Embora muitas das discussões - pobres e improdutivas,
diga-se - sobre política, atualmente, girem em torno de nomes cuja definição
quase todos desconhecem, como esquerda, direita, capitalismo e socialismo, a
história da humanidade indica que a força motriz subjacente é basicamente a
mesma desde, pelo menos, quatro milênios antes de Cristo, data em que se pode
afirmar que nascera a civilização: a força das armas move a tudo e a todos.
Em escala internacional, a força das armas corresponde à
força dos impérios. E a história dos impérios é muito antiga, embora tenhamos a
tendência de nos lembrarmos apenas dos impérios modernos do nosso hemisférios ocidental.
Iniciada por Portugal e Espanha, quando da conquista do
novíssimo continente americano, a era dos impérios atingiu seu ápice no período
entre 1880 e 1980. Até o estouro da I Guerra Mundial, Grã-Bretanha, França,
Bélgica, Holanda e Alemanha, que, somadas, correspondiam a menos de 1% da
superfície da Terra e a menos de 8% da população mundial, governavam um terço
do planeta e mais de 25% dos terráqueos. Ficam de fora dessa conta todos os
países americanos, exceto o Canadá, ainda colônia inglesa, contudo sabendo-se
terem sido eles governados por impérios europeus por séculos.
Mas a situação em escala mundial era ainda mais angustiante.
A maior parte da Europa central e oriental gravitava em torno das órbitas dos
impérios russo, alemão ou austríaco. Havia ainda o império Otomano, senhor
absoluto do Oriente Médio, e o milenar império Chinês. E novos entrantes
pareciam interessados em se juntar à festa. O Japão, após ter suas portas
comerciais arrombadas por frotas yankees, logo se lançou à sua aventura
imperial após invadir a Coréia.
Os EUA mesmos, embora concebido em meio a guerras anti-imperialistas,
punham suas mangas de fora ao conquistar, um após outro, Texas (1845),
Califórnia (1898), Alasca (1867), Filipinas, Porto Rico, Havaí e Guam (1898). O
imperialismo que se iniciou em escala continental não parou até se tornar
hemisférico.
Mas, no século XX, a rejeição ao imperialismo se instalou. O
marco fundador dessa ojeriza foi a publicação de “Imperislismo: um ensaio”, de
J. Hobson, uma crítica ferina ao Império Britânico, na qual o autor definia aquele
império como uma enorme extorsão desenfreada em proveito de uma pequena elite
de financistas e de seus clientes especuladores. Esse livro seminal serviu de
inspiração para outra obra de tirar o fôlego: “Imperialismo: etapa superior do
capitalismo”, de Vladimir Lênin. Este via a I Guerra Mundial como o embate
inevitável entre nações imperialistas, não mais capazes de conviverem em paz.
Após cambalearem quase moribundos ao longo dos anos 1920 e
1930, os impérios ocidentais que sobreviveram ao primeiro conflito mundial foram
abatidos pela fúria desenfreada da II Guerra Mundial, fruto da tentativa de
alemães, italianos e japoneses construírem impérios próprios na Europa, na
África e na Ásia.
Ao cabo, restavam quase incólumes dois impérios, ainda que
suportassem um discurso anti-imperialista: EUA e URSS. A China seguia a
definição de império à risca, mas não tinha territórios ultramar, portanto tinha
pouca probabilidade de se beneficiar com o movimento de descolonização que se
iniciou pós-1945.
O clima para a descolonização do mundo não era dos mais
propícios. No mundo ocidental, a voz de Roosevelt soava única. A vontade de conceder
ampla soberania às ex-colônias pode ser resumida numa frase de sincera e retumbante,
pronunciada por Herbert Morrison, em 1943: “Seria um absurdo ignorante e
perigoso falar em concessões de governo próprio a muitos dos territórios
dependentes por algum tempo no futuro. Nesses casos seria como dar a uma
criança de dez anos a chave de casa, uma conta no banco e uma arma.”
Mas Roosevelt terminou por derrotar Churchill e a
descolonização do mundo ocorreu, embora os EUA tenham atrapalhado muito
naqueles países onde havia o perigo de tomada do poder por grupos comunistas,
como ocorreu na Indochina (Vietnã, Camboja e Laos), e no Oriente Médio. Nesses
lugares, ditaduras sanguinárias forma financiadas por Washington para evitar a “ameaça
vermelha”.
Se a I Guerra Mundial pôs um ponto final nas famílias
imperiais dos Habsburgo (Austro-Húngaro), dos Hohenzollern (Alemanha) e no
império Otomano (sediado na atual Turquia), a II Guerra enterrou os impérios
britânico, francês, holandês, belga e português.
Após isso, o mundo viu assombrado o número de países do
globo aumentando exponencialmente. Em 1920 havia 69 países soberanos; em 1950,
o número chegou a 89; em 1995, quando o império russo finalmente desabou, havia
192 países soberanos no mundo.
Diante do crescimento abrupto da China, do enfraquecimento
militar dos EUA, da retomada da indústria bélica russa... o que nos guarda o
futuro?
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “Colosso”
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