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quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

XADREZ PARA LER E PARA JOGAR


O primeiro livro contendo as regras do xadrez moderno surgiu em fins do século XV, escrito por um espanhol de nome Lucena. Continha passagens como “Se jogardes à noite com uma única vela, colocai-a de vosso lado esquerdo, de modo que não atrapalhe vossos olhos; se jogardes de dia colocai vosso adversário voltado para a luz, o que vos dará grande vantagem. Procurai também jogar com vosso adversário quando ele tiver acabado de comer e beber abundantemente. Para jogar durante muito tempo é melhor ter comido ligeiramente. Para evitar de ficar atordoado durante o jogo, deveis beber água, mas, de maneira alguma, vinho.”

Em 1512, um boticário português chamado Damiano publicou uma obra muito bem sucedida sobre xadrez. Até 1560 a publicação teve sete edições e chegou a ser falsificado por dois outros autores. Foi citado por grandes mestres pelos três séculos seguintes.

Em 1561, um padre espanhol chamado Ruy López de Segura, considerado o melhor enxadrista da Espanha e beneficiário de uma fortuna paga pelo rei Filipe II, grande aficionado pelo grande mestre, publicou sua obra sobre xadrez. Desse período em diante, toda corte européia tinha seu mestre enxadrista, a quem recompensavam desmedidamente.

O século XVI viu a supremacia no jogo passar da Espanha para a Itália, pelas mãos dos mestres Giovanni Leonardo e Paolo Boi. Este último chegou a disputar uma partida contra o rei português D. Sebastião, usou suas habilidades notáveis no jogo para se livrar de sua prisão por piratas argelinos e muito mais. Ao cabo de dez anos de invencibilidade no tabuleiro, havia amealhado mais de 30 mil coroas, numa época em que mil coroas anuais garantiam uma vida bastante confortável.

Giacchino Greco deu início a suas vitórias espetaculares em 1621, na corte do Duque de Lorena, em Nancy. Mudou-se para Paris, onde ganhou 5 mil coroas derrotando três nobres mestres em xadrez, em sequência. Mudou-se para Londres, mas foi assaltado na viagem, perdendo tudo. Mas suas habilidades no xadrez lhe garantiram uma rápida recuperação financeira. Mudou-se para a Espanha, onde garantiu ainda mais dinheiro derrotando adversários diversos na corte de Filipe IV. Levado À América por um nobre, morreu em 1634, deixando sua fortuna para os jesuítas.

As grandes partidas eram disputadas nas cortes, especialmente dos reis aficionados pelo jogo, como Catarina de Médicis, Henrique IV, Luís XIII, quando foram abertos os primeiros cafés em Paris, em fins do século XVII. Em Londres, o café Slaughter`s ocupou o centro da vida dos jogadores de xadrez.

O sírio Phillip Stamma deu um grande salto na técnica de ensinar táticas de xadrez quando, pela primeira vez, empregou a notação algébrica para identificar as colunas no tabuleiro, em sua obra The Noble Game of Chess, de 1745 – na verdade era uma tradução para o inglês de seu primeiro livro sobre o assunto, Essay sur Le Jeu des Echecs, publicado em Paris em 1737. Essa obra recebeu edições em diversas línguas pelos 120 anos seguintes.

Em 1717, Stamma foi derrotado por aquele que seria um dos maiores enxadristas de todos os tempos, o francês André Philidor, gênio na música e nos tabuleiros. Aos onze anos, Philidor compôs o coro “Motete com Grande Coro”, executado na presença do rei. Foi também na capela, observando os músicos da orquestra, que Philidor aprendeu a jogar xadrez.

Com o estatus de melhor jogador da orquestra, Philidor aventurou-se no Café de la Régence, onde os melhores começavam a se concentrar para disputas que arrastavam multidões para seu interior. Conquistar o estatus de melhor da França foi questão de tempo. Após, já era admirado em diversos países. Em 1748, Philidor publicou o Analyses Du Jeu dês Echecs. Teve três edições já no ano de lançamento.

