Em 13 de junho de 1942, como parte de seu esforço de guerra,
o presidente dos EUA, Franklin D. Roosevelt, criou o OWI – Office of War
Information, ou Escritório de Informação de Guerra. Era uma espécie de
Ministério da Propaganda voltado para o período de guerra, contando com uma
divisão específica para cinema. Era sua tarefa, basicamente, assistir às
recentes produções e sugerir adaptações que pudessem ajudar na vitória contra o
Eixo. Segundo seu chefe, Elmer Davis: “A maneira mais fácil de injetar uma idéia
de propaganda na mente da maioria das pessoas é introduzi-la por meio de um
filme de entretenimento, quando elas não percebem que estão sendo submetidas à
propaganda.”
Este foi o período em que Hollywood trouxe à luz alguns de
seus maiores sucessos: Casablanca, de 1942, trazia mensagens ideológicas
embutidas; os atores Ingrid Bergman e Humphrey Bogart não deixavam a atração recíproca
que sentiam sobrepujarem sua luta antifascista.
O sucesso Mrs. Miniver (Rosa da Esperança por aqui),
emocionou de tal forma o primeiro-ministro britânico Winston Churchill que ele
declarou que o efeito deste filme “no sentimento público dos Estados Unidos valeu
por um regimento inteiro”.
O filem Once Upon a Honeymoon (ou Era uma Lua de Mel, aqui),
estrelado por Ginger Rogers e Cary Grant, primeira obra a mostrar
especificamente o que ocorria com os judeus no Reich, foi assim elogiado pelo
OWI, no que se refere à perseguição nazista contra o povo judeu: “É feita uma
tentativa de mostrar a crueldade e a insensatez de se discriminar uma minoria.
A questão judaica é exposta com extrema franqueza, e em duas instâncias
importantes é retratado todo o terror e pathos do sofrimento de um trágico
povo.”
Esta obra foi a primeira a retratar a rotina num campo de
concentração nazista. O OWI assim se referiu a estes trechos: “Esses trechos do
filme são imensamente eficazes e o filme merece todo elogio por seu tratamento
desse importante problema.”
Por esse período, a
causa judaica recebeu um reforço de peso: o roteirista Bem Hecht, vencedor
do Prêmio da Academia pelo filme de gângsteres Underworld (Paixão e Sangue), de
1927; e também escreveu outros clássicos: Scarface, de 1932; Design for Living,
de 1933; Viva Villa, de 1934; Nothing Sacred, de 1937; His Girl Friday, de
1940. A frase que escreveu para um pequeno jornal, onde expunha suas reflexões
sobre o sofrimento que seu povo enfrentava, resumia bem seus sentimentos: “Já
que somos judeus aos olhos dos nossos inimigos; já que eles com grande astúcia
e malícia nos reinventaram – tudo o que sugiro é que nos transformemos em
Frankensteins.”
A causa contaria com outras iniciativas, como a de Peter
Bergson, que arrecadava fundos nos EUA para financiar o que chamou de Irgun: um
movimento até então clandestino que visava à fundação de um Estado judeu na
Palestina. Em 1940, diante da tragédia que testemunhava, mudou o foco de sua
luta para o estabelecimento de um exército judeu para combater Hitler. Sua
iniciativa de chamava Comitê para um Exército Judeu.
Tamanha energia despendida por membros da comunidade judaica
deram o ânimo para que se devolvessem a eles o orgulho e o respeito de serem
judeus.
Em novembro de 1942, a imprensa tornou público que mais de 2
milhões de judeus haviam sido assassinados na Polônia, Áustria e Holanda –
aniquilação total estava em curso. Tronou-se premente elaborar algum tipo de ajuda
para que se resgatassem aqueles alvos em potencial na Europa, mas nenhuma
iniciativa concreta evoluiu nesse sentido. Os sobreviventes eram enviados aos
campos de concentração de Treblinka, Belzec e Sobibor.
