo. Seu objetivo era a proteção da igreja em Jerusalém, onde se cria existia o Templo de Salomão, e dos peregrinos que para lá se deslocavam. Mas esse objetivo somente seria posto em prática uma geração após.

Inicialmente os templários se dedicaram à construção daquilo que seria o molde dos futuros Estados cristãos: Portugal. Em nenhum lugar ela foi mais relevante; afinal, após sua extinção em todo o mundo, sobreviveu em Portugal até o século XIX, por meio da Ordem de Jesus.

A Ordem do Templo se tornou a instituição mais rica do mundo ocidental, mais rica do que qualquer monarquia. Mais rica do que a Igreja, mesmo.

Para seu intento, Hughes viajou até Borgonha, nação mais rica do ocidente então, era um entroncamento comercial e intelectual na Europa. Lá, obteve a ajuda de um monge, Bernardo, abade de Claraval. Era um religioso altamente prestigiado, fulcral quando se tratava de eleições de papas. Ao contrário de muitos monges que se regalavam e banqueteavam alimentos raros e caros, Bernardo abriu mão de toda sua fortuna, própria de filhos de aristocratas.

O mosteiro construído por Bernardo prezava o despojamento. Os monges dormiam sobre palhas, em dormitórios sem aquecimento e dividiam o dia entre orações e trabalhos extenuantes. A alimentação era restrita a legumes cozidos. Sonhava livrar a Igreja da imoralidade. Pregava contra a discriminação de judeus e promovia o respeito às mulheres por meio da veneração a Virgem Maria.

Não se sabe ao certo quem, e em que momento, decidiu fundar Portugal, uma nação cristã fundada no flanco ocidental do império do islã. Mas três séculos mais tarde, quando Portugal já ocupava o lugar de nação mais rica da Europa, foi o desejo de São Bernardo de conquistar o Marrocos que levou a eminente nação à flagrante derrota que o submeteu a duas gerações de submissão à coroa espanhola.

Foram fatos como os acima descritos que sempre levantaram suspeita sobre o real objetivo da nova Ordem: não seria a proteção de peregrinos, mas a guerra contra os árabes muçulmanos. Como alicerce moral – afinal, era diametralmente oposto aos ensinamentos de Deus matar homens, ainda que num contexto de guerras religiosas – recordou os ensinamentos de Santo Agostinho, que afirmava que guerras ordenadas por Deus ou por uma autoridade legítima eram justas.

A fundação da Ordem do Templo ocorreu em 1128, na cidade de Troyes. Seis semanas depois, Hughes e um grupo de cavaleiros empossados chegaram a Portucale – terras da família de Bernardo, banhadas pelo Atlântico, recebidas de D. Afonso por ter doado soldados para as guerras de expulsão dos árabes.
Inicialmente, Hughes e seu cavaleiros tomaram um castelo dos berberes no local onde fica atualmente Leiria, no estuário do Lis. Eram menos cavaleiros do que bandidos que faziam incursões em território inimigo e os faziam escravos.

Nesse período, ficou muito famoso um cavaleiro chamado de Geral Sem-Pavor. Escalava os muros das cidades muçulmanas à noite, sem ser visto, criava uma algazarra tal que fazia parecer aos inimigos que se tratava de um regimento completo e fugiam. Somente foi capturado pelos castelhanos quando do ataque a Badajoz, cidade na fronteira com Portugal. Capturado, após escapar alistou-se nas tropas muçulmanas. Em razão do grande sucesso de seus feitos contra cidades cristãs, recebeu um feudo no norte da África.

Por volta de 1147, a situação dos cristãos era péssima. Avanços muçulmanos pareciam incontíveis. Nesse contexto, São Bernardo e o papa Eugénio III deram largada à Segunda Cruzada.

Mais tarde, o rei Afonso Henriques de Portugal, primo de São Bernardo, e Hughes de Paynes conduziram seus homens até Santarém, às margens do rio Tejo. Mandaram avisar ao governador muçulmano que tinha apenas três dias para se render. Ignorados, encostaram uma escada no muro da cidade, três conseguiram matar os soldados da murada e alcaçaram o portão, que abriram, permitindo a entrada dos demais soldados. Deram início a um banho de sangue que vitimou quase toda a população local.

D. Afonso legou aos cavaleiros todas as igrejas de Santarém. O sucesso da empreitada levou pessoas de toda a Europa a se alistarem na Ordem. Foram mais de 3 mil homens.

Foram transportados em 164 navios com destino a Jerusalém. No entanto, no Golfo de Biscaia foram vitimados por uma tempestade. Aportaram no Porto e lá foram instados por D. Afonso a ajudar-lhes na conquista de Lisboa. Essa empreitada bem sucedida, em 1147, foi a única vitória relevante da Segunda Cruzada. Seu relato se encontra na biblioteca da Faculdade Corpus Christi, em Cambridge. Lisboa, finalmente, após 400 anos, estava franqueada aos norte-europeus. Era a cidade comercial mais rica da Europa.

