O índio se orientava por meio de qualquer sinal de que
dispusesse na natureza. Movimentava-se por trilhas, nas capoeiras ou nos matos
ralos, ao longo da qual cortava ramas, assinalando sua marcha para os demais
que o seguissem.
Na mata fechada, usava seu machado para sinalizar em troncos
de árvores. Se estivesse se movendo por descampados sem fim, onde a paisagem
era todo igual, usava varetas enfiadas no chão, cuja parte menor indicava a
direção.
Se houvesse sol, usava a sombra de seu polegar na palma da
mão para se orientar. Se fosse à noite, as estrelas os guiavam. Para saber se e onde havia água nas
redondezas, nada melhor do que a sensação do vento batendo no rosto.
As andanças dos indígenas ocorriam com tal intensidade que
seus pés se adequaram, desenvolvendo plantas mais largas e com dedos cabeçudos
e compridos, ótimos para agarrar no solo e que distribuíam melhor o peso do
corpo.
A maloca (ou oca), local de habitação dos índios, era
construída com varas, fechada e coberta com palhas e folhas. Duravam cerca de 5
anos, após os quais era abandonada, sem receber quaisquer reparos. O tamanho
variava, dependendo da quantidade de moradores (de 50 a 100, geralmente). Os
animais que conviviam no espaço doméstico eram muitos: papagaio, macaco, tatu,
porco, pato, passarinho... Hans Staden testemunhou ocas com 4,62 metros de
largura por quase 50 metros de comprimento, e 4,40 metros de altura.
As malocas não possuíam janelas; tinham aberturas laterais
nas extremidades. Não havia paredes e divisões internas, mas havia nichos,
espécies de divisões não aprentes: cada um tinha de 4 a 7 metros, dependendo do
tamanho da família que o ocuparia.
A construção da maloca era um obra coletiva, que mobilizava
de 40 a 50 homens, sendo um deles o líder dos trabalhos. Cada um que
contribuísse com a construção poderia habitar a maloca.
Após a construção, o casal principal da maloca ganhava o direito
a uma “ini”: a rede do casal. Os demais poderiam ter esteiras. Havia também na
maloca a “igaçaba”, ou talha para guarda água, cuias; a nhaemperó, ou panela,
fuso, gamelas, porongos, arcos, flachas, tacapes, aves, animais completavam os
utensílios caseiros. No centro, a tatárendaba, a fogueira, que permanecia
sempre acesa.
Próximo ao teto, havia um estrado de varas, onde guardavam a
urupema, um espremedor de mandioca, a urupema, o jacá, o puçá, usado em pescarias,
o uru, um cesto com tampa. O induá – o pilão – ficava do lado de fora.
Embora simples, era uma habitação que se adequava bem ao
ambiente onde instalada: era ventilada, fresca e a fumaça da fogueira mantinha
os insetos distantes.
Aquela quantidade assombrosa de pessoas, reunidas em núcleos
familiares menores, porém reunidos sob um único teto, conviva em harmonia
graças a algumas regras de convivência bem definidas: os contatos íntimos entre
os casais ocorriam fora da oca (no mato, na praia); as necessidades
fisiológicas também eram feitas no relento, sendo logo cobertas com terras e
folhas. As mães tinham o hábito de manter tudo limpo. O bom dia era desejado
pronunciando-se “Enecôema!”; a resposta era “Yauê!” ou a mesma frase anterior,
repetida.
Após a morte, a maloca continuava sendo o centro dos ritos.
Os índios eram enterrados no local onde dormiam. Então, o local se tornava
sagrado.
Quanto à família indígena, apenas os parentes pelo lado
paterno eram considerados familiares consangüíneos. Os filhos do mesmo pai eram
considerados irmãos.
Se um índio morresse, seu irmão mais velho assumia a viúva
do morto, ainda que fosse casado com várias outras índias. Na falta de irmão,
um parente mais próxima poderia fazer o mesmo.
Pelo lado materno, o casamento do tio com a sobrinha era
recomendado na mesma situação.
A proteção às mulheres era buscada por meio do casamento das
solteiras, sob a batuta do chefe da família.
Se a morte do índio casado ocorresse numa guerra, o índio
que o matou era obrigado a levar a viúva para sua maloca.
Se o número de solteiras aumentasse muito, o conselho tribal
definiria quem receberia mais esposas.
As mulheres casados ganhavam o direito de dormir em redes, ao
lado da rede do marido, deixando os tempos da esteira para trás. Contribuíam
nos trabalhos da família, mas apenas a primeira (escolhida por amor) poderia
acompanhar o marido na caça e na guerra. E apenas os filhos da primeira esposa
poderiam herdar a posição do pai no comanda da família.
A fidelidade conjugal era levada a sério. O adultério era
repudiado. Se a mulher traísse o marido, este poderia devolvê-la ao pai. O
adultério masculino era tolerado, desde que ocorresse entre o nascimento de um
filho e o momento em que este começasse a andar.
Uma eventual separação poderia ocorrer, desde que acordado e por iniciativa
de um dos cônjuges. Um eventual reatamento também poderia ocorrer. Portanto a
formação da família advinha do casamento.
O incesto era vedado.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Os povos indígenas no Brasil”
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