Diante da inércia, o Comitê para um Exército Judeu deixou seu
sionismo militante na geladeira por enquanto, enquanto tentavam preparar um
plano de resgate de suas contrapartes europeias. Também foram eles que exigiram
do governo americano punição aos nazistas, após a guerra, por seus crimes
contra a humanidade.
No início de 1943, outra manchete terrível causava náuseas
na comunidade judaica, assim como naqueles que compartilhavam algum sentimento
de humanidade: o governo romeno oferecera transportar 70 mil judeus para um
local seguro, ao preço de 20 mil lei (cerca de 50 dólares) por pessoa. Hecht
logo fez publicar uma de suas manchetes desconcertantes:
“À VENDA PARA A HUMANIDADE: 70 MIL JUDEUS. SERES HUMANOS
GARANTIDOS POR R$ 50 CADA.” Logo abaixo: “A Romênia cansou de matar judeus.
Matou 100 mil em dois anos. A Romênia agora vai distribuir judeus praticamente
de graça. Setenta mil judeus estão esperando a morte em campos de concentração romenos...
É uma oferta sem precedentes! Setenta mil pessoas por R$ 50 cada! As portas da
Romênia estão abertas! Decida já!”
Mas o Departamento de Estado ignorou a oferta e recusou
fazer parte da proposta. Quanto a Ben Hecht, ouviu de diversas lideranças
judaicas que se sentiram ultrajadas pela sua matéria.
Um evento organizado pelo Comitê para um Exército Judaico na
Madison Square Garden, no qual foi encenada uma peça de Hecht chamada We Will Never
Die, que contou com a participação de famosos como Billy Rose, Moss Hart, Kurt
Weill, Paul Muni, Edward Robinson, Frank Sinatra, Marlon Brando e outros.
O efeito positivo sobre a opinião pública fez a peça viajar
para Washington, Filadélfia, Chicago, Boston e Hollywood. Somente pararam
quando a encenação foi proibida pelo governo.
Entre 19 e 30 de abril, na Ilhas Bermudas, ocorreu uma
conferência para tratar dos refugiados judeus na Europa, envolvendo governo e
organizações judaicas. Representantes dos governos americano e britânico
vetaram qualquer ação prático nesse sentido sob a alegação de que não
pretendiam negociar nada com Hitler. Apenas os 5 mil judeus refugiados na
Espanha foram objeto de deliberação.
Foi somente após essa negociação fracassada e o desânimo que
se lhes abateu que a criação de um Estado judeu passou a ser o principal
objetivo das organizações judaicas. O crescimento do movimento sionista nos
EUA, então, tornou-se irrefreável.
Após anos de crescimento, o Comitê para um Exército Judaico
mudou seu nome para Comitê Emergencial para Salvar o Povo Judeu da Europa. Para
chamar atenção para sua causa, usavam manchetes alarmantes como “Corrida do
tempo contra a morte”, “Eles são levados à morte todo dia, mas podem ser salvos”,
“Estamos todos diante do tribunal da Humanidade, da História e de Deus”, “Você
consegue dormir com a consciência tranquila?”
Ben Hecht também continuava a usar bem suas habilidades
literárias: publicou o poema “Balada dos Judeus Condenados da Europa” (Ballad
of the Doomed Jews of Europe), com grandes conseqüências, especialmente sobre o
presidente Roosevelt, até então acusado pelos judeus de fazer muito pouco
frente a seu genocídio. Os 5 milhões de judeus vivendo no Reich eram objeto de
grande preocupação nos EUA.
Conforme o tempo passava, deputados e senadores afiliados ao
Comitê Emergencial eram eleitos e passavam a exercer pressão sobre Roosevelt.
Aprovou-se uma resolução, a Comissão de Refugiados de Guerra, porém esta decisão
foi muito criticada pelas organizações judaicas por não recomendar a criação de
um Estado judeu na Palestina. De qualquer maneira, a Comissão criada foi
responsável por salvar cerca de 200 mil judeus da morte no Reich.
Rubem L. de F. Auto
Fonte: livro “A Colaboração: o pacto entre Hollywood e o
nazismo”
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