Após a chegada dos cavaleiros triunfantes, a população de Lisboa superou as 150 mil pessoas. Naquela época, Paris contava 50 mil habitantes, enquanto Londres não possuía mais do que 30 mil. Tinha ali residência aristocratas de todo Portugal, comerciantes e mercadores da Espanha e da África. Lisboa era inteiramente murada, tendo de um lado o Atlântico, de outro, seus subúrbios. Os novos governantes ficaram espantados com a quantidade e qualidade dos campos que rodeavam a cidade. Ouro, prata, ferro, frutas, vinhas, azeitona tudo em abundância e qualidade. O sal consumido vinha de depósitos subterrâneos. Figos estragavam no chão. A caça era abundante, o ar, saudável. Éguas se reproduziam nos pastos. Os peixes tirados do Tejo eram tanto que se dizia que o rio era constituído 2/3 de água e 1/3 de peixes e mariscos.
No entanto, os normandos, ingleses e franceses que tomaram parte na invasão de Lisboa queriam ficar com todos os bens que conseguissem carregar, nada deixando aos portugueses. D. Afonso cedeu aos pedidos, afinal desejava mais do que qualquer cosia expulsar os muçulmanos dos domínios que tanto almejava. Aceitou a cidade totalmente espoliada e saqueada pelos norte-europeus daquela cruzada. Lorde Saher de Archelle foi o comandante dos cavaleiros-saqueadores.

Iniciando os ataques às nove horas da manhã, com uma chuva de pedras prontamente respondida, passaram aos ataques com flechas e lanças e, ao anoitecer, os moçárabes bateram em retirada dos subúrbios.

Os dias seguintes viram uma guerra verbal. Cristãos gritavam que Maomé era filho de uma prostituta, ao mesmo em tempo que os muçulmanos cuspiam e urinavam em crucifixos e os lançavam contra os inimigos.
Cavaleiros alemães tentaram escavar um túnel por baixo da muralha. Foram repelidos. Cavaleiros franceses construíram uma torre móvel. Ficou atolada e os árabes a atacaram até que a incendiaram completamente.

As relações entre cavaleiros normandos, alemães e ingleses azedaram de vez. Foi quando surgiu o boato de que na missa rezada no acampamento alemão, a h´[ostia se transformara num pedaço de carne ensanguentada. Entenderam que Deus apelava a seus instintos sanguinários.

As lutas ficaram mais renhidas. Um dia, os ingleses atacaram a margem sul de Almada. Regressaram com 200 prisioneiros e mais de 80 cabeças cortadas. Empalaram as cabeças em lanças e as arremessaram para o interior de Lisboa.

A cidade era densamente povoada. Não havia cemitérios. A cada dia a situação lá ficava mais insuportável com cheiros de mortos e falta de alimentos. Quando alguém saía em busca de alimentos, era capturado e morto. A cada dia mais residentes se bandeavam para o lado dos cristãos.

Após 15 semanas, os alemães conseguiram fazer o túnel subterrâneo pretendido. Puseram fogo e, ao amanhecer, 65 metros de muralha vieram abaixo. Após longo embate corpo a corpo, os árabes conseguiram permanecer no seu território. Mais uma torre foi construída, protegida com couro de boi. Mais alguns dias de sofrimento e angústia de lado a lado e os árabes depuseram armas e se entregaram. Não aguentavam mais, queiram a trégua.

Cinco representantes muçulmanos saíram para negociar a rendição. A avidez com que alemães, flamengos, ingleses e normandos se lançavam sobre os espólios causou repulsa nos portugueses. Após recolherem tudo o que havia sido entregue pela população, empreenderam buscas em casas e lojas, saqueavam o que encontravam e decapitavam quem escondesse qualquer coisa. Decidiu-se que o rei de Lisboa e sua família poderiam ficar com seus bens, e isso deixou muitos cavaleiros fulos.

Após a abertura dos portões, os cavaleiros adentraram com ainda mais ódio e mais sangue foi derramado. Nas palavras do capelão dos cavaleiros cristãos temerosos a Deus:

“Ah, como todos exultaram! Ah, como todos estavam verdadeiramente orgulhosos! Ah, que quantidade de lágrimas, de alegria e de piedade, foram derramadas, quando, para honra e louvor de Deus e da Santíssima Virgem Maria, a insígnia da Cruz salvadora foi colocado sobre a mais alta torre da cidade como penhor da sua submissão, enquanto o nosso arcebispo e o nosso bispo, acompanhados pelo clero, entoaram, em lágrimas e repletos de júbilo, o Te Deum Laudamus.”


Rubem L. de F. Auto

Fonte: livro “A Primeira Aldeia Global”