Por meio de contribuições de fãs ingleses e com a boa tiragem de sua obra, Philidor viveu alguns anos em Londres, até se mudar para Berlim, sob o governo de Frederico, o Grande, também grande fã do jogo de xadrez.

Quando retornou a Londres, deparou-se com um fato inusitado: sua grande fama de mestre no xadrez fez com que se duvidasse de suas composições musicais, afinal era incrível que alguém pudesse ter nascido com ambas as habilidades. Para silenciar a crítica, Philidor musicou o poema “Ode on St. Cecilias`s Day”, de Pope, obtendo amplo reconhecimento pelo feito – Handel ouviu e adorou a música.

Após, passou a trabalhar com óperas-cômicas. Seu sucesso no Théatre de la Foire fez com que o Théatre Italien, até então o maior de Paris, fosse à beira da falência. A fusão dos dois deu origem à atual Ópera Comique.

Embora tivesse jogado partidas contra Robespierre, a proximidade da Revolução Francesa e o fato de ser conhecido por dezenas de nobres franceses o fizeram retornar a Londres. Morreu em 1795.

Luis Charles Mahé de la Bourdonnais, nascido rico mas logo tornado pobre por jogadas financeiras péssimas, foi o mestre seguinte. Sua pobreza somente foi atenuada por convites para enfrentar os melhores mestres ingleses na época. Foi sepultado ao lado de seu maior adversário, Alexander MacDonnell, quem derrotou diversas vezes. As disputas entre os dois foram as primeiras partidas registradas na história, lance a lance.

Finalmente, em 1843, o mundo do xadrez viu a supremacia se mudar para o norte, para a Inglaterra. Em 1843, Howard Stauton derrotou o mestre Pierre de Saint-Amant. Em 1851, por ocasião da Grande Exposição de Londres, organizou-se uma competição internacional. Foi vencida pelo alemão Adolf Anderssen.

Stauton mostrou-se péssimo competidor, ao não admitir a superioridade do adversário. Mas o próprio alemão veria um jovem norte americano, Paul Morphy, ofuscar a todos após derrotá-lo em 1857.
O mestre seguinte, o alemão William Steinitz, foi o primeiro jogador agraciado com o título de campeão mundial, em 1862. Após derrotar Anderssen, Steinitz passou os vinte e sete anos seguintes derrotando os maiores mestres europeus. Mudou-se para os EUA, a convite de admiradores. Suas maiores vitórias ocorreram em 1885, contra Zukertort, em NY, Saint Louis e Nwe Orleans; em 1889 e 1892, em Havana, contra o mestre russo Tchigorin.

Até meados do século XIX, o xadrez na Rússia estava limitado à alta sociedade. Foram grandes amantes do jogo: Pushkin, Tolstoi, Turgenev. O melhor enxadrista daquele século foi Dimitrovich Petroff. O primeiro enxadrista russo a participar de uma competição internacional foi Simon Winawer, comerciante de Varsóvia, arrastado para o torneio por acaso, enquanto estava em Paris a fim de realizar negócios, em 1867. A ocasião de seu durante a Feira Mundial de Paris. A organização decidiu chamá-lo após ser informada de que ele entrara no Café de la Régence e derrotou os melhores jogadores da casa.

Na competição internacional, Winawer ficou em segundo, somente perdendo para Steinitz, o então campeão mundial.

Em 1880, foi fundado o primeiro clube de xadrez russo, em São Petersburgo, por Mikhail Tchigorin. Este ficou empatou com Winawer em terceiro lugar, em 1881, quando tinha apenas 31 anos de idade, no torneio internacional de Berlim. Assombrou a todos a originalidade dos jogadores russos, até então um tanto isolados do resto da Europa.

Em 1883, Tchigorin derrotou a todos, inclusive a Steinitz, por duas vezes. Na final do campeonato mundial, em 1889, Steinitz sairia vencedor, mas foi Tchigorin quem seduziu a todos com suas belas jogadas. Inclusive a popularização do xadrez na Rússia deveria muito a ele.

Quarenta anos depois surgiria o primeiro campeão mundial russo.


Rubem L. de F. Auto

Fonte: livro “História do xadrez”


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