O casamento entre indígenas ocorria em meio a uma cerimônia
muito simples. Em geral, apenas após o primeiro filho a união se realizava
plenamente.
Quando a menina passava ser considerada mulher, atava a seu
braço e à cintura uma fio de algodão colorido. Pronto, um ano depois já poderia
se casar.
Já os homens passavam à maturidade mediante cerimônia mais
complexa. Após os 25 anos, apenas após ter lutado uma guerra, ter feito
prisioneiros e tê-los matado e devorado poderia o infante cogitar casar-se.
Cria-se que o homem sem esses predicados poderia vir a ser um “mebeque”, isto
é, pessoa mole, medrosa, covarde, tímida, enfim, uma desonra para a tribo.
Escolhida uma esposa, o pretendente então oferecia seus serviços
ao pai da noiva. O pai então levava o pedido do jovem ao conselho tribal, que
deliberava acerca das qualidades do jovem: se reprovado, deveria abandonar a
aldeia.
Se aceito, passava a algumas provas, como testes físicos,
sofria chicotadas dadas pelos homens da tribo, sem poder reclamar, dentre
outras provas.
Após casado, era comum o sogro cortar o punho da rede onde
dormiam os recém-casados, de madrugada, dando um tombo no casal. Criam que esse
ritual evitava que os filhos nascessem com rabo.
Quando a mulher engravidava, declarava-se puruabare: já não
poderia comer caças de fêmeas, nem comer frutos ácidos, nem raízes, nem certos
peixes.
Nascido o filho, o casal então se mudava para a maloca do
sogro: agora era considerado um continuador da família.
O nascimento do filho era uma festa. O pai ajudava no parto,
as amigas da mãe davam o primeiro banho na criança, o peitan (bebê). Se menina,
recebia um colar de dentes de capivara: pensavam que isso daria uma bela
dentadura à menina, o que era um forte atrativo feminino. Após, a mãe recebia
um cesto e punha a criança dentro. Assim, três dias depois já voltava aos
trabalhos.
Os meninos eram presenteados com unhas de onça e garras de
gavião (ou águia). Assim, criam, o menino (guri, ou uuri, isto é, bagre novo)
se tornaria um homem de corajoso, respeitado. O pai amarrava nos punhos de sua
rede miniaturas de tacape, arco e flecha. No outro lado, ervas. Eram os
símbolos de trabalho, honra e ódio tribal.
O pai deitava na rede para o ritual do choco, ou couvade:
deitado na rede, em jejum, esperava o umbigo do recém nascido cair.
Os filhos cresciam em harmonia, sem castigos nem
repreensões: a educação se deva pelo exemplo e participação. Ao fim da
infância, davam-se os rituais de iniciação à juventude. Era quando os jovens
recebiam um tembetá (ou metara) no lábio inferior. Este era o símbolo da
virilidade. Mas os lábios eram furados aos seis anos, como aviso ao curumim para
que se preparasse para a entrada na juventude.
Já o ritual feminino variava de tribo para tribo. Algumas
sofriam cortes no corpo, para que o sangue novo jorrasse. Outras eram isoladas
e, em jejum, ouviam as idosas revelarem-lhe as belezas e as obrigações de ser
mulher. Algumas meninas eram isoladas durante um ano, reclusas em suas ocas.
A mulher era um ser a ser protegido, sempre. Sem elas não haveria tribo, nem família. Todos deveriam proteger as mulheres.
A mulher servia ao marido, cuidava dos filhos, da maloca,
semeava e colhia, e seguia os homens na caça e na guerra. Mesmo aquelas que
dividiam seu esposo com outras, eram dedicadas e ternas.
Comerciantes franceses testemunharam invejosos como viviam
os trabalhadores que carregavam as toras de pau-brasil. Quando paravam para descansar, eram cobertos
de carinhos de suas mulheres. Elas também embalavam suas redes, davam-lhe
alimentos na boca e faziam carinhos ao som de músicas. Daí a sensação de que os
índios eram muito ciumentos com suas esposas.
As mulheres que revelassem algum dote especial, como
profecia ou premonição, eram consideradas sobrenaturais e recebiam privilégios
diversos.
As idosas deveriam educar os jovens, manter as tradições e
preparar as bebidas usadas em rituais.
As solteiras usavam cabelos soltos. As casadas, os cortavam
na altura da orelha, poliam os dentes incisivos e arrancavam pestanas e
sobrancelhas.
Dentre os índios, a velhice se iniciava aos quarenta anos.
Os velhos eram cobertos de honras e respeito: eram servido primeiro nas festas,
seus pés eram lavados pelas jovens, que também tiravam ossos e espinhos da
comida a eles servidas. Não precisavam mais trabalhar.
Eram eles que detinham o poder político e elaboravam as
táticas de guerra. Eram também eles que passavam oralmente as tradições, lendas
e crenças que tentavam explicar a origem da vida, da morte e dos fenômenos
naturais.
As cerimônias eram coordenadas pelas “uainuy”. Elas detinham
o segredo do preparo de bebidas alucinógenas, preparavam a carne do prisioneiro
a ser executado, choravam mortos. Também ajudavam a preparar as jovens para a
vida adulta.
Quanto à Justiça, um viajante europeu relatou que “se um
deles é ferido, o ofensor recebe dos parentes do ofendido ofensa igual e no
mesmo lugar do corpo”. O assassino então recebia o repúdio de todos da tribo e
deixava a taba; ou passava a prestar à família do morto os serviços antes
executados pelo índio que ele matou.
Os casos mais graves eram solucionados pelo conselho tribal.
O líder da tribo era chamado “morubixaba”, ou tuxaua, ou
cacique. Todos esses nomes significam “o principal”. Não havia eleição, posse,
juramento. O grupo simplesmente aceitava a liderança do mais capacitado.
Alçado à posição de liderança, o índio deveria reafirmar
suas capacidades a todo momento. A posição estava sempre em aberto e outro
poderia vir a ocupá-la.
O índio mais estável em seu cargo era o pajé, quem detinha o
poder mágico-místico. Ele previa o futuro, previa doenças, curava pessoas. Era
fruto de longo trabalho e aprendizagem.
Havia também o nheengaba, ou conselho de anciãos. Formado
por membros com mais de 40 anos, também não eram eleitos: eram escolhidos por
suas qualidades. Atuavam na mudança de taba, nas guerras, na execução de
prisioneiros, impediam e aprovavam casamentos.
Já nos assuntos de família, o chefe era a autoridade
soberana.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Os povos indígenas no Brasil”
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