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terça-feira, 2 de outubro de 2018

FIB, A FELICIDADE TAMBÉM ENCHE BARRIGA?



Nos anos 1970, insatisfeito com as estatísticas econômicas do pequeno reino que comandava, o rei do Butão resolveu limpar o tabuleiro e instituiu novas medidas, que julgava mais compatíveis com o que pensava ser importante para sua população. Desta medida surgiu o FIB – Felicidade Interna Bruta, em oposição ao já tradicional PIB – Produto Interno Bruto. Surgia a economia da felicidade.

É indiscutível que, materialmente, a humanidade tem pouco do que reclamar: os níveis de renda e de riqueza crescem continuamente, exceto por pequenos intervalos marcados por guerras e tragédias, ainda assim de efeito limitado geograficamente. Mas é fato que mesmo a população dos países ricos tem dado provas de crescente insatisfação nos últimos 50 anos.

Embora a riqueza seja a medida de progresso desde os tempos de Adam Smith, pelo menos, cujos indicadores são facilmente mesuráveis – desemprego, expectativa de vida, desigualdade, renda , a ideia de que a felicidade é uma medida de progresso remonta a Thomas Jefferson que, em 1776, determinou que todos os americanos deveriam ter o direito à “busca da felicidade” – ou right to pursuit of hapiness, conforme a Constituição norte-americana.

Outro liberal-iluminista preocupado com a questão, Jeremy Bentham criou a filosofia do utilitarismo – teoria filosófica que se opõe ao egoísmo, na medida em que prega que uma ação só pode ser considerada moralmente correta se suas consequências promoverem o bem-estar coletivo - e declarou que os humanos deveriam buscar a “maior felicidade para o maior número” de indivíduos.

E quanto ao Butão, seus cidadãos hoje são felizes pedintes e mendicantes? Não. Desde que adotou o FIB, o país tem visto seu PIB decolar. Em 2007, foi o segundo país que mais cresceu no mundo (em 2008, esse número alcançou invejáveis 17,9%).

As medidas que põem o país ao encontro de seus objetivos incluíram reservar 60% do território nacional às florestas, limitar o número de turistas. Além disso, fortes políticas de distribuição de renda e eliminação da pobreza foram adotadas.

Os resultados das medidas de felicidade no Butão apontam para resultados satisfatórios: em 2005, apenas 3% dos cidadãos não se diziam felizes. Mais de 50% se consideravam muito felizes. Embora todos sejam capazes de reconhecer que medir a felicidade é mais difícil do que medir indicadores quantitativos óbvios, como nível de riqueza ou expectativa de vida, progressos observados na tecnologia de mapeamento cerebral tornaram-no capaz de identificar a região do cérebro estimulada pela felicidade.

Alguém poderia alegar, cinicamente diga-se, que ao aumentar o nível de renda geral, o nível de felicidade acompanharia esse eventual enriquecimento. Mas décadas de medições levaram a conclusões um tanto diversas. Sabe-se que quando a pessoa passa da pobreza para a riqueza, seu nível individual de felicidade aumenta; mas à medida que seu nível de riqueza atinge patamares mais altos, seu nível de satisfação passa a retornos decrescentes. Segundo o economista britânico Richard Layard, o patamar que leva ao maior nível de felicidade é uma renda média nacional de cerca de US$ 20 mil.

A explicação para essa reação tão humana pode estar no chamado “ciclo hedonista”: o novo nível de riqueza rapidamente passa a ser considerado patamar básico, o que leva a mais aspirações em busca de satisfação. Pesquisas têm mostrado que, atendidas as necessidades básicas, o indivíduo para de  se ocupar apenas com suas necessidades e passa a ter outros indivíduos como parâmetro: seu salário o deixará feliz se for superior ao do seu cunhado. O resultado coletivo disso é que o excesso de informação das sociedades atuais tem levado à redução da felicidade geral, na medida em que o estilo de vida dos ricos e famosos deprime aqueles que não têm acesso àqueles bens – isto é, a grande maioria da sociedade.

Os resultados interessantes trazidos pela economia da felicidade estimularam autoridades da China, da Tailândia, da Austrália, do Reino Unido e de muitas outras nações a buscarem uma medida internacional comparativa. Uma medida utilizada pela New Economics Foundation, chamada de “índice planeta feliz”, que combina satisfação com a vida, expectativa de vida e pegada ecológico entre as medidas, tem despertado discussões interessantes. Em 2006, a ilha de Vanuatu, localizada no Pacífico, ficou em primeiro lugar. Em seguida vieram Colômbia e Costa Rica; Burundi, Suazilândia e Zimbábue ficaram nas últimas colocações. Quase todos os países ricos ficaram na metade inferior do ranking.

Algumas políticas públicas adotadas em diversos países têm o índice de felicidade em seu gene. Por exemplo, os impostos progressivos que alcançam as rendas mais elevadas têm o efeito de diminuir o “nível de inveja geral” e, por consequência, aumentam o nível de felicidade. Até medidas para estimular eleitores a irem votar são pensadas de acordo com a felicidade que trará, eventualmente.
Como tudo nesse mundo, a economia da felicidade tem seu lado sombrio. De acordo com a psicologia, fatores de infelicidade, como descontentamento e inveja, podem ser positivos sobre a formação da personalidade das pessoas. Muitos também questionam a justificativa moral de se exigir um governo que busque a felicidade nacional.

Por fim, o próprio Butão deu mostras de como a felicidade pode ser questionável. Em 1990, o Butão expulsou mais de 100 mil pessoas do país por pertencerem a uma etnia diversa daquela que governa o país. Diante do aumento da felicidade nacional decorrente de tamanha violência contra os direitos humanos, não deixa de ser curioso de se a Alemanha nazista teria boas medições no índice de felicidade do país.


Rubem L. e F. Auto

Fonte: livro “50 Ideias de Economia: que você precisa conhecer”

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