Nos anos 1970, insatisfeito com as estatísticas econômicas
do pequeno reino que comandava, o rei do Butão resolveu limpar o tabuleiro e
instituiu novas medidas, que julgava mais compatíveis com o que pensava ser
importante para sua população. Desta medida surgiu o FIB – Felicidade Interna
Bruta, em oposição ao já tradicional PIB – Produto Interno Bruto. Surgia a
economia da felicidade.
É indiscutível que, materialmente, a humanidade tem pouco do
que reclamar: os níveis de renda e de riqueza crescem continuamente, exceto por
pequenos intervalos marcados por guerras e tragédias, ainda assim de efeito
limitado geograficamente. Mas é fato que mesmo a população dos países ricos tem
dado provas de crescente insatisfação nos últimos 50 anos.
Embora a riqueza seja a medida de progresso desde os tempos
de Adam Smith, pelo menos, cujos indicadores são facilmente mesuráveis –
desemprego, expectativa de vida, desigualdade, renda , a ideia de que a
felicidade é uma medida de progresso remonta a Thomas Jefferson que, em 1776,
determinou que todos os americanos deveriam ter o direito à “busca da
felicidade” – ou right to pursuit of hapiness, conforme a Constituição norte-americana.
Outro liberal-iluminista preocupado com a questão, Jeremy
Bentham criou a filosofia do utilitarismo – teoria filosófica que se opõe ao
egoísmo, na medida em que prega que uma ação só pode ser considerada moralmente
correta se suas consequências promoverem o bem-estar coletivo - e declarou que
os humanos deveriam buscar a “maior felicidade para o maior número” de
indivíduos.
E quanto ao Butão, seus cidadãos hoje são felizes pedintes e
mendicantes? Não. Desde que adotou o FIB, o país tem visto seu PIB decolar. Em
2007, foi o segundo país que mais cresceu no mundo (em 2008, esse número
alcançou invejáveis 17,9%).
As medidas que põem o país ao encontro de seus objetivos
incluíram reservar 60% do território nacional às florestas, limitar o número de
turistas. Além disso, fortes políticas de distribuição de renda e eliminação da
pobreza foram adotadas.
Os resultados das medidas de felicidade no Butão apontam para
resultados satisfatórios: em 2005, apenas 3% dos cidadãos não se diziam felizes.
Mais de 50% se consideravam muito felizes. Embora todos sejam capazes de
reconhecer que medir a felicidade é mais difícil do que medir indicadores quantitativos
óbvios, como nível de riqueza ou expectativa de vida, progressos observados na
tecnologia de mapeamento cerebral tornaram-no capaz de identificar a região do
cérebro estimulada pela felicidade.
Alguém poderia alegar, cinicamente diga-se, que ao aumentar
o nível de renda geral, o nível de felicidade acompanharia esse eventual
enriquecimento. Mas décadas de medições levaram a conclusões um tanto diversas.
Sabe-se que quando a pessoa passa da pobreza para a riqueza, seu nível individual
de felicidade aumenta; mas à medida que seu nível de riqueza atinge patamares
mais altos, seu nível de satisfação passa a retornos decrescentes. Segundo o economista
britânico Richard Layard, o patamar que leva ao maior nível de felicidade é uma
renda média nacional de cerca de US$ 20 mil.
A explicação para essa reação tão humana pode estar no
chamado “ciclo hedonista”: o novo nível de riqueza rapidamente passa a ser
considerado patamar básico, o que leva a mais aspirações em busca de
satisfação. Pesquisas têm mostrado que, atendidas as necessidades básicas, o
indivíduo para de se ocupar apenas com
suas necessidades e passa a ter outros indivíduos como parâmetro: seu salário o
deixará feliz se for superior ao do seu cunhado. O resultado coletivo disso é
que o excesso de informação das sociedades atuais tem levado à redução da
felicidade geral, na medida em que o estilo de vida dos ricos e famosos deprime
aqueles que não têm acesso àqueles bens – isto é, a grande maioria da
sociedade.
Os resultados interessantes trazidos pela economia da
felicidade estimularam autoridades da China, da Tailândia, da Austrália, do
Reino Unido e de muitas outras nações a buscarem uma medida internacional comparativa.
Uma medida utilizada pela New Economics Foundation, chamada de “índice planeta
feliz”, que combina satisfação com a vida, expectativa de vida e pegada
ecológico entre as medidas, tem despertado discussões interessantes. Em 2006, a
ilha de Vanuatu, localizada no Pacífico, ficou em primeiro lugar. Em seguida vieram
Colômbia e Costa Rica; Burundi, Suazilândia e Zimbábue ficaram nas últimas
colocações. Quase todos os países ricos ficaram na metade inferior do ranking.
Algumas políticas públicas adotadas em diversos países têm o
índice de felicidade em seu gene. Por exemplo, os impostos progressivos que
alcançam as rendas mais elevadas têm o efeito de diminuir o “nível de inveja
geral” e, por consequência, aumentam o nível de felicidade. Até medidas para
estimular eleitores a irem votar são pensadas de acordo com a felicidade que
trará, eventualmente.
Como tudo nesse mundo, a economia da felicidade tem seu lado
sombrio. De acordo com a psicologia, fatores de infelicidade, como
descontentamento e inveja, podem ser positivos sobre a formação da
personalidade das pessoas. Muitos também questionam a justificativa moral de se
exigir um governo que busque a felicidade nacional.
Por fim, o próprio Butão deu mostras de como a felicidade
pode ser questionável. Em 1990, o Butão expulsou mais de 100 mil pessoas do
país por pertencerem a uma etnia diversa daquela que governa o país. Diante do
aumento da felicidade nacional decorrente de tamanha violência contra os
direitos humanos, não deixa de ser curioso de se a Alemanha nazista teria boas
medições no índice de felicidade do país.
Rubem L. e F. Auto
Fonte: livro “50 Ideias de Economia: que você precisa
conhecer